Em seu exame
abrangente de episódios históricos de crises
financeiras, C.P. Kindleberger observou que
os mercados financeiros funcionam bem na maior
parte do tempo. Mas há circunstâncias nas
quais o comportamento dos participantes do
mercado cria efeitos de feedback,
que fazem com que as perturbações se propaguem
de um mercado para outro, em lugar de ser
absorvidas no segmento de origem. Uma razão
importante para isto é que os investidores
institucionais, os principais fornecedores
de liquidez, interpretam mal os sinais de
preços. Em um ambiente de incerteza, eles
podem entender um colapso nos preços devido
a uma escassez temporária de liquidez como
uma revisão para baixo do valor fundamental
do ativo. Em lugar de comprar o ativo
porque seu preço encontra-se temporariamente
subvalorizado, gerando assim a liquidez necessária,
eles apressam-se em vender, fazendo com que
o preço continue deslizando para baixo. Se
os market makers não entrarem como
substitutos dos investidores institucionais,
o segmento de mercado em questão pode entrar
em colapso. Agentes que estavam usando este
segmento para proteger, sob forma de hedging,
suas posições em outros segmentos, vão ter
que recorrer precipitadamente ao hedging
dinâmico – e com isso disseminarão o desequilíbrio
inicial.
Segundo
o relatório de 1993 do G-30 sobre derivativos,
a tarefa de market making, nos mercados
globais, está altamente concentrada em um
pequeno número de bancos internacionais de
investimento e comerciais e securities
houses. Quanto mais a poupança for canalizada
por meio de investidores institucionais, maior
será a dependência em relação aos mercados
de securities como repositórios de
liquidez. Quando os investidores institucionais
produzem liquidez comprando títulos de dívida
de curto prazo, eventualmente fazem o hedge
de pelo menos uma parte do risco de mercado.
Derivativos de balcão, em franco desenvolvimento,
são instrumentos adequados à configuração
de instrumentos sob medida. São emitidos pelos
bancos internacionais. Estes dealers
precisam fazer o hedge de suas posições.
A questão crucial é: podem fazê-lo por meio
dos mercados de derivativos de balcão ou precisam
contar com o hedging dinâmico nos mercados
de securities subjacentes, contribuindo
assim para a pressão de venda em massa? Podem
fazer o hedge diretamente se houver
investidores querendo negociar risco em mercados
de balcão. Estes investidores tornam-se os
emissores finais dos derivativos. Nesse caso,
o risco de mercado está efetivamente diversificado,
e não ocorre nenhuma externalidade dinâmica.
Os dealers também podem fazer o hedge
se sua posição agregada líquida em mercados
de balcão é pequena. O risco de mercado é
redistribuído no interior do grupo de market
makers segundo seus perfis de risco individuais,
de modo que não são mantidas posições indesejadas.
Este padrão ótimo de provisão de liquidez
e diversificação do risco seguramente é possível
quando as condições financeiras são estáveis.
Contudo, é extremamente improvável que o padrão
se sustente em ambientes voláteis, quando
a opinião dos investidores institucionais
passa por mudanças abruptas e coletivas em
resposta a choques. Mercados de balcão podem
tornar-se muito pouco líquidos, e o conjunto
dos market makers terá que se garantir
por meio do hedging dinâmico nos mercados
subjacentes.
As crises de
mercado a que se faz referência no Quadro 1 e outros episódios
de graves perdas por parte de operadores em mercados de balcão
demonstram que condições relativamente favoráveis nem
sempre estão presentes. As estruturas dos mercados ocultam
fragilidades que só se revelam em situações de maior tensão,
quando os preços encontram-se excepcionalmente instáveis. As
características de muitos contratos de derivativos do tipo
das opções tornam-nos
altamente vulneráveis a mudanças inesperadas na volatilidade
de taxas de juros e de câmbio. Quando os clientes tendem a
fazer o hedge em um único sentido em um mercado de câmbio,
a exposição agregada dos intermediários do mercado pode
aumentar subitamente, e suas perdas são imensas.
Como
será argumentado a seguir, o risco de liquidez
nos mercados deveria constituir uma motivação
central para que os reguladores incentivem
a cooperação organizada. Isso porque as dúvidas
sobre a liquidez destroem a confiança na qual
repousa a estrutura dos compromissos financeiros,
o que leva ao contágio, como aconteceu na
crise asiática.
3. A crise
asiática, para além dos fundamentos macroeconômicos
A explicação
convencional das crises financeiras foi extraída
da experiência latino-americana dos anos 80
– ou seja, de crises originadas pela insolvência
de devedores soberanos. Entendem-se as crises
como fruto da deterioração de fundamentos
macroeconômicos: ampliação dos déficits público
e externo, supervalorização da taxa real de
câmbio, baixa poupança privada, inflação alta,
baixas reservas cambiais, e assim por diante.
Quando se analisam as crises financeiras em
países emergentes, dedica-se pouca atenção
à experiência das recorrentes crises bancárias
e de mercado que acompanharam a liberalização
financeira nos países desenvolvidos. O erro
de diagnóstico originalmente cometido no caso
da Ásia resulta provavelmente deste viés interpretativo.
Com a possível exceção da Tailândia, porém,
não há muito o que aprender com a tentativa
de inferir fatores de crise de variáveis macroeconômicas.
Não há explicação tradicional que dê conta
da desvalorização média de 80% enfrentada
pelos países abatidos pelo pânico entre 2
de julho e o final de dezembro de 1997, combinada
com o declínio de 50% no índice de valor das
ações asiáticas. O caso da Coréia é notável.
O país apresentou uma taxa média de crescimento
de mais de 8%,
nos anos de 1994 a 1996; uma taxa de
inflação decrescente de 6 a menos de 5%; uma
taxa de poupança doméstica de nada menos que
35% do PIB (sem nenhum sinal de queda); um
déficit de conta corrente, muito modesto até
1995, que aumentara, sem motivos para alarme,
para menos de 5% do PIB em 1996 e já em 1997
recuperava-se para 2%; e uma taxa de câmbio
real estável. Não se pode dizer que este quadro
representasse uma deterioração da situação
macroeconômica... Definitivamente, torna-se
imperioso conduzir a investigação para além
da visão convencional de uma crise estrutural
induzida pelos fundamentos. A questão principal
é descobrir o que provocou as condições de
tensão, que forneceram as bases para o pânico
e o contágio que se seguiram.
3.1. Uma
fragilidade financeira fundada em uma liberalização mal
concebida
Segundo a análise
do funcionamento dos mercados financeiros,
estes são vulneráveis ao risco de liquidez,
que leva a feedbacks positivos e efeitos
de spillover.
A dinâmica deriva de falhas de coordenação
em condições de incerteza endógena. Estes
tipos de incerteza, éticas ou epistêmicas,
fazem com que os participantes do mercado
percebam a possibilidade de equilíbrios múltiplos.
Uma taxa de câmbio fixa, por exemplo, é um
regime que envolve ao menos dois equilíbrios,
pois o fim da ancoragem leva a uma taxa de
câmbio flexível, que é um regime factível.
