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Insurreição Comunista de 1935
em Natal e Rio Grande do Norte

Velhos Militantes

 

Velhos Militantes
Depoimentos

Depoimento de João Lopes, o Santa
Ângela de Castro Gomes (coordenadora), Dora Rocha Flaksman, Eduardo Stotz
Jorge Zahar Editor

 

 

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Disciplina e idéias próprias

- Chegando ao Rio, o senhor voltou a trabalhar?

- Voltei. Só podia trabalhar quem tivesse carteira, e então arranjei uma carteira como eletricista. Não quis tirar como metalúrgico, porque eu era escrachado, muito procurado. Aí fui para o Sindicato dos Eletricistas.

- Havia algum tipo de luta nessa época dentro dos sindicatos contra a orientação do Ministério do Trabalho?

- Tinha, nas assembléias. Se combatia cara a cara: "Quero dizer que você é um pelego, é isso, aquilo." Era assim.

- Havia muitos pelegos nessa época?

- Ah, minha filha, tinha muitos. Todos os que desejavam ganhar melhor, ficar na boa vida, passavam para pelego.

- Como é que o senhor define um pelego?

- Pelego é o camarada que está servindo, mas no interesse próprio. Ele vai lá para o sindicato e arranja um bom emprego para servir à orientação do Ministério do Trabalho. Era isso que nós combatíamos.

- As leis trabalhistas eram cumpridas nessa época?

- Muito se vendia, mas não se cumpria. Botavam no papel muito bonito, mas não cumpriam não. Muito trabalhador, com medo dizia que as leis estavam sendo cumpridas, mas era só chegar no meio dos operários para ver que não.

- Durante o Estado Novo era comum se organizar grandes manifestações, para as quais os trabalhadores eram convocados. O senhor se lembra disso?

- Lembro. Era obrigado a ir. Uma vez me mandaram ir na inauguração do prédio do Ministério do Trabalho. Cheguei lá, me botaram a bandeira do Sindicato dos Eletricistas na mão. Quando o Getúlio saltou do carro, aquele Gregório me deu um coice que, se pega, eu caio com bandeira e tudo lá daquela escada.33

- O senhor ouviu Getúlio falar nessa inauguração?

- Ouvi. Ele era bom orador, bom orador. E no começo tinha boas intenções. Entrou com um espírito de democracia, mas depois se bandalhou com os integralistase os fascistas, e foi uma desgraça. Começou vacilando, até que foi obrigado a ser um carrasco para nós. Foi quem mais deportou, no governo dele mataram muita gente.

- O que as autoridades diziam aos trabalhadores em seus discursos nessas ocasiões festivas?

- Que iam dar mundos e fundos a nós. Que íamos ter casa grátis, isso e aquilo.

- E o pessoal acreditava?

- Acreditava. Tudo era analfabeto, vinha da roça. O Brasil em si é analfabeto. Eu também sou, mas acontece que eu já vim danado com o negócio da questão racial, que o francês me ensinou. Já vim brabo. já vim doido.

- Em 1939 começou na Europa a Segunda Guerra Mundial. Como é que o senhor e os seus companheiros receberam a notícia?

- Quando a guerra começou, eu já estava em Fernando de Noronha. Quando Hitler invadiu a União Soviética, eu estava lá.34

- Portanto o senhor foi preso novamente. Como foi isso?

- Foi o seguinte: arranjei trabalho como eletricista numa firma que foi construir o Quartel-General.35 Um dia, foi lá um detetive dizendo que estava procurando um eletricista que tinha feito mal a uma moça. O capitão lá falou: "Não, temos aqui um eletricista que é um senhor, muito decente."

Mandou me chamar, e o polícia disse: "Ele volta já, vamos levá-Ia só para um esclarecimento." Do lado dele estava o encarregado da obra, e vi logo que ele é que tinha me denunciado. Fui para a Polícia Central, e lá estava tão cheio que não tinha mais lugar. Prenderam uma fábrica inteira que ficava ali perto da Zona. Até um sujeito que era um getulista danado, vivia dizendo: "Porque o dr. Getúlio Vargas..." Bastava o sujeito ter uma briga pessoal, o outro dizia logo que ele era comunista e mandava prender. Foi aí que me mandaram para Fernando de Noronha. Foram uns duzentos e tantos presos, integralistas e comunistas.

- E como foi sua chegada a Fernando de Noronha?

