Ricardo
Balestreri
Solidariedade:
Caminho do Desenvolvimento
"As
comunidades se desenvolveram, em resumo,
devido às redes e associações...
Elas se tornaram ricas porque havia
civismo e não o contrário."
Robert Putnam
Durante
muito tempo a humanidade acreditou que o desenvolvimento dos povos
passava apenas por cálculos e estratégias complicadas de economistas
e decisões políticas de governantes.
Essa
compreensão tecnoburocrática e estatista turvou-nos seriamente a capacidade
de ver caminhos outros, mais consistentes, que são os responsáveis
reais pelos avanços históricos na direção da riqueza e do bem-estar.
Recentemente dois cientistas da Universidade de Harvard, com substanciosas
teses de história e ciências sociais, o Professor Robert Putnam1 e
o Professor David Landes2, fizeram-nos ver ainda mais claramente essa
correlação entre políticas públicas competentes, produtividade, justiça
social e as chamadas "redes de engajamentos cívico".
Nada se produz de significativo, nada se administra com eficácia e
eficiência, nada se distribui, sem permanente criatividade e participação
popular.
Ainda que a democracia não possa e não deva prescindir do voto, hoje
sabemos que construí-la é muito mais do que votar ou até simplesmente
controlar a ação daqueles que nos representam.
Há um
nível inabdicável da sustentação do edifício democrático que é a representação
que o cidadão faz de si mesmo, "arregaçando as mangas",
fazendo sua parte, não esperando pelas famigeradas "elites",
pelos poderosos, pelos que quase nunca chegam.
Aos poucos estamos descobrindo, inclusive, que a melhor forma de pressionar
o Estado a assumir suas responsabilidades é assumirmos as nossas.
Todo Estado, qualquer Estado, teme profundamente diminuir em importância
diante da cidadania organizada e, por isso, quando a cidadania se
organiza, trata de dizer "presente" e não perder tanto tempo.
Não estou aqui defendendo a perspectiva neoliberal do "estado
mínimo", que é uma forma de "sumiço" para dar lugar
ao poder também "gravitacional" do grande capital. Não estou
pregando a anomia, a "maternagem" social por um segmento
alternativo ao Estado. Estou propondo a "cidadania máxima",
as tais redes de responsabilidade direta, de engajamento, de voluntariado,
que constroem a autonomia moral e intelectual dos cidadãos, não mais
como "filhos" impotentes de quem quer que seja, mas como
"pais" de si mesmos e de sua pátria.
Solidariedade é isso. Quando nos mobilizamos por outrem é por nós
mesmos que nos mobilizamos em primeiro lugar. Quando somos solidários,
os primeiros beneficiários somos nós, que assumimos nosso lugar na
história, deixamos de ser as "vítimas", os "chorões",
os queixosos, os desesperançados. Só a solidariedade resgata para
nós a grandeza e a dignidade com que o criador nos fez, plenos de
sentido existencial e imensamente ricos de possibilidades.
Pragmaticamente, em nível amplo, só a solidariedade pode construir
um pais de abastança para todos. A solidariedade é, em si mesma, uma
postura política diante da vida, mas é também uma postura reflexiva,
contemplativa, terapêutica.
Alguém conhece algum outro caminho que tenha dado certo?
1 Putnam, Robert.
Comunidade e Democracia, Fundação Getúlio Vargas Editora, Rio de Janeiro,
1996.
2 Landes, David S. A Riqueza e a Pobreza das Nações, Editora Campus,
1998.