Família
Documento
aprovado pela Comissão Representativa da Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil
Reunião
Extraordinária Brasília, 18-20/3/1975
DOCUMENTOS
DA CNBB -
3
O
presente documento foi elaborado e promulgado pela
Comissão Representativa da CNBB, reunida
extraordinariamente em Brasília, de 18 a 20 de março
de 1975. Possa ele contribuir para orientar e encorajar a
quantos, em nosso País, querem trabalhar pela valorização
e defesa da Família, da sua
santidade e estabilidade.
Guiou
sempre os Bispos em suas considerações a Palavra de Deus.
Na sua luz deve ser lida e meditada a
argumentação.
O
bem-estar da Sociedade está intimamente
ligado ao bem-estar da Família.
t Aloísio Lorscheider
Presidente da CNBB
Brasília, 20 de março de 1975.
ÍNDICE
Introdução
7 1. Aspectos sócio-políticos
1.1
- A indissolubilidade do vínculo:
exigência
do progresso social 11
1.2 - Razões e contra-razões dos divorcistas
15
1.2.1 - O divórcio: mimetismo cultural 15
1.2.2 - A quem interessa o divórcio 15
1.2.3 - Os casos dramáticos 16 1.2.4 - Os impasses
da permissividade 17
1.2.5
- A absurda inversão 17 . 1.2.6 - Valores ou utilidades? 18
'
1.2.7
- Os Filhos ou os Pais? 19 1.2.8 - A sorte da mulher 20 2.
Aspectos teológico-pastorais
2.1
- A indissolubilidade do vínculo conjugal: Mandamento do
Senhor 21 2.2 - A indissolubilidade do vínculo:
exigência
do amor 23 3. Tarefas que se
impõem para promoção
da
familia
3.1
- Requisitos para uma política familiar 27 3.2 - Algumas
sugestões para a Pastoral da Família 31
35
Conclusão
ÍNDICE
Introdução
1.
Aspectos sócio-políticos
1.1
- A indissolubilidade do vínculo: exigência do progresso
social
1.2
- Razões e contra-razões dos divorcistas 1.2.1 - O divórcio:
mimetismo cultural 1.2.2 - A quem interessa o divórcio
1.2.3 - Os casos dramáticos
1.2.4
- Os impasses da permissividade 1.2.5 - A absurda inversão
1.2.6
- Valores ou utilidades? 1.2.7 - Os Filhos ou os Pais? 1.2.8
- A sorte da mulher
2.
Aspectos teológico-pastorais
2.1
- A indissolubilidade do vínculo conjugal: Mandamento do
Senhor
2.2
- A indissolubilidade do vínculo: exigência do amor
3.
Tarefas que se impõem para promoção da família
3.1
- Requisitos para uma política familiar 3.2 - Algumas
sugestões para a Pastoral da Família
Conclusão
,
INTRODUÇÃO
1.
A XIV Assembléia Geral da CNBB, reunida em Itaici, SP, de
19 a 27 de novembro de 1974, incluiu, com prioridade, no seu
novo Plano Bienal, a Pastoral da Família. Essa decisão
reflete a crescente preocupação do Episcopado brasileiro
com relação à família.
2.
Atendendo à orientação definida pela Assembléia Geral, a
Comissão Episcopal de Pastoral (CEP), responsável direta
pela elaboração e execução do Plano de Pastoral, em sua
sessão ordinária de fevereiro próximo passado, aprovou um
texto, que situa o problema da família no seu contexto
contemporãneo e projeta determinadas linhas de ação, que
podem ser assim resumidas:
a)
Criar condições para que a família possa realizar sua tríplice
missão de formadora de pessoas, de evangelizadora e de
construtora da sociedade.
b)
Levar em consideração a evolução pela qual passa a
instituição familiar e bem assim os novos valores que
surgem.
c)
Colaborar na realização de estruturas sociaìs que
permitam às famílias marginalizadas atingir condìções
mínimas de estabilidade.
d)
Incentivar e aprimorar a pastoral junto aos casais cristãos,
a começar pela preparaçâo séria para a consciente
celebração do sacramento do matrimõnio.
