Tecido
Social
Correio Eletrônico da Rede Estadual de Direitos Humanos
- RN
N.
015 – 08/12/03
Depoimentos de mulheres
vítimas de violência recolhidos na Delegacia Especializada de
Atendimento à Mulher (DEAM) da Ribeira, Natal (RN)
S.
M. S., 40 anos, empregada doméstica, moradora do bairro Mãe
Luíza
O
mês passado fui estuprada pelo meu ex marido mas fiquei com
pena dele e tirei a queixa da delegacia, então ele voltou a
praticar outros crimes comigo. Colocou água, gelo e açúcar numa
camisinha cheia de esperma dele e me obrigou a tomar. Depois
de eu vir de novo dar parte na delegacia, veio para mim chorando,
pedindo que tirasse a queixa. Ele não é de Natal, é de Alagoas
e está sozinho aqui, além do mais tem um bom emprego e tudo
isso me deixou mais uma vez com pena dele, não queria prejudicá-lo
nem sujar seu nome. Assim retirei a queixa outra vez e desisti
de processá-lo. Então no domingo passado ele entrou na minha
casa botando a porta para dentro, me agrediu, ainda estou com
o corpo todo arranhado. Chegou a dizer que tinha falado aos
amigos dele que não ia me matar mas ia trazer para eles uma
orelha minha. Me atirou encima da cama, cuspiu na minha cara
e disse que do jeito que fez comigo fazia na cara da delegada.
Depois pegou um espeto de churrasco para me ferir, lutei com
ele e ele furou minha mão, ainda tenho as marcas. Agora eu pretendo
levar adiante o processo sem pena, sem dor nem nada, porque
ele não tem pena de mim.
M.
G. B., 26 anos, empregada doméstica, moradora do bairro Cidade
Nova
Trabalhava
na casa de um empresário desta cidade há sete anos. Um dia a
esposa dele chegou em casa e passou direto para o quarto deles,
ao qual só têm acesso eles dois, pois fica tudo trancado. Eram
as 4:00 da tarde, às 4:30 ela tinha médica, foi para a consulta
levando consigo a bolsa, trancou o quarto e saiu. No dia seguinte,
quando cheguei ao trabalho às 6:00 da manhã, fui acusada de
ter roubado dinheiro da bolsa dela, da qual estavam faltando
3.100 reais. Ela veio me fazer a acusação e em seguida voltou
para o quarto. Poucos minutos depois chegou o esposo perguntando
pelo dinheiro, eu respondi que não sabia nada e começou a me
bater com tapas no rosto para me forçar a assumir o furto. Como
eu continuava a dizer que não tinha feito nada, colocou uma
sacola na minha cabeça tentando me asfixiar. Depois tirou esta
sacola da minha cabeça e saiu dizendo que ia buscar a polícia.
Eu voltei ao meu trabalho e pouco tempo depois ele chegou com
três amigos. Me obrigaram a entrar no carro dele e me trouxeram
até a minha casa. Quando chegaram, meu esposo estava tomando
banho. Eles empurraram a porta para dentro e meu marido chegou
correndo para perguntar o que estava acontecendo. Disseram que
eram da polícia, então meu esposo perguntou um mandato de busca
para entrar na nossa residência e um deles sacou um revólver,
o apontou contra o peito dele e disse que seu mandato de busca
era aquele. Então começaram a revirar tudo procurando o dinheiro:
guarda-roupa, bolsas, gavetas, tudo o que tinha lá em casa...
Colocaram de novo uma sacola na minha cabeça e começaram a bater
no meu rosto e me dar chutes. Jogaram meu esposo encima do sofá,
apontaram a arma na sua cabeça e disseram que se o dinheiro
não aparecesse atiravam nele. Me amarraram com fio de luz, com
as mãos para atrás, e algemaram meu marido com algema de dedo.
Então quebraram todos os cofrezinhos de gesso que tinha lá em
casa, tiraram todo o dinheiro (2.725 reais, as nossas economias),
levaram as nossas duas televisões, o som, o som do carro do
meu esposo e ainda nos levaram - eu amarrada com fio de luz
e meu marido com os dedos algemados - para o estacionamento
do condomínio dele. Ai disse que se a gente não entregasse o
dinheiro ia nos matar. Depois de nos ameaçar a agredir muito
verbalmente, nos levaram de volta para casa e tiraram dai tudo
o que ficava, todos os pertences que a gente tinha. Ainda por
cima, foi à delegacia denunciar a gente de furto, mas a gente
veio aqui dar entrada por danos morais.
Nota
da redação: O autor dos abusos cometidos contra M. G. B. e o esposo
dela é dono dos motéis Bahamas e Cassino, em Natal
(RN).
Veja
também:
- ENTREVISTA. João
Alfredo (Deputado Federal do PT e fundador do Observatório
do Judiciário do Ceará). "O Poder Judiciário
também tem que responder perante a sociedade"
- VIOLÊNCIA CONTRA
A MULHER. A Delegacia da Mulher de Natal: como funciona e as
dificuldades que enfrenta
- Comissão do Conselho
de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) sobre o caso
Jorge Abafador é mal recebida pelo Judiciário
de Natal
- Campanha pelo respeito dos Direitos
Humanos durante a Festa da Exclusão
- ENTREVISTA. Rogério
Tadeu Romano (Procurador da República do Rio Grande do
Norte). "Hoje o compromisso do Ministério Público
não é com as elites, mas com a sociedade"
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