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Insurreição Comunista de 1935

ÀS ARMAS, CAMARADAS!
A Insurreição Comunista e o Governo Popular de 1935 em Natal
Natanael Sarmento


Prólogo

O baú da Insurreição Comunista de 1935 já foi revirado por historiadores, memorialistas, ensaístas e romancistas1. Vasculhados livros, processos, inquéritos, denúncias, sentenças, ofícios, jornais, fotografias e reminiscências da revolução. Mas, sendo a história o fato sucedido jamais repetido, e história contada não passa da fotografia, do desenho, ou da caricatura do fato ocorrido, aqui se apresenta um esboço fotográfico com traços caricaturais burlescos, ao gosto da autoria. Desenho para deleite, sem rigor de normas acadêmicas, mas com notas de rodapé, a dizer que o uso do cachimbo entorta a boca .

Os escrivães oficiais, dos cartórios de registros, ordinariamente, formalistas, desprezam ou omitem episódios anedóticos, das anotações averbadas à margem do livro da história. Só anotam a tragédia no teatro da História. Confundem a máscara da tragédia com seriedade, o que nem sempre é. Na nossa companhia mambembe, apresentamos algumas funções cômicas, a dizer que quanto mais séria for a anedota, mais motivos, para risos.

Na tragédia revolucionária de Natal, com mortos e feridos em 1935, abundam episódios pitorescos e cômicos. O panglossiano Chefe da Polícia Dr. João Medeiros Filho, sozinho, dirigir-se ao quartel amotinado, a indagar o que se passava e lá ficar preso até o fim da revolução. A entrada triunfal do Júlio Cesar do Seridó Dinarte Mariz em Natal, sem disparar um traque de massa na Serra do Doutor, passando à História como o grande General da batalha. Representação amadora, porém mais bem-sucedida que a clássica obra de Shakespeare. A falsificação do Chefe de Polícia e do Comandante do Quartel da PM do episódio do débil mental Doidinho, transformado no lendário Soldado Luiz Gonzaga? O defunto que sentou praça na Polícia e se tornou herói e patrono da PM, com direito a Mausoléu? Revolucionários na guerrilha do Vale do Açu, tratados como cangaceiros? Distribuição de dinheiro saqueado do Banco do Brasil? Sacos de dinheiros jogados, nas casas ricas da cidade, para incriminar a burguesia? O Prefeito construtor civil que desmembrou e privatizou metade da Praça Pedro Velho? Dos bilhetes escritos pelo fantasma do Bluche? Para Gabriel Garcia Marquez a fonte do realismo mágico não tinha mistério: o fantástico caminha pelas ruas da América Latina . O surrealismo da Macondo dos Cem Anos de Solidão acaso faz inveja ao de Natal?

Algumas histórias são escritas sob medida, como roupas medidas e cortadas por artífices. Na tesoura dos alfaiates, a história recortada, ampliada aqui, no heroísmo de uns, diminuída acolá, na tesourada das vilezas de outros. Antigas técnicas dos primeiros artesãos, mantidas pela tradição milenar de Heródoto, bastante banalizada na história da revolução de 35 .

Era uma vez... Mas, uma abertura teatral em latim dá maquiagem de erudição... In ilo tempore.

Uma noite de sábado, cujo silêncio foi bruscamente interrompido pelos barulhos dos tiros, do começo da revolução. Tudo começou no Quartel do 21º BC, da Avenida Rio Branco, parte Alta da capital Natal. Praças, cabos e sargentos renderam a Guarda e apossaram o quartel, em nome de Luís Carlos Prestes. E da Aliança Nacional Libertadora.

Os insurretos, sem oposição violenta, prendem a oficialidade presente na ocasião, no cassino dos oficiais, local de lazer e passatempo do quartel. Em seguida, eles foram ao átrio central e conclamaram todos a empunhar armas pela Revolução Nacional Libertadora. Em questão de minutos, a invasão dos civis, estivadores, funcionários, motoristas, poetas, bancários, homens e mulheres, quartel adentro, a receber fardas e armas do exército popular.

Com o 21º BC controlado, os rebelados ocupam os pontos estratégicos da cidade, a Companhia de Luz, Correios, Recebedoria de Rendas, Estação Ferroviária e outros prédios públicos. Na mureta do quartel, o sapateiro Zé Praxedes, fazendo as vezes de arauto da revolução, proclamou a Junta Governativa Popular Revolucionária, diante da carque mobilizada e da plateia desavisada que a tudo assistia, pasmada.

Raphael Fernandes Gurjão, o governador do Rio Grande do Norte, eleito a menos de mês, assistia a tediosa solenidade de formatura do Colégio Marista, no Teatro Carlos Gomes, da Ribeira. O Gurjão e enxame de secretários, auxiliares e autoridades civis, militares e religiosas. Séquito maior que o do Grande Klan da Mongólia e do Rei Artur somados. A programação publicada na imprensa oficial prometia a exibição do melodrama O Triunfo da Cruz. Cada qual carrega com a sua, completa o brejeiro.

Os tiros, nas proximidades da Praça, ecoam no Teatro. Que se passa? Os informantes não demoram a chegar, atabalhoadamente. Trazem más notícias, imprecisas, mas ruins. Estourou rebelião no 21º BC; uma patrulha rebelde desce para cercar o Teatro e prender as autoridades ali presentes. O governador Gurjão a lembrar o D. João VI do cerco napoleônico, juntou panos e acólitos, tratando de dar no pé.

O governador e alguns membros do staff homiziaram-se numa residência particular localizada na Avenida Duque de Caxias, próximo do Teatro Carlos Gomes. Cavilação diplomática transformou a casa do Xavier em consulado do Chile do asilo na primeira noitada da agonia do Governador deposto.

No dia 24, as excelências buscaram abrigo mais seguro, e foram recepcionados pela bandeira consular italiana. Deputados, bispos, secretários, oficiais militares, a corte real escafedida. Vários se asilam nos navios da Marinha mexicana, surtos no porto. Outros, tantos acorrem aos sítios, fazendas e casas de veraneio dos parentes e amigos. A que servem os parentes e os amigos?

O autoproclamado Governo Popular Revolucionário editou mil exemplares do jornal A Liberdade. Gastou tinta e papel, a folha sequer circulou, mal saída das máquinas, a oficina gráfica foi ocupada por tropas da contrarrevolução. O governo nacional e popular tombou do poder com idêntica rapidez como subiu .

No frontispício de A Liberdade a bajulação ao líder da revolução Luís Carlos Prestes e a proclamação da liberdade:


Enfim, pelo esforço invencível dos oprimidos de ontem, pela colaboração decidida e unânime do povo, legitimamente representado por Soldados, Marinheiros, Operários e Camponeses, inaugura-se no Brasil a era da Liberdade, sonhada por tantos mártires, centralizada e corporificada na figura legendária – onipresente e na confiança divinal e pia dos humildes – Luiz Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperança.2


Uma Junta Popular Governativa foi composta com cinco representantes das forças revolucionárias, PCB e ANL: Lauro Lago, João Galvão e José Macedo, funcionários; o sargento Quintino; o sapateiro José Praxedes, sapateiro que não deu bolas à censura de Apeles e foi além das sandálias, ungido a Ministro Comissário do Abastecimento.3

A maioria da população de Natal, trinta e dois mil habitantes aproximados, não coloca lenços vermelhos, tampouco defende os casacas do governo deposto, que os miúdos não haviam de entrar em briga de cachorros grandes, aduz o brejeiro.

Durante o tríduo subversivo, a cidade enfrentou problemas com a interrupção do transporte dos bondes, decretados gratuitos, pela Junta Governativa Popular, e com o desabastecimento, a falta de gêneros alimentícios, além do mau funcionamento do comércio. Nessa turbulência, também se registraram atos de expropriações de gêneros, veículos e dinheiro, pelos revolucionários, roubos e saques, praticados pelos pescadores de águas turvas, bandidos e aproveitadores. Saques, assaltos, em casas comerciais e residenciais, arrombamentos de agências do Banco do Brasil da capital e do interior, mesas de renda, incêndio do 1º Cartório Civil de Notas, na Cidade Alta.

O quartel da Polícia Militar, não aderiu à rebelião e resistiu, enquanto pôde. Recebeu a embaixada comunista com sonora chuva de balas. Os rebeldes contavam com as células na Polícia Militar. Mas as células não funcionaram e diversos comprometidos estavam fora do quartel, que sábado não era dia de se fazer revolução.

A unidade da PM sustentou dezessete horas de cerco. Somente no dia seguinte, sem munição, deu-se a rendição. O sítio da PM potiguar foi um feito memorável. Mas os escribas da corte exageram nas tintas. O cerco recebeu mais loas e versos que a guerra de Troia.4

O governo popular revolucionário , sem o apoio social necessário, sem o devido preparado ao ofício administrativo, parecia leitão de chiqueiro, pois quanto mais fuçava a lama, mais a lama fedia. Decreta a gratuidade do transporte dos bondes, sem o controle de uma companhia de bondes; baixa o preço do pão, sem um saco de trigo e sem padaria; solta os presos e prende fiscais de feiras, prefeitos, edis , a dizer ladrão que rouba ladrão, tem cem anos de perdão. Distribuiu dinheiro saqueado do Banco do Brasil, limpou as mesas das recebedorias. De todas as atrapalhadas, escapam as três colunas despachadas ao interior com escopo de expandir e fortalecer a revolução pelo Estado.

Contudo, as forças políticas chamadas pelos rebeldes da reação contrarrevolucionária, mobilizam-se, no Sertão do Seridó. E se articulam com o governador da Paraíba. Tropas da Polícia Militar paraibana, sertanejas e do exército deslocadas de Pernambuco juntas, ocupam e retomam a Capital Natal. Sem encontrar resistência alguma, dos rebeldes. Trupe de muito barulho, e na hora h de nada, a Junta Popular Revolucionária, arribou, sem resistir, não quis se entregar, é verdade, tampouco tentou resistir.

Assim, na manhã do 27, da chama revolucionária, apagada, restavam as cinzas. Nas primeiras horas da tarde, o Dr. Rafael Fernandes Gurjão retomava o posto perdido, respaldo pelas tropas militares, federais e estadual paraibana. Ocupam e guardam, provisoriamente, os pontos estratégicos de Natal, para garantia da ordem pública, como tudo que se faz e desfaz.

Seguiu-se a abertura da temporada de caça às bruxas, das invasões de casas e prisões ilegais, das delações e interrogatórios, dos tratos e maus -tratos. Ao cabo da revolução, o saldo negativo das cinco mortes, das dezenas feridos, dos prejuízos bancários, comerciais e também os morais.

Na cantilena “lembrai-vos de 35” açoda-se o anticomunismo elevando-se ao paroxismo os crimes dos Agentes de Moscou. A propaganda afinada no diapasão fascista dos governos federal, estadual e paroquial. Nos pretexto aos ataques à democracia , às sucessivas violações das liberdades políticas, à precária democracia do país. Na esteira preparatória do golpe getulista, o caviloso preparava o Estado Novo, advindo em 1937. Também décadas depois, com o golpe militar, de 1964, o espectro comunismo serviu às manipulações propagandísticas de viés nazifascista. Da doutrina de Goebbels adaptadas às condições do Brasil, pelos pupilos Filinto Müller, Ustra, Fleury et caterva.5

Sob o impacto das denúncias, dos crimes do stalinismo, mudanças e cisões entre comunistas brasileiros. A maioria partidária ajusta a questão da democracia que passa à centralidade da luta, ao teor da Declaração de Março de 1958, como objetivo estratégico dos comunistas do PCB. Agildo Barata rompe primeiro, depois João Amazonas, Pedro Pomar, Arruda Câmara e outro fundam ou refundam o PCdoB, no ano de 1962.6

 

 

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