Insurreição
Comunista de 1935
em
Natal e Rio Grande do Norte
A
Revolta Comunista de 1935 em Natal
Relatos
de Insurreição que gerou o primeiro
soviete nas Américas
Luiz Gonzaga Cortez
Nosso
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de Produção
08. Em 35, os coronéis fugiram da luta
Em
depoimento inédito nos anais da historiografia
do Rio Grande do Norte, o ex-prefeito de Santana
do Seridó, Seráfico Batista, conta
os lances dramáticos do tiroteio na ‘Serra
do Doutor” (Campo Redondo-RN), a “Batalha
de Itararé” cabocla, ocorrida no
final da tarde do dia 25 de novembro de 1935,
entre sertanejos aliciados pelos integralistas
e chefes políticos, de um lado, e os revolucionários
aliancistas, comunistas e militares, de outro.
Na luta da “Serra do Doutor”, morreram
três soldados do Exército, enquanto
mais de 100 insurretos, que procediam de Natal
, fugiram em caminhões e a pé. Alguns
deles foram presos depois; outros, trancafiados
na delegacia de Polícia de Currais Novos,
cujo delegado mandou matá-los numas grotas
das cercanias da cidade ( localidade Serra da
Dorna).
“Na hora do pega-pra-capá muita gente
corria com medo. Os fazendeiros e os chefes políticos
faziam os preparativos, mas na hora do fogo, todos
eles tinha viajado pra longe. Isso aconteceu nos
tiroteios ocorridos em Panelas (hoje Bom Jesus)
e na Serra do Doutor, perto de Campo Redondo.
Por exemplo; em Panelas, o contigente de homens
que saiu de Parelhas para dar combate aos revoltosos
que saíram de Natal, foi comandado pelo
“coronel” Florêncio Luciano,
2º Tenente Pedro Siciliano Lustoza, da Polícia
Militar, comerciante Kalil Habib, Sérgio
Ricarte, Raimundo Luz, médico Graciliano
Lordão e por mim.
A cidade de Panelas foi cercada por tropas do
Exército. Ai o fogo foi tão grande
que fomos obrigados a recuar às carreiras,
sendo que muitos dos nossos abandonaram as armas,
veículos e equipamentos por lá”.
A declaração é do ex-prefeito
de Santana do Seridó, Seráfico Batista,
74 anos, motorista aposentado, residente à
rua Caetanópolis, 4806, Conjunto Pirangi,
Natal, testemunha dos dois importantes episódios
da insurreição liderada pelos membros
do Comitê Regional do Partido Comunista
do Brasil-PCB, agremiação mais ativa
da Aliança Nacional Libertadora que combatia
o fascimo e Getúlio Vargas.
“CORRI DE QUATRO PÉS”
Em
1935, Seráfico Batista tinha 24 anos, era
motorista e dono de um caminhão, além
de fazer parte do tiro de guerra de Parelhas,
cidade seridoense próxima à Jardim
do Seridó, terra do ‘Coronel”
João Medeiros. “Naquele tempo, o
tiro de guerra de Parelhas tinha 70 homens, que
foram alistados para a resistência contra
os comunistas, comandado pelo sargento José
Nunes, da Polícia Estadual. Esse povo todo
foi para Panelas, onde tivemos que recuar e voltar
para Currais Novos. O Sr. Miguel dos Santos deu
a idéia de voltarmos para a serra, onde
botamos cercas de pedras, com 2 metros de largura,
enquanto o tenente Pedro Siciliano mandou que
fizéssemos as trincheiras para proteger-nos
durante o tiroteio. Por isso, passamos a segunda-feira
carregando pedras e cavando as trincheiras. Mataram
um boi e descarregaram 30 cargas de rapadura,
que vieram em lombos de jumentos. Essa comida
seria consumida no jantar, do qual iriam participar
o doutor Lordão e Florêncio Luciano,
que passaram o dia num barracão que existia
na Serra do Doutor. Muitas latas d’água
foram transportadas para o pessoal, mas nada deu
certo porque, às 17h30, foram buscar o
jantar e chegou a notícia de que os rebeldes
estavam se aproximando. Nessa hora, os chefes
do contingente disseram que nós devíamos
permanecer ali, esperando “a tropa federal
que vai chegar da Paraíba”. “Esperem
por eles e não atirem”, disseram.
Mas, às 18h30, apareceram uns 10 caminhões
e automóveis cheios de soldados com lenços
vermelhos no pescoço. Explodiram a cerca
de pedras. Os comunistas tiraram uma metralhadora
pesada de um caminhão e começaram
a atirar. Era bala pra danado, e teve gente que
não conseguiu disparar um tiro, porque
não tinha condições de botar
a cabeça para fora do buraco (trincheira).
O tiroteio terminou às 07h30 da noite.
Ai o medo tomou conta de nós e resolvemos
correr, pois eles estavam atirando contra nós,
a uns 30 metros de distância. Além
disso, os comunistas estavam em baixo, e nós
em cima. Somente o sargento José Nunes
atirava e gritava muito. Eu quase ficava soterrado
com areia que caiu em cima de mim. A areia era
jogada pelas balas dos comunistas que batiam no
chão, em cima das trincheiras, e o poeirão
cobria no mundo. Eu fiz carreira quando o tiroteio
serenou. Entrei no meio do mato e andei um quilômetro
de quatro pés. Antes de fugir, eu disse
para os companheiros: “Pode aparecer comunistas
em banda de lata, mas eu não vou mais lutar”.
Eu pensava que aquela expedição
para a Serra do Doutor seria um passeio, uma brincadeira.
Além disso, todo mundo tinha medo de comunista.
Quando notei que estava sendo enganado, pois os
fazendeiros ricos não tiveram coragem de
ir aos locais dos tiroteios, a solução
foi fugir para os cafundós. Corri da Serra
do Doutor até Currais Novos, onde vi muita
gente jogar as armas no chão dos hotéis,
das casas e correr mundo afora”, conta Seráfico
Batista.
POUCAS MORTES
Ele
revelou que 150 ou 200 homens participaram do
tiroteio na Serra do Doutor, onde os revoltosos
foram impedidos de prosseguir a suposta viagem
de fuga. Seráfico informou que morreram
3 soldados do Exército, do 21º Batalhão
de Caçadores de Natal, local em que explodiu
a insurreição militar de novembro
de 35.
Três veículos foram destruídos
na explosão da cerca de pedras, cujos explosivos
foram colocados pelos integralistas de Carnaúba
dos Dantas. Ele recorda que um dos caminhões
pertencia à firma natalense “Severino
Alves Bila”.
“Depois do tiroteio, os comunas deram ré
nos seus carros e caminhões e tomaram destino
ignorado, segundo eu soube no dia seguinte ao
tiroteio na Serra do Doutor. Acho que foi na terça
ou quarta-feira, que muita gente saiu de Currais
Novos, inclusive eu, para ver os escombros na
Serra. Nesse retorno ao local da “batalha”,
muita gente começou a contar histórias
fantasiosas, que tinha sido o valente e coisas
e tal. Na minha opinião, fomos derrotados
na Serra do Doutor porque os soldados eram pessoas
treinadas no Exército, enquanto nós
não tínhamos conhecimento de tática
de guerra. O Pedro Siciliano, que era delegado
de Parelhas, não era homem treinado para
a guerra, mas para ser policial", acrescenta
Seráfico Batista, prefeito de Santana do
Seridó de 1964 a 1968.
Seráfico
confirma que o então industrial e fazendeiro
de Caicó, Dinarte de Medeiros Mariz, foi
uma das pessoas que aliciaram os sertanejos para
a luta na Serra do Doutor e Panelas, além
de Kalil Habib (sírio), Florêncio
Luciano, Graciliano Lordão, padre Walfredo
Gurgel e outros proprietários rurais do
Seridó, já falecidos.
As forças aliciadas pelos fazendeiros e
políticos seridoenses viajaram para Natal
depois do dia 28 de novembro de 35, entrando na
capital potiguar sem encontrar nenhuma resistência.
Seráfico Batista não se lembra dos
nomes dos integralistas que participaram das refregas,
em virtude de Parelhas não ter núcleo
de seguidores de Plínio Salgado. Parelhas
era feudo de Florêncio Luciano e os coronéis
conservadores não admitiam camisas verde
nos seus pastos.
“Quando fugíamos de Panelas para
Currais Novos, paramos em Santa Cruz, que estava
cheia de homens com camisas verdes. Comunicamos
que tínhamos fugido de Panelas por causa
da resistência dos comunistas. Então,
meu filho, foi gente pra danado correndo no meio
do mundo. As mulheres, com criança nos
braços, corriam pra cima dos caminhões.
Foi um corre-corre grande”, afirma, sorrindo,
Seráfico Batista.
CARTA
O advogado
e escritor Bianor Medeiros, que está acompanhando
a série de reportagens sobre o movimento
comunista no RN, enviou carta sobre trecho de
matéria publicada na edição
de 09.06.85, deste jornal. Eis a carta na íntegra:
Natal(RN),
14 de Junho de 1985.
Caro Luiz Gonzaga Cortez.
Tendo lido com a atenção devida,
suas reportagens sobre o Movimento Integralista
Brasileiro, nos idos de 1935.
No último Poti de 09/06 você diz:
“ Mas a primeira pessoa, nos cinquenta anos
que falou a verdade sobre o episódio de
novembro de 1935, na Serra do Doutor, foi Dona
Otávia Bezerra Dantas, natural de Acari,
integralista que em entrevista publicada em O
Poti de 26.08.84, disse que o padre Walfredo Gurgel
estava em Santa Luzia/PB e o fazendeiro e “coronel”
Dinarte de Medeiros Mariz, tinha viajado para
Campina Grande em busca de armas e munições.
Conforme declarações de Seráfico
Batista e Otávia Bezerra Dantas, dentre
inúmeras pessoas que estavam em local da
refrega, não houve nenhum general da Serra
do Doutor.
Mantenho o que disse no meu trabalho “ Monsenhor
Walfredo Gurgel um Símbolo”; contesto
as declarações de Dona Otávia
( mando-lhe, até, uma fotografia do seu
casamento celebrado pelo vigário do Acari,
Pe. Walfredo Gurgel) e de Seráfico, parelhense
que também conheço.
Ambos devem ser mais velhos do que eu: justificam-se,
portanto, ditas revelações.
Sei que Walfredo estava na Serra do Doutor e,
até comandou os serviços preparatórios
do contra-ataque.
Sei, também, que o Senador Dinarte Mariz
não estava presente à Serra porque
teve a missão de viajar à Paraíba
para recrutar reforços, o que foi feito,
embora tardiamente em virtude da debelação
do movimento em contra-ataque efetuado por seridoenses
de várias cidades, principalmente Carnaúba
dos Dantas.
Indico-lhe uma pessoa que viajou com o Pe. Walfredo
Gurgel em sua Sedan verde, e nova, comprada quando
chegou a Acari, como vigário, até
a Serra do Doutor e que poderá tudo historiar.
Não é testemunho de “ ouvi
dizer” é testemunha “ de vista”.
Seu nome: JOSÉ PACHECO (Hotel Tirol). Bom
seria que o amigo o ouvisse para que fosse a verdade
colocada em seu devido lugar.
Um abraço.
__________________
BIANOR MEDEIROS
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