A ruptura do regime é auto-realizável, se
advém de uma coordenação de expectativas,
fundada sobre a crença de que o ataque especulativo
será validado pelas autoridades monetárias
sob pressão (Obstfeld, 1996).
Considerando-se
a experiência dos repetidos eventos na América Latina,
Europa e Ásia, pode-se concluir que a liberalização do
mercado financeiro é o elo frágil na criação do tipo de
incerteza que conduz a entradas de capital insustentáveis e
às subseqüentes crises auto-realizáveis.
A crise asiática
tem raízes plantadas nas finanças privadas,
ao contrário das crises de dívida soberana
dos anos 80. A fragilidade financeira desenvolveu-se
a despeito do desempenho macroeconômico favorável,
assim como na Europa e nos Estados Unidos
em 1986/89. Na Ásia, a crise surgiu depois
de um longo período de crescimento elevado
e estável, com uma acumulação financiada por
dívida, que não apresentou maiores problemas
enquanto os sistemas financeiros dos países
permaneceram regulados.
A liberalização finaneira será entendida
como uma inovação sistêmica, que destruiu
a coerência anterior sem criar uma nova. É
um solo fértil para a incerteza epistêmica
entre os participantes do mercado – locais
ou estrangeiros.
A liberalização
financeira correspondeu a um desaparecimento súbito do
controle do crédito por parte do Estado, controle esse que
era o pilar da estabilidade financeira em economias propensas
ao endividamento. Este pilar foi derrubado sem que se desse
tempo, nem às instituições financeiras locais para adquirir
experiência no gerenciamento de riscos, nem às autoridades
supervisoras para constituir um conjunto de regras prudenciais
e mecanismos de sanção. Os métodos de gerenciamento
prevalecentes, tão criticados ultimamente pelos mesmos
comentaristas que aplaudiam o milagre asiático no começo da
década, eram de fato incompatíveis com a abertura dos
mercados financeiros.
3.2.
Garantias implícitas?
Uma explicação
muito em voga sobre a crise, divulgada com
vigor por Paul Krugman e seguida por outros,
entende que a crise origina-se de fraquezas
estruturais nos sistemas financeiros. Porém,
atribui ela toda a culpa aos devedores, dando
ênfase às assim chamadas garantias implícitas.
Os investidores internacionais ficam inteiramente
redimidos e o capitalismo de compadrio é apontado
como o único culpado pelas desordens financeiras.
Esta visão não
resiste a um escrutínio cuidadoso. Como já foi mencionado,
é preciso explicar por que o capitalismo de compadrio
funcionou tão bem e por tanto tempo, e por que desarranjou-se
tão abruptamente por si só. A única resposta possível é
que a abertura financeira instantânea eliminou a lógica
fundamental e a coerência geral do sistema asiático. A lógica
básica era que o setor financeiro não constituía
uma atividade autônoma, e sim um mecanismo de crédito
voltado ao crescimento. Maximizar o crescimento total não é
o mesmo que maximizar o valor financeiro líquido. Mas o
sucesso desta concepção da atividade financeira, adotada na
Europa continental e no Japão ao longo da era de crescimento
do pós-guerra, requer um sistema regulado com controle direto
do crédito. Com a eliminação deste controle, não pode
haver garantia efetiva, seja explícita ou implícita. Os
investidores internacionais deveriam ter sido mais cautelosos
do que aparentemente foram, tendo em vista as experiências
passadas. Mas aqui cabe uma acusação ainda mais direta do
que a de terem ignorado a mudança no arranjo sistêmico.
A
forma mais desagregadora de influxo de capital
foi a dos empréstimos de curto prazo em moeda
estrangeira, concedidos pelos bancos internacionais
aos bancos locais. Sabia-se bem que estes
últimos estavam estendendo o crédito em moeda local em ritmo cada vez mais acelerado,
e com prazos mais breves, a empreendedores
imobiliários e a empresas industriais que
passavam por uma situação de excesso de capacidade.
Não havia falta de transparência sobre o montante
de crédito de curto prazo. Além disso, os
bancos internacionais certamente não ignoravam
que os bancos locais estavam juntando um imenso
risco de câmbio a seu risco de crédito e ao
descasamento de prazos. Com certeza sabiam,
por sua experiência no passado, que o risco
de câmbio é o mais volátil dos fatores de
risco. Se acreditavam em garantias implícitas,
qual teria sido a fonte desta crença? Como
tinham concedido empréstimos em moeda estrangeira,
as garantias dependiam inteiramente das taxas
fixas de câmbio adotadas pelos países asiáticos.
Se existe uma coisa sabida e aceita, pela
teoria e na prática, é que nada é mais frágil
que uma taxa fixa de câmbio. Assim que o câmbio
se torna supervalorizado, vêm à tona os equilíbrios
múltiplos e os ataques especulativos auto-realizáveis.
Se os bancos internacionais tivessem levado
em conta a possibilidade do colapso das taxas
fixas, teriam conduzido stress tests para
avaliar suas perdas potenciais nos piores
cenários. Os resultados de uma avaliação de
risco adequada teriam feito com que os bancos
internacionais cumprissem o dever de disciplinar
seus devedores, sob a forma de prêmios de
risco muito mais elevados e limites de crédito.
Ainda assim,
seria possível argumentar que os bancos internacionais
contavam com garantias, uma vez que não comportaram de acordo
com o que seus sistemas de controle interno permitiam. Mas os
governos asiáticos não podiam oferecer garantias sólidas. A
origem da garantia era a política do FMI. Tendo em vista
crises de endividamento anteriores, os bancos internacionais
sabiam muito bem que o FMI sempre veio em seu resgate. É uma
prática padrão comum nacionalizar as obrigações dos
bancos, por meio de contratos de reescalonamento, elaborados
junto aos governos locais sob o auspício do FMI, manobrando
os mecanismos de crédito do Fundo. Enquanto se praticar esta
doutrina arraigada, não haverá incentivo para que os bancos
internacionais fortaleçam suas próprias políticas
prudenciais e monitorem seus devedores mais de perto.
Tabela
1
Coréia:
indicadores macroeconômicos e financeiros após a liberalização
financeira
??l????
|
1992
|
1993
|
1994
|
1995
|
1996
|
1997
|
1
– Variáveis macroeconômicas
|
|
|
|
|
|
|
Taxa de
crescimento do PIB (%)
|
5.1
|
5.8
|
8.6
| ??l????
8.9
|
7.1
|
6.0
|
Taxa de
inflação (%)
|
6.2
|
4.8
|
6.3
??l???? |
4.5
|
4.9
|
4.3
|
Taxa de
poupança interna (% do PIB)
|
35.1
|
35.2
|
34.6
|
35.1
|
33.3
|
32.9
|
Saldo
em conta corrente (% do PIB)
|
–1.5
|
0.1
|
–1.2
|
–2.0
|
–4.9
|
–2.0
|
Taxa de
câmbio real (índice 1990=100)
|
87.8
|
85.2
|
84.7
|
87.8
|
86.8
|
–
|
|
|
|
|
|
|
|
2
– Variáveis financeiras
|
|
|
|
|
|
|
Crescimento
do crédito interno (%)
|
11.7
|
12.7
|
??l????
