A Associação Norte-RioGrandense de Anistiados Políticos: “Queremos discutir os
crimes da ditadura militar sem revanchismo, mas exigindo
clareza”
A
Associação Norte-Riograndense de Anistiados Políticos é
uma entidade da sociedade civil organizada cujo objetivo
é a defesa dos direitos daqueles que sofreram torturas,
perseguições e cerceamento das liberdades durante a ditadura
militar instaurada pelo golpe de 1964 e a preservação da
memória histórica dos que lutaram pela instauração da democracia.
Ela representa um desdobramento natural da luta do Centro
de Direitos Humanos e Memória Popular (CDHMP) de Natal pela
preservação da memória e pelo estabelecimento da verdade
e a justiça para os mortos e desaparecidos políticos no
Brasil. A entidade existe há quase três anos e conseguiu
algumas vitória, como o reconhecimento
de vários potiguares como beneficiários da Lei de Anistia
Política promulgada em agosto de 1979. Perguntamos a Mery
Medeiros, presidente da Associação, a opinião desta última
sobre as mais recentes agressões à memória dos mortos e
desaparecidos políticos no Brasil.
A opinião da Associação Norte-Riograndense
de Anistiados Políticos sobre os fatos reportados recentemente
pela mídia nacional, relativos à morte do jornalista Vladimir
Herzog, e sobre o questionamento que alguns fizeram sobre
a origem das mortes e torturas que aconteceram nos presídios
brasileiros durante o regime militar é que tais fatos devem
ser apurados à luz não do revanchismo, mas da legalidade
e do direito das famílias – como a de Herzog ou de Virgílio
Gomes da Silva – de conhecer as circunstâncias em que seus
parentes desapareceram, os locais onde foram detidos e torturados,
o paradeiro de seus restos mortais e o direito de sepultá-los
dignamente.
Ao mesmo tempo, é absolutamente necessário
promover a memória à qual todo brasileiro
e toda brasileira tem direito, como foi feito – por
exemplo – com os restos mortais do estudante potiguar Emmanoel
Bezerra, morto e desaparecido durante a ditadura, que encontravam-se
em uma cova rasa em São Paulo e que com o esforço do Grupo
Tortura Nunca Mais, do Centro de Direitos Humanos e Memória
Popular e o apoio da prefeita paulistana da época, Luiza
Erundina, foram trazidos para Natal. O que nós, os democratas
brasileiros, queremos é que a memória das barbáries do passado
seja não apenas preservada, mas promovida, valorizada e
constitua um dos fundamentos de uma verdadeira ordem democrática.
Lamentamos a recente saída de um dos membros
da Comissão de Desaparecidos Políticos e reconhecemos que
a Comissão de Direitos Humanos da Câmara, alguns membros
da Comissão de Anistia e a Secretaria Nacional de Direitos
Humanos da Presidência da República, dirigida por Nilmário
Miranda, estão fazendo esforços enormes e louváveis para
o esclarecimento da verdade sobre os mortos e desaparecidos
políticos e a preservação da memória. Mas isso é uma tarefa
muito difícil, pois ainda existem nos órgãos públicos e
na Comissão de Anistia pessoas que consideram estes objetivos
ações de revanchismo ou caça às
bruxas dos ex perseguidos políticos e não entendem que o
que nós queremos não é vingança, mas dar ao país um verdadeiro
caráter democrático. Para isso, temos que completar o ciclo
de anistias que ficaram pendentes.
Por exemplo, um dos presos políticos mais
antigos do Brasil, que cumpriu pena integral e em condições
duríssimas, que é o nosso companheiro potiguar Luciano de
Almeida, jornalista, ainda não viu completada a legalização
da sua anistia. Como ele, tantos outros. Ainda existem no
Brasil resquícios de revanchismo e ódio, ambientes inconformados
com o rumo democrático que o país tomou e o que nós queremos
é discutir a anistia e os Direitos Humanos sem vingança
mas com clareza, contribuindo a construir o Estado
de Direito.
O que aconteceu em Recife, a depredação
do monumento Tortura Nunca Mais em memória de todos aqueles
que lutaram contra o regime militar e em defesa da democracia,
é um ato abominável que a sociedade civil e qualquer pessoa
com consciência democrática tem que repudiar veementemente
para não deixar o menor espaço àquelas forças que querem
destruir a legalidade e o Estado de Direito. A democracia
implica a discussão ampla de todos os problemas da sociedade,
mas rejeita sem meios termos atos de vandalismo como este,
perpetrado por forças que rechaçam a livre discussão das
idéias e pretendem impor ao povo brasileiro o autoritarismo
violento e a barbárie.
Mery Medeiros, histórico militante social potiguar
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