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Insurreição Comunista de 1935
em Natal e Rio Grande do Norte

Giocondo Dias, a Vida de um Revolucionário

 

 

 

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Giocondo Dias,
a Vida de um Revolucionário

João Falcão, Agir 1993

Infância e Mocidade | Filiação à ANL e ao PCB | Véspera da Revolução | A Rebelião de Natal | Junta Governativa | Três dias de governo | Jornal da Revolução | A Derrocada | A Fuga | Refúgio de comunistas

Infância e mocidade

Giocondo Gerbasi Alves Dias era baiano de Salvador, nascido a 18 de novembro de 1913, na rua dos Ossos, bairro de Santo Antônio Além do Carmo. Era o primogênito de uma família modesta: seus pais, o comerciário Antônio Alves Dias, baiano, e D. Ana Maria Frederico Gerbasi Alves Dias, italiana, além de quatro irmãos: Maria, Gilberto, Gerson e Antônio. Seus avós paternos foram Mathias Alves Dias e Arminda Cunha Alves Dias, baianos; e avós maternos, Jacob Gerbasi e Maria Philomena Frederico Gerbasi, italianos.

Órfão de pai aos sete anos de idade, trabalhou inicialmente num armazém de secos e molhados, e depois como coroinha1 no convento de São Francisco e na Igreja de Santana. Filho de católica fervorosa, o fato de ganhar 10 mil réis por mês teria também contribuído para sua inclinação religiosa. Essa quantia representava providencial ajuda às despesas da casa de uma viúva pobre. Nessa função entrou em choque com o padre, porquanto costumava oferecer-se para batizar, em caso de emergência, crianças sem recursos. Com isso, a criança não morria pagã, mas o pároco deixava de receber a espórtula doada pelo padrinho. Sem condições financeiras para assumir esse papel, Giocondo foi proibido de arranjar novos afilhados.

Não pôde fazer o curso ginasial. O primário completou-o na cidade de Feira de Santana. Aos treze anos foi trabalhar num escritório onde conheceu o datilógrafo Alberto Campos, sergipano que, vindo do Rio de Janeiro, passou a morar em Salvador para tratar-se de tuberculose. Alberto Campos era correspondente do jornal A Nação, editado no Rio de Janeiro e dirigido por Leônidas de Rezende, ligado ao PCB. Os exemplares eram trazidos por marinheiros do Lloyd Brasileiro e pelos navios Ita, da Cia. Comércio e Navegação, chegando com pouco atraso.

Dias ia vendê-los, a seu pedido, no Charriot, como era chamado naquela época o Plano Inclinado Gonçalves, que liga a cidade alta à cidade baixa, local muito movimentado. Como os compradores eram poucos, tinha autorização para entregá-los gratuitamente, de maneira a forçar sua divulgação. A quantia apurada na vendagem seria sua. Mas a maioria dos transeuntes não queria o jornal, ainda que de graça, por medo.

Campos candidatou-se a deputado federal pelo BOC (Bloco Operário e Camponês), legenda que o Partido Comunista encontrara, em 1927, para concorrer às eleições. Os pequenos comícios que fazia tinham como assistente assíduo o jovem Giocondo, encantado com a oratória do seu colega de trabalho e já se considerando comunista, embora sem o mais longínquo contato com a organização partidária, então clandestina. De Alberto Campos recebeu as primeiras noções, ainda bem vagas, sobre comunismo. No seu espírito ficou o gérmen desse ideal.

Dias gostava de praticar esportes como futebol, basquete, natação, vôlei e salto em altura, tornando-se um atleta forte e saudável. Torcia pelo time mais tradicional da capital baiana, o Ipiranga.

A Aliança Liberal, partido que lançara a candidatura oposicionista de Getúlio Vargas à Presidência da República contra o candidato Júlio Prestes, apoiado pelo governo Artur Bernardes, empolgava o país. No dia 4 de outubro de 1930, em Salvador, um ruidoso movimento popular fez incendiar mais de cem bondes da Cia. Linha Circular. E Giocondo participando, no meio da massa! O vermelho da bandeira da Aliança Liberal o atraía. Essa agitação propagou-se por todo o Brasil, principalmente pelo Nordeste, de onde partiu a Revolução de 1930, movimento vitorioso que colocou Getúlio Vargas no poder, em 30 de outubro daquele ano.

