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Tecido Social
Correio Eletrônico da Rede Estadual de Direitos Humanos - RN

N. 095 – 19/11/04

A Associação Norte-RioGrandense de Anistiados Políticos: “Queremos discutir os crimes da ditadura militar sem revanchismo, mas exigindo clareza”

A Associação Norte-Riograndense de Anistiados Políticos é uma entidade da sociedade civil organizada cujo objetivo é a defesa dos direitos daqueles que sofreram torturas, perseguições e cerceamento das liberdades durante a ditadura militar instaurada pelo golpe de 1964 e a preservação da memória histórica dos que lutaram pela instauração da democracia. Ela representa um desdobramento natural da luta do Centro de Direitos Humanos e Memória Popular (CDHMP) de Natal pela preservação da memória e pelo estabelecimento da verdade e a justiça para os mortos e desaparecidos políticos no Brasil. A entidade existe há quase três anos e conseguiu algumas vitória, como o reconhecimento de vários potiguares como beneficiários da Lei de Anistia Política promulgada em agosto de 1979. Perguntamos a Mery Medeiros, presidente da Associação, a opinião desta última sobre as mais recentes agressões à memória dos mortos e desaparecidos políticos no Brasil.

A opinião da Associação Norte-Riograndense de Anistiados Políticos sobre os fatos reportados recentemente pela mídia nacional, relativos à morte do jornalista Vladimir Herzog, e sobre o questionamento que alguns fizeram sobre a origem das mortes e torturas que aconteceram nos presídios brasileiros durante o regime militar é que tais fatos devem ser apurados à luz não do revanchismo, mas da legalidade e do direito das famílias – como a de Herzog ou de Virgílio Gomes da Silva – de conhecer as circunstâncias em que seus parentes desapareceram, os locais onde foram detidos e torturados, o paradeiro de seus restos mortais e o direito de sepultá-los dignamente.

Ao mesmo tempo, é absolutamente necessário promover a memória à qual todo brasileiro e toda brasileira tem direito, como foi feito – por exemplo – com os restos mortais do estudante potiguar Emmanoel Bezerra, morto e desaparecido durante a ditadura, que encontravam-se em uma cova rasa em São Paulo e que com o esforço do Grupo Tortura Nunca Mais, do Centro de Direitos Humanos e Memória Popular e o apoio da prefeita paulistana da época, Luiza Erundina, foram trazidos para Natal. O que nós, os democratas brasileiros, queremos é que a memória das barbáries do passado seja não apenas preservada, mas promovida, valorizada e constitua um dos fundamentos de uma verdadeira ordem democrática.

Lamentamos a recente saída de um dos membros da Comissão de Desaparecidos Políticos e reconhecemos que a Comissão de Direitos Humanos da Câmara, alguns membros da Comissão de Anistia e a Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República, dirigida por Nilmário Miranda, estão fazendo esforços enormes e louváveis para o esclarecimento da verdade sobre os mortos e desaparecidos políticos e a preservação da memória. Mas isso é uma tarefa muito difícil, pois ainda existem nos órgãos públicos e na Comissão de Anistia pessoas que consideram estes objetivos ações de revanchismo ou caça às bruxas dos ex perseguidos políticos e não entendem que o que nós queremos não é vingança, mas dar ao país um verdadeiro caráter democrático. Para isso, temos que completar o ciclo de anistias que ficaram pendentes.

Por exemplo, um dos presos políticos mais antigos do Brasil, que cumpriu pena integral e em condições duríssimas, que é o nosso companheiro potiguar Luciano de Almeida, jornalista, ainda não viu completada a legalização da sua anistia. Como ele, tantos outros. Ainda existem no Brasil resquícios de revanchismo e ódio, ambientes inconformados com o rumo democrático que o país tomou e o que nós queremos é discutir a anistia e os Direitos Humanos sem vingança mas com clareza, contribuindo a construir o Estado de Direito.

O que aconteceu em Recife, a depredação do monumento Tortura Nunca Mais em memória de todos aqueles que lutaram contra o regime militar e em defesa da democracia, é um ato abominável que a sociedade civil e qualquer pessoa com consciência democrática tem que repudiar veementemente para não deixar o menor espaço àquelas forças que querem destruir a legalidade e o Estado de Direito. A democracia implica a discussão ampla de todos os problemas da sociedade, mas rejeita sem meios termos atos de vandalismo como este, perpetrado por forças que rechaçam a livre discussão das idéias e pretendem impor ao povo brasileiro o autoritarismo violento e a barbárie.

 

Mery Medeiros, histórico militante social potiguar

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