18.4
|
14.7
|
19.4
|
–
|
Crédito
ao setor privado (% do PIB)
|
53.4
|
54.2
|
56.8
|
57.0
|
61.8
|
–
|
Passivos
externos dos bancos (% dos passivos totais)
|
7.6
|
6.9
|
8.0
|
10.1
|
12.8
|
–
|
Passivos
externos líquidos dos bancos (U$ bilhões)
|
–
|
20.9
|
29.2
|
43.8
|
58.4
|
57.1
|
Passivos
externos líquidos de instituições não bancárias (U$
bilhões)
|
–
??l????
|
9.1
|
11.2
|
14.3
|
20.4
|
23.1
|
Fonte: IMF
World Economic Outlook (Dec. 1997, Tab. A1).
O caso da Coréia
é particularmente eloqüente (Tabela 1). Ele mostra
claramente que a tomada excessiva de riscos origina-se da
regulação financeira inadequada (Stiglitz, 1998). Com a
eliminação do controle de crédito, o crédito ao setor
privado em relação ao PIB saltou de 53% em 1992 para 62% em
1996. Os passivos externos líquidos dos bancos quase
triplicaram, subindo de US$ 21 em 1993 para US$ 58 bilhões em
1996. No caso das
instituições não bancárias, o aumento foi de US$ 9 para
US$ 20 bilhões. A disseminação deste comportamento em meio
ao novo ambiente financeiro é ilustrada pelo caso dos chaebols.
Eles antes competiam por fatias de mercado com margens de
lucro estreitas, em decorrência de uma política industrial
que tinha como objetivo a obtenção de economias de escala em
indústrias exportadoras (Yung Chul Park, 1998). É por isso
que suas posições relativas dependiam de seus gastos com
investimento. Com o endividamento, estes gastos foram
fortemente alavancados. A desregulação iniciada em 1993
simplesmente eliminou o controle estatal sem reinstituir
qualquer outro mecanismo de monitoramento. Logo depois, a dívida
foi às alturas e tornou-se mais de curto prazo.
No início dos
anos 90, uma campanha ideológica liderada
pelos Estados Unidos e pelas instituições
internacionais pressionava os governos asiáticos
a liberalizar seus setores financeiros. A
??l???? China resistiu; mas a Coréia, como
novo membro da OCDE, não podia fazer nada
a não ser sujeitar-se a essas exigências.
A abertura, forçada e sem uma preparação adequada,
abriu caminho, imediatamente, ao impressionante
e insustentável crescimento dos influxos de
capital acima mencionado. Fortíssimas exposições
a riscos de descasamento de prazos e de mercado
foram acrescentadas a riscos de crédito ampliados.
Empréstimos de curto prazo passaram a responder
por mais de 60% das entradas líquidas totais
– quando correspondiam a menos de 40% no período
de 1990 a 1993. Tanto as disponibilidades
para crédito comercial quanto os empréstimos
bancários ultrapassaram em muito o crescimento
doméstico e a expansão do comércio. Foram
atraídos pelo chamariz do rendimento elevado,
no contexto de grandes diferenciais de juros
entre os mercados financeiros domésticos e
os externos, com taxas de câmbio fixas. Com
os bancos locais acumulando dívidas externas
de curto prazo para oferecer empréstimos internos
de longo prazo a um ritmo que só podia ser
sustentado temporariamente, e com a incapacidade
das autoridades supervisoras em fazer valer
medidas corretivas, viriam sem dúvida momentos
de tensão, tão logo a qualidade dos ativos
começasse a ser questionada. A coluna dos
ativos, nos balanços das instituições financeiras,
deteriorou-se drasticamente, em razão dos
investimentos descuidados em securities
estrangeiras e das operações com derivativos
financeiros. Firmas de securities
e fundos mútuos da Coréia estabeleceram
fundos offshore para disfarçar seus
empréstimos como se fossem investidores estrangeiros,
reinvestindo em securities domésticas
de alto risco. Essas posições offshore
abertas acarretaram imensas perdas.
3.3. A
crise asiática como processo auto-realizável
Quando uma
grande alta nos preços de ativos, alimentada
por um aumento acelerado na demanda por crédito,
leva ao aumento da volatilidade, ou quando
corporações fortemente alavancadas começam
a dar sinais de insolvência, uma mudança drástica
nas opiniões do mercado pode estar bem próxima.
Porém, a explosão da bolha é inerentemente
imprevisível. Há um período de latência após
a incerteza ter atingido o ápice. As informações
que normalmente alimentam o julgamento do
mercado deixam de ser relevantes. As expectativas
perdem seus parâmetros. Em busca de informações
significativas e sem poder encontrá-las em
valores fundamentais, os participantes
do mercado voltam-se para dentro. A coordenação
das expectativas torna-se mimética e dá vazão
à formação de um estado de espírito coletivo,
que pode mudar abruptamente de euforia para
desilusão. Inicia-se uma forte pressão de
vendas; as entradas de capital transformam-se
em saídas. Como foi demonstrado na seção 2,
seguem-se problemas de liquidez que desencadeiam
uma fuga generalizada para a qualidade e levam
ao contágio por meio do comportamento de manada.
Os mercados
de câmbio sofreram uma impressionante reversão
nos fluxos de capital. Nos cinco países asiáticos
assolados pela crise, o movimento de retorno
dos fluxos de curto prazo foi equivalente
a mais de 10% do PIB. Investidores estrangeiros
sacaram seus fundos, e os residentes correram
para cobrir suas dívidas em moeda estrangeira.
O bath mergulhou no dia 2 de julho.
Duas semanas depois, o contágio atingiu a
Malásia e a Indonésia, enquanto o dólar de
Singapura despencava. A confiança foi sendo
minada ao longo do verão, com o declínio contínuo
das três moedas sob pressão especulativa.
Àquela altura, já era evidente que os mercados
não estavam conseguindo encontrar um piso
para os preços, com base no qual a liquidez
pudesse ser regenerada. Em outubro, a crise
ganhou vulto. Entre 10 de outubro e 24 de
dezembro, o won caiu 50%, ao passo que a rúpia
desabou completamente. Até o dólar de Taiwan
teve uma depreciação substancial, e o dólar
de Hong Kong
entrou na linha de ataque. Nesse ínterim,
a queda brusca da bolsa de valores de Hong
Kong em 23 de outubro derrubou os mercados
acionários em toda a região. A esta altura,
o FMI precisou, repetidas vezes, vir ao socorro
tomados dos países tomados pelo pânico, sem
conseguir acalmar os mercados.
Esta breve
reconstituição do contágio pode ser suplementada por um
relato mais detalhado sobre a Coréia, para demonstrar que a
dinâmica dos mercados ilíquidos estava operando de acordo
com o padrão descrito na seção 2.
