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Militantes Reprimidos no Rio Grande do Norte
Mailde Pinto Ferreira Galvão
Livros
e Publicações
1964.
Aconteceu em Abril
Mailde Pinto Galvão
Edições Clima
1994
Fernando
de Noronha
ALDO
DA FONSECA TINOCO
(Odontólogo, ex-suplente de Deputado
Federal, ex-Professor da UFRN. Professor
da USP)
Para conseguir informações
sobre o confinamento dos quatro presos políticos
na ilha de Fernando de Noronha, procurei
ouvir o professor e ex-suplente de deputado
federal Aldo da Fonseca Tinoco, que iniciou
a entrevista justificando a dificuldade
de recompor as lembranças de 1964
e citando o escritor André Maulraux:
“A memória é uma grande
artista; só guarda as passagens belas
da vida.”
Aldo Tinoco encontrava-se preso há
quatro meses e estava numa cela do quartel
do 16° Regimento de Infantaria quando
foi despertado, em uma madrugada de agosto,
juntamente com o prisioneiro Floriano Bezerra;
avisaram-lhes que preparassem seus pertences
pois iriam viajar. Em seguida, foram levados
até um caminhão que os aguardava
no pátio. No caminhão encontravam-se
o ex-prefeito Djalma Maranhão e o
professor Luís Maranhão Filho.
Na quase escuridão daquele amanhecer,
desconfortavelmente acomodados nos bancos
de um caminhão militar, os presos
conjecturavam sobre seus destinos. Levados
ao aeroporto pelo capitão Lacerda.
Certificaram-se de que seriam transferidos
para prisões em outros Estados ou
para a ilha de Fernando de Noronha. Admitiam,
também, com muita preocupação,
que poderiam ser jogados do avião
para a morte no mar, como se comentava que
já havia acontecido com alguns prisioneiros
políticos. No avião encontraram
um general, cuja presença tranquilizou
Djalma, que comentou para os companheiros:
“Acho que não vão nos
jogar no mar porque o general deve nos garantiu
um destino mais humano.” Quando o
avião sobrevoava o oceano, certificaram-se
de que o destino era mesmo a ilha de Fernando
de Noronha.
Chegando à ilha, foram recolhidos
ao quartel do exército que possuía
diversas celas nas quais foram distribuídos
e onde encontraram outros prisioneiros,
muitos deles originários da Bahia.
No mesmo avião foi embarcado, de
volta, o ex-governador de Sergipe, Dr. Seixas
Dória. Em cela isolada encontrava-se
o prisioneiro Miguel Arraes de Alencar,
ex-governador de Pernambuco.
O professor Aldo, embora estivesse beneficiado
por um habeas-corpus requerido
pelo desembargador Túlio Bezerra
de Melo, seu cunhado, continuou preso na
ilha por mais de trinta dias.
No dia-a-dia do quartel os presos se encontravam
nas horas das refeições, tomavam
banhos de sol e, após o jantar, conversavam
por meia hora até se recolherem para
dormir. Sob a liderança de Djalma
trocavam ideias e fortificavam-se para suportar
o isolamento do mundo, naquela ilha de beleza
e solidão. Possuidor de habeas-corpus,
Aldo tinha autorização para
dirigir-se a uma pequena mercearia onde,
algumas vezes, burlando a vigilância,
comprava cachaça e fazia uma meladinha
que todos tomavam. O comandante do quartel,
um major espírita, sociólogo
e maçom, tratava-os com respeito,
o que contribuía para conservarem
um estado de espírito razoável.
Aldo tinha permissão, também,
para pescar e o fazia em companhia de um
sargento, que se tornou seu amigo. Ao sargento
confidenciou o desejo de fugir da ilha utilizando
um caiaque como meio de transporte. O sargento
contou-lhe histórias de pessoas que
tentaram fugir e morreram. Assim, morreu
também aquele frágil projeto
de fuga para a liberdade. Aldo comenta que
sofria do que chamou “psicose reativa
do preso que pensa sempre em fugir e reagir”.
Trinta e tantos dias após a chegada
à ilha, lá desembarcou, a
bordo do avião presidencial, o general
Ernesto Geisel, então chefe da Casa
Civil do Presidente da República,
general Humberto de Alencar Castelo Branco,
com o objetivo de apurar denúncias
de maus tratos aos presos que, segundo Aldo,
não ocorriam e verificar o descumprimento
dos habeas-corpus. Terminada a
visita, o general Geisel trouxe, no seu
avião, para uma prisão no
Recife, o Dr. Miguel Arraes e, para a liberdade,
o professor Aldo Tinoco. Na ilha ficaram
os demais presos, entre eles Djalma, Luís
Maranhão e Floriano Bezerra.
Desembarcando no Recife, o general entregou
Aldo a um coronel, determinando, de dedo
em riste: “O Tinoco está em
liberdade! É para ser posto em liberdade!”
Apesar da recomendação, Aldo
foi levado, juntamente com o governador
Miguel Arraes, para a mesma cela de um quartel,
onde se encontrava o líder das ligas
camponesas, Francisco Julião. Minutos
depois chegou o coronel a quem havia sido
recomendado pelo general e, bastante nervoso,
disse, rapidamente e em voz alta: “O
Senhor está posto em liberdade. Pode
ir embora.”
Livre da prisão e consciente de que
retornando a Natal seria novamente preso,
Aldo embarcou anonimamente para o Rio de
Janeiro onde viveu, clandestinamente, até
conseguir novo habeas-corpus, requerido
pelo advogado Roque de Brito Alves, o qual
o livrou do processo que corria na Auditoria
Militar. No mês de setembro, o ex-prefeito
Djalma Maranhão foi transferido da
ilha para um hospital militar do Recife,
onde foi submetido a tratamento de saúde,
para curar doenças adquiridas na
prisão.
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