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Tecido Social
Correio Eletrônico da Rede Estadual de Direitos Humanos - RN

N. 017 – 20/12/03

BALANÇO DOS DIREITOS HUMANOS NO BRASIL EM 2003

Com esta edição de Correio Tecido Social dedicada ao relatório Direitos Humanos no Brasil 2003, que faz um balanço da situação dos Direitos Humanos no país durante o ano que está acabando- infelizmente, muito negativo e decepcionante considerando as expectativas de mudança que a eleição de Lula tinha gerado no começo de 2003 - interrompemos temporariamente nossa atividade, que retomaremos na metade de janeiro. Desejamos um feliz 2004 a todos os nossos leitores, esperando que o ano que está começando apresente uma melhora no respeito dos direitos elementares da pessoa humana no Rio Grande do Norte e no Brasil.

Lançado no Rio Grande do Norte o relatório Direitos Humanos no Brasil 2003

Na passada quinta-feira, 18 de dezembro, foi lançado no Rio Grande do Norte, em uma cerimónia que teve lugar na sede do Sindicato dos Jornalistas do RN, em Natal, o relatório Direitos Humanos no Brasil 2003 da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, organização com sede em São Paulo que todos os anos, desde 2000, produz um relatório com dados sobre a situação dos direitos humanos no país. É o documento mais amplo sobre o assunto que se tem feito no Brasil nos últimos anos.

Participaram do lançamento o Presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos do Rio Grande do Norte, Roberto Monte de Oliveira, o Coordenador de Direitos Humanos do Governo do Estado, Fábio dos Santos, a Presidenta do Sindicato dos Jornalistas do RN, Margareth Grilo, o jornalista norte-riograndense residente em São Paulo Dermí Azevedo (figura histórica da resistência à ditadura militar no Estado e no Brasil e um dos fundadores do Movimento Nacional de Direitos Humanos) e a jornalista e coordenadora da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, Evanize Sydow.

Na cerimónia estiveram presentes, entre outros, o jornalista e histórico militante da luta contra a ditadura no Rio Grande do Norte, Ubirajara Macedo, o jornalista Antonino Condorelli de Tecido Social, o Ouvidor da Defesa Social do RN, Marcos Dionísio de Medeiros Caldas, o Corregedor Geral de Polícia do RN, Tertuliano Cabral Pinheiro, o advogado da Associação Norte-Riograndense de Anistiados Políticos, Oswaldo Monte Filho, o Presidente de dita associação e membro da Sociedade dos Poetas Vivos, Mery Medeiros, o Secretário Executivo do Centro de Direitos Humanos e Memória Popular (CDHMP), Aluízio Matias dos Santos e a antropóloga e Presidenta do Fórum de Mulheres do RN, Elizabeth Nasser.

O relatório, resultado de um trabalho desenvolvido em conjunto por 25 entidades, mostra que em 2003, primeiro ano de mandato do Governo de Luiz Inácio Lula da Silva, houve uma aumento das violações dos direitos elementares da pessoa humana em muitas áreas. As gigantescas expectativas de mudança que a posse de Lula gerou na maioria da população brasileira que o elegeu o ano passado, neste primeiro ano de Governo, foram traidas: é o que todos nós que acreditamos nas transformações estruturais que a eleição de Lula tinha vislumbrado não podemos deixar - tristemente, com o amargo sabor da decepção na boca - de constatar.

As políticas econômicas neoliberais caracterizaram os oito anos de Governo de Fernando Henrique Cardoso e que produziram espantosas violações dos direitos econômicos, sociais e culturais da maioria da população brasileira foram, na substância, mantidas inaletradas. Por exemplo, entre janeiro e agosto de 2003, os gastos com juros da dívida externa chegaram a 102,4 bilhões de reais, 68% a mais do que no mesmo período de 2002. Estes pagamentos foram realizados pelas nossas instituições públicas (Governo Federal, Estados, municípios, Previdência Social, Banco Central e empresas estatais) a bancos, investidores da Bolsa de Valores, FMI, Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento e Governos estrangeiros. Tais gastos equivalem a três vezes o orçamento do Governo Federal para saúde, a 334 vezes o orçamento para habitação, a 10,2% do Produto Interior Bruto e a cerca de 30% da receita fiscal dos três níveis de Governo.