(Cf.
Plano Bienal 75/76). 3. Entretanto, nessa mesma sessâo, a
Comissão Episcopal de Pastoral é informada, oficialmente,
pela Presidência da CNBB, da iminência da apresentação,
no Legislativo Federal, do projeto de emenda do artigo 175
§ 1 da Constituição, relativo à indissolubilidade do
casamento. Ante este fato novo, julgou a Presidência da
CNBB, que era seu dever convocar uma reunião extraordinária
da Comissão Representativa [CR) do Episcopado brasileiro.
4.
A posição da Hierarquia da Igreja não pode ser a do silêncio
e da omissão. Ela tem de levantar a voz profética em
conformidade com os "princípios e luzes que promanam
de Cristo" (GS 46), para guiar os fiéis e todos os
homens na busca da solução de seus problemas.
Por
tal motivo, a Igreja, embora compreendendo a importãncia
das leis que procuram dar proteçâo às vítimas de lares
desajustados ou desfeitos, não deixou de manifestar sua
preocupação pelos impactos negativos de tais leis, no
sentido de enfraquecer o apoio à família legítima e
desvirtuar o vínculo conjugal.
5.
Agora, entretanto, o problema sai do plano da legislação
comum e atinge a Constituição. Não que, para a Igreja, as
Constituições sejam intocáveis. As Constituições
mudam, como também os tempos e as circunstâncias. Contudo,
a emenda do divórcio toca em elementos que até hoje têm
sido considerados básicos em nossa cultura, como bem
comum e fundamental da brasilidade. A Igreja não
deseja envolver-se num problema de revisão constitucional,
mas julga seu dever falar quando esta revisão compromete um
valor que transcende o arbítrio dos legisladores.
6.
Reunidos, pois, em sessão extraordinária, nós os membros
da Comissão Representativa queremos, de início,
esclarecer:
1.
Estamos convencidos de que as propostas de emenda
constitucional 04/75 e 05/75 virão afetar gravemente a família
brasileira.
2.
Num debate desta natureza, cujas implicações tendem sempre
a transcender os termos em que é inicialmente formulado,
podem inserir-se outros interesses nos quais não queremos
envolver-nos.
3.
Se a questão do divórcio ofereceu a oportunidade para
nossa convocaçâo, não queremos perder de vista o amplo
quadro no qual ele se situa e que envolve o próprio papel
da família na sociedade de massa, a posição da mulher na
disciplina do casamento, a prioridade do ãmbito familiar
para a educação e, especialmente, a real condiçâo da
família brasileira nas camadas majoritárias de sua população.
4.
Não permitiremos, em especial, que a meta prioritária da
Pastoral da Família venha desviar-nos de nossa permanente
preocupação quanto ao respeito devido aos direitos
humanos. Pela mesma razão, defendendo a família indissolúvel,
nâo deixaremos de sustentar, com igual energia, a significação
da escola livre, do sindicato autõnomo, da auto-organização
das formas profissionais rurais, dos direitos da inteligência
ao exercício da crítica social ou da expressão das
minorias validamente configuradas no contexto da vida
social, a abolição total e definitiva das torturas, dos
sequestros e das prisões arbitrárias.
7.
Não cabe à Hierarquia da Igreja impedir a abertura do
debate de questões de conteúdo moral vinculadas a
valores humanos fundamentais, nem pretende ela envolver-se
num processo meramente político. Cabe-Ihe no entanto
anunciar a fé que ilumina um sistema de valores sem os
quais a atividade política, também ela sujeita às leis
morais, não teria condições de prover ao bem comum.
1.
ASPECTOS SÓCIO-POLÍTICOS
1.1
- A
indissolubilidade do vínculo: exigéncia do progresso
social
8.