Investidores
estrangeiros retiraram seus investimentos do mercado de ações
coreano já na primeira semana de setembro (Yung Chul Park,
1998). Emitiram assim um sinal aos bancos estrangeiros, que se
recusaram a rolar seus empréstimos de curto prazo às
instituições financeiras coreanas. Depois de sua temerária
distribuição de empréstimos, que evidenciava nível elevado
de risco moral, os bancos internacionais pressionaram o
governo coreano a buscar financiamento junto ao FMI. Como o
pacote do FMI não foi suficiente para estancar a crise de
liquidez, a situação piorou em dezembro, em meio à
incerteza política.
Só
em dezembro chegou-se à decisão de fornecer
uma assistência emergencial, da ordem de US$
10 bilhões, para cobrir a iminente interrupção
nos pagamentos relativos aos empréstimos estrangeiros
de curto prazo. Isto constituiu uma intervenção
retardada de emprestador em última instância.
Esta intervenção – e não a política tradicional
de crédito restrito do FMI, imposta anteriormente
ao governo coreano – restituiu um pouco de
confiança ao mercado de câmbio. Depois de
ter atingido seu ponto mais baixo no início
de janeiro de 1998, a taxa de câmbio recuperou-se.
Isto é uma pista de que a Coréia havia sofrido
um arrocho da liquidez
provocado pelo excesso de passivos estrangeiros
de curto prazo. Alarmados pelo sinal de alerta
emitido pela queda nos preços das ações, os
bancos haviam se lançado em busca da quitação
dos empréstimos concedidos, negando a seus
devedores a rolagem de rotina (Feldstein,
1998). A resultante pressão de venda em massa
sobre o won deveria ter sido combatida já
em outubro de 1997.
As lições
trazidas por este episódio enfatizam o papel crucial do
mercado de câmbio. É este o canal pelo qual os riscos de crédito
e de mercado, normalmente separados, tornam-se
interdependentes. É também o canal privilegiado do contágio.
Enquanto a
taxa de câmbio se mantém fixa, a pressão especulativa
crescente revela-se nas taxas de juros em
franca ascensão e no declínio das reservas
contra a dívida de curto prazo em moeda estrangeira.
As saídas em forma de pagamentos de juros
aumentam quando da rolagem dos empréstimos
vincendos. Uma inquietação com respeito a
uma possível escassez de liquidez em relação
a compromissos de pagamento futuros alimenta
a especulação, porque a perspectiva de um
colapso da taxa fixa de câmbio
torna-se visível.
Se o câmbio
fixo realmente entra em colapso, os passivos dos bancos locais
endividados ultrapassam instantaneamente seus ativos,
deteriorando seu patrimônio líquido. O risco de câmbio
efetivado alimenta o risco de crédito. Os bancos
internacionais cortam suas linhas de crédito e resgatam seus
títulos assim que estes vencem. A crise de liquidez torna-se
aguda e deflagra nova rodada de queda livre no câmbio. A
pressão de venda é gerada pela incerteza a respeito das
condições de liquidez. Como ninguém sabe qual será o piso
do preço, o mercado não consegue reequilibrar-se
endogenamente. Quando falhas de mercado ocorrem em mercados
cambiais, faz-se necessária a presença de um emprestador em
última instância internacional.
4. A
necessidade de um emprestador em última instância e o
controle do risco moral
É sabido que
a atividade de emprestador em última instância
e o risco moral são frutos gêmeos do risco
sistêmico. Além disso, o risco moral é onipresente
em mercados financeiros enfraquecidos por
informações assimétricas e externalidades.
O custo social supera o custo privado. O problema
principal é que a intervenção do emprestador
em última instância deve ser soberana – e
não refém dos bancos, ou dos países devedores
sempre que as dívidas externas do setor privado
forem de facto nacionalizadas. É exatamente
por isso que o risco moral deve ser controlado.
Ao contrário do que se costuma dizer, como
o risco moral está envolvido na maioria dos
contratos financeiros, proibir o emprestador
em última instância com certeza não é a maneira
de lidar com essa ineficiência. O caminho
está em fortalecer políticas prudenciais,
que assegurem ao emprestador em última instância
autonomia plena em sua ação. Isso significa
nada além de um retorno à própria essência
do emprestador em última instância: salvaguardar
a confiança no funcionamento dos mercados
monetários.
Com a globalização
dos mercados, a assistência do emprestador
em última instância também precisa ampliar
seu escopo, pois os efeitos de contágio difundem-se
por vastas áreas. Se é necessário um emprestador
em última instância internacional, isto não
significa que este papel deva caber a uma
única instituição supranacional. O regulador
sistêmico poderia ser organizado como uma
rede cooperativa de bancos centrais, com a
responsabilidade de manter um estoque regular
de liquidez. Correlativamente, a prevenção
do risco moral deve ser construída com base
na compreensão de que as estruturas de mercado
envolvem instituições centrais.
4.1. A
prevenção do risco moral
Em abril de
1997, o Comitê da Basiléia para a Supervisão Bancária lançou
seus Princípios Centrais para uma Efetiva Supervisão Bancária
(BIS, 1997), defendendo diretrizes consistentes para reformas
financeiras, a serem realizadas individualmente pelos países,
sob a responsabilidade de seus respectivos governos. A
implementação de tais diretrizes em países emergentes
certamente ajudará a tornar o sistema financeiro
internacional mais robusto. Mas serão necessários anos, ou
mesmo décadas, para que as reformas estejam avançadas,
implementadas e disseminadas a ponto de terem influência
significativa no sistema financeiro global.
Esta
abordagem estrutural depara-se com obstáculos descomunais. Em
primeiro lugar, a visão normativa que inspira os princípios
centrais é bastante estranha aos métodos utilizados para
manter a estabilidade financeira nos países em
desenvolvimento. Já foi observado, neste artigo, que a
liberalização financeira constitui um choque sistêmico,
porque o pilar da
estabilidade financeira – isto é, o controle estatal – é
removido abruptamente. Estabelecer regras c??l????apazes de fornecer
uma estrutura de incentivos que propicie o bom comportamento
em mercados livres, em lugar de segmentar operações e
proibir determinadas ações, é um salto muito grande, que
enfrentará obstáculos filosóficos e políticos. Criar
instituições supervisoras capazes de fazer valer as regras
é um desafio ainda maior. Traz à tona questões como expertise,
dessegmentação, autoridade política com mandato claro,
independência estatutária. Assim, a mudança comportamental
e organizacional das instituições financeiras exige um
processo cognitivo demorado, que enfrentará fortes resistências
a práticas administrativas ainda não testadas.
Como a
reforma financeira provavelmente prosseguirá de modo muito
desigual de um país para outro, a cooperação entre os
organismos supervisores nacionais ficará muito aquém dos
requisitos de uma supervisão global. Entretanto, as
recorrentes crises financeiras em mercados interrelacionados
chamam atenção para as deficiências das agências
supervisoras nacionais, que não alcançam uma visão global
mesmo em países financeiramente sofisticados. Por sua vez, as
recomendações das firmas de auditoria e das agências de rating
podem ser seriamente questionadas. Não se pode esperar muito
do aumento da transparência
a menos que a divulgação seja muito drástica para
firmas internacionais com múltiplas posições
interconectadas em uma ampla ga??l????ma de segmentos de mercado.
