Insurreição
Comunista de 1935
em
Natal e Rio Grande do Norte
1935
Setenta anos depois
Isaura Amélia Rosado Maia
e Laélio Ferreira de Melo (Organizadores)
Nosso
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de Produção
O papel da mulher na Insurreição
Comunista
Aloízia Medeiros Freire
Abordarei a importância da mulher nos movimentos
sociais compreendendo o período de 1930-1935.
A partir de uma reflexão tendo como temática
o papel da mulher num contexto da nova história
política.
Assim
como em nível nacional e internacional
os trabalhadores estavam insatisfeitos com á
política implementada pelos governantes,
no Brasil a política imposta por Getúlio
Vargas, populista e conservador que não
rompeu com as antigas relações sociais
e com os velhos métodos e hábitos
da vida política e social brasileira, nem
a extirpação do latifúndio
e do imperialismo. No Rio Grande do Norte não
era diferente, predominava cada vez mais o poder
das oligarquias marcado pela violência e
repressão aos trabalhadores.
A
crise econômica que atinge todo o sistema
capitalista mundial em 1929, decorrente da quebra
da bolsa de valores de Nova York, que afetará
as economias latino-americanas, favoreceu as mudanças
políticas em alguns países como
no Brasil em que as correntes antiliberais se
fortaleceram e passaram a atuar com vistas á
derrocada das instituições vigentes.1
Os
trabalhadores brasileiros diante de tanta opressão
começam a se organizar em sindicatos e
partidos políticos, como forma de se contrapor
ao capitalismo e as grandes desigualdades sociais
existentes. A fundação do Partido
Comunista do Brasil (PCB), em março de
1922, a partir de uma cisão do movimento
anarcosindicalismo, que dirigiu as grandes lutas
do proletária do brasileiro na segunda
década do século 20, como as greves
gerais de 1917 e 1919. Nesse sentido, de acordo
com Vinhas, o partido é herdeiro direto
dessas grandes mobilizações operárias.2
Para
Vinhas, não era a primeira vez que se tentava
organizar um partido operário no Brasil,
nem mesmo Comunista. De 1918 a 1921 são
várias as tentativas, com maior ou menor
grau de confusão ideológica. As
greves generalizadas e os movimentos de massas
de 1917 a 1920 haviam revelado toda a debilidade
orgânica e política do anarquismo,
sua incapacidade de resolver os problemas de direção
colocados por um movimento revolucionário
de envergadura histórica.3 Assim como a
criação da Aliança Nacional
Libertadora (ANL), primeiro movimento de massa
no país onde o Partido Comunista terá
uma influência decisiva; além da
União Feminina do Brasil (UFB). Percebe-se
um fortalecimento dos movimentos sociais e surgimentos
de entidades sindicais fortalecendo as greves
como meio de luta do operariado.
No
Rio Grande do Norte temos um movimento em Natal
e Mossoró, o movimento grevista dos ferroviários
da Great Western, dos taxistas, e em Mossoró
a greve dos salineiros. As reivindicações
tinham com bandeira de luta a redução
da jornada de trabalho e aumento salarial.4 Portanto
foi de suma importância para o processo
histórico do país e determinante
para a luta do proletariado a fundação
de um partido de esquerda com o PCB.
Para
alguns historiadores as bases da Insurreição
Comunista, em 1935, começaram a ser sedimentas
a partir desses movimentos grevistas. Já
que o Partido Comunista havia se fortalecido bastante
em Natal, com células formadas em diversas
empresas. A linha política do governo era
atacar Getúlio Vargas e denunciar publicamente
as massas que nada havia sido feito para melhorar
as condições de vida da classe trabalhadora.
Vale ressaltar também que o PCB surge em
Mossoró quando ainda não havia qualquer
sindicato organizado.
Diante
dessa conjuntura, as mulheres não estavam
fora do contexto. Por muitos anos as mulheres
estiveram ausentes da historiografia brasileira,
como em qualquer outra parte do mundo, não
se fez justiça ao papel que elas desempenharam
no desenvolvimento do país e no próprio
processo de democratização política
de mentalidades. Pouco se sabe da trajetória
política das mulheres no movimento pelos
direitos da mulher no Brasil e no mundo no século
19. Afinal, de acordo com a visão tradicional
burguesa, as mulheres no Brasil ainda sofriam
séculos de opressão e obscuridade.5
No
Brasil do início do século 20, como
nos Estados Unidos, o movimento pelos direitos
da mulher coincidiu em parte com o movimento sufragista,
um aspecto específico do que deveria ser
visto como uma luta mais ampla. Porém,
o direito do voto extensivo à mulher só
foi conquistado com a constituição
de 1934 (art. 109), durante o Governo de Vargas.6
Dá-se
início a mudanças nas leis, que
em parte era um avanço para a sociedade
como um todo, principalmente para as mulheres.
Desde os anos 1920, as mulheres estavam mobilizadas
pelo direito de voto, mas que ampliasse todos
os direitos legais das mulheres e por igualdade,
ou seja, equidade de gênero. Por sua vez,
a burguesia, que vinha ascendendo socialmente,
tinha todo interesse na luta pelo sufrágio
feminino, seus interesses perpassam pelo econômico,
político e social, além de se perceber
que o número de mulheres aptas a votar
era equivalente ao número de homens.
Somente
com a Constituição de 1934 (art.
109) “O alistamento e voto são obrigatório
para homens e mulheres, quando estas exerçam
funções públicas e remuneradas,
sob as sanções e salvas as exceções
para a lei determinar”.7 Mesmo com essa
conquista, as mulheres permaneceram ainda à
margem da sociedade, com os seus direitos sendo
esquecidos. O Rio Grande do Norte foi pioneiro
nessa questão quando Alzira Soriano de
Souza foi eleita prefeita em 1928, no município
de Lages, sendo assim a primeira mulher a ocupar
um cargo público. A partir daí,
outras mulheres também se destacaram, entre
elas: Celina Guimarães, considerada primeira
eleitora e Maria do Céu Fernandes, como
uma das primeiras deputadas. Percebe-se, então,
que a mulher entra na vida pública e começa
a sair do anonimato.
A
mulher no movimento insurrecional de 1935, no
Rio Grande do Norte, e a participação
na União Feminina do Brasil (UFB)
A partir da pesquisa no Arquivo Público
do Estado, da coleta das fichas documentais e
dos processos criminais do Departamento de Ordem
Política e Sociais (DOPS) obtivemos dados
a respeito da participação das mulheres
na Insurreição Comunista de 1935,
e da militância das mesmas na União
Feminina do Brasil, órgão ligado
ao Partido Comunista do Brasil e beneficiado pelo
Socorro Vermelho Internacional Comunista e pela
Aliança Nacional Libertadora (ANL), ambos
considerados movimentos de massa que defendiam,
através do Partido Comunista do Brasil,
a derrubada do governo e a instalação
de um governo democrático e popular.8
A
União Feminina do Brasil (movimento auxiliar
feminino que endossava o programa da ANL e o Socorro
Vermelho Internacional, ligado a Internacional
Comunista), se organizou em Natal de forma clandestina
e passou a receber recursos financeiros do Comitê
Central. Na verdade, os dados sobre aquela organização
são bastante escassos, sendo citada nos
jornais A República e A Ordem, ambos anticomunista
e de visão conservadora, além do
Tribunal de Segurança Nacional. Observamos
que essas mulheres lutavam pela emancipação
política e social buscando a eqüidade
de gênero, ou seja, homens e mulheres com
direitos iguais perante a lei. O objetivo dessas
mulheres era tornar visível a luta que
elas empreendiam, sair da esfera privada e entrar
na esfera pública. No entanto, os jornais
de Natal, de visão conservadora e anticomunista,
declaravam que a União Feminina do Brasil
ocupava-se de assuntos de interesses direto das
filiadas e termos gerais relativos a emancipação
da mulher, e criticava o papel secundário
da mulher na sociedade brasileira, por isso era
combatida violentamente pelos políticos
conservadores, que atacavam as mulheres e as agrediam,
criticando-as como pessoas de comportamento imoral
e espalhafatoso.9
Em
julho de 1935, a ANL e a UFB são postas
na ilegalidade, com base na Lei de Segurança
Nacional, criada em março daquele ano.
Decretada na ilegalidade, há uma saída,
que é desencadear dentro dos quartéis
a Insurreição, ocorrendo no 21BC,
hoje antiga casa do estudante. O movimento é
precipitado em Natal, inicia-se no dia 23 de novembro
de 1935 e no dia 27 de novembro do mesmo ano é
sufocado. Portanto esse é um dos aspectos
importante para compreender a insurreição
em Natal.
Em
linhas gerais, as mulheres desempenharam papel
fundamental no movimento, e de acordo com a pesquisa
realizada, 33 mulheres foram indiciadas pelo DOPS;
dessas, três faziam parte do movimento em
nível nacional. Maria Prestes (Olga Benário
Prestes) ou Maria Bergner Villar, Elvira Fuentes
e Katarina Shissler, todas expulsas do território
nacional. Vale salientar que dessas mulheres a
que mais se destacou no movimento foi a figura
de Olga Benário, uma judia comunista, revolucionária
profissional a serviço do Comintern uma
organização profissional de caráter
internacional, que veio ao Brasil com a missão
de fazer a segurança de Luís Carlos
Prestes, considerado presidente de honra da ANL.
Olga Benário é uma comunista a quem
a historiografia oficial do movimento operário
brasileiro, produzida por partidos ou pesquisadores
marxistas, relegara o papel subalterno de “mulher
de Prestes” – e nada mais do que isto.10
Observamos esse descaso também com as mulheres
do movimento de 1935 em Natal.
A
análise feita nos processos criminais mostra
que a maioria das que participou da Insurreição
Comunista, em 1935, eram mulheres de classe média
ou pobre, cores morenas, jovens sem profissão
definida, alfabetizadas, algumas tinham título
eleitoral como Luzia Gomes dos Santos, quase todas
moradoras das Rocas. Naquele bairro, não
foi encontrada nenhuma informação
sobre elas. É pertinente dizer que as fichas
documentais do DOPS denotam o descaso com a verdadeira
identidade das mulheres, uma vez que se encontram
preenchidas de forma incompleta, dificultando
a pesquisa. Face ao exposto, os documentos demonstram
a força das mulheres no movimento e a atuação
delas como defensoras de uma nova sociedade que
atenda as necessidades de mulheres e homens.
De
acordo com os depoimentos analisados nos documentos,
a maioria das mulheres tinha filiação
na UFB, e a grande maioria entrou por iniciativa
de Amélia Gomes Reginaldo e sua mãe
Luzia Gomes dos Santos, quem desempenharam papéis
relevantes. Amélia Reginaldo foi a única
a ser condenada a cinco anos de reclusão
por ter invadido o quartel ao lado de Leonila
Félix, Chica Pinote e Chica da Gaveta.
Amélia Reginaldo também foi responsável
pela única edição de um jornal
revolucionário chamado A Liberdade. Mesmo
tendo Leonila Félix, e todas as outras
acusadas, confirmado a participação
no movimento, elas foram absorvida por deficiência
de acusações nos processos.
Com
base nos depoimentos prestados, é lícito
supor que quase todas as mulheres estavam ligadas
por laços de parentesco aos principais
líderes da Insurreição Comunista.
Portanto, observa-se essa participação
dúbia; de um lado, protagonista da história,
e do outro, coadjuvante de esposa, filha ou amante.
Não
foram encontrados dados pessoais de Amélia
Gomes Reginaldo, pois ela fugiu após o
fim do movimento, todas as informações
foram coletadas através dos depoimentos
de outras implicadas. Presume-se também
que a historiografia também trata do tema
de maneira superficial, sem da ênfase à
importância das mulheres nos movimentos
sociais. Os dados, mesmo incompletos, não
inviabilizaram a pesquisa, pois tive acesso às
cartas que Amélia enviou para a sua mãe
e para o seu tio Lauro Reginaldo.
Finalizando,
concluo que a presença feminina na vida
política, econômica e social da época
desmistifica a visão da mulher enquanto
inferior e submissa. Segundo Louro,11 “essa
segregação social e política
a que as mulheres foram historicamente conduzidas
teve como conseqüência sua ampla invisibilidade
como sujeito”. Assim sendo, essa pesquisa
mostrou fundamentalmente como as mulheres eram
vistas pela sociedade e principalmente nos movimentos
sociais da época. Esperamos, portanto estar
contribuindo no desenvolvimento do papel da mulher
enquanto pessoa ativa observando que esta nunca
se deixou ficar no papel que outros deliberaram.
Aloízia
Medeiros Freire
Licenciada e bacharel em História
pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Notas:
1
CAPELATO, Maria Helena Rolim. Estado Novo: novas
histórias, 1988.
2
VINHAS, Moisés. O Partidão: a luta
por um partido de massas 1922- 1974.
3 Ibid.
4 SOUZA, Francisco. In: FERREIRA, Brasília
Carlos, O sindicato do garrancho.
5
HAHNER, June. A Mulher brasileira: essas lutas
sociais e políticas.
6 PIMENTEL, Sílvia. A Mulher e a constituinte,
1987.
7 Ibid.
p.24
8
ROCHA, Lauro Reginaldo: Bangu: memórias
de um militante. (Org) de: FERREIRA, Brasília
Carlos.
9 LEVINE, Robert. O Regime de Vargas: anos críticos
1934-1938.
10
MORAIS, Fernando. Olga. São Paulo: Ed.Alfa
Omega, 1986.
11
LOURO, Guacira Lopes. Gênero, sexualidade
e educação: uma perspectiva pósestruturalista.
Petrópolis: Vozes, 1997.
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