Vivemos numa sociedade pluralista. O fato é invocado em
abono da tese, segundo a qual, em tal contexto cultural,
nenhum grupo ou instituição pode pretender ìmpor sua
filosofia de vida, exercendo pressões no sentido de dar
estrutura legal às decorrências de sua filosofia.
Entretanto,
exatamente porque vivemos numa sociedade pluralista e
pretendidamente laicizada, nós, os bispos da Igreja, nos
julgamos no direito e no dever de expor e de defender a
doutrina a respeito do matrimõnio e da família, doutrina
que se inspira na palavra de Deus, da qual a Igreja tem
consciência de ser guardiã e testemunha, na experiência
da condição essencial da pessoa humana e na própria
natureza do matrimônio. Ela sabe que não é por decreto
que o casamento se torna indissolúvel. Ela afirma que todo
matrimônio é por sua natureza indissolúvel.
9.
A sociedade moderna se caracteriza por um processo de
massificação que reduz a pessoa humana a uma simples função
de um imenso mecanismo anõnimo. Nesta conjuntura, a família
se apresenta como o grande fator de personalização, como o
corpo intermediário no qual cada ser humano tem condições
de atingir uma certa plenitude, por se sentir acolhido na
sua absoluta singularidade. Assim, defendendo a família,
a Igreja se antecipa à angustiosa busca
do homem moderno, no sentido de se preservar como pessoa,
contra a massiticação do grande complexo urbano
industrial.
10.
A palavra da Igreja não está, pois, marginalizada em face
às exigências da evolução da sociedade de massa. Ao
contrário, torna-se precursora dos direitos da diferenciação
social. Sentimo-nos na obrigação de por-nos sempre mais a
serviço do nosso povo, ajudando a iluminar os direitos
dessa diferenciação. De outro lado, a Igreja se manifesta
sobre essa matéria na ampla visão da instituição da família
e de seu papel personalizante na sociedade global, vìsão
essa que a Igreja interpreta como uma exigência dos
Sinais dos Tempos, uma mensagem a todos os homens de boa
vontade e um convite a uma profunda meditação sobre o
papel real da família na sociedade de hoje.
11.
Se o homem moderno, inserido nessa sociedade, parece perder
real vínculo comunitário, não deixa ele de participar de
uma civilização essencialmente solidária.
Diante
de tal realidade em evolução, faz-se mister encontrar as
visões do mundo e a compreensão das instituições que
exprimam a sua condíção atual e não venham
anacronicamente refletir uma política e uma concepção que
emergiu nos primórdios da sociedade industrial do século
XIX.
A
visão
liberal comporta a compreensão meramente contratualista
do casamento, de que resulta a afirmação da dissolução
do vínculo, ao arbítrio dos cõnjuges. Na visão do mundo
correspondente à sociedade
de todos os dias, impõe-se a idéia da família como
instituição. A instituição familiar tem efeitos e
responsabilidades para além da estrita vontade dos cônjuges.
12.
A família-instituição, transcendendo à mera íntenção
dos cõnjuges, apresenta-se hoje como 0 órgão privilegiado
de personalização. A família é redescoberta pela
sociedade moderna como forma de vida essencial à sua
estabilização. '
13.
No momento em que o meio social põe à prova formas de
associação não autênticas, os grupamentos
fundamentais, entre os quais a família é primordíal, vêem
realçado o seu papel na nova constelação de forças da
sociedade urbana.
Dir-se-ia
mesmo que, quanto mais complexa a vida urbana da sociedade
ìndustrial, tanto mais é exigido da família, como elo
primeiro da vida social. 14. É na revalorização da família
que está, pois, o princípio ordenador e a base da
verdadeira personalização. Sem ela a pessoa, pela
variedade exasperada das novas condições de pressão
social, logo à saída do meio familiar, será presa fácil
dos estereótipos, das condutas programadas, das mobilizações
de massa.
15.
