Espanhol
Italiano
Inglês

Tecido Social
Correio Eletrônico da Rede Estadual de Direitos Humanos - RN

N. 078 – 04/08/04

Carta de Roberto Monte ao Jornal de Hoje

Ilma. Sra.
THAÍSA GALVÃO
Editora-chefe do Jornal de Hoje

Natal, 03 de agosto de 2004 

Ofício n.º  104/2004 – CDHMP

Senhora Editora:

Na edição de ontem, 02/08, do Jornal de Hoje, foi veiculada matéria a respeito da “perda” de proteção de vida que ROBERTO DE OLIVEIRA MONTE, Coordenador do CDHMP-Centro de Direitos Humanos e Memória Popular, recebia, em função de comprovadas e concretas ameaças de morte, conforme a Recomendação da Organização dos Estados Americanos fez ao Estado brasileiro.

Em tal reportagem, fez-se uma afirmação acusatória de que, dentre outros motivos, a “perda” da proteção seria por causa de “abuso do serviço”, em que o protegido teria, supostamente, utilizado os Policiais Federais para que fizessem compras particulares em um supermercado, como que fossem empregados pessoais de ROBERTO MONTE.  Não foi indicada, porém, a fonte de tal acusação, de modo que o Jornal, com esse proceder, chamou para si a responsabilidade da acusação veiculada, infeliz e lamentavelmente.

A presente missiva, contudo, não tem a pretensão de fazer a defesa de ROBERTO MONTE, visto que não há necessidade de se defender do que não existe, ou que só existe na fonte obnubilada e parcial, que fez tal declaração, mas apenas de esclarecer os fatos noticiados.

Em verdade, o que se quer – e se pede – é que o próprio Jornal de Hoje reconheça que a acusação foi veiculada sem que existam provas a respeito, bem como que não houve qualquer condenação judicial sobre aqueles fatos. Isto é, que a acusação é infundada, pois constitui um pré-julgamento, sem qualquer respeito ao devido processo legal e aos ditames constitucionais.

Nesse contexto, afigura-se pertinente e relevante o registro de uma crítica pela ausência de senso crítico no momento de divulgar a referida acusação.  Porquanto, a acusação ofende até os próprios Policiais Federais (todos) que prestaram proteção a ROBERTO MONTE, no período em que a Justiça Federal de Natal não se opôs aos Tratados Internacionais e aos direitos humanos, porque se passou a imagem de que eles teriam se desviado de suas funções e atribuições – o que é pior, para atender ao pedido de um particular, coisa que configuraria improbidade administrativa.  Não bastasse isso, passou-se a imagem, também, que os referidos Policiais Federais seriam meras marionetes, paus-mandado do protegido.

Diante disso, faz-se necessário dizer que o CDHMP e ROBERTO MONTE discordam veementemente de tais imagens negativas, de modo que registram, com imensa gratidão, que os Policiais Federais que prestaram a proteção durante aquele período são pessoas que merecem respeito e consideração, pois se mostraram competentes e fiéis no cumprimento de suas atribuições, sem se desviarem para qualquer lado, com exemplar profissionalismo e que a proteção obedecia a critérios pré-estabelecidos e aceitos pelo beneficiário.

Por último, é importante esclarecer que, na opinião do CDHMP, a interpretação fornecida quanto à impossibilidade de a Polícia Federal prestar segurança e dar garantia de vida a qualquer cidadão, em virtude de atendimento a uma Recomendação da OEA, de que o Brasil faz parte e é signatário dos Tratados Internacionais de proteção e promoção dos Direitos Humanos, é extremamente equivocada.  Primeiro, por uma questão de competência, pois é o Estado brasileiro que deve prestar as obrigações recomendadas, a partir do instante em que as aceita, e não um Estado-membro, sob pena de quebra do pacto federativo.  Segundo, o decreto que trata do serviço em questão é ato normativo bastante inferior à Constituição e aos Tratados Internacionais, que se sobrepõem para permitir a proteção a qualquer ser humano no território brasileiro por parte das Instituições Federais, até mesmo porque não há uma vedação expressa no próprio decreto.

Em suma, a “perda” não foi de ROBERTO MONTE, mas de toda a Sociedade Civil, pois a decisão que determinou o cancelamento da proteção poderá servir de paradigma para impedir que outras pessoas ameaçadas venham ser protegidas.  E, ainda, do próprio Estado brasileiro, que terá que se justificar perante a OEA sobre algo que não tem justificativa, pois afronta os Tratados Internacionais, que foram conquistados a duras penas pela Humanidade.

Finalmente, acaso esse ilustre Jornal decida não se retratar, resta-me como um cidadão civilizado os caminhos garantidos pelo Estado de Direito.

Sem mais para o momento, renovam-se os votos de estima e respeito a esse veículo de comunicação, deixando-se claro que o presente episódio, por ser isolado e por ser fruto de um mal entendido, não terá o condão de abalar as relações com esse órgão.

ROBERTO DE OLIVEIRA MONTE
Coordenador do Centro de Direitos Humanos e Memória Popular (CDHMP)

Veja também:
- Solidariedade a Roberto Monte contra as ofensas gratuitas do Jornal de Hoje

Adquira o CD-ROM Enciclopédia Digital Direitos Humanos II
O maior acervo sobre DH em língua portuguesa, revisto e atualizado
www.dhnet.org.br