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A
Comissão da verdade
Homero
de Oliveira Costa
Prof. ciência
política da UFRN
“A
verdade sobre o nosso passado é fundamental
para que fatos que mancharam nossa história
nunca mais voltem a acontecer” (Presidente
Dilma Rousseff na solenidade que sancionou
a lei que cria a Comissão da Verdade)
No dia 18 de novembro de 2011, a presidente
Dilma Rousseff sancionou a duas leis: uma
que permite a acesso a informação
pública (entre outros aspectos permite
que todos os brasileiros tenham acesso a
documentos públicos de órgãos
federais, estaduais e municipais, exceto
as que dizem respeito à segurança
do Estado e de informações
de caráter pessoal) e a lei que cria
a Comissão da Verdade. O projeto
havia sido aprovado na Câmara dos
Deputados no dia 21 de outubro e no Senado
no dia 26 de outubro.
A lei foi sancionada com alterações
em relação ao projeto que
havia sido encaminhado ao congresso em abril
de 2010. A principal alteração
diz respeito às atividades da comissão
(cujo período foi estendido de 1946
a 1988) que investigará as violações
de direitos humanos cometidos por agentes
públicos por razões políticas,
mas não terá “caráter
jurisdicional ou persecutório”,
ou seja, não haverá julgamento,
já que não se trata de um
tribunal e, portanto, não prevê
punições para aqueles que
cometeram crimes.
A presidente Dilma deixou claro o espírito
não revanchista da lei. Para ela
“O Brasil inteiro se encontra, enfim,
consigo mesmo sem revanchismo, mas sem a
cumplicidade do silêncio” e
que o dia 18 de novembro de 2011 “é
uma data histórica para o Brasil
(...). É o dia que a partir de agora
iremos comemorar a transparência e
celebrar a verdade”.
O Brasil era o único país
da América do Sul que, tendo passado
por experiências autoritárias,
ainda não havia criado comissões.
Todos os demais, como Bolívia, Peru,
Chile, Venezuela, Colômbia, Equador,
Paraguai, Argentina e Uruguai, criaram comissões.
Algumas, já revogadas, outras não
funcionaram, como as da Bolívia e
Equador, por exemplo e outras como no Chile
(mais de uma comissão) e Argentina,
com a prisão e punição
de violadores dos direitos humanos.
A formação das comissões
certamente tem relação com
a forma como foram feitas as transições
das ditaduras militares para os governos
civis. Na maioria dos casos, foram pactos
e leis possíveis como a lei de anistia
no Brasil, aprovada em agosto de 1979, sancionada
pelo presidente João Batista Figueiredo
e considerada por muitos juristas como irrevogável
(em que pese o esforço de alguns
parlamentares, como a deputada Luiza Erundina,
do PSB/SP, por sua revogação).
Na argentina, pós ditadura militar
(1976-83) foi aprovada a Lei do Ponto Final
(1986), no governo de Raul Alfonsín,
com perdão aos violadores dos direitos
humanos. Essa lei foi revogada em 2003 pelo
presidente Nestor Kirchner e tem sido à
base para punições de civis
e militares envolvidos em assassinatos e
torturas de presos políticos. Num
país em que se estima 30 mil o número
de vítimas da ditadura, mais de 200
já foram punidos, alguns com prisão
perpétua, como foi o caso recente
de um ex-oficial da Armada, Alfredo Astiz.
Em relação ao Uruguai, no
momento em que o Brasil aprovava a criação
da Comissão da Verdade, o presidente
José Mujica revogou a lei que anistiava
os militares envolvidos em crimes contra
a humanidade (conhecida como “Lei
da caducidade”, que havia sido aprovada
nos anos l980 e ratificada em dois plebiscitos
- l989 e 2009) que, segundo o governo uruguaio
atual, dificultava às investigações
sobre os crimes cometidos durante a ditadura
militar.
Creio que a lei aprovada no Brasil de criação
da Comissão da Verdade (que terá
sete integrantes e um prazo de dois anos
para apresentar um relatório) foi
um avanço, um passo inicial de um
processo de investigação,
no entanto, se gerou apreensões em
setores da direita (e seus aliados na imprensa),
já sendo articulada inclusive uma
Frente Nacional Contra a Comissão
da Verdade, a lei foi também criticada
por entidades como o Grupo Tortura Nunca
Mais, pela Comissão dos Familiares
dos Mortos e Desaparecidos Políticos
e Comissão de Anistia, por exemplo,
porque não apenas não foram
consultadas, como a lei sancionada é
muito diferente do projeto que havia sido
enviado ao congresso em abril de 2010, com
base no conjunto de propostas do III Programa
Nacional de Direitos Humanos, que previa,
entre outras coisas, punição
aos torturadores, por considerar a tortura
crime comum, imprescritível e inafiançável.
Agora, nos resta esperar a formação
da comissão e, claro, seu relatório
que pode ajudar a conhecer melhor a história
da repressão política no país.
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