Projeto DHnet
Ponto de Cultura
Podcasts
 
 Direitos Humanos
 Desejos Humanos
 Educação EDH
 Cibercidadania
 Memória Histórica
 Arte e Cultura
 Central de Denúncias
 Banco de Dados
 MNDH Brasil
 ONGs Direitos Humanos
 ABC Militantes DH
 Rede Mercosul
 Rede Brasil DH
 Redes Estaduais
 Rede Estadual RN
 Mundo Comissões
 Brasil Nunca Mais
 Brasil Comissões
 Estados Comissões
 Comitês Verdade BR
 Comitê Verdade RN
 Rede Lusófona
 Rede Cabo Verde
 Rede Guiné-Bissau
 Rede Moçambique



AVALIAÇÃO GERAL DO FENÔMENO SOCIAL DA VIOLENCIA

 

O fenômeno social da violência tem se manifestado nos últimos anos no Brasil onde a principal vítima é o tra­balhador: moradores das favelas e vi­las periféricas, sindicalistas, possei­ros, lideranças; ora de forma seletiva, ou de forma indiscriminada, chegando às chacinas. Se formos analisar mais detalhadamente este fenômeno verifi­caremos que a violência interpessoal, que é um número grande, está sendo superado pela violência estatal, através de ações dos policiais nas mais diversas formas de violações dos direitos fundamentais do cidadão; ou seja, a violência “pública”. Por outro lado assistimos ao aparecimento dos grupos de extermínio (os justiceiros esquadrões da morte), com relações e apoio por parte da polícia, além do crime organizado que vem quantificar a manifestação como também compli­car as ações de quem pretende enten­der e dirimir a violência.

O que está em jogo são as insti­tuições que o movimento popular tem lutado para consolidar, tais como a democracia, cidadania e a liberdade – o direito à vida e à felicidade.

Num primeiro momento as entida­des de direitos humanos tinham como forma de luta principal a denúncia e a cobrança das arbitrariedades ocorridas perante os órgãos públicos. A maioria deles se negavam em participar ou opinar dentro do Estado, e o resultado não foi muito favorável, a tática se mostrou frágil e de poucos resultados positivos.

Hoje já começamos a ter uma pos­tura diferente, pois nossas ações não se limitam mais a denúncia pura e simples, como também tomamos ini­ciativas jurídicas cabíveis, além de tentar influir diretamente nos órgãos estatais que desenvolvem a política de Segurança Pública. Continuamos omissos em relação ao poder judiciá­rio e a maioria de nossos atos se diri­gem contra os policiais (nosso bode expiatório preferido) ou o executivo, mais na pessoa de quem está no poder do que na sua política global.

Porém, temos que reconhecer também que existem alguns consensos no movimento de direitos humanos: que o problema da violência é um fenômeno complexo e não se resol­verá a curto prazo, que é uma questão eminentemente política. E por acredi­tar que as alternativas para o problema são políticas, tentaremos fazer uma abordagem, dentro desta ótica, sobre sociedade e controle da política públi­ca, pois precisamos saber onde esta­mos, para pretender ir a algum lugar.

Se analisarmos os conceitos jurídi­cos que se têm na sociedade sobre se­gurança pública, ordem pública, por exemplo, chegaremos facilmente à conclusão que a segurança pública do Estado, das classes e grupos hegemônicos na direção política do Estado em determinado momento histórico; ou seja, quem viola a ordem social e jurí­dica, a paz social, em principio, é a sociedade, por isso que ela tem que ser reprimida. Só cabe ao Estado esta­belecer a sanção, coação, a repressão

através de seus órgãos específicos pa­ra esse fim. É seu monopólio da sanção e repressão.

Usaremos uma definição de Segu­rança Pública para visualizarmos sua concepção e ideologia: “É o afasta­mento, por meio de organizações pró­prias, de todo perigo, ou de todo mal, que possa afetar a ordem pública, em prejuízo da vida, da liberdade, ou dos direitos de propriedade do cidadão”.

“A segurança pública assim se li­mita às liberdades individuais estabe­lecendo que a liberdade de cada ci­dadão, mesmo em fazer aquilo que a Lei lhe veda, não pode ir além da li­berdade assegurada aos demais, ofen­dendo-a” (de Plácido e Silva, 1987/1988).

Entenda-se da mesma forma Ordem Pública como a situação e o estado de legalidade normal, em que as autori­dades exercem suas principais atri­buições e os cidadãos as respeitam e acatam, sem constrangimento ou pro­testo. E o poder de polícia deve ser exercido quando os interesses do Es­tado, superiores ao indivíduo, indi­quem a necessidade de uma restrição às liberdades e direitos individuais. (de Plácido e Silva, 1987).

Essa definição parte da concepção positivista onde prevalecem paradig­mas conservadores e estanques, onde foram muito bem cultivados na cultura jurídica brasileira, como bem afirmou o professor e advogado José Eduardo Faria: “Eles estão ainda associados a um positivismo transcendente, segun­do o qual o direito positivo é postula­do como um direito natural inerente ao homem, integrante de sua persona­lidade. Por esse motivo, a Lei e a ordem passam a ser os primeiros valo­res naturais a serem preservados. En­carando o direito como objeto ético, que o indivíduo encontra na sociedade e por ele se regra, dando ao ensino um enfoque generalista, privilegiam-se aqui questões relativas à justiça, à le­gitimidade e aos vínculos entre direito e moral”.

Dentro desta lógica, onde o traba­lhador, o “inimigo interno” é visto potencialmente como um infrator, e a divisão de maneira compartimentada de quem deveria elaborar uma política global de Justiça e Segurança Pública

— da policia civil, polícia militar, judi­ciário, ministério público — não con­seguem organizar uma ação conjunta no combate à criminalidade e à impunidade. Na realidade, esse aparente caos parece cumprir no final das con­tas alguns objetivos para o qual foi “desorganizado”: garantir o privilégio e o “status” de uma minoria, reprimir qualquer questionamento advindo da sociedade. Não queremos aqui passar uma imagem de que a União e os Es­tados ficam maquiavelicamente prepa­rando a desordem em suas políticas, mas que, sem dúvida essa desco­necção favorece em muito a quem eles representam, que no final das contas são eles que ganham com esta desorganização.

Dentro deste quadro, verificaremos, entre outras coisas, que o cerne da questão é a concepção política e fi­losófica que temos não só de seguran­ça, ordem, justiça, mas principalmente de democracia. Os paradigmas hoje usados, por não corresponderem a nossa aspiração por um novo tipo de sociedade, devem ser superados, a fim de que possamos começar a reverter essa lógica conservadora e excluden­te.

A sociedade brasileira vive sob o regime democrático, pelo menos é o que está escrito nas “cartilhas” ofi­ciais e nos discursos do governo e de seus políticos que lhe dão sustentação nas assembléias legislativas. Porém, temos que questionar que tipo de de­mocracia é esta e quais são suas imutações.

Existem vários conceitos sobre de­mocracia, e cada qual define as for­mas do povo participar no poder. No Brasil vivemos o tipo chamado demo­cracia representativa ou indireta. É aquela na qual, o povo, fonte primária do poder, não podendo dirigir os negócios do Estado, diretamente, de­vido a extensão de seu território, da complexidade social, outorga as funções de governo aos seus represen­tantes, que elege periodicamente. Lo­go, na democracia representativa, a participação popular é indireta, perió­dica e formal, e se dá majoritariamen­te por via das eleições.

Foi assim que surgiu o mandato re­presentativo: alguém que lhe represen­ta e decida os rumos do país, Estados ou Município por você. O mandato representativo é uma criação do Esta­do liberal-burguês, que acaba cum­prindo o papel de manter distintos Es­tado e sociedade, como se fossem duas coisas estanques e incomunicá­veis, com exceção na hora da eleição. É na prática a forma de tornar abstrata e distante a relação povo/governo.

Pois, ao se eleger alguém, o eleito não fica, obrigatoriamente, vinculado aos seus eleitores, já que não é uma re­lação contratual, onde as duas partes têm direitos e obrigações vinculados entre si, toma-se, portanto, um man­dato irrevogável por princípio, e não precisa que os atos realizados pelo re­presentante sejam ratificados, confir­mados pelos “representados”. Ele (o mandato) é geral, livre e irrevogável.

A história da democracia brasileira é quase que a história de uma demo­cracia elitista. Na definição do Profes­sor Manoel Gonçalves Ferreira Filho, a democracia elitista é a “democracia que é possível. Na realidade consiste no governo por uma minoria democrática, ou seja, por uma elite formada na tendência democrática, renovada de acordo com o princípio democrático, imbuída do espírito democrático, vol­tada para o interesse popular: o bem comum”. Ela deu a base teórica para a doutrina de Segurança Nacional, im­plementada pelos militares no golpe de 64.

Em outras palavras, essa elite “de­mocrática” ao “ouvir” os anseios e aspirações do povo, através de sua privilegiada sensibilidade, já que pos­sui um maior conhecimento da reali­dade brasileira, tendo como con­sequência uma visão mais global e elaborada dos autênticos desejos e ne­cessidades nacionais. Ela poderá com mais precisão definir os interesses do Brasil. Na realidade, as elites brasilei­ras sempre viram com muita descon­fiança o povo, além de achá-lo pro­fundamente incompetente para geren­ciar os negócios do Estado.

Dentro desta conjuntura desfavorá­vel encontramos dificuldade de inter­ferir na formulação de uma política de segurança pública, onde muita das ve­zes somos obrigados a nos limitar à denúncia, sem termos clareza de que esses escassos canais de pressão são resultado prático desta democracia eli­tista que vivemos.

Devemos superar essa compreensão de democracia, pois a democracia é um conceito histórico, que se constrói na luta e na rebeldia de não se conten­tar com os limites impostos. Sob esse aspecto, “a democracia não é um con­ceito político abstrato e estático, mas é um processo de afirmação do povo e de garantia dos direitos fundamentais que o povo vai conquistando no correr da história” (José Afonso da Silva, 1990/1991).

Imbuídos deste espírito que deve­mos construir um “novo” conceito de democracia, na nossa práxis de luta, que não se limitará à representação, pois buscaremos outros caminhos, além de garantir os já conquistados, e se dará com mais ênfase a partici­pação popular no processo político. Essa nova democracia não temerá, muito pelo contrário, precisará fun­damentalmente da participação ampla do povo e de suas organizações de ba­se no processo político e na ação go­vernamental.

Para isso, é de fundamental importância que não ocorra a supremacia política sobre a sociedade civil. En­tenda-se sociedade política o Estado, sendo uma realidade material articula­da em aparatos, sendo uma determina­da forma de relação social entre os homens, e sociedade civil o conjunto de organismos ditos privados. Para que vivamos essa “nova” democracia é necessário que exista uma equidade de poderes entre sociedade civil e política.

E para que isso se concretize é es­tratégica a participação popular no processo político, para que garanta a hegemonia da sociedade civil, pois senão toda a nossa luta e conquista ou se perderá ou terá que se limitar a de­nunciar as tentativas de sensibilizar nossos representantes, já que não te­remos outros mecanismos de mediação com o Estado.

Nesse contexto, a frase do poeta Baudelaire expressa com muita nitidez a nossa contradição, ao expressar que: “Só se destrói realmente aquilo que se substitui”, e realmente precisamos de uma política de segurança pública da sociedade e não para a sociedade.

 

Desde 1995 © www.dhnet.org.br Copyleft - Telefones: 055 84 3211.5428 e 9977.8702 WhatsApp
Skype:direitoshumanos Email: enviardados@gmail.com Facebook: DHnetDh
Busca DHnet Google
Notícias de Direitos Humanos
Loja DHnet
DHnet 18 anos - 1995-2013
Linha do Tempo
Sistemas Internacionais de Direitos Humanos
Sistema Nacional de Direitos Humanos
Sistemas Estaduais de Direitos Humanos
Sistemas Municipais de Direitos Humanos
História dos Direitos Humanos no Brasil - Projeto DHnet
MNDH
Militantes Brasileiros de Direitos Humanos
Projeto Brasil Nunca Mais
Direito a Memória e a Verdade
Banco de Dados  Base de Dados Direitos Humanos
Tecido Cultural Ponto de Cultura Rio Grande do Norte
1935 Multimídia Memória Histórica Potiguar