Nesses termos compete à Igreja trazer à sociedade
brasileira a contribuição de uma visão da realidade
capaz de superar a anacrônica concepção liberal do
casamento.
16.
As reivindicações divorcistas são só aparentemente
progressistas. A indissolubilidade da família é uma das
exigências de sua inserção na modernidade de nossa época
como instítuição fundamental da sociedade de massa.
17.
A sociedade moderna, cada vez mais pluralista, exige
o reconhecimento dos vários grupos intermédios, que
enfeixam e preservam os liames específìcos da vida do
homem e de sua promoção.
É
precisamente neste contexto que assume toda sua importãncia
a doutrina das comunidades intermédias, princípio básico
do pensamento social da Igreja. Sua validade é realçada
pela falência de substitutivos da família nas tarefas de
integração do indivíduo à sociedade. É o que vem
demonstrar, por exemplo, o abandono crescente da legislação
permissiva na etapa mais recente de consolidação dos
sistemas socialistas, forçados a reverem sua doutrina clássica
ante a dissolução da família.
18.
Uma visão da família aberta ao futuro, considera
portanto que o casamento exige a fundaçâo de uma legítima
instituição social, que deixa às partes formadoras, no
limite da liberdade, tão somente a sua constituição. Os
contraentes são livres para contratar, mas não o são
para dissolver o vínculo matrimonial. Por sua implicação
social, o vínculo matrimonial transcende o arbítrio dos
cônjuges, em razão das funções que Ihe competem nos
mecanismos de coesão interna do núcleo familiar, de
diferenciação social, de adaptação e de integração
exigidos pela vida coletiva em nossos tempos.
1.2
- Razões
e contra-razões dos divorcistas 1.2.1 - O divórcio:
mimetismo cultural
19.
Faría prova de mimetismo cultural pretender trazer o divórcio
para o Brasil, com base no fato de que ele já foi adotado
pela grande maioria dos povos dìtos civilizados. A instituição
generalizada do divórcio não dirime a questão do seu
valor ético. As nações não se devem reger por maiorias
estatísticas, mas por imperativos morais.
Mais
ainda, a instituição generalizada do divórcio não
prova que uma lei divorcista seja em si boa. Seria mesmo
desastrosa num país em cujo povo existe uma forte tradição
familiar, num país no qual a família é a instituição
que assume a proteção e a primeira educação da prole,
pela carência inclusive de outros órgãos eficazes de
assistência social.
Ninguém
duvida, nem mesmo os divorcistas, que uma lei de divórcio
afeta seriamente a estrutura da família. Seria um
contra-senso social abalar essa estrutura sobretudo num país,
como o Brasil, onde a família, em nível de povo, é muitas
vezes a única instituição em condições de desempenhar
funções sociais indispensáveis.
1.2.2
- A quem
interessa o divórcio
20.
Neste contexto, a quem interessa realmente no Brasil uma lei
divorcista? Não haverá impostura em pleitear para nosso
povo uma lei que vìrá apenas trazer facilidades
suplementares a determinada camada da sociedade, para a qual
o dispositivo constitucional
da indissolubilidade pouco ou nada representa? A verdade
é que para a grande maioria, para o povo humilde e simples,
o problema não é o de dispor de instrumentos legais para
desfazer a família. O problema real consiste exatamente em
ter ou não ter os meios para constituir família e condições
mínimas de dignidade na estabilidade.
1.2.3
- Os casos dramáticos
21.
