II.
ESTRUTURA, CONJUNTURA E DIREITOS HUMANOS (Subsídio-SIN)
(Contribuição
do Prol. José J. Queiróz - Centro Santo Dias,
CDDH
Guarulhos e CDDH Vila Paulista).
1
- ONDE ESTAMOS?
1.
De onde viemos
É sempre
importante perguntarmos DE ONDE VIEMOS.
Nascemos como Colônia
de Portugal, na época, metrópole poderosa no conjunto do
capitalismo mercantil. O importante para Portugal era produzir açúcar
para o mercado europeu. Os senhores de engenho, em busca de mão-de-obra,
escravizaram os índios. Não deu certo. Mataram-nos. Nossos índios
continuam ainda sendo mortos pe???•?los novos colonizadores. Depois, os
senhores trouxeram os negros da África como escravos. E escravos
os negros continuam sendo até hoje apesar do “ventre livre” e
da abolição. Grandes glebas para grandes engenhos foi a nossa
primeira “reforma agrária”. Até hoje a situação pouco
mudou.
A Igreja foi
muitas vezes complacente com o massacre dos índios. Depois abençoou
o chicote do senhor do engenho no lombo do escravo e lhe garantiu
o céu se fosse um bom escravo, obediente às ordens do senhor.
Hoje, diante da escravidão do século XX, a igreja mudou?
Quando a
cana-de-açúcar entrou em decadência e Portugal também perdia o
domínio colonial para a Inglaterra, os senhores de engenho,
aliados à classe média e à burguesia comercial emergente,
levaram o Príncipe Regente a proclamar a “INDEPENDENCIA”. Foi
apenas uma troca de domínio. Em vez de Portugal é a Inglaterra
que exerce seu mando sobre nós e sobre o produto do nosso
trabalho. Tivemos que pagar a Portugal uma grande indenização
pela nossa “independência”. A Inglaterra bancou esse
dinheiro. desinteressadamente? Foi a nossa primeira dívida
externa. Até hoje o nosso individamento, que não pára de
crescer, é um labirinto onde se perde totalmente a nossa economia
vinculada ao capitalismo internacional.
Os senhores de
engenho são derrotados pela burguesia agrária dos cafeeiros. São
estes que proclamam a nossa República para proteger os seus
interesses setoriais mediante a criação de um Estado Federa???•?tivo.
Desde então o nosso sistema eleitoral não passou de pequenas
farsas ou de grandes corn~3dias manipuladas pelos interesses da
classe dominante. Os partidos nascem como máquinas eleitorais
coordenadas por um conjunto de hierarquias e lealdades
conhecidas como “coronelismo”.
Com a ascensão
da burguesia industrial e, mais ainda, com a implantação do
predomínio das multinacionais, o coronelismo teve seu poder enfraquecido.
Entretanto, ele permanece operante em vastas áreas do país. Aliás,
a impressão que se tem é que ele está renascendo com acentuado
vigor nas rei ações políticas município-estado-governo
federal. De seus currais políticos do Maranhão, foi guindado
casualmente ao máximo cargo executivo o Coronel Sarney. Ulisses
parece ser o grande Coronel do PMDB, disputando esse predomínio
com vários outros concorrentes dentro do partido; Quércia e sua
Frente Municipalista copia o modelo; figurões do PFL e do PDS,
que ocupam posições de destaque no cenário político,
utilizam-se do mesmo esquema. Até a nomeação de Ministros
depende da briga dos coronéis.
Outro fator
determinante ao longo de nossa história é o papel das Forças
Armadas. Nossa República é proclamada por um marechal do Exército,
sem nenhum apoio das classes populares, quando a nossa economia
passa a ser controlada pela burguesia cafeeira. Desde então, as
Forças Armadas exercem o papel de tutela do nosso regime
‘democrático”, preservando com o poderio das armas, quando
necessário, o domínio dos grupos econômicos que se sucedem no
???•? cenário político. A República foi palco de várias intervenções
militares não só contra movimentos populares mas também contra
oligarquias rebeldes. “Nesse período, as Forças Armadas,
incluindo aí também as Forças Públicas Estaduais, jamais se
limitaram a simples ornamento do Estado. Foram aparelhos
efetivamente empregados pela burguesia agrária para esmagar
rebeliões camponesas, movimentos populares e resolver conflitos
entre oligarquias” (Pedro A. Ribeiro de Oliveira, Religião e
Dominação de Classe, Vozes, 1985, p. 229).
2.
Aqui e Agora. A Segurança Nacional e suas implicações sócio-econômico-políticas
Mas o papel das
Forças Armadas torna-se preponderante nos tempos modernos,
quando penetra nos quartéis a Doutrina da Segurança Nacional.
Após a II Guerra
Mundial, o mundo assim dito desenvolvido dividiu-se em dois
grandes blocos: o bloco capitalista, agora liderado não mais pela
Inglaterra, cujo império decaíra, mas pela potência emergente,
os Estados Unidos da América do Norte, e o bloco comunista,
liderado pela União Soviética (o bloco chinês, embora fugindo
da liderança soviética e se colocando muito próximo dos
interesses americanos, é considerado pela Doutrina da Segurança
Nacional como parte do Bloco Comunista).
A Doutrina da
???•?Segurança Nacional apresenta-se, entre nós, como uma geopolítica,
que responde à seguinte indagação: qual o papel geográfico e
político da América Latina, em especial do Cone Sul e do Brasil
neste panorama mundial dividido em dois grandes impérios?
2.
1. Princípios básicos da geopolítica
a) Dualismo
A geopolítica da
Segurança Nacional se embasa numa visão dualista ou maniqueísta
do mundo. A humanidade está dividida em dois grandes impérios.
O império do bem, cristão, humano, democrático, justo. É o
Ocidente capitalista. A tutela desse império cabe à superpotência
do bem e da democracia, os Estados Unidos da América do Norte. Do
outro lado, está o império do mal, da mentira, da atrocidade, do
materialismo. É o império comunista que tem como chefe e príncipe
dos demônios, a União Soviética.
b) Guerra
constante e universal
Entre esses dois
impérios não há trégua. Citemos o maior ideólogo dessa
Doutrina entre nós, o General Golbery: “Homens de todas as
latitudes e de todas as raças - a guerra é global -; homens de
todas as idades - a guerra é permanente homens de todas as profissõe???•?s e dos
credos mais diversos - a guerra é total. Devemos pois olhar bem
de frente essa Esfinge dos novos tempos para decifrar-lhe o mistério
tremendo que em si mesma encerra e fortalecermo-nos na defesa da
Liberdade que é exigência essencial e indispensável da condição
humana, para que nem na guerra acabemos por soçobrar, vencidos,
nem por ela soçobre, afinal, conosco, a Humanidade inteira”
(Gen. Golbery do Couto e Silva, Conjuntura Política Nacional. O
Poder Executivo. Geopolítica do Brasil. Ed. José Olímpio, 3ª
Ed., p. 9-10).
c) Integração
Face a esse
panorama irreversível, é inevitável a integração dos fracos
aos fortes, dos subordinados ao país líder. É o que afirma com
toda crueza Spykman, o representante dessa Doutrina nos Estados
Unidos: “Quem não aceitar a criação de um espaço vital, que
incorpore todo o Continente Americano com base em uma economia
planificada, com produção controlada e direção centralizada
no comércio internacional, não poderá sobreviver. Nenhum dos
Estados aceitará de bom grado as modificações imprescindíveis
para criar essa economia regional. . . Somente a conquista do
hemisfério pelos Estados Unidos e a implacável destruição das
economias ora existentes poderá realizar a integração necessária”
(Citado em Paulo Shiling, O Imperialismo Brasileiro, p. 21).
d) Fatalismo
Só resta nos países
periféricos a aceitação fatalista da geopolítica do império
a???•?mericano. Ainda o Gen. Golbery: “As pequenas nações se vêem
da noite para o dia reduzidas a condições de Estados pigmeus e já
se prevê o seu melancólico fim, devido aos planos de inevitáveis
integrações regionais; a equação de poder no mundo se reduz
a um pequeno número de fatores e nele se percebem como pequenas
constelações feudais... Não existe outra alternativa para nós
senão aceitar os planos de integração e aceitá-los
conscientemente” (Op. cit., p. 52).
2.2. A predestinação
do Brasil. Teoria do destino manifesto.
Como os Estados
Unidos tem o destino manifesto de serem o baluarte da civilização
ocidental frente a ameaça do materialismo comunista, assim também
o Brasil, no Atlântico Sul e no Cone Sul está predestinado a
exercer a função de subimpério ou de satélite privilegiado da
Superpotência. Esta predestinação se deduz de sua posição
geográfica (a vastidade e estratégica de sua extensão
territorial), economia (suas imensas riquezas) e culturais (sua
tradição cristã). É imprescindível que o Brasil exerça essa
função porque a Superpotência não tem condições de cuidar
sozinha da sua defesa no Atlântico Sul. Neste sentido, cabe ao
Brasil ser o gendarme da Segurança do Ocidente “cristão”
nesta parte do Hemisfério.
Esta visão
geopolítica vem permeando e contaminando todo o sistema sócio-econômico
e político brasileiro das últimas décadas, com???•? consequências
práticas de profundo alcance.
2. 3. A Estrutura
Política do Estado
Ela atinge em
primeiro lugar a própria estrutura política do Estado. Nessa
estrutura, o princípio fundamental, no ápice da pirâmide política,
é a própria Segurança Continental e Mundial. A filosofia política
que sustenta essa segurança é o Conceito Estratégico Nacional
ou o conjunto de estratégias destinadas a defender o
Continente. São essas estratégias que dominam e comandam as
diretrizes governamentais. O objetivo nacional deve ser a
arrancada para o desenvolvimento e elevação do país ao nível
de uma grande potência. Para isso as diretrizes governamentais
devem firmar quatro estratégias que garantirão o desenvolvimento
com segurança: a estratégia política, a estratégia econômica,
a estratégia psicossocial (incumbida de informar e “orientar”
a opinião pública) e a estratégia militar.
Até poucos anos
atrás, a geopolítica da Segurança exigiu a predominância da
estratégia militar na estrutura política em quase todos os países
da América do Sul. Por esta razão, assistimos ao terrível
desfile de golpes e a implantação de ditaduras militares em
quase todo o Continente para salvar a “Paz” Americana ameaçada
pelos movimentos de esquerda. Em todos esses golpes, houve ingerência
da Cia, do Pentágono. A Escola Superior de Guerra e os militares
brasileiros e???•?xportaram em larga escala técnicas e táticas de
golpe e de repressão política para os países vizinhos.
A preponderância
da estratégia militar foi o fator responsável pela violenta
sistemática violação dos Direitos Humanos do Cone Sul e no
Brasil. Institucionalizou a tortura e reforçou a truculência do
aparato policial-militar. Agigantou o executivo, transformou o
legislativo em vaquinha de presépio, contaminou o poder judiciário.
Castrando a participação da sociedade civil nas decisões,
impossibilitou qualquer espécie de controle e deu margem aos
maiores desmandos, que desembocaram numa corrupção sem limites
que envolve todo o país, de alto a baixo, num mar de lama.
2.4. A economia
da Segurança. Crescimento e miséria
Garantindo a
segurança do Capitalismo no Hemisfério, o Brasil conseguiu uma
grande arrancada de desenvolvimento econômico. O capital internacional
se transferiu para cá em massa, O parque industrial cresceu. Do 40º
lugar que ocupávamos entre as maiores economias do mundo,
passamos para o 8. Nosso crescimento se deu ao lado da destruição
do parque industrial de países latino-americanos como Argentina,
Uruguai, Chile. Petrodólares e Eurodólares correram em abundância
para cá atraídos pelos juros privilegiados e pela mão-de-obra
barata.
Mas esse
crescimento é tam???•?bém a nossa miséria. Grande parte dos empréstimos
se perderam nas malhas da corrupção. Outros foram enterrados
em obras faraônicas, inacabadas ou sem retorno para o povo. A
injusta distribuição favoreceu a transferência cada vez maior
das rendas da classe pobre para a burguesia nacional e
internacional e para a classe média. Daí o crescimento da miséria
ao lado do desenvolvimento econômico. Socialmente falando, o
Brasil é um dos países mais abandonados. No sinistro
campeonato da fome, ele já ocupa o 60 lugar no mundo.
2. 5. A geopolítica
da Segurança e a Nova República
O fim da ditadura
militar não significou absolutamente o fim do predomínio da
Doutrina da Segurança Nacional. Esta continua balizando os rumos
do país no período de transição. A passagem do bastão de
comando das mãos dos militares para a Nova República de
Tancredo-Sarney teve sem dúvida um direcionamento, por trás dos
bastidores, destinado a salvaguardar os interesses do capital
internacional e a aliança entre o Brasil e o império do
capitalismo. A permanência operante da Doutrina da Segurança
Nacional explica o fracasso das diretas-já, explica a criação
da Aliança Democrática, para sustentar a Nova República, que reúne
partidos conservadores esvaziados de qualquer compromisso com a
transformação social do país; explica o caminho imposto de uma
Constituinte congressual; explica a decapitação da Soberania
dessa Constituinte; explica a i???•?mplantação do Plano Cruzado
como esforço extremo para salvar da derrota os partidos que
sustentam essa transição conservadora.
O Plano Cruzado
fracassou, como era de se esperar, mas conseguiu seu objetivo político:
colocou no poder o PMDB, partido desfigurado, heterogêneo,
eleitoreiro, neopopulista e loteador de cargos e poderes. Mas a ânsia
em ganhar as eleições obrigou a reprimir além dos limites o
vulcão inflacionário. O Plano arriscou uma tímida redistribuição
da renda; alargou o consumo para certas faixas da população;
provocou uma passageira euforia de novos empregos. Mas acabou
sendo implodido pela ganância de lucros sem limite, que
caracteriza a nossa burguesia nacional e internacional.
A balança
comercial desequilibrou-se. As reservas se esgotaram O desperdício
nunca foi reprimido. A corrupção disparou. Mordomias e gastos
faraônicos continuaram à solta. Consequência: não há dinheiro
para pagar os juros da astronômica dívida externa. E o assim
chamado “calote”, tantas vezes recusado pelas autoridades
monetárias do país, já é uma realidade.
O capital
estrangeiro se retrai. A hiperinflação bate às portas. O
mercado interno despenca. A estagnação e o desemprego já
campeiam com o seu sinistro cortejo de fome e violência. É a
crise do capitalismo periférico brasileiro em proporções jamais
atingidas até hoje.
2 — PARA ONDE
VAMOS?
As crises do
capitalismo desnudam as suas contradições. Põe às claras a
exploração que lhe é intrínseca e possibilitam enxergar, por
trás das falsidades ideológicas, a realidade da degradação
humana. Os mitos se esfacelam. O mito Tancredo foi colhido pela
morte. O mito da Nova República já desvendou sua face autoritária:
pacotes, decretos-leis, incursões militares em locais de
trabalho, truculência policial contra operários e bóias-frias,
alianças e conchavos espúrios, a volta do coronelismo, do
nepotismo. Tudo indica que nada mudou. Da ditadura dos militares
passamos a uma ditadura sem farda sob a espreita do militarismo. O
peso pesado do capital internacional massacra o povo e está de
volta aquele princípio, que por um rápido instante pareceu
afastado: É preciso exportar e pagar os interesses do capital
internacional às custas da miséria do povo. A mentira institucionalizada
como forma de governo lançou sobre os poderes constituídos um
descrédito universal e irrecuperável. Estamos vivendo num país
cada vez mais ingovernável.
A crise do
Brasil, que é também da América Latina, pode ter dois
desfechos. Uma saída possível é a reabsorção do Brasil e dos
demais países em crise, no seio do hemisfério capitalista, com o
revigoramento da geopolítica que já descrevemos. Se atendermos
a uma recente análise de Alain Touraine, os países ricos estão
diante de um dilema: “tem que decidir se é indispensável para
a sua sobrevivência uma América???•? Latina democrática (?) e
capaz de manejar seus problemas econômicos e sociais ou se não há
maiores inconvenientes em o Continente se transformar num vasto
território subdesenvolvido dominado por uma economia afundada e
uma política clientelística, deixando a algumas empresas
multinacionais organizar os setores incorporados às economias
desenvolvidas”. É evidente que essa segunda solução é
perigosa para a Segurança Nacional pois criaria uma situação
explosiva e um desequilíbrio que nenhum país industrializado
seria capaz de controlar. Por alguns anos mais os Estados Unidos
podem manter a dramática ilusão de que uma combinação de
“marines” em apoio a grupos contra-revolucionários e a ajuda
econômica a governos debilitados podem manter a “paz”
americana em todo o Continente; porém não por muitos anos”. E
eis o caminho de reintegração apontado por Touraine:
É indispensável
organizar uma grande conferência internacional entre os quatro
principais componentes do sistema ocidental: América do Norte,
Europa Ocidental, Japão e países recém-industrializados do
Extremo Oriente e da América Latina. Não somente para resolver
os problemas da América Latina “enferma” mas também para
salvar o mundo inteiro da catástrofe econômica e política
inevitável se continuar desenvolvendo uma economia financeira
distante da economia produtiva e que conduz os Estados Unidos, a
Grã-Bretanha e a França, assim como a América Latina rumo à
desindustrialização através de uma economia especulativa...
Esta crise destrói primeiro os países mais débeis, periféricos,
porém ameaça também aos???•? países centrais”. (Alain Touraine,
Artigo em “A Folha de São Paulo”, 03/06/87, p. A 44).
Outro caminho
diametralmente oposto ao apontado por Touraine é a via para o
socialismo. O Brasil como toda a América Latina, não é um país
enfermo, que poderá ser curado com uma integração mais adequada
na economia dos países ricos. A América Latina é um Continente
explorado e sugado pelo capitalismo nacional e supranacional.
Somente destruindo os mecanismos desta exploração do homem
pelo homem será possível vencer as crises constantes que afundam
nossos países no abismo da desumanidade. E a negação deste
sistema só é possível com o triunfo do socialismo. Cuba e Nicarágua
já optaram por este caminho e, apesar de todas as dificuldades,
enveredam para a consolidação do sistema socialista.
O projeto
socialista, em que pese a diversidade dos modelos, contém algumas
linhas básicas.
A primeira é a
constatação de que o trabalho humano é a verdadeira medida do
valor de tudo o que se produz sobre a terra. Não é o capital,
nem a mercadoria, nem o dinheiro a base da civilização e da
cultura. Por esta razão, o projeto socialista coloca o trabalho
humano como fundamento da nova sociedade. E é imprescindível
que o trabalho seja realmente livre. Esse reino da liberdade
implica em que o trabalho não seja mais unia mercadoria que
alguns privilegiados, os donos do capital e dos meios de produção,
compram para em cima dele lucrar, arrecadar excedentes econômicos,
acu???•?mular, poupar ou gastar, deixando quem produz na miséria.
Implica em devolver ao trabalhador o fruto do seu trabalho da
maneira mais adequada possível. Como meta ideal, implica em
exigir que cada trabalhador contribua para o todo social conforme
suas forças a fim de receber da sociedade os bens que lhe
competem conforme suas necessidades. Isso só é possível
mediante a socialização dos meios de produção.
Nesse estágio do
projeto, a abolição da fonte de toda a desumanidade, que é a
propriedade privada, será também “o fim da alienação humana,
a verdadeira apropriação da natureza humana através do e para o
homem. Será o retorno do homem a si mesmo como um ser social,
isto é, realmente humano, um regresso completo e consciente, que
assimila toda a riqueza da evolução e a natureza entre o homem e
seu semelhante... é a resposta ao enigma da História... (“Karl
Marx, Manuscritos Econômicos e Filosóficos, Ed. em E. Fromm,
Conceito Marxista do Homem, Zahar, 3 Ed., 1964, p. 123).
3 - COMO CHEGAR LÁ?
Supondo que seja
este o projeto que anima os corações e as mentes do pessoal, que
milita nos Direitos Humanos, a pergunta mais empenhativa e essa:
como chegar lá?
O projeto
socialista está presente, inspira ou rege grande parte da
humanidade contemporânea. E se implantou mediante uma pluridade
de cami???•?nhos. Razão pela qual seria absurdo querer trazer este
ou aquele modelo como sendo infalível ou o mais eficaz.
A teoria somente
aponta algumas pistas.
Não é impossível
implantar o projeto socialista mediante a via política. Um
partido, com o apoio consciente e efetivo das massas, toma o podei
pela via do voto e executa a transformação das estruturas
sociais. Na América Latina, o Chile de Allende foi uma tentativa.
Não deu certo. As forças reacionárias, nacionais e
internacionais massacraram o incipiente socialismo e implantaram
uma das mais cruéis ditaduras da história, que perdura até
hoje.
O caminho mais
trilhado para o socialismo tem sido a luta armada. Na América
Latina, dois exemplos de revolução socialista vitoriosa: Cuba e
Nicarágua.
Uma revolução,
entretanto, é algo tremendo, exige o sacrifício de milhares de
vidas humanas. Por isso, consoante ao espírito cristão, expresso
pelo grande teólogo Tomás de Aquino, só pode se desencadear
quando não há outro meio de eliminar a tirania que oprime o
povo.
Toda revolução
requer condições objetivas muito concretas. A primeira é a
crise aguda e irremediável da estrutura dominante. A velha
estrutura está em agonia e o novo está para nascer. Sintoma
evidente dessa agonia se tem quando a classe dominante não
consegue mais dirigir a classe subalterna com os seus i???•?nstrumentos
de transmissão, propagação e manutenção da ideologia. Os
partidos tradicionais deixam de ser reconhecidos como
polarizadores das massa, envelhecem e se esvaziam inteiramente de
qualquer significado para o povo. A desconfiança generalizada
penetra em todos os órgãos da opinião pública. A classe
dominante já não possui mais o consenso dos dominados. É a
crise da autoridade.
Essa crise
acontece, em geral, por duas razões: ou porque a classe dominante
fracassou em um dos seus grandes projetos políticos ou porque
amplas massas passaram da passividade política para uma certa
atividade e apresentam reivindicações que, em seu conjunto, já
constituem uma espécie de revolução. Às vezes, essa luta das
massas toma características caóticas e desorganizadas
(banditismo, saques, incêndios, sequestros). Esse caos, em geral,
não leva a nenhuma transformação social; ao contrário, pode
provocar a intervenção das forças de direita e fazer regredir
o processo.
Dentro da crise
aguda do sistema é que se implanta a luta pela superação do
regime opressor.
O primeiro passo
é a ruptura da classe subalterna com a classe dirigente e com a
sua ideologia. É a construção de uma visão de mundo cada vez
mais coerente com a prática dos dominados e a denúncia clara
destemida das contradições e da desumanidade do sistema
dominante.
Essa luta ideológica
deve fazer-se acomp???•?anhar de uma formação intensiva de quadros
e lideranças oriundas da própria classe subalterno.
Não há revolução
sem massas organizadas e politizadas. Uma revolução de
vanguardas desvinculadas das massas é uma revolução de elites e
só pude desembocar numa outra subjugação do povo sob o rótulo
de socialismo. Por isso é fundamental confiar nas massas,
acreditar que possam chegar e compreender e agir em função de
tarefas transformadoras, sempre que sejam convenientemente
mobilizadas. É preciso respeitá-las. Respeitar seus interesses
espontâneos e seus interesses a longo prazo. Isto se deve
traduzir cm propor tarefas que, embora relacionadas com seus
interesses estratégicos a longo prazo, partam sempre de seus
interesses espontâneos imediatos. Consultá-las. Recolher suas idéias
e opiniões em face dos fatos. Não lhes dar tudo pronto, vindo de
cima. Informar-lhes sobre a situação histórica, sobre a
conjuntura e a estrutura, sobre os caminhos da luta. Educá-las.
Elevar seu nível de consciência partindo de suas próprias
lutas. Organizá-las. Isto é, buscar formas que lhes possibilitem
a máxima participação. Mobilizá-las. Cada fato conjuntural
pode ser uma brecha para orna ação política e estratégica das
classes populares.
Só
depois deste longo e paciente aprendizado de luta é que
desabrocharão do povo as condições objetivas para um possível
movimento revolucionário armado, última instância a que se
deve recorrer para transformar a sociedade desumanizante num convívio
???•? de irmãos, sob o signo da paz, fruto da igualdade.
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