Em 1931 fechou-se o escritório onde ele e Campos trabalhavam, conseqüência direta do crack norte-americano de 1929 na economia brasileira.

Restavam-lhe então poucas alternativas. Engajar-se no Exército era uma delas. Apresentou-se como voluntário para servir em Recife. Pretendia ir para a Escola de Sargentos, onde em seis meses estaria ganhando 390 mil réis. Mas engajou-se como soldado em 2 de abril de 1932, tomando o número 633. Não demorou a entrar em ação: a 9 de julho daquele ano eclodiu a Revolução Constitucionalista de São Paulo, e o 21 º Batalhão de Caçadores de Recife foi enviado a Uberaba no dia 12, para ajudar no combate aos paulistas.

Essa revolução, falsamente apresentada como um movimento separatista, sublevou-se contra o governo ditatorial de Getúlio Vargas para exigir nova Constituição e tentar restaurar a República Velha, desbancada pela Revolução de 1930.

Em seguida, Dias enfrentou muitas surpresas, peripécias e incertezas vividas pelo batalhão:

– Nós fomos tomar parte no combate aos paulistas. E, quando íamos voltar para o Recife, o interventor Carlos de Lima Cavalcanti vetou. Ora, este Batalhão não tinha nada a ver com o antigo 21º BC, mas mesmo assim ele vetou. E o que aconteceu? Depois de termos feito toda a campanha em São Paulo, nos mandaram para Recife – passamos lá oito dias – e fomos enviados para a fronteira da Colômbia. Isto criou no batalhão um estado de ânimo muito sério...

O batalhão foi para Tonantins, na foz do Içá, no Amazonas, por ocasião do conflito que houve entre a Colômbia e o Peru. Eu, por exemplo, fiquei lá no Rio Içá, lá em Porto Ipiranga, por 120 dias. Era um contingente de cerca de 120 homens, que, em quatro meses, ficou reduzido a seis. Adoeceram todos de beribéri, maleita e uma série de outras doenças. Eu sobrevivi porque era atleta, jovem e forte e não me socorria da cachaça como os outros.

Bem, mas isso é secundário: o fato é que este batalhão foi retirado da fronteira e o Carlos de Lima Cavalcanti persistiu na posição de que ele não devia voltar para Pernambuco. Fizeram, então, o seguinte: o 29º BC de Natal foi mandado para o Recife e o 21º para Natal. Veja bem, um batalhão escaldado por uma participação na luta paulista de 32, sobrevivente da selva amazônica... Nós éramos elementos efetivamente dispostos a qualquer ação que se voltasse contra o status quo. Em Manaus, chegamos a nos reunir e conspirar para não saltar em Natal. Quando o navio chegasse ao porto nós nos levantaríamos, jogaríamos a oficialidade ao mar... Mas na hora "H", foi dada a última forma e nós desembarcamos.2

Tanto em São Paulo como em Mato Grosso do Sul, Giocondo teve uma atuação militar destacada, marcada até mesmo por atos de heroísmo. Assim, de certa feita, o comandante do Batalhão precisou de cinco homens para uma missão de altíssimo risco, ou seja, um levantamento topográfico até 20 metros de distância dos canhões Krupp utilizados pelos paulistas. Ele foi o primeiro a se apresentar, e sua atitude permitiu a constituição imediata do grupo de voluntários.3

Nesse período, Dias teve uma atuação excepcional no Exército: foi promovido a 1º cabo, foi aprovado no curso para sargento e quatorze vezes elogiado em boletim, tendo sempre ressaltada a disciplina, a abnegação, a dedicação ao trabalho, o amor à instrução, e os relevantes serviços prestados ao Batalhão. Quando regressou da missão à fronteira da Colômbia, o comandante do destacamento de Içá, capitão Djalma Bayma, mandou publicar no boletim de 5 de junho de 1933 extraordinário elogio:

- Louvo-o pelo belíssimo exemplo de sacrifício pessoal no cumprimento do dever, com prejuízo da própria saúde, por ter voluntariamente e resignadamente enfrentado e vencido a toda sorte de obstáculos, sem meios de defesa, em uma região insalubre, quase impossível mesmo de se permanecer, como a que esteve destacado por longo tempo, tal a falta absoluta de conforto e quantidade enorme de mosquitos que não davam um segundo de trégua, ferroavam seus infelizes habitantes, castigando-os ainda com a transmissão de moléstias, não lhes dando um momento de sossego durante todo o dia. É, pois, digno dos maiores elogios pela noção exata do cumprimento do dever, espírito de sacrifício, disciplina, amor ao corpo a que pertence, patriotismo, enfim, pelos inestimáveis serviços que desassombradamente prestou à pátria, no desempenho da missão árdua e espinhosa, porém muito honrada que lhe foi confiada. Extremamente envaidecido por comandá-Io, sinto-me orgulhoso de tão disciplinado praça, cujo heroísmo, abnegação, dedicação e força de vontade o tomaram digno de minha estima pessoal e da admiração de todos os seus companheiros.4

Em Natal, a partir de 1933, Giocondo passou a ter uma vida normal, sem os perigos e o desconforto sofridos desde que se engajara no Exército. Com excepcional capacidade de liderança, e ocupando a função de instrutor de educação física, a cada dia alcançava maior prestígio junto à tropa, onde a quebra de hierarquia e o desprestígio da oficialidade contribuíram para uma indisciplina generalizada. Giocondo, chefe e conselheiro dos homens sob seu comando, protegia-os sempre que podia. Para citar um exemplo, após uma arruaça promovida num bonde pelo cabo Estevam Guerra e mais alguns soldados, o comandante colocou o batalhão em forma para que o cabo explicasse a sua mão machucada. Giocondo imediatamente respondeu pelo cabo Estevam, afirmando que este a machucara fazendo exercício. Evitou, desta forma, que mentindo ou confessando o soldado fosse conseqüentemente punido.5

Aos 21 anos, é tocado pelo amor. Conhece uma jovem potiguar, 18 anos, estudante secundarista, morena do tipo índio, que costumava passar em frente ao quartel na ida à escola: Lourdes Tavares, filha de um funcionário público oriundo de numerosa família de classe média. Apaixonam-se e, após três meses de arrebatado namoro, casam-se na Igreja de São Pedra, no bairro do Alecrim, a 18 de abril de 1934 - não se casaram no civil por não permiti-Ia o regulamento do Exército. Vão morar com os pais dela. Giocondo dedica-se ao novo lar, à sua jovem mulher e ao trabalho no quartel. Cuida de um sítio herdado pelo sogro, nos arredores da cidade, cultivando uma horta, atividade que sempre o atraíra.

Foram muito felizes nos poucos meses de convívio e ro¬mance, abruptamente interrompidos por uma revolta no 21º BC.

 

Notas:

1 - Nome dado ao menino sacristão que ajuda o padre na celebração de missas e ladainhas.

2 - Giocondo Dias. Os Objetivos dos Comunistas – Artigos, Entrevistas e um Depoimento Político. São Paulo, Edições Novos Rumos, 1983, p. 146 e 147.

3 - Ivan Alves Filho. Giocondo Dias – Um Ensaio Biográfico. Rio de Janeiro, Edição do autor, 1991, p. 16.

4 - Certidão do currículo de Giocondo Dias, dada pelo Arquivo Histórico do Exército, em 23 de abril de 1993, a pedido de Antônio Eduardo Alves Dias.

5 - Estevam Juvenal Guerra, 20 anos, foi um dos participantes do levante de 1935. Grande e leal amigo de Giocondo, com o qual conviveu por mais de dez anos, em Salvador, para onde fugiram em 1937. Foi por ele indicado para compor o Comitê Estadual do PCB, em 1945.

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