Leva-se freqüentemente o debate para o terreno emocional,
e se faz referência aos casos dramáticos daqueles que vívem
uma vida em comum que já se tornou intolerável, sobretudo
para o cõnjuge inocente, sem perspectivas de poder
reconstruir um novo lar para uma nova família. A Igreja
quer tornarse ainda mais sensível a estes dramas que
constituem uma preocupação constante de sua pastoral
familiar, porque ela está atenta ao fato de que, ao lado da
família ordenada e feliz, cresce o número dos lares
desajustados. Reconhece que, através de seus Tribunais
Eclesiásticos especializados, deverá procurar sempre mais
e melhor uma solução humana dos casos concretos, dentro
dos imperativos canônicos e pastorais. Neste sentido, já
se vem elaborando, na Igreja, uma jurisprudência mais
atenta à complexidade com que os problemas hoje se apresentam,
especialmente os que dizem respeito às causas que
justificam a declaração da nulidade de casamento, podendo
mesmo vir a oferecer oportunamente subsídios para a
atualização da própria lei civil. Entretanto, nesse mesmo
terreno emocional, a Igreja estranha que se omita qualquer
referência ao fato de quem uma lei divorcista
comprovadamente abre a porta ao escapismo fácil daqueles
que se sentem simplesmente cansados do outro consorte, cuja
única falta, muitas vezes (e muito mais do que se admite),
reside numa juventude ou numa beleza perdidas.
1.2.4
- Os impasses da permissividade
22.
Por uma lei divorcísta estaríamos entrando num plano
inclinado que conduziu a graves impasses as autoridades
complacentes de socìedades permissivas. Tais autoridades
começam a sentir que a pressão da permissividade,
buscando munir-se de proteções legais, não tem limites.
A responsabilidade pública das autoridades constituídas
sente hoje todo o alcance das ameaças geradas pela complacência
inicial. Assim se chegou à adoção do divórcio por mera
desistência ou por comum acordo, à legislação do aborto,
ao reconhecimento legal do homossexualismo, à total tolerância
com relação a uma pornografia degradante.
1.2.5
- A absurda inversão
23.
Não se trata de discutir a eventual necessidade de uma
separação ou de uma declaração de nulidade de um matrimõnio
que, de fato, nunca existiu. Tratase de saber se o Estado,
que tem o dever de criar condições, não no interesse de
uns poucos, mas para a verdadeira dignidade de todos, pode
criar, pela lei do divórcio, uma situação que, servindo a
poucos privilegiados, prejudica a maioria. A incompreensão
de
alguns não justifica a demolição institucionalizada dos
últimos amparos e estímulos de uma vida mais digna, mais
responsável, mais comunitária.
24.
A sociedade já gravemente ferida pela instabilidade
e pela irresponsabilidade, não precisa de facilidades,
mas de todas as formas justas e dignas de ajuda. O divórcio
tudo facilita para aqueles que nem sempre buscam a dignidade
e a corresponsabilidade maior na comunidade humana e trocam
tão facilmente os va'lores invioláveis dos outros por
seus próprios interesses. Ao mesmo tempo, ele em nada
serve aos que tão imperiosamente precisam de orientação,
de preparação, de ajuda que sustente os valores mais
sublimes da vida.
1.2.6
- Valores ou utilidades?
25.
O mal da humanidade não está na carência de recursos, mas
em não saber ou querer bem empregá-tos. O homem, ao
esquecer os valores superiores capazes de orientar sua existência,
e ao se entregar à insaciável sofreguidão de prazeres e
de utilidades egoístas, não faz mais do que cavar a
sepultura de sua própria felicidade.
Os
que tém o encargo de cuidar das condições do bem comum,
como o tem o Estado, não podem assumir a atitude ambígua
ou contraditória de facilitar, através de uma legislação
divorcista, as tendéncias para a progressiva dissolução
dos valores humanos, ao mesmo tempo que pretendem legislar
no sentido de dar amparo à sociedade. O Estado não terá
meios de impedir as conseqüências desastrosas
desencadeadas pelas condições por ele mesmo criadas
mediante Leis contrárias à verdadeira realização
humana.
26.
Esta reflexão se impõe numa época em que, ao mesmo tempo
que se prolonga cada vez mais a vida, se institucionaliza o
extermínio de tantos seres humanos que ainda nem nasceram.
