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REDE
BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS |
EDUCANDO
PARA UMA SOCIEDADE CIVIL: DEFRONTANDO-SE COM O FIM DA IGUALDADE E DO
EMPREGO
Jon
Van Til
Professor
de Estudos Urbanos, Rutgers University at Camden, EUA
Num simpósio
recente cujo tema era “Repensando o propósito da Educação”, o
professor Stan Karp notou o terrível custo que as iniquidades de
classe e raça exerciam sobre seus alunos. Do mesmo modo, os
economistas Richard J. Murnane e Frank Levy observaram que os
graduados na universidade sustentavam melhor seu papel na economia
que os graduados no colégio nas últimas décadas, e que os
empregadores continuarão sendo seletivos ao contratar para as posições
mais bem pagas nos próximos anos. E, também no mesmo simpósio, o
analista político Jeremy Rifkin constatou que o microchip está
desempregando continuamente pessoas ao redor da terra, criando
possibilidades tanto para o crescimento da miséria como do lazer.
O
que, então, cabe a nós, que acreditamos nos direitos humanos e
educação, fazer? O analista político solicitou que se reconheça
o papel crescente das organizações do terceiro setor no mundo em
que ambos governos e empresas estão diminuindo empregos a ponto de
atividades comunitárias voluntárias tornarem-se um meio de
sobrevivência ao invés de um passatempo chique. Os economistas
constataram que as habilidades básicas inculcadas em qualquer
colegial, torna complexo o papel do empregador já que um grande número
de candidatos se apresenta para qualquer posição disponível. E o
professor asseverou que as escolas serão incapazes de lidar com a
carga de revoluções na política, economia, cultura e nação que
ele vislumbra como única resposta a nossos males correntes.
Serão
estas escolhas mutuamente exclusivas? Gostaria de asseverar, não
necessariamente, mas o ponto requer o reconhecimento de que as
coisas são realmente um bocado piores que os meus colegas querem
admitir. Em primeiro lugar, a questão da desigualdade
não é somente tão ruim como o professor o constata, mas
ela está piorando continuamente. Sua lista de vítimas pode ser
extendida para incluir não só os pobres, mas também de forma
crescente uma lista isolada de adultos e crianças da classe média,
que estão se defrontando com um futuro de oportunidades e
recompensas menores.
Rifkin
reconhece esta realidade em seu best-seller, O Fim do Emprego, onde
ele prevê um futuro em que apenas um em cada cinco trabalhadores
mantém uma posição adequadamente remunerada, enquanto os outros
80% são vinculados a várias funções de baixa remuneração, os
“Mac-empregos” ou quase permanentemente desempregados.
Com certeza, muitas destas posições vão requerer um perfil
com as habilidades básicas que os economistas descrevem, mas não há
razão em compensá-los adequadamente numa época de computadorização
onipresente. Se apenas metade de nossos graduados na universidade
podem esperar encontrar-se entre o quinto do topo, só ocorrerá um
espaço para o graduado no colegial se um graduado na universidade
é eliminado. A solução dos economistas de educar todos faz
sentido somente se for emparelhada com a proposta de Rifkin de
reduzir a jornada de trabalho. E apenas o tipo de transformação
social que Karp vislumbra, pode redirecionar a crescente divisão
entre os cada vez mais ricos, a estagnação da classe média, e a
pobreza decadente da América contemporânea, e apenas o terceiro
setor tem condições de atingir esta transformação.
O
desaparecimento do Estado do Bem Estar Social, ou como me apraz
definí-lo, o aparecimento do “Estado da Despedida”, significa
mais que o fim do bem-estar como o conhecemos. Ele também significa
o fim da taxação progressiva, da regulamentação dos negócios, e
do governo como um instrumento para a reforma. As políticas são
frequentemente de enriquecimento pessoal, enquanto os negócios são
frequentemente no sentido de privilegiar os salários febrilmente
ampliados dos CEOs enquanto as posições
dos empregados são golpeadas.
Numa
era em que o governo e o mercado falham, o papel do terceiro setor
se estende muito além da oferta de sopa aos sem-teto ou da reza
pela saúde da nação. O terceiro setor é, acima de tudo, o lugar
onde a mudança social emerge, se clarifica, e apresenta suas
demandas por mudanças.
No
fundamento da Igreja Batista de Ebenezer, por exemplo, Martin Luther
King Jr., reuniu o que viria a se tornar o núcleo de um grande
movimento da sociedade civil que se seguiu à prisão de Rosa Parks.
Nos
bastidores do Teatro da Lanterna Mágica de Praga, um ex-condenado
chamado Vaclav Havel introduziu-se na sociedade civil com seus pares
para planejar uma revolução pacífica que conduziu-o alguns meses
depois à presidência da nação. Numa organização da sociedade
civil chamada PEN, os escritores membros protestaram bravamente para
derrubar o veredito de um governador iraniano que pesava sobre
Salman Rushdie.
Tanto
da comunidade como da nação podem emergir vozes profundamente
perturbadas com o fim dos empregos e a desigualdade. Do campo
conservador pode ser ouvido William Bennett clamando por uma renovação
cultural e a restauração da boa sociedade. Do lado liberal vem a
advertência de Rifkin de que necessitamos não só de uma economia
forte e de um governo efetivo mas também de uma vital esfera
associativa. Do centro vem o chamado de Amitai Etzioni pela combinação
de direitos e responsabilidades num novo “comunitarismo”, uma
perspectiva que tem dado forma a muitas declarações presidenciais
nos últimos anos.
Estas declarações requerem que entendamos a forma do
pensamento público americano neste momento, como quatro visões
majoritárias que se esforçam por atenção e controle. Uma maneira
de entender estas diferenças pode ser provida pela coleção de
ensaios colecionados recentemente por Don E. Eberly, um jovem
especialista em política com formação republicana impecável. Está
incluído nesta coleção um ensaio notável de A. Lawrence
Chickering, entitulado “Cidadania: transcendendo esquerda e
direita”.
Chickering
afirma que tanto a esquerda americana (“liberais”) como a
direita (“conservadores”) estão eles próprios divididos em
dois grupos bem distintos, de acordo com sua avaliação de
liberdade ou ordem.
Ele
escreve: “O conservadorismo é portanto dividido em libertários
(conservadores da liberdade) e tradicionalistas (conservadores da
ordem); e o liberalismo inclui os liberais libertários
(anarquistas, a contra cultura, libertários civis) e os liberais da
ordem (socialistas, liberais adeptos do estado do bem-estar). No
terceiro setor com seus muitos milhares de organizações de defesa,
estas diferenças são claramente evidentes.
Os
pensadores contemporâneos providenciam respostas para nossos males
sociais: Família! Igreja! Impostos menores! Participação comunitária!
Direitos e responsabilidades! Fim aos programas falidos do governo
federal! Escolha! Vida! E assim por diante. Mas será que estas
respostas quando comparadas entre si, conduzem a uma solução para
nossos males nacionais? O que não está sendo atingido?
Eu
recomendo uma listagem simples quando os reformadores começam a
listar suas respostas. Chamo-o de “sistema PECTS”. O sistema
PECTS é baseado num sistema em geral incompreensível desenvolvido
pelo sociólogo Talcott Parsons cerca de meio século atrás. Ele
nos sugere que qualquer organização social, seja uma família, ou
uma cidade ou uma nação, deve resolver seus problemas se pretende
prosperar, ou mesmo sobreviver. Estes problemas incluem atingir
objetivos, atrair recursos, compartilhar significados e pregar
junto.
Toda
sociedade tem que resolver estes problemas, também, e é aí que os
PECTS aparecem. Uma sociedade como a nossa desenvolveu um conjunto
de instituições que se preocupam com cada uma destas necessidades,
como segue:
P=Políticos
(ou governo): como tomar decisões a respeito de problemas básicos
com que nos defrontamos em nossa comunidade. Num país como o nosso,
isto é feito através do sistema que denominamos “democracia
constitucional”.
E=
A Economia: como organizamos o trabalho no sentido de realizar nosso
modo de vida, produzir bens e serviços, e criar riquezas. Num país
como o nosso, isto é feito por um sistema que denominamos
“capitalismo misto”.
C=
Cultura: Como damos significado à vida através do idioma,
identidade étnica e religião. Num país como o nosso, isto é
realizado por estruturas que denominamos famílias, escolas, igrejas
e círculos de vizinhança.
TS=O
Terceiro Setor (às vezes denominado setor voluntário ou sem fins
lucrativos): Como nos juntamos a outros para criar associações de
causas comuns. Em nossa sociedade, isto é realizado por mais de 1,2
milhões de organizações com isenção fiscal e muitos outros
clubes, grupos e associações voluntárias.
Nenhum
conjunto de respostas resolve as necessidades da sociedade a menos
que se mostre como cada um dos elementos de nosso PECTS pode
trabalhar em conjunto para assegurar soluções reais.
Por
último, estas soluções chegarão quando for amplamente
reconhecido que ambos, tradição como
mudança são importantes, que tanto a liberdade como a ordem
devem ser assegurados. Isto só vai ocorrer quando as contribuições
de cada um dos setores majoritários da sociedade forem
reconhecidos: quando os valores culturais sustentarem a família, a
religião e a vida comunitária; quando o terceiro setor organizar
ambos, a ação coletiva e o serviço livre e efetivamente; quando
as organizações empresariais descobrirem e servirem a humanidade,
seus empregados bem como seus consumidores; e quando o governo
assegurar um nível de oportunidades e uma probidade de resultados
na política, recompensas econômicas e livre expressão individual.
Uma
sociedade moderna contêm quatro setores, dos quais nenhum pode ser
negligenciado ou funcionar de forma imprópria. As respostas abundam
no mundo moderno, mas somente quando elas estão limitadas numa visão
coerente quadri-setorial que elas se tornam soluções reais para as
nossas necessidades prementes.
As
escolas nos EUA estão incluindo crescentemente lições acerca dos
rumos de uma sociedade civil em seus currículos. Muitas aulas têm-se
enriquecido por métodos de “serviço-estudo”, onde instruções
tradicionais são suplementadas por um envolvimento direto dos
estudantes no trabalho de organizações comunitárias onde eles se
defrontam com as necessidades dos residentes de uma comunidade.
Através deste envolvimento, e a reflexão sobre o seu significado
que segue na sala de aula, os estudantes aprendem a navegar pelas
muitas interações sociais requeridas por um cidadão efetivo,
trabalhador, e pessoa de nosso mundo multifacetado.
Já
que parece que o futuro vai requerer de forma crescente um movimento
potente de cidadania que emerja para defender os direitos de todos
por um emprego produtivo e uma remuneração decente, parece
imperativo que os cidadãos estejam prontos para mobilizar de modo
singular os poderosos recursos do terceiro setor. E desta maneira o
interesse dos professores na igualdade torna-se mais facilmente
atingível, os hábeis estudantes dos economistas conseguem
encontrar com mais probabilidade melhores empregos, e a fé do
analista político no poder do terceiro setor é remida.
UM
EXEMPLO DE TAL VISÃO DE ESCOLA E SOCIEDADE É DADO PELA DECLARAÇÃO
DA SOCIEDADE EDUCACIONAL E CIVIL: CRIANDO UMA TEIA PERFEITA ENTRE
ESCOLA E COMUNIDADE
PREÂMBULO
·
deslocamento da Era Industrial para a Era da Informação está
transformando nossa civilização. Grandes mudanças econômicas,
sociais e políticas ainda estão em andamento. Ao ingressarmos na
Era da Informação, nos defrontamos com muitas mudanças reais para
redirecionar o curso da educação americana de forma que os jovens
estejam preparados para a luta pelas demandas da nova economia
globalizada e das novas realidades frente ao governo. Devemos ter em
mente que o fortalecimento do mercado e a efetividade de nossa forma
de governo democrático sempre dependeram, em última análise, dos
princípios de democracia e comunidade que serviram como pedras
angulares de nossa sociedade civil por mais de 200 anos. A sociedade
civil é a mola propulsora de nosso espírito como povo. Preparar a
próxima geração para um compromisso duradouro com a sociedade
civil é uma das mais importantes mudanças com que se defrontam os
educadores e as comunidades. Nossas escolas e
universidades podem exercer um papel chave no fortalecimemto
dos valores cívicos da América ao ajudar na criação da teia
perfeita entre escolas e comunidades.
CHAMADA
PARA A AÇÃO
Criando
a teia perfeita entre escolas, universidades e comunidades requer-se
grandes esforços para a integração de valores cívicos no
processo educacional. A ênfase deve recair sobre: 1) a expansão de
oportunidades no sentido dos estudantes tornarem-se mais envolvidos
com serviços significativos dos grupos de vizinhança e organizações
comunitárias, fazendo com que a aprendizagem de serviços seja
parte integral da experiência acadêmica; 2) encorajamento aos
estudantes visando explorar as questões gêmeas do desenvolvimento
do caráter e da participação responsável na sociedade civil na
integração de oportunidades da aprendizagem de um serviço, educação
do caráter e educação da cidadania em classe; 3) inserção do
legado histórico e dos valores da sociedade civil nos amplos domínios
curriculares e programas comunitários; 4) extensão dos valores da
democracia e comunidade à sala de aula ao encorajar os estudantes a
participar no planejamento de suas próprias experiências de
estudo; 5) envolvimento mais direto das organizações comunitárias,
associações cívicas e empresas com as escolas e universidades
locais; 6) garantia de uma verdadeira voz à faculdade, aos
estudantes, famílias e comunidades junto ao poder político das
escolas e universidades; e 7) envide de esforços para assegurar a
disponibilidade dos recursos humanos, financeiros e comunitários
necessários para atingir estes objetivos.
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