De que adiantam os "programas sociais compensatórios", as migalhas do orçamento público destinadas à programas de redistribuição de renda, se as políticas macroeconômicas estão destinadas exclusivamente a beneficiar os interesses do capital financeiro? Como afirmou Maria Luíza Mendonça, coordenadora da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, à agência de notícias ADITAL em ocasião do lançamento do relatório em São Paulo, hoje em dia os mecanismos de defesa do capital financeiro são muito mais eficientes do que os de defesa da pessoa humana.

É triste observar que o Partido dos Trabalhadores - que tem em seu código genêtico a luta pela justiça social, que sempre pregou que o cumprimento dos direitos civis e políticos é indissociável do cumprimento dos direitos econômicos, sociais e culturais como trabalho, saúde, educação e habitação, porque não há verdadeira democracia sem igualdade de direitos e de oportunidades - no seu primeiro ano de Governo não sou não mudou de maneira estrutural o rumo das políticas macroeconômicas neoliberais, mas as aprofundou e fortaleceu.

A conclusão a que chega o relatório, e que nós de Tecido Social compartilhamos plenamente, é que não é possível que haja cumprimento dos Direitos Humanos se o Governo segue as políticas ditadas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e pelos organismos financeiros multilaterais, porque as exigências do capital financeiro (cuja única meta é a sua própria reprodução, portanto, seu intresse é o mantenimento dos mecanismos econômicos, sociais e políticos que a favorecem e implementam) não são compatíveis com as da maioria dos seres humanos.

O relatório mostra um aumento significativo das violações dos Direitos Humanos em muitos âmbitos. Os número de indígenas assassinatos, por exemplo, chegou a 23 casos confirmados, 3 desaparecidos que podem estar mortos também e um que foi morto em uma delegacia e a causa da morte foi atribuída a suicídio, fato que a família contesta. No ano passado, os homicídios de indígenas registrados foram 7.

Também aumentaram os assassinatos de trabalhadores ruaris ligados a conflitos pela terra com latifundiários. Enquanto no ano passado a Comissão Pastoral da Terra (CPT) registrou 43 homicídios, este ano o número chegou a 61.

O trabalho escravo, uma das mais graves infamias do Brasil, também teve um índice de denúncias muito elevado, desta vez - porém - por causa da efetiva vontade do Governo de erradicá-lo e não por descaso, indiferência ou políticas econômicas anti-sociais. Se em 2002 foram registrados, através de denúncias, 4.000 casos, neste ano o número aumentou para 7.000.

Apesar dos dados negativos e alarmantes, o relatório também constata que, depois da eleição de Lula, as organizações da sociedade civil e os movementos populares estão cada vez mais direcionados para exigir o cumprimento dos Direitos Humanos. Por exemplo, a pressão para o cumprimento das dívidas históricas da Reforma Agrária e da homologação das terras indígenas aumentou enormemente.

Ao mesmo tempo, este fenômeno gerou uma reorganização dos setores violentos das forças conservadoras que iniciaram este ano uma repressão muito forte, especialmente contra os movimentos sociais no campo. Isto combinado com as ações dos grupos de extermínio, principalmente nas periferias dos centros urbanos. Só no Estado de São Paulo, o número de homicídios da polícia aumentou em 51%.

O relatório Direitos Humanos no Brasil 2003 apresenta ainda dados sobre a situação da mulher no mercado de trabalho, da exploração trabalhista, da exclusão social nos centros urbanos, da educação, do tráfico de mulheres para fins de exploração sexual, entre outros. Esta edição de Tecido Social, com a qual fechamos este ano, contém um resumo dos dados e das principais questões tratadas no documento.

Antonino Condorelli

Veja também:
- ENTREVISTA. Evanize Sydow (Jornalista da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos). "Em 2003, a situação dos Direitos Humanos no Brasil piorou em muitas áreas"
- DIREITOS HUMANOS NO BRASIL 2003

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