Essas afirmações soam pessimistas; mas apontam, na
realidade, para uma abordagem que concentre a prevenção do
risco nas instituições centrais dos mercados monetários
globais.
Concentrar-se
no lado dos tomadores de recursos não basta. Se a dívida
externa de curto prazo não tivesse se acumulado, não teria
havido uma crise financeira com potencial de risco sistêmico
na Ásia. Os empréstimos de curto prazo dos bancos locais
foram fornecidos pelos grandes bancos internacionais, na forma
de volumosos créditos interbancários. Supõe-se que estas
instituições centrais sejam dotadas de sistemas de controle
interno eficientes, capazes de evitar que se arrisquem
excessivamente. Contudo, os sistemas não conseguem integrar o
risco de crédito e o risco de mercado, além de subestimarem
grosseiramente as perdas potenciais em tempos de tensão.
A crise asiática
traz à baila um grave desafio para o gerenciamento
de riscos. A elevada alavancagem em processo
era conhecida dos participantes do mercado.
Havia pistas de que algo de errado estava
acontecendo. Mas uma profunda incerteza ocultava
a magnitude dos problemas e o momento de sua
explicitação. Os modelos emitiam sinal verde
até o início da crise; as agências de rating
não foram mais eficientes. Todo administrador
de portfólio presume que diversificar é bom,
porque se supõe que as condições financeiras
nos diferentes países são independentes, em
vista das informações obtidas junto aos especialistas
em cada país. A ênfase no stress testing
não é tão desenvolvida, não só por causa das
dificuldades técnicas, mas também – e principalmente
– porque é muito difícil pensar no impensável.
Como foi observado na seção II, o risco moral
é o resultado da miopia quanto ao risco sistêmico.
Por isso é tão difícil, no stress testing,
distinguir cenários. Ataques auto-realizáveis
trazem uma incerteza radical. Alguns países
podem ir à bancarrota sem que se desenvolva
uma turbulência mundial; outros podem suscitá-la
inesperadamente. Mas não há critério para
diferenciar choques financeiros que são auto-contidos
de outros que não são.
É possível
tirar conclusões decisivas destas observações.
Mercados de capital globais precisam de uma
regulação financeira global, não de uma mixórdia
de supervisores nacionais de visão estreita
e qualidade variável. Além disso, a questão
da regulação prudencial das instituições centrais
é muito diferente da supervisão macroeconômica
de cada país. Uma tal responsabilidade deveria
recair sobre uma entidade que conheça intimamente
as grandes firmas financeiras, tenha capacidade
de reunir informações sobre a atividade dos
mercados e de investigar os sistemas de controle
internos das firmas. Isto aponta para um BIS
ampliado, e não para o FMI, com a vantagem
de desenvolver a expertise onde esta
já existe, e impedir uma concentração de poder
demasiadamente grande.
Em relatório
recente, o G-30 sustentava que as exposições a risco mais
opacas, não detectadas pelos sistemas de monitoramento
existentes, provêm da trama intrincada de riscos de
contraparte assumidos pelas principais firmas internacionais,
diretamente umas com as outras e, indiretamente, por meio de
suas transações com os mesmos clientes pelo mundo (G-30,
1997). Portanto, um fortalecimento substancial da supervisão
global seria indispensável para levar os principais intermediários
a assumir maior responsabilidade por seus riscos.
Quadro
2
Organização
da regulação prudencial
Tipos
de regulação
|
Natureza
das instituições
|
Nível
1: regulação do mercado
Proteção
ao consumidor
Preservação
da liquidez do mercado em tempos normais
|
Agência
independente (SEC, ...)
Câmaras
de compensação em mercados organizados??l???? sob a forma
de bolsas
Intermediários
privados em mercados de balcão
|
Nível
2: supervisão bancária
Monitoramento
prudencial de ratios
Supervisão
de sistemas internos de controle
|
Reguladores
prudenciais: autoridades supervisoras independentes e
(ou) bancos centrais
|
Nível
3: tratamento de crises financeiras
Solução
de falências bancárias
Contenção
do contágio sistêmico
|
Reguladores
sistêmicos:
Fundos
dotados de dinheiro público (resolution funds)
Emprestador
em última instância
|
Uma organização
eficiente da regulação prudencial deveria
distinguir três níveis, exercidos por diferentes
tipos de instituição (Quadro 2). O caráter
internacional complica ainda mais a questão:
pode se tratar tanto de instituições localizadas
em centros financeiros diferentes trabalhando
em cooperação, como de instituições genuinamente
internacionais, com autoridade para regular
intermediários financeiros, de qualquer origem,
que estejam envolvidos em atividades financeiras
internacionais.
A supervisão
de bancos internacionais é um tipo de regulação do nível
2. As instituições diretamente envolvidas, no âmbito
nacional, são os bancos centrais, e talvez autoridades
supervisoras independentes, conforme as idiossincrasias das
legislações de cada país. Os bancos centrais estão sempre
envolvidos – mesmo que não monitorem diretamente os
intermediários financeiros – já que também são
reguladores sistêmicos. A questão do risco moral é,
justamente, a conexão entre as regulações do nível 2 e do
nível 3. A qualidade da supervisão no nível 2 influencia a
capacidade de conter crises financeiras e resolvê-las, caso
cheguem a ocorrer, com firmeza e a custos mínimos.
Supervisores
de bancos também precisam trocar informações
com as instituições do nível 1, pois os principais
intermediários estão profundamente envolvidos
em atividades de mercado, sendo subscritores
de securities internacionais e market
makers de derivativos de balcão.
Uma estrutura
coerente deveria envolver todas as instituições ativas no âmbito
global. A abordagem market friendly recentemente
desenvolvida deveria ser acompanhada pelo princípio duplo de
controle interno e supervisão delegada. Mas os padrões de
qualidade deveriam ser muito mais severos para o grupo
altamente concentrado das principais instituições do que
para outros participantes do mercado. Isso significa que os
modelos de controle interno devem ser capazes de operar em
condições de mercado extremas; a transparência relativa às
exposições deve ir além dos extratos financeiros de rotina
para determinar posições consolidadas; deve haver abertura
para investigações in loco, e deve ser adotada uma
estrutura administrativa que separe criteriosamente funções
operacionais e funções de auditoria interna. É necessário,
também, aperfeiçoar a auditoria externa. Firmas de auditoria
que lidam com instituições globais devem ser capazes de
investigar o perfil de risco dos auditorados, o que significa
que deve haver uma única firma de auditoria para cada
instituição central.
Para que estes
mecanismos aperfeiçoados operem tranqüilamente,
é necessário que haja um monitoramento financeiro
global. O BIS parece ser o lugar apropriado
para isso. Ele já centraliza os relatórios
dos bancos internacionais; abriga um comitê
bancário que reúne os supervisores nacionais
da maioria, senão de todos os bancos internacionais.
Este comitê já conduziu um diálogo substancial
com a comunidade financeira, protegido das
influências dos governos. O BIS é também o
eixo principal de uma rede de bancos centrais.
