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Tecido Social
Correio Eletrônico da Rede Estadual de Direitos Humanos - RN

N. 067 – 21/07/04

INFORMES DA I CNPM

Plataforma traduzida em diretrizes

Missão cumprida. Consideramos que muitos dos desafios da Plataforma Política Feminista estão traduzidos em diretrizes para as políticas públicas para mulheres. As delegadas dos movimentos de mulheres e feministas compareceram à I Conferência Nacional de Políticas para Mulheres afirmando lutas históricas do feminismo, como a autonomia das mulheres e o direito ao aborto.

Saiu consolidada a posição feminista que afirma a responsabilidade do Estado sobre o financiamento, formulação e gestão das políticas públicas, a articulação entre políticas econômicas e sociais, ambas com caráter distributivo; além da manutenção dos vínculos orçamentários para saúde e educação, a relevância de ações afirmativas e os princípios da igualdade e eqüidade, laicidade do Estado e da intersetorialidade das ações para implementação de políticas públicas, o que exige a participação de todas as áreas de governo. Também foi afirmada na conferência a importância da participação da sociedade civil na formulação de um código de ética que oriente produtores e executores de ações na mídia, na perspectiva de que descartem dos meios de comunicação: propostas racistas ou lesbofóbicas, ou que esteja baseadas em estereótipos, discriminação ou mercantilização do corpo da mulher.

Trazendo valorosa contribuição à democratização e transformação do Estado brasileiro, as militantes de todos os segmentos dos movimentos de mulheres e feminista conseguiram atuar em composição e de forma articulada, demonstrando nossa grande capacidade de fazer política diante das inúmeras objeções e obstáculos colocados pela correlação de forças entre governos e sociedade, nos distintos planos da federação, em especial no contexto de governos cujas forças políticas hegemônicas não têm qualquer compromisso com a justiça e a democracia.

Principais resultados da I Conferência Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres

Os eixos propostos pela Comissão Temática para esta I Conferência foram: Enfrentamento da pobreza (geração de renda, trabalho, acesso ao crédito e à terra); Violência contra a mulher (prevenção, assistência e enfrentamento); Promoção do bem-estar e qualidade de vida para as mulheres (saúde, moradia, infra-estrutura, equipamentos sociais e recursos naturais); Acesso ao poder e efetivação dos direitos das mulheres; Desenvolvimento de políticas de educação, cultura, comunicação e produção do conhecimento para a igualdade.

De maneira geral, os resultados são muito mais significativos do que se poderia pensar, considerando o difícil processo de preparação. Nas disputas travadas pelo movimento de mulheres e feminista prevaleceu a afirmação de diretrizes anti-neoliberais e foram fixadas as proridades da luta feminista nas políticas públicas: creches e equipamentos sociais, aborto legal e seguro, estratégias de combate à violência de gênero e autonomia das mulheres, inclusive econômica. Além disso, manteve-se a prioridade das ações afirmativas e especificidades de diversos segmentos de mulheres, como negras, índias, lésbicas e portadoras de deficiência.

O posicionamento inequívoco do movimento em defesa de mudanças na política econômica foi outro marco importante. O processo, entretanto, foi desgastante, em especial pela tentativa de se viabilizar esta Conferência nos moldes de outras, como a de Saúde, colocando sobre os governos a responsabilidade pelo processo prreparatório. Isso fragilizou imensamente as articulações estaduais de mulheres e contribuiu para a baixa qualificaçao do debate, vez que há muita resistência por parte das forças políticas tradicionais em aceitar, valorizar e debater políticas para mulheres como instrumento de justiça e transformação social.

Deste modo, consideramos que sem a ação organizada dos movimentos de mulheres e feministas esta Conferência não teria resultados tão importantes e muito pouco avançaria na direção da emancipação das mulheres. Vale ainda salientar que os resultados, se bem instrumentalizados, poderão inclusive fortalecer a Secretaria Especial de Políticas para Mulheres (SPM) no contexto do Governo Lula e, com certeza, serão um instrumento nos planos locais e estaduais na luta feminista por políticas públicas para mulheres.

Aborto

A recomendação para a revisão da legislação na perspectiva da descriminaliza-ção e legalização do aborto, com garantia de atendimento humanizado pelos serviços públicos de saúde foi aprovada por maioria em todos os grupos dos eixos ligados à efetivação dos direitos da mulheres e à saúde, e na plenária final. Para isso, foi intensa a articulação e a mobilização do movimento de mulheres. Agora, esta reco-mendação será encaminhada (juntamente com as demais diretrizes) para o Grupo de Trabalho Interministerial res-ponsável pela elaboração do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres.

A diretriz pela legalização do aborto foi acompanhada de várias outras que visam garantir amplamente os direitos sexuais e os direitos reprodutivos das mulheres. Além disso, as delegadas da Conferência tam-bém aprovaram uma moção de apoio à decisão do ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), que concedeu liminar autorizando a realização de aborto em caso de gestação de feto com anen-cefalia (sem cérebro). O tema será julgado pelo STF em agosto.

Aliança Afro-Indígena

Um destaque nesta Conferência para as mulheres negras e indígenas, que firmaram uma aliança Afro-Indígena, com a perspectiva de lutar articuladamente nas questões de gênero, raça e etnia. Além da grande delegação de mulheres indígenas, que já haviam realizado uma conferência nacional, cerca de 47% das delegadas presentes na Conferência eram mulheres negras, que participaram dos painéis e atuaram como coordenadoras, relatoras ou como delegadas presentes em todos grupos.

Sueli Carneiro, da Articulação de ONGs de Mulheres Negras, falou no painel “Análise da realidade brasileira, avaliando políticas realizadas e os compromissos assumidos pelo Estado brasileiro”. E, oportunamente, resgatou a contribuição recente do movimento de mulheres e feminista através da organização da Conferência Nacional de Mulheres Brasileiras (CNMB,2002) e da elaboração da Plataforma Política Feminista. Tanto a CNMB, como a Plataforma foram esquecidas e não citadas no vídeo apresentado na abertura da Conferência, que abordou a história de luta das mulheres, no Brasil.

Lesbianidade

O movimento de mulheres lésbicas, juntamente com as negras e as indígenas, foi um dos mais mobilizados nesta Conferência de Políticas para Mulheres. As reuniões organizadas por iniciativa da Liga Brasileira de Lésbicas/Sul articulou todos os demais regionais e focou as propostas do movimento para a Conferência. Na argumentação em defesa do aborto, as lésbicas se somaram às muitas delegadas que ressaltaram a autonomia das mulheres como princípio para diretrizes de políticas para mulheres.

Outro aspecto priorizado pelo movimento foi a educação com perscpetiva não sexista, anti-racista e não lesbofóbica. Destaque também para a aprovação da diretriz que coloca como dever do Estado o desenvolvimento de mecanismos de promoção, respeito e legitimação à diversidade de orientação sexual, tendo como referência o Programa Nacional Brasil sem Homofobia, bem como a criação de grupo de trabalho e estudo para conceituação da lesbofobia e da homofobia como crimes. A proposta foi apresentada pelo DIVAS (PE), assumida pelo movimento na CNPM e aprovada nos quatro grupos de trabalho do eixo que focou os direitos das mulheres, assim como na plenária final da Conferência.

Saúde e Educação - Desvinculação do Orçamento

Além da moção de repúdio encaminhada pelo movimento de mulheres e feminista e aprovada na Plenária final da I CNPM, o Fórum Brasil de Orçamento está divulgando para assinaturas (de organizações ligadas aos movimentos sociais) o manifesto contra a proposta do Governo de desvinculação das receitas das áreas de Saúde e Educação.

Conforme divulgado pelos jornais, o Ministério da Fazenda esteve fazendo estudos com esta intenção, em cumprimento ao acordo firmado com o FMI, ano passado. Dia 16, o porta-voz do Presidente, André Singer, afirmou estar descartada esta possibilidade da desvinculação das despesas com educação e saúde, dois dos principais itens do orçamento federal com verbas vinculadas. Mas, o Ministério da Fazenda também anunciou que segue estudando como cumprir o compromisso com o FMI.

Neste contexto, a pressão dos movimentos sociais no sentido de garantir a vinculação orçamentária continua sendo muito importante. Para assinar o manifesto, entre em contato com o Fórum Brasil Orçamento: fbo@cfemea.org.br

Cobertura da Imprensa

Ainda restrita e em alguns momentos lamentável foi a cobertura da imprensa, que noticiou de forma míope uma conferência que reuniu mais de duas mil mulheres, em Brasília, entre 15 e 17 de julho. Além das 1.770 delegadas - que eram urbanas, rurais, indígenas, negras, lésbicas, portadoras de deficiência e pesquisadoras de universidades com reconhecimento internacional, estavam parlamentares e observadoras/es de vários países. Mas as propostas de tantas ativistas do movimento de mulheres e feminista não mereceu da imprensa nenhuma análise mais consistente.

Diante da fraca cobertura às conferências, a mídia tem demonstrado que considera política apenas o que é próprio da ação partidária. Da CNPM, foi manchete nos jornais apenas a referência do Presidente Lula a uma suposta paciência das mulheres, durante discurso que fez na abertura do evento.

Os jornais não quiseram saber se as mulheres presentes na CNPM tinham esta tal paciência ou se, no contexto atual, consideramos esta a melhor estratégia. Se tivessem nos perguntando, ficariam sabendo que, entre outras coisas, a Conferência aprovou moção de repúdio à proposta do Ministério da Fazenda para desvinculação das verbas constitucionalmente garantidas para Saúde e Educação. Ou seja, demonstramos que as mulheres não tem nenhuma paciência frente a propostas que contribuem para a manutenção das desigualdades.

Veja também:
- I CONFERÊNCIA NACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA AS MULHERES (I CNPM)
- DOCUMENTOS DA I CNPM
- Documento da Marcha Mundial das Mulheres para a I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres

- MAIS SOBRE A IX CONFERÊNCIA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS (BRASÍLIA, 29/06-02/07)

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