- A minha chegada lá foi triste, que eu já fui bombardeado, doente. Mas mesmo assim me juntei com O pessoal para organizar. Toda vez que a gente chegava num lugar assim, fazia um coletivo. Tudo o que você tinha, dinheiro, cigarro, entregava ao co-letivo e era de todo mundo.

- O que vocês faziam em Fernando de Noronha?

- Nós lá plantávamos muita verdura, tinha um grupo que cuidava da criação de galinha. Quem era intelectual tinha quatro horas para estudar: ou política, ou francês, ou exercício militar. Tinha um camarada lá que veio da Argentina, o Ghioldi,36 um camarada sábio, capaz mesmo. A gente fazia umas reuniões para falar da política nacional e internacional, e ele fazia a explanação, dizia o que era e o que não era.

- Como eram as relações entre os comunistas e os integralistas?

- Fizemos a união de todos. Jogávamos futebol juntos, fizemos um teatro. O Agildo Barata escreveu duas peças e foi muito aplaudido por todos. Mas um dia estávamos escutando o rádio, e deu a notícia: "Agora mesmo a Alemanha invadiu a União Soviética." Os integralistas começaram a fazer uma festa, porque os fascistas iam vencer, e aí foi bofetada para todo lado, uma briga danada. Aí separamos.

- Qual era a proporção de integralistas e de comunistas?

- No começo éramos minoria, tinha muito mais integralistas, Agora, como o Getúlio dava mais proteção a eles, de vez em quando um navio passava e levava um grupo embora.

- E os comunistas continuavam presos.

- Continuavam. Depois chegou lá um delegado, a pedido do médico, o dr. Pistola, porque tinha gente doente e a responsabilidade era grande se o pessoal morresse. Eu, por exemplo, tinha sangue na urina, estava atacado do rim. O Hilcar Leite tinha problema do coração. Esse delegado fez uma inspeção, e a gente acabou sendo mandado embora para ser tratado. Mas ainda ficaram muitos presos.

- Ainda em Fernando de Noronha, discutia-se o que deveria acontecer no Brasil depois da guerra?

- Já se começava a discutir. Como é que íamos fazer o governo do povo para o povo. Alguns já diziam que a gente tinha que mudar de tática, que era preciso apoiar o Getúlio. O Agildo Barata era o cabeça do negócio. Aí houve uma discórdia muito grande. Eu, por exemplo, era contra o Agildo.

- Já aqui no Rio, o senhor foi contra o movimento queremista?37

- Fiquei ciente do movimento e fui contra. Quando me perguntavam, eu dizia: "Sou contra porque esse homem me jogou em Fernando de Noronha, e fiquei lá padecendo."

- Em 1945 começaram a se organizar partidos políticos e foram lançados candidatos à presidência da República o brigadeiro Eduardo Gomes e o general Dutra. O senhor teve simpatia por algum dos dois?

- Fui contra os dois. Votei no Fiúza. Nem no Dutra, nem no Brigadeiro.

- E, em 1950, em quem o senhor votou?

- Votei no Getúlio. Recebi orientação dos camaradas para apoiar Getúlio e votei nele.

- Era a disciplina do Partido.

- É. Nunca fui getulista, sabe? Não gostava dele. Fui preso, espancado, O diabo a quatro; como é que eu podia gostar desse homem? Obedeci a uma disciplina, mas sempre fui contra ele.

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Notas

33 - A inauguração do prédio do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio ocorreu em 10 de novembro de 1938, marcando o primeiro aniversário do Estado Novo. Gregório Fortunato era um conhecido e temido guarda-costas de Getúlio Vargas.

34 - Vale observar que o depoente situa o início da Segunda Guerra Mundial quando da invasão da União Soviética pelo exército alemão em 1941. Nessa ocasião, ele de fato estava preso na Ilha de Fernando de Noronha.

35 - O Quartel-General mencionado é o edifício do Ministério da Guerra, na Avenida Presidente. Vargas, que foi construído nesse período.

36 - Rodolfo Ghioldi era jornalista, dirigente do Partido Comunista argentino, membro do Komintern e, nesta qualidade, secretário do Birô Latino-Americano da III Internacional. Viera para o Brasil, juntamente com outros: estrangeiros, para planejar a insurreição comunista. Preso, juntamente com sua mulher, foi considerado um excelente organizador de cursos na cadeia.

37 - Movimento queremista foi como ficou conhecida a campanha da "Constituinte com Getúlio" ou "Queremos Getúlio", que se desenvolveu no Brasil entre julho de 1945 até a queda do Estado Novo, em outubro seguinte.

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