Sob seus auspícios, ou em estreita ligação
com ele, poderia ser criado um instituto para
o estudar e diagnosticar o risco sistêmico.
Ainda assim,
uma melhor estrutura para prevenir condutas
que induzem ao risco sistêmico não será completamente
segura. Para combater o risco moral de modo
eficaz, o supervisor ou a rede de supervisores
devem ter o poder de impor sanções. Pode-se
defender duas estratégias para relacionar
as sanções a uma estrutura de incentivos que
impeça a aceitação deliberada de perdas elevadas
(Goodhart et al. 1998). Uma delas é um esquema
de rating para as principais
instituições, conferido pelo supervisor do
país sede das instituições, segundo um método
de rating acordado pelos supervisores
como parte do monitoramento financeiro global.
Este procedimento profundo de rating terá
a vantagem adicional de obrigar as agências
de rating a também encontrar métodos
melhores. A outra maneira é uma abordagem
de pré-compromisso, pela qual uma instituição
se compromete com um limite máximo de perda
em seu portfólio global ou de trading,
sofrendo uma punição se o limite é ultrapassado
(Kupiec & O’Brien, 1997).
A vantagem do
pré-compromisso para o supervisor é que ele não precisa
avaliar os sistemas internos de controle. Mas a abordagem também
encerra desvantagens graves. O pré-compromisso não é apenas
uma auto-avaliação do nível de risco; envolve também as
questões do apetite pelo risco e do custo de capital, em uma
avaliação que dependerá da cultura de cada firma. A conseqüência
é que não há consistência entre os limites pré-compromissados
das várias instituições; eles podem variar amplamente, e
ainda encerrar níveis excessivos de risco. Além disso, se a
punição por ultrapassar a perda máxima anunciada for de
natureza financeira, ela poderá ser contornada pelo uso de
estratégias de opção – pois a punição opera como uma opção
relativa aos rendimentos do banco.
Portanto, a
melhor estratégia para os supervisores deve
ser elaborar um esquema de rating combinado
a sanções de natureza não financeira. Um caminho
que talvez valesse ser estudado seria definir
as sanções como um gradiente de reações, da
parte dos supervisores, em uma estrutura ampliada
de ações corretivas imediatas. Um rebaixamento
no rating teria como resultado uma
determinação de que o banco tomasse medidas
no sentido de reduzir sua exposição ao risco.
Quanto mais rápido e maior o rebaixamento,
mais drásticas e mais imediatas seriam as
medidas exigidas.
4.2. A
questão do emprestador em última instância
Originada na
obra de Thornton, já em 1802, a doutrina de emprestador em última
instância adquiriu características operacionais nas duas últimas
décadas do século XIX. Desde então, sofreu mudanças
significativas. Porém, a estrutura básica do risco sistêmico,
que constitui sua razão de ser, indica as condições e o
objetivo de suas ações. Reafirmar seus princípios é a
melhor maneira de levantar o problema trazido pela exigência
de tornar internacional o escopo desta função. Permite,
assim, definir que tipo de instituição pode melhor
desempenhar a função de emprestador em última instância no
cenário financeiro globalizado de hoje.
A função de
emprestador em última instância é um atributo
soberano de uma autoridade monetária, que
evita a propagação de um colapso da liquidez
devido a falhas de coordenação nos mercados
monetários. No período anterior à primeira
guerra mundial, quando as crises financeiras
foram freqüentes e se espalharam internacionalmente,
a atividade de emprestador em última instância
era considerada a arte dos bancos centrais.
O empréstimo de última instância não decorre
de um contrato, e sim de uma decisão discricionária
tomada por um banco central, ao diagnosticar
que uma economia inteira está prestes a cair
em um equilíbrio subótimo por causa da escassez
de liquidez.
Este poder
discricionário e soberano provoca nos mercados uma ambigüidade
estrutural. Como as crises de liquidez podem ser auto-realizáveis,
o volume de liquidez para contê-las não pode ser
predeterminado. Só uma instituição com soberania na criação
de dinheiro pode mobilizar recursos ilimitados. A elasticidade
infinita do dinheiro do banco central durante uma contração
brusca da liquidez é que restaura a confiança entre os
bancos. É possível, portanto, exercer o papel de emprestador
em última instância induzindo certos bancos importantes a
manter suas linhas de crédito ou depósitos junto a outros
bancos, sem que efetivamente haja dispêndio de dinheiro pelo
banco central. Esta medida será facilitada se o banco central
puder contar com um bom monitoramento financeiro para
controlar o risco moral e para avaliar a tempo a deterioração
da liquidez.
Para ser operacional
e não conduzir ao risco moral, a doutrina
precisa distinguir entre iliquidez e insolvência
fundamental. Instituições podem tornar-se
insolventes por causa da queda nos preços
dos ativos e do cancelamento das linhas de
crédito, que resultam da própria crise de
liquidez. Mas se seus portfólios fossem avaliados
em níveis pré-crise, e se os passivos fossem
rolados como de costume, estariam perfeitamente
solventes. Em vista disso, a doutrina clássica
do emprestador em última instância recomendava
que se emprestasse com liberalidade a instituições
capazes de apresentar boas garantias, quando
avaliadas a preços “normais”, fazendo-o a
uma taxa punitiva, para desencorajar o risco
moral. É sabido que uma distinção precisa
entre falta de liquidez e insolvência não
é factível em meio ao turbilhão de uma crise
aberta. É exatamente por isso que o risco
moral surge juntamente com o auxílio do emprestador
em última instância. Seja como for, uma percepção
básica da doutrina clássica perdura: em um
mundo de mercados financeiros livres, o emprestador
em última instância é a única instituição
capaz de determinar um piso para o preço em
mercados cruciais tomados de assalto por vendas
motivadas pelo pânico.
Além disso,
os grandes intermediários de mercado só podem
ser recrutados para auxiliar no resgate da
liquidez se por trás deles houver a figura
de um emprestador em última instância de prontidão.
Com esta garantia coletiva, eles podem ser
induzidos à formação de pools para
compra de ativos, ou à realização de empréstimos
a instituições dispostas a comprar os ativos
que estão sendo colocados à venda por todos
os demais agentes em fuga para a liquidez.
Tais intervenções,
que afirmam a presença do emprestador em última instância
sem que haja dispêndio de sua parte, são comuns em mercados
nacionais. Basta lembrar que, em 20 de outubro de 1987, quando
o mercado futuro de índices de ações ameaçou entrar em
colapso total, o FED incitou os big city banks a
continuar emprestando aos dealers do mercado, e emitiu
uma declaração anunciando que estaria pronto a fornecer
qualquer montante de liquidez que se fizesse necessário.
Em mercados
financeiros globais, a visibilidade do emprestador
em última instância tem sido menos nítida,
e nunca foi institucionalizada. Não obstante,
episódios de crise recentes salientam sua
eficácia. No final de setembro de 1992, o
franco francês foi alvo de um ataque especulativo
auto-realizável. Uma declaração conjunta solene
das autoridades monetárias francesas e alemãs
reafirmou a pertinência da paridade central
no que dizia respeito aos fundamentos e sua
importância na transição para a União Monetária
Européia. A declaração afirmava ainda que
a paridade seria defendida com todos os meios
disponibilizados pelo acordo do Sistema Monetário
Europeu. Esse comunicado singular e simbólico
teve grande impacto no mercado. Deu credibilidade
ao cenário oficial e desacreditou o cenário
rival, sufocando efetivamente a especulação.
No final de 1994, tornava-se claro que as
autoridades mexicanas enfrentariam problemas
incontornáveis de liquidez no primeiro semestre
de 1995. A imensa demanda por dólares deflagrou
uma venda pânica de pesos. A queda da taxa
de câmbio estava se transformando em debandada
geral, e o mercado de ações estava à beira
do colapso total, porque ninguém sabia qual
seria o piso para o valor em dólares do peso.
Depois
de alguma demora, o FED e o tesouro
americano entraram em cena e prepararam um
empréstimo de emergência para o governo mexicano,
restaurando efetivamente a confiança e interrompendo
a queda livre do peso. A falha de mercado
foi combatida com sucesso porque as autoridades
monetárias dos Estados Unidos convenceram
o mercado de que queriam um piso razoável
para o valor do peso. Com este ponto de referência
assegurado, foi possível retomar as transações,
com alguns investidores internacionais apostando
na recuperação do peso, baseados neste piso.
Uma perspectiva
histórica mais profunda, que investigue os
mercados financeiros globais do período anterior
à Primeira Guerra Mundial, pode lançar mais
luz sobre o funcionamento do emprestador em
última instância. Recentemente, surgiu uma
controvérsia entre historiadores econômicos.
Uma vertente sustenta que a cooperação entre
os bancos centrais representou uma contribuição
decisiva para o funcionamento do padrão-ouro
clássico (Eichengreen, 1995). Outra ressalta,
em contrário, que a cooperação era episódica
(Flandreau, 1997). É possível reconciliar
as duas visões quando se admite que o padrão
ouro funcionava bem sozinho em tempos normais,
graças à força da propriedade de reversão
à média dos fluxos de capital na proximidade
dos gold points, expressando a confiança
na regra de convertibilidade. Porém, em tempos
de tensão, podia ocorrer uma escassez aguda
de ouro, por causa da mesma regra de convertibilidade.
O Banco da Inglaterra estava contido, em seu
papel de emprestador em última instância,
pelas severas restrições impostas pelo Peel
Act. Em contraste, o Banco da França havia
acumulado uma quantidade considerável de ouro,
que possibilitava a esta instituição oferecer
empréstimos de emergência a bancos estrangeiros
ou regularizar as condições de liquidez no
mercado monetário internacional.
Dois episódios
notáveis merecem ser comentados. Na crise
do Baring em 1890, o Banco da França
e o Banco da Rússia em conjunto emprestaram
ouro como parte de um pacote internacional
de resgate, preparado sob os auspícios do
Banco da Inglaterra. No outono de 1907, a
crise de liquidez estava a todo vapor no mercado
monetário de Nova Iorque. J. P. Morgan dirigiu-se
a Londres para pedir auxílio, em nome dos
membros da Câmara de Compensação. O Banco
da França fez uma contribuição crucial, fornecendo
ouro diretamente e descontando letras de câmbio
contra Londres.
Tanto
episódios contemporâneos como históricos mostram que as
intervenções internacionais de emprestador em última instância
são ações de bancos centrais, unilaterais ou bilaterais,
que se dão sempre que os bancos centrais têm interesse em
manter tranqüilos os mercados monetários sob seus cuidados.
Os bancos centrais não estão autorizados a sofrer perdas no
cumprimento de suas atribuições de prestamistas de última
instância; por isso, precisam encontrar boas garantias. Na Ásia,
nenhum membro do poderoso grupo de bancos centrais do G-10
estava interessado o bastante para entrar em cena. Os mercados
estavam assustados, e as perdas acarretadas pelo pânico foram
desnecessariamente altas. Se o FED ou o Banco do Japão
tivessem interferido para sustentar o won nos dias críticos
de outubro – eventualmente trocando mais tarde os ativos
adquiridos por ativos em DES (Direitos Especiais de Saque) com
o FMI – teriam enviado um importante sinal para o mercado. A
crise de liquidez teria sido estancada muito provavelmente já
em outubro de 1997.
4.3.
Intervenção em última instância sobre o iene
Em
6 de junho de 1998, houve uma intervenção
conjunta inesperada sobre a taxa de câmbio
iene-dólar, que ilustra o esquema defendido
neste artigo. O FED e o Banco do Japão compraram
moeda estrangeira no valor de dois bilhões
de dólares para interromper a queda livre
do iene. A presença do FED no mercado teve
um efeito dramático sobre os agentes. O iene,
que perdia valor dia após dia em um mercado
em crise de confiança – tendo chegado a 146
e estando a caminho dos 150 ou mais – reagiu
de imediato, indo para 135, estabilizando-se
na faixa de 135 a 140 nos dias subseqüentes.
É importante
ressaltar que este evento foi um intervenção de emprestador
em última instância, e não uma intervenção de rotina no
mercado de câmbio. Foi motivado pela preocupação das
autoridades monetárias dos Estados Unidos ao diagnosticarem
um risco sistêmico global.
Em 1997, as
condições macroeconômicas no Japão haviam
deteriorado flagrantemente, piorando assim
a insolvência generalizada do sistema financeiro.
As taxas de juros de curto prazo estavam paradas
em 0,5% e a impotência da política monetária
era um indício de uma situação de armadilha
da liquidez. De um modo geral, o processo
de política econômica como um todo parecia
paralisado. Os consumidores haviam perdido
a confiança na elite política e financeira.
Já não reagiam a qualquer estímulo, sacando
seus depósitos dos bancos e optando pelo sistema
postal ou por dinheiro vivo.
Enquanto
isso, o big bang da liberalização financeira estava
marcado para abril de 1998. O início da liberalização
permitiria aos investidores japoneses uma margem de manobra
muito maior para exportar capital. Diante de um diferencial de
5% nas taxas de juros de longo prazo, manadas de investidores
lançaram-se precipitadamente a comprar ativos em dólar,
aumentando assim a pressão de venda sobre o iene.
A queda contínua
do iene teve conseqüências terríveis para os países asiáticos
mergulhados na crise. Mercados acionários e moedas asiáticas
flutuantes afundaram junto com o iene, agravando os problemas
financeiros e tornando as políticas restritivas implementadas
sob a égide do FMI ainda menos toleráveis para a população.
Mas o principal temor era a ameaça de um impacto sobre China
e Hong Kong. Lá residia o elo sistêmico que poderia dar início
a uma turbulência financeira global.
Um quase-pânico
em Hong Kong fez as taxas de juros de curto
prazo dobrarem, alçando-as a seu nível mais
alto desde o ataque especulativo ao câmbio
fixo, em outubro de 1997. O que provocou isso
foi o boato de que os bancos japoneses, necessitando
de dinheiro para satisfazer a demanda de seus
clientes, estariam liquidando de 10 a 20 bilhões
de seus ativos em dólar em Hong Kong, criando
assim uma crise de liquidez no território.
Além disso, a queda da maioria das moedas
asiáticas, incluindo o iene, estava provocando
um conflito de interesses com a China.
As
autoridades chinesas deixaram bem claro a seus colegas
americanos que se chegara ao ponto em que elas não mais
desempenhariam o papel de estabilizadores. O espectro de uma
desvalorização do yuan era um sinal de alerta aterrorizador
para o câmbio fixo de Hong Kong, para as moedas em estado frágil
na Rússia e na América Latina, para os mercados acionários
em toda parte. O FMI não tinha nem os recursos nem a
habilidade necessários para lidar com crises de mercado
simultâneas em escala global.
A atitude do
FED foi uma intervenção de emprestador em última instância
para impedir uma falha num mercado
crucial com repercussões sistêmicas. Estabeleceu um
precedente para a atribuição de papéis na regulação do
sistema financeiro global, ao distinguir a provisão de
liquidez da resolução de insolvências bancárias – distinção
essa que a conduta do FMI havia obscurecido.
Conclusão
A
conclusão a que se pode chegar é que a função
de emprestador em última instância não pode
ser desempenhada pelo FMI, a menos que ele
seja transformado em um banco central supranacional
plenamente constituído. O emprestador em última
instância lida com mercados e instituições
financeiras privadas; o FMI lida com governos.
O emprestador em última instância age segundo
um critério inteiramente discricionário, preservando
a ambigüidade estrutural necessária para manter
o risco moral sob controle. O FMI opera a
pedido dos governos, ao fim de uma negociação
demorada e sob condicionalidades. O emprestador
em última instância internacional e o FMI
são complementares, e não substituíveis entre
si. O primeiro tem a ver com a prerrogativa
de um banco central para deter o contágio
em mercados monetários. O outro é um mecanismo
político, por cujo intermédio a comunidade
internacional conduz alguns de seus membros
ao bom comportamento (nos moldes de uma doutrina
liberal), por meio de ajustes estruturais
apoiados na concessão de financiamentos. Um
representa uma iniciativa preventiva e de
curto prazo, que não deixa vestígios duradouros
na estrutura financeira, quando corretamente
conduzida. O outro constitui um processo de
longo prazo, que altera irreversivelmente
a estrutura financeira dos países envolvidos.
O Quadro 3 resume a função dual da regulação
sistêmica; contrapõe a ação de emprestador
em última instância à reabilitação dos bancos
e às reformas estruturais.
Quadro
3
Regulador
sistêmico: separação das funções
Emprestador
em última instância internacional
(clube
de bancos centrais)
|
Reformas
estruturais e ajustes
(FMI
e Banco Mundial)
|
??l????
Ação
discricionária junto aos mercados
Ambigüidade
estrutural
Recursos
potencialmente ilimitados
Auxílio
de liquidez de curto prazo para restaurar
confiança aos mercados
Ato
de soberania monetária pura, para deter o contágio
nos mercados de dinheiro globais
Estabelecimento
de um piso para o preço em mercados cruciais
Ausência
de vestígios duradouros na estrutura financeira dos
participantes do mercado solventes
|
Ação
contratual junto aos governos
Condicionalidade
Concessão
predeterminada de financiamentos
Ajustes
estruturais de longo prazo e ajustes macroeconômicos
de médio prazo
Mecanismo
político para incentivar o bom comportamento nos países
membros, nos moldes de uma doutrina liberal
Mudanças
duradouras na estrutura financeira dos países
envolvidos
|
Portanto,
a proposta que sugere a atribuição de uma
função de emprestador em última instância
ao FMI é um grave engano. Além da exorbitante
e perigosa concentração de poder, ela significaria
misturar em uma mesma instituição política
duas funções claramente separadas. Uma tal
proposta opõe-se frontalmente à doutrina de
separação e independência, adotada pelos países
financeiramente avançados, na configuração
da estrutura institucional de suas autoridades
monetária e prudencial.
Uma regulação
market-friendly precisa ser implantada no sistema
financeiro global. Ela requer um monitoramento financeiro
reforçado dos principais intermediários internacionais e um
emprestador em última instância internacional. Estes são
domínios de um clube de bancos supervisores e bancos
centrais, aberto a novos membros e sediado no BIS. A função
de emprestador em última instância não deve ser
institucionalizada. Deve seguir sendo uma cooperação ad hoc
entre os bancos centrais mais envolvidos em uma determinada
crise. Mas a dedicação dos bancos centrais à prevenção de
perturbações desestabilizadoras nos mercados monetários
globais deve ser maior do que aquela demonstrada no episódio
da crise asiática. A atitude do FED perante o iene é uma
indicação de que esta preocupação está sendo levada em
conta.
Michel
Aglietta é professor da University of Paris X-Mini Forum
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Resumo
A crise financeira asiática
demonstra a fragilidade do sistema financeiro
global. Falhas de coordenação nos mercados
financeiros, equilíbrios múltiplos, ataques
especulativos auto-realizáveis, defaults
bancários disseminados são sintomas de risco
sistêmico.
O risco sistêmico torna
necessária uma rede de proteção abrangente, capaz de conter
os episódios de pânico e os spillovers nos mercados
financeiros globais. Esta regulação deve ser tanto sistêmica
como prudencial. Como o risco moral e a necessidade de um
emprestador em última instância internacional são frutos gêmeos
do risco sistêmico, uma regulação global deve tratá-los
como questões complementares, e não substituíveis entre si.
A idéia central do empréstimo
em última instância é estabelecer um piso para o preço em
mercados monetários cruciais. Isto está bastante distante
daquilo que o FMI é capaz de oferecer. O papel de emprestador
em última instância internacional só pode ser executado por
um clube de bancos centrais poderosos, como o BIS, que
cooperem numa base ad hoc para prevenir e conter as turbulências
em mercados monetários globais.
Palavras-chave:
Crise financeira; Crise asiática; Sistema financeiro
internacional; Risco sistêmico.
Abstract
The
Asian financial crisis demonstrates the fragility of the
global financial system. Co-ordination failures in financial
markets, multiple equilibria, self-fulfilling speculative
attacks, widespread bank defaults are symptoms of systemic
risk.
Systemic
risk calls for a comprehensive safety net capable of thwarting
panic and spillovers in global financial markets. Such a
regulation should be systemic as well as prudential. Since
moral hazard and the need of an international
lender-of-last-resort are the twin offspring of systemic risk,
a global regulation should handle both questions as
complementary instead of substitutable.
The
gist of lending in last resort is setting a bottom price in
critical money markets. This is quite foreign to what the IMF
can deliver. The role of the international
lender-of-last-resort can only be played by a club of powerful
central banks, such as the BIS, working on an ad hoc
co-operation and dedicated to preventing disorderly conditions
in global money markets.
Key-words:
Financial
crisis; Asian crisis; International financial system; Systemic
risk.