Vivemos num mundo que possui recursos impressìonantes para
a formação e a educação, mas que, em meio à funesta
confusão dos egoísmos antagônicos, introduz a juventude
numa sociedade, que é exatamente o contrário do que
apregoam belas teorias. Estamos numa época em que tantos
tomam conhecimento da sorte infra-humana de muitos, mas não
sabem como deixar de se entregar ao esbanjamento absurdo,
e deixam morrer os que não conseguem saciar-se com o que
sobra do luxo que não Ihes é lícito cobiçar.
Ou
o homem obedece a valores que o fazem ultrapassar a si mesmo
e a seus interesses imedia· tos e assim se liberta, ou se
escraviza e arruina toda a comunidade humana.
1.2.7
- Os FiIHos ou os Pais?
27.
É esta uma pergunta mal colocada. Reflete a atitude que
contrapõe os interesses de uns aos de outros. É por aí
que tem início a morte do amor. O amor é a capacidade de
encontrar a felicidade exatamente no serviço ao outro. Os
filhos vítimas do egoísmo dos pais, muitas vezes, não
querem para sì o que as disposições legais Ihes podem
garantir:
escola,
saúde, alimentação. Eles exigem para sì o que não é
objeto de leì humana alguma: amor, carinho, compreensão,
aprender a viver em confiança. Quantos jovens têm o melhor
colégio, mas maldizem os próprios pais, dos quais nunca
receberam o valor maior da vida: o exemplo do amor altruísta,
o respeito por sua intocável dignidade e a aspiração a
uma verdadeira superação de toda indignidade humana. É
por isso que a geração jovem começa a descrer da
sociedade dos oportunìstas que não se empolgam com valores
humanos e espirituais.
1.2.8
- A sorte da mulher
28.
O igualitarismo que o divórcio pretende promover não
condiz com a justa emancipação da mulher, nem mesmo a
promoção sócio-política e cultural, por mais indispensável
que seja, atinge ainda o último direito, a última
necessidade da mulher: a de ser o princípio de compreensão,
de comunhão na sociedade; a de encontrar a total e
irrestrita confiança como ambiente indispensável para
que desabroche a sua feminina e materna capacidade de amar
e de conduzir a humanidade, das utilidades meramente
materiais aos valores que ultrapassam o indivíduo e
servem ao bem de todos.
29.
A experiência desmente a fácil propaganda e demonstra que
a mulher, inúmeras vezes, é a mais prejudicada pela
irresponsabilidade conjugal. Ela não precisa de mais uma
experiência; ela precísa descobrir a grandeza humana, num
clima no qual possa revelar o valor maior da vìda.
30.
Também nesse particular se verifica que o divórcio
privilegia uns e desampara outros, porque subtrai ao cônjuge-vítima
o último estímulo sério (a indissolubilidade), para um
maior esforço do outro no sentido de construirem juntos a
própria felicidade.
2.
ASPECTOS TEOLÓGICO-PASTORAIS 2.1 -
A indíssolubilidade do vínculo conjugal: Mandamento do
Senhor
31.
Se a Igreja eleva a sua voz em defesa da perenidade da união
conjugal, alicerce da estabilidade da família, é porque
recebeu este mandamento do Senhor. Já na Antiga Aliança,
pelo profeta Malaquias, Deus diz que detesta o divórcio
[cf. Mal 2,13ss). 32. No Evangelho o Senhor inculca a
indissolubilidade do matrimônio. Na verdade, o matrimõnio,
entendido como comunidade de vida, instituída por Deus,
do homem e da mulher, que se fundamenta no amor e fidelidade
incondicionaìs de ambos os cônjuges, nunca mais pode ser
dissolvido, segundo a vontade de Deus: o que Deus uniu,
jamais o homem pode separar" (Ml 19,6ss), quem se
separa não poderá casar outra vez [cf. Mc 10,11).
Fiel,
como o apóstolo Paulo, a Igreja aceita a lei evangélica,
[cf. 1 Cor 7,10-16) porque ela sabe que essa leì procede da
vontade amorosa e da sabedoria infinita de quem anela pela
felicidade humana e constantemente ilumina os homens,
descortinando-Ihes
novas dimensões de sua própria realidade humana. Ela traz
luz e orienta a própria Igreja e todos os homens de boa
vontade e faz descobrir nova dimensão do amor na unìão
conjugal, que alcança seu ápice no matrimônio-sacramento,
reflexo da união indi.ssolúvel de Cristo com a sua
Igreja (Et 5,31-32).
O
Evangelho, de fato, desvenda o mistério original que
trabalha, ativa e nutre por dentro os que vivem o amor
matrimonial. Coloca-os inseridos no mistério criador e
salvador, em nova condição existencial, na qual são
absorvidas e transformadas as vidas individuais e as
vontades pessoais libertas de seus caprichos egoístas.
Surge e se instaura pelo casamento um ser novo, os dois,
inseparavelmente, num só; os dois, irrevogavelmente, numa só
carne, como diz a Bíblia [cf. Gên 2,24; Mt 19,6; Mc 10,8;
Ef 5,31-32).
33.
Cristo se recusa a pactuar com a fraqueza humana. Sabe
que, onde há fraqueza no homem, ali nascem também novas
energias restauradoras, novos anseios e esforços por
recuperar valores esquecidos ou perdidos. Nestas forças
renovadoras que parecem recursos misteriosos de todo ser
vivo, reconhecemos a graça pascal de Cristo que morrendo
ressuscita e dá a vida até aos mortos [cf. do 11 ). À luz
do Evangelho divisamos a graça do matrimônio elevado à
plenitude de sacramento [cf. Et 5,2527.32). Pelo Evangelho
descobrimos o apelo do amor nupcial para o vínculo estável.
0 Evangelho nos torna mais conscientes da enorme dificuldade
em responder plenamente a esse apelo. Do Evangelho
também
hat:rimos a promessa e a esperança no dom de Deus de
fidelidade absoluta ao compromisso assumido no casamento por
todos os dias da vida, fidelidade na qual, em última análise,
se funda e repousa a estabilidade da família.
34.
Baseando-se, pois, nas Sagradas Escrituras, a Igreja ensinou
e ensìna a indissolubilidade do vínculo matrimonial, que
adquire peculiar firmeza no matrimônio-sacramento (Cân.
1013 § 2°). Mais: segundo a doutrina da Igreja, a
indissolubilidade constitui uma das propriedades essenciais
do matrimônio, de tal forma que sua exclusão traria
consigo a nulidade do casamento.
Assim
se compreende que "a ação da Igreja sempre tem sido
dirigida e continua a sê-Io ainda hoje no sentido de obter
que esta propriedade essencial seja reconhecida e garantida
mesmo pela legislação dos Estados no concernente não só
só matrimõnio-sacramento, mas a todo casamento válido"
(Osservatore Romano n" 8, de 23.2.75, comentárìo p.
1 ).
2.2
- A
indissolubilidade do vínculo: exigência do amor
35.
Ao falar da família, a Igreja não pode admitir que
a sua mensagem seja interpretada em dois níveis
irredutivelmente separados, quais seriam o
"natural" e o "sobrenatural". É um fato
que a Igreja proclama a sacramentalidade do matrimônio como
valor altíssimo e novo. Todavia, a Igreja sempre afirmou
igualmente que o sacramento do matrimõnio não
se substitui à realidade do compromisso matrimonial
natural, nem a ela se sobrepõe, mas a santifica nas
pessoas marcadas pela Fé e pelo Batismo. Por isso, a
Igreja, quando fala do matrimõnio, visa essencial e
fundamentalmente a instituição conjugal e familiar na sua
original intangibilidade.
36.
A doutrina da Igreja sobre o matrimônio tem por
fundamento a sua inconfundível concepção da dignidade do
homem, dignidade que se expressa plenamente no amor.
Pelo
uso da sua liberdade, o homem busca o bem, a posse de
valores que o elevem e o promovam. Ovando este bem ou este
valor é uma coisa, o movimento da liberdade se consuma num
gesto de posse. Ovando porém este valor é uma pessoa, o
homem intui que ela não se rende a um gesto de posse, mas
se oferece livremente em resposta, a um gesto de dom. O amor
humano se revela assim como o encontro de um dom mútuo e
total. Só a totalidade do dom inaugura um relacionamento de
amor. Nesta totalidade está inscrita uma exigência
imanente de irreversibilidade. O amor humano, na sua
autenticidade original, transcende o tempo e não se deixa
limitar pelas precauções de um calculismo egoísta. Um
compromisso condicional inaugura, de fato, uma aproximação
de egoísmos paralelos, da qual cada um dos cõnjuges
procura extrair para si a maior soma de satisfações
pessoais. Esta contrafação do amor se dissolve quando o
balanço hedonista apresenta um saldo negativo, liberando
cada um dos cônjuges para uma nova aventura, votada ao
mesmo fracasso. Defendendo a indissolubilidade
como exigência do amor, a Igreja não se obstina numa
irritante intolerãncia, mas procura defender a dignidade
do amor humano contra sua própria fragìlidade, para
assegurar a experiência de uma verdadeira plenitude que se
situa além das inevitáveis crises. Sem uma garantia de
indissolubilidade, taìs crises, que poderiam reduzir-se a
episódios dolorosos mas passageiros, transformam-se em
rupturas irreparáveis.
37.
Sem o amor irrestrito, pelo qual o homem se ultrapassa e
ultrapassa as necessidades dos interesses efêmeros, não
há comunhão autêntica. Porque só este amor leva a pessoa
à maturidade, à libertação das raízes da escravidão
do egoísmo. A comunhão humana, livre do capricho
e do instinto, só existe quando há compromisso pelo bem do
outro, dedicação ao valor do outro, que não se mede por
nenhum interesse. Mas supõe a disposição para as implicações
do amor, mesmo com sacrifício. Aí está a dimensão
pascal do amor cristão.
38.
A vida só é verdadeiramente humana, se vivida em
confiança. A juventude, sobretudo, exige um clima de
confiança, cuja razão de ser não seja o cálculo, mas
exclusivamente a dignidade do outro. Se não o encontra, a
sua capacidade de conviver humanamente e a sua generosidade
se atrofiam.
No
matrimônio o amor tende a se expandir em tal plenitude que
compromete os cônjuges em todas as dimensões da vida. Isto
só será possível se a confiança mútua tiver por
fundamento valores pelos quais se sintam totalmente
comprometidos na livre opção
que fizeram por essa possibilidade única de um verdadeiro
desabrochar humano.
39.
Sabemos que todos os homens de boa vontade são guiados pela
graça de Deus toda vez que, em generosidade e gratuidade,
se comprometem ao irrestrito respeìto mútuo e se dão
verdadeira e religiosa confiança recíproca, mediante
livre opção por um ideal de vida, que independe do seu arbítrio
pessoal. Somente o homem que se emancipa das efêmeras
arbitrariedades, está aberto ao mistério de Deus, tenha
ele disso consciência ou não. É por isso que o casamento,
digno desse nome, mesmo quando vivido por não cristãos, é
abertura verdadeira para o sentido divino da existência a
dois.
40.
O matrimônio que não se abre ao mais alto e absoluto
ideal, que não supera o arbítrio, traz em si a causa da
esterilidade espiritual e do fastio inevitável. Não
podemos afirmar que a busca do ideal seja livre em nossas
vidas, pois é o próprio homem que, no exercício de sua
liberdade, tem necessidade do ideal. O caminho da realização
e da felicidade humanas não coincide com os desvios fáceis
que pretendem evitar os obstáculos e as dificuldades, mas
que na realidade levam ao engano e à fatal ilusão.
41.
Não podemos deixar de mencionar aqui que o Evