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Insurreição Comunista de 1935

ÀS ARMAS, CAMARADAS!
A Insurreição Comunista e o Governo Popular de 1935 em Natal
Natanael Sarmento


Revolução à vista!


O espectro da insurgência rondava o Brasil, no ano de 1935. O governo de Getúlio recrudescia, nos sucessivos atos autoritários. Proibida a livre organização partidária. Censura e fechamento de jornais. Repressão brutal de greves. Evidenciavam-se, cada vez mais, as pretensões continuístas do caudilho dos pampas. A oposição queria derrubar o pampeiro do cavalo do poder. Já não podia retirá-lo através do voto, face à suspensão das eleições, que fosse pelas armas. Ora, o próprio Vargas chegou ao poder através do golpe armado, em 1930.

As demandas reprimidas chegavam como uma tromba d’água desabada no ano 35 , ano de crises, agitações, conspirações e rupturas.

Os políticos da tradição oligárquica, os “carcomidos”, ganharam novo fôlego, após as eleições de 1933. E a Revolução de 30, ainda inconclusa, parecia insegura, em seus primeiros passos. O Exército Nacional permanecia sendo foco da rebeldia da jovem oficialidade, do chamado tenentismo. Divididos após a vitoriosa Revolução Liberal, uma parte liderada por Juarez Távora, Cordeiro de Farias e outros adentram no projeto governista, outra, permanece insurgente, como Luís Carlos Prestes, Agildo Barata, Hercolino Cascardo e outros do tenentismo de esquerda.

No nome do internacionalismo proletário os comunistas do PCB seguiam alinhados às orientações do Comintern, o centro do Movimento Comunista Internacional, de Moscou. A Frente Única, modernizadora, Nacionalista contra o imperialismo e o fascismo, a ANL agregava personalidades civis e militares expressivas: Comandante Hercolino Cascardo, herói da revolta do couraçado São Paulo , Capitão Amoreto Osório, fundador do Clube Militar, Capitães Trifino Correia, Moisés Rolin, Henrique Oest, Agildo Barata e Major Costa Leite. Francisco Mangabeira, advogado, Venâncio da Paz, médico, o deputado Abguar Bastos, Rubem Braga e Benjamin Soares, jornalistas, Ivan Martins, estudante. Em poucos meses, mais 50 mil inscritos, nomes de peso, Miguel Costa, Magalhães Barata, João Cabanas. Comícios concorridos, repressão do governo, confrontos de rua com integralistas, as escaramuças anunciavam a batalha. No Teatro João Caetano, o estudante Carlos Lacerda aclama o nome de Luís Carlos Prestes para Presidente de honra da ANL, ovacionado pela plateia.19

No outro lado da barricada, o nacionalismo da direita fascista, do integralismo defendido por intelectuais e padres católicos, Plínio Salgado, Miguel Reale, Câmara Cascudo, Hélder Câmara, Tristão de Ataíde. O Clube Militar agitado pelo debate da Lei de Segurança e pelo aumento dos soldos. Completava esse clima de descontentamento e agitação geral.

Desde Moscou, do exílio, Luís Carlos Prestes escrevia balanço da Coluna, a dizer que faltaram objetivos políticos à vitória. Com esse ingrediente carreavam-se as condições revolucionárias dos camponeses ao caminho chinês de revolução, avaliava o “Cavaleiro da Esperança”. As condições objetivas à revolução, de tal avaliação, confirmavam as informações de líderes do PCB e se enquadravam na estratégia do Comintern da revolução socialista mundial.

O Miranda, Secretário Geral do PCB e delegado do 3º Congresso dos Partidos Comunistas da América e Caribe, transmitia informações fantasiosas a Moscou. Fantasiava o amadurecimento das condições revolucionárias no Brasil e exagerava sobre os cangaceiros, mais de mil na Bahia. Miranda avaliava o cangaço como produto da contradição da luta no campo, entendendo que muitos grupos atenderiam ao chamamento à luta política do proletariado. Essa absurda presunção foi aprovada pelo conclave e remetida à recomendação do Comitê Central do PCB: estabelecer laços mais estreitos com as massas de grupos de cangaceiros e vinculá-los ao movimento geral da revolução proletária e camponesa do Brasil.

Na análise dos comunistas, o Brasil país agrário e feudal, em contradição com o capitalismo industrial. Barril de pólvora, na iminência de explosão. As greves generalizadas, nas cidades, e as lutas sociais do campo, precisavam da mão certeira a dar direção política. Tarefa da vanguarda do proletariado, do PCB. Nessa miragem de revolução à vista, o jornal A Classe Operária, órgão oficial do PCB orientava: Como os Trabalhadores Brasileiros Resolverão a Crise em todos os Estados do Brasil há pessoas dispostas a pegar em armas, camponeses, vaqueiros, peões, índios, negros, mestiços e brancos nas fazendas . O tal documento aponta o caminho da revolução camponesa:


[sic] [...] guerrilhas multiplicadas em todo Brasil em dezenas e dezenas, o governo não vai dar conta. Ele não dá conta hoje dos nossos irmãos camponeses que se revoltam – os cangaceiros – a quem chamam de bandidos, nem lhes cortando as cabeças, e nós arrastaremos conosco os cangaceiros, lhes ensinaremos a lutar melhor e a não praticar certos atos de revolta que dão armas ao governo para envenenar a população contra os cangaceiros. O Governo [...] baterá em retirada diante de nossas guerrilhas multiplicadas em todo o Brasil, e nós, nos reuniremos em zonas seguras, tomaremos cidades e mais cidades, e com o povo dessas cidades, vilas e aldeias, formaremos nossos governos de municípios, os nossos conselhos (sovietes) eleitos por camponeses, negros, índios, mestiços e brancos, saibam ou não ler.20


Enquanto os comunistas brasileiros e da cúpula do Comintern cogitaram “ganhar” cangaceiros à perspectiva do movimento geral da revolução , a grande imprensa tratava a luta armada camponesa como cangaço. Os jornais do Rio Grande do Norte, Pernambuco, Rio de Janeiro, noticiavam as greves dos ferroviários e salineiros, em Mossoró e em Macau e o movimento extremista típico de guerrilha rural, no Vale do Açu. Na mesma trilha do editorialista do jornal A República, que qualificava de comunista “o cangaceirismo açoitado à sombra da bandeira do credo exótico; grupos de rudes analfabetos dispostos a toda maldade de crime; movimento de caráter nitidamente comunista”.21 Para os setores da informação social, cangaceiros e comunistas são a mesma coisa, ou acabam sendo.

Em março de 1935, Miranda, o Antônio Maciel Bonfim, controverso Secretário Geral do PCB, radicalizava: “[...] pegar em armas desde já, não há outra solução. Ou morrer lutando, ou ser escravo [...] em todo Brasil há camponeses, trabalhadores, vaqueiros, peões, índios, negros, mestiços e brancos que querem pegar em armas”.22

Com o terreno da revolução adubado, nos cálculos dos dirigentes comunistas, a IC despacha ao Brasil Luís Carlos Prestes de Moscou , para liderar a revolução Nacional e Libertadora Antifascista . O Cavaleiro da Esperança usa uma retórica belicista, no Manifesto de 5 de julho de 1935, avocando o troar dos canhões de Copacabana e da jornada da Coluna, e convocando os companheiros de farda à luta e à vitória.

Prestes desembarcou, clandestinamente, no Brasil, acompanhado de meia dúzia de assessores e especialistas, da IC. Estabelecem o Comando Geral da revolução, na Capital Federal, Rio de Janeiro. O chefe Militar da rebelião acumulava a experiência guerrilheira da Grande Marcha que cruzou o Brasil, de Norte a Sul, entre 1925 a 1927. Cercado da aura de líder maior da rebeldia popular, ele contava com Olga Benario, dirigente da IC e companheira , com Rodolfo Guioldi, dirigente do PC da Argentina, com os alemães Arthur Ernest Ewert – Harry Berguer –, Johnny de Graaf – Paul Franz –o norte-americano Victor Allen Baron, os russos Pavel Vadmirirovich – León Jules Vallée e Sofia Stuchevskaya.23Após a derrota do movimento e a prisão dos comunistas, todos os estrangeiros foram presos e barbaramente torturados. A polícia de Filinto

Müller com assessoria e treinamento da Gestapo, enlouqueceu uns, matou outros, deportou para a morte certa outros.

Sonhando com a revolução à vista, Prestes encarregou o Capitão Silo Furtado Meireles, aquartelado no Recife, do Comando da revolução na Região Nordeste. As ordens desciam pela escala hierárquica: do Comando Geraldo Rio de Janeiro aos Comandos Regionais, destes, aos respectivos Estados. Pela hierarquia, Natal devia receber a ordem de rebelião do Comando Regional sediado no Recife. Era esse o protocolo. Mas, revolução alguma vai respeitar protocolos?

Enquadrar na disciplina militar uma situação revolucionária, é algo como querer arrumar uma casa por onde passa o tufão. A hierarquia e os protocolos pretendidos, cogitados e imaginados, por alguns chefes, podiam funcionar no âmbito exclusivo dos quartéis. Com hora e data certa da eclosão do motim. Porém, em movimentos mais amplos, com greves e protestos, com adesão de vários e diferentes atores sociais, como fixar hora certa? Dizer às paredes chegou a hora? Envolver na disciplina castrense os estivadores, camponeses, funcionários, intelectuais, militares dos vários segmentos da sociedade? No Rio Grande do Norte, o concurso de várias forças sociais, inclusive no âmbito da oligarquia, dificultou o pretendido controle protocolar da revolução.

Em fase de preparação, a revolução germinava nos outros estados e cidades. Mas estava de vento em popa, em pleno desenvolvimento, em Natal, no Rio Grande do Norte. Havia rebentada a guerrilha , no Vale do Açu. Natal levanta-se, e o Recife tenta acompanhar, em seguida, assim como o Rio de Janeiro. No roldão da revolução fato consumado, das notícias de vitória do movimento em Natal, sem suficiente preparação e organização, forçando a situação.

Tanto o comando regional do Recife quanto o geral do Rio de Janeiro, foram surpreendidos, pelas notícias da vitória da revolução, em Natal. Estavam atolados nos atos preparatórios. Porém, Natal definiu e a revolução ganhou as ruas. A derrota seguinte, consequência de vários fatores, da preparação insuficiente, inclusive, porém, daria munição à tese sinistra da infiltração policial. Tese que atribuía ação de espiões internacionais infiltrados no movimento revolucionário. A polícia teria precipitado o levante em Natal, para fracionar e depois esmagar, facilmente, a revolução. Essa versão foi concebida, primeiramente, nos porões da Polícia política de Getúlio, assessorada pela Gestapo. Logo ganharia adeptos, a adesão de historiadores e memorialistas, do lado da própria revolução, em erro crasso.

Obviamente, não se nega os males dessa praga nefasta, da provocação de policiais infiltrados, nos partidos e movimentos revolucionários. Porém, a ação desses agentes duplos, dos espiões, precisa ser colocada no seu devido lugar na história. Delações e espionagens estão presentes, em todos os movimentos revolucionários, porém, atribuir a ditas ações da canalha espião insucesso da revolução significa superdimensionamento do papel na história da luta de classes. É uma perspectiva incompatível com a teoria da revolução desenvolvida pelo marxismo dialético e histórico de Marx, Engels e Lenine. Não é o espião que define a história, é a luta de classes, o espião é produto desta luta, ele não cria nem tampouco tem o condão de a definir. Isso equivale a dizer que o rabo balança o cachorro.

Luís Carlos Prestes acreditava em condições amadurecidas da revolução, a revolução social no Brasil como favas contadas:


Organizai o vosso ódio contra os dominadores transformando-o na força irresistível e invencível da Revolução brasileira! Vós que nada tendes a perder, e a riqueza imensa de todo Brasil a ganhar! Arrancai o Brasil da guerra do imperialismo e dos seus lacaios! Todos à luta pela libertação nacional do Brasil! Abaixo o fascismo! Abaixo o governo odioso de Vargas! Por um governo Popular Nacional revolucionário. Todo o poder à Aliança Nacional Libertadora!24.


Para uns, o momento era de lubrificar as baionetas para fazer a revolução. Para outros, melhor cantar a marcha de Lamartine Babo, de sucesso no carnaval de 35, bastante tocada, nas rádios:


A vitória há de ser tua, tua, tua,

Moreninha prosa!

Lá no céu a própria Lua, Lua, Lua

Não é mais formosa

Rainha da cabeça aos pés

Morena eu te dou grau dez!

 

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