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Conselho Estadual de Defesa dos Direitos do Homem e do Cidadão da Paraíba

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
Saúde do Trabalhador e Direitos Humanos:
A Ação Sindical como Conquista da Cidadania


Edil Ferreira da Silva1
Maria Helena Serrano de França Lins2

 

 Em busca da cidadania, na luta pela saúde e segurança no trabalho

O processo de luta pelo reconhecimento dos direitos dos trabalhadores da construção, por condições de vida e trabalho dignas, remonta a meados da década de 80 quando a oposição então denominada de Zé Pião consegue, depois de algumas tentativas, assumir a direção do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil. Desde a criação do movimento oposicionista Zé Pião, já havia diferenças na sua forma de inserção e mobilização da categoria, ocorrendo a sua potencialização com sua entrada na direção da entidade.

Calcada numa atuação de combatividade e de mobilização da base, com o incentivo da participação dos trabalhadores nas lutas da entidade, os construtores3 passaram a ser vistos de outro modo. No Setor da Construção Civil este Sindicato, transformou-se uma referência em todo o país pela combatividade no enfrentamento com o empresariado.

Não foram só as lutas salariais que deram uma nova dinamicidade ao trabalho do Sindicato. Outras conquistas, no campo dos direitos se seguem, como as de instalação de filtros em todos os canteiros, copos individuais para os construtores que tiveram significativo papel psico-social, significando o reconhecimento de um direito: era um passo na conquista do resgate da dignidade dos trabalhadores.

O Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil foi um dos pioneiros na discussão e implementação de ações junto à categoria na área de Saúde do Trabalhador. Neste sentido apresentou uma demanda, ao Setor de Estudos e Assessoria a Movimentos Populares (SEAMPO/UFPB), com o intuito de realizar intervenções com a categoria. No processo de discussão e análise da demanda foi se construindo uma proposta conjunta que resultou em cursos na área de saúde e segurança do trabalho, tanto na sede da entidade como nos canteiros de obras (de 5 empresas), envolvendo mais de 250 trabalhadores nesses eventos.

Aonde queremos chegar... E como.

As atividades desenvolvidas pelo sindicato, em parceria com o SEAMPO, teve como objetivo a formação (técnica e política) dos trabalhadores em Saúde e Segurança do Trabalho, visando sua atuação nos ambientes de trabalho, no combate às condições e a organização do trabalho nocivas à sua vida e ao meio ambiente, bem como desenvolver seu potencial como agente multiplicador da luta pela Saúde dos Trabalhadores.

Esse trabalho empreendido, teve como opção teórica-metodológica para desenvolvimento da prática educativa, a Educação Popular, pautada na produção cientifica sobre o tema e na experiência acumulada dos profissionais envolvidos nesse trabalho. A educação popular foi utilizada como instrumento metodológico com o intuito de auxiliar neste processo de construção da autonomia dos trabalhadores, na luta contra a desvalorização do seu saber e o colocando em diálogo/confronto com o saber científico.

A respeito da prática educativa, a entendemos como uma pedagogia que ajude a modificar a realidade social, através da compreensão da sociedade capitalista com as contradições inerentes à relação capital e trabalho. Ou seja, tornando transparente as formas de exploração do trabalho, e criando condições para explicitação dos interesses da classe trabalhadora de forma coletiva.

O desenvolvimento desta prática educativa, constou de um curso sobre saúde e segurança do trabalho, com duas fases.

O primeiro curso (correspondendo à primeira fase do trabalho), realizado na sede do sindicato, tinha como objetivo a formação de cipeiros, dentro da estratégia de envolvê-los posteriormente em ação nos canteiros de obras. Deste curso, participaram uma média de 20 cipeiros de 8 canteiros de obras situados na grande João Pessoa. O grupo compunha-se de serventes, pedreiros, eletricistas, carpinteiros, mestre de obra e técnico de segurança.

Estes trabalhadores foram escolhidos por uma equipe composta por dirigentes do Sindicato e profissionais do SEAMPO. Para fazer a escolha dos participantes do curso, a equipe visitou vários canteiros de obra, levantando em cada um os representantes dos trabalhadores na Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA). Dessa atividade pôde-se observar empresas que não tinham CIPA e outras que a possuíam, mas os trabalhadores não sabiam da sua existência. Houve situações em que os trabalhadores faziam parte da CIPA e não tinham conhecimento disso. Na maioria das empresas, a CIPA era apenas uma formalidade legal. Essa realidade demonstra o descaso das empresas no cumprimento da Norma Regulamentadora nº 5 (NR.5), que trata da constituição e funcionamento da CIPA. O sub-setor edificações da construção civil, por oferecer um grau de risco alto, requer que em cada canteiro com mais de 20 trabalhadores seja formada uma CIPA, conforme reza a Norma Regulamentadora nº5.

A etapa de levantamento dos trabalhadores/cipeiros nos canteiros de obras foi bastante rica, uma vez que propiciou discussões e conversas com os operários/construtores acerca de questões referentes à luta sindical pela saúde. Essa metodologia permitiu, portanto, uma problematização e uma disseminação das questões referentes à Saúde do Trabalhador, contribuindo para o engendramento de outro modo de sentir/pensar/agir na saúde do trabalhador, permitindo que acontecimentos importantes ocorressem na categoria.

Por exemplo, a direção do sindicato foi convidada por um mestre de obra durante estas visitas, para realizar a eleição da CIPA de um canteiro. Essa experiência mostrou-se singularizante, já que mobilizou e permitiu aos trabalhadores/construtores da obra viverem esse processo, quebrando o esquema viciado de formação de CIPA neste sub-setor. Isto ficou demonstrado pela grande lista de candidatos a cipeiro, sendo a eleição realizada no próprio canteiro. O mestre de obra suspendeu o expediente mais cedo, para que os operários pudessem votar. Foram eleitos dois operários como representantes dos trabalhadores na CIPA e dois, ficaram como suplentes. Dias depois, ficamos ciente que o mestre de obras fôra demitido. Embora consideremos que, esta atitude tenha sido um rebatimento à ação desencadeada por ele naquela obra, não temos como confirmar. Apesar disto, o ato de mobilizar um canteiro para eleição teve um sentido esclarecedor, já que demonstrou aos trabalhadores o direito de poder participar ativamente nos processos de mobilização pela saúde nos ambientes de trabalho. Certamente contribuiu para perceber também a violência do empresariado.

Voltando ao curso, a proposta elaborada pela equipe foi submetida aos cipeiros, que sugeriram a inclusão de um módulo sobre noções básicas de primeiros socorros. O curso, intitulado "A CIPA enquanto espaço de luta", foi organizado em 8 módulos, abrangendo um conteúdo temático variado, ministrado por profissionais de diversas áreas e organismos, tendo a duração de três meses, no período noturno. A seguir a relação dos módulos apresentados no curso.

  • Histórico da CIPA, contexto histórico e político da sua criação;

  • Legislação-NR-5, norma que disciplina a criação e funcionamento da CIPA;

  • Legislação NR-18, norma que rege sobre as condições de segurança coletiva e individual;

  • Riscos ocupacionais, a que estão sujeitos os trabalhadores;

  • Primeiros socorros, fornecido noções básicas (este módulo foi sugerido pelos próprios cipeiros);

  • Novas tecnologias no Construção Civil, como estas afetam a saúde do trabalhador;

  • Sofrimento mental no trabalho;

  • Aspectos econômicos da industria da construção civil situando-a no contexto político histórico econômico do estado e do país.

Na avaliação da primeira fase, os cipeiros afirmavam a importância da extensão das discussões para o conjunto dos trabalhadores, como forma de resgatar e afirmar a sua função perante os companheiros de trabalho.

A segunda fase contou com a realização de "ciclos de debates nos canteiros", tendo início em 93 e sendo concluído em 94. O primeiro passo desta segunda fase foi definir os critérios para a escolha dos canteiros onde as ações seriam desenvolvidas, chegando-se aos seguintes:

  • que o canteiro selecionado deveria ter um tempo de duração suficiente para realização do trabalho,

  • possuir CIPA e ter um número de trabalhadores significativo, já que pretendia-se envolver o maior número possível de operários.

Este trabalho nos canteiros de obra foi possível também devido à conquista (pelo Sindicato), de uma cláusula na Convenção Coletiva que previa o direito de utilizar uma hora para realização de atividades referentes às questões de saúde e segurança do trabalho, a cada l5 dias, dentro do horário de trabalho.

Partindo-se da experiência positiva da primeira fase, a equipe decidiu adaptar o temário daquele curso aos "ciclos de debates nos canteiros". Foi planejada a realização desses ciclos, com 4 módulos em cada obra:

a) Legislação NR-05;

b) Legislação NR-18;

c) Doenças ocupacionais;

d) Processo produtivo na construção civil.

A diminuição do número de módulos, em relação a primeira fase, deu-se com a finalidade de ampliar a atuação, atingindo um maior número de canteiros.

Nos "ciclos de debates" privilegiava-se a participação dos trabalhadores, estimulada por recursos audiovisuais e outros recursos pedagógicos. A equipe de assessoria juntamente com membros do sindicato, participaram de todas as fases e passos deste trabalho, efetivando uma prática de ação/intervenção que buscava o confronto/diálogo entre os saberes técnico-científicos e dos profissionais da construção.

Nestas duas fases do trabalho tivemos, também, a participação de profissionais da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) e de outros setores da UFPB (Centro de Tecnologia, Departamento de Nutrição e Departamento de Psicologia), como ministradores de alguns módulos, o que configura uma prática inter-disciplinar e inter-institucional.

Considerações finais

Os avanços dessa intervenção do sindicato foi ter conseguido entre outras coisas:

  • adentrar o meio ambiente do trabalho;

  • ter acordado junto ao empresariado a parada do serviço (uma hora antes do fim do expediente) para que os trabalhadores discutissem assuntos relevantes à situação de trabalho;

  • possibilitar a participação dos trabalhadores na discussão de forma aberta e democrática, resgatando seu saber e considerando o seu sentir/pensar/agir;

  • produzir no seio da categoria a idéia de que cada trabalhador poderia ser um fiscal do sindicato nas questões de segurança e saúde e que caberia a qualquer um denunciar os casos de acidentes de trabalho nas obras.

Este trabalho de extensão do SEAMPO pode assim ser incluído no rol daqueles que buscam garantir aos trabalhadores o resgate de sua cidadania negada na produção quando se tornam mera mercadoria. O desrespeito aos direitos fundamentais do homem, como a uma vida digna e a um trabalho com segurança, é a tônica da prática do empresariado do setor da construção civil. Prova disso, são os dados alarmantes de acidentes e casos fatais no setor, segundo dados do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil no ano passado (1997) foram registrados seis mortes. Ou ainda, os canteiros de obras espalhados por toda cidade, onde pode ser observado o descaso com as condições de trabalho propiciadas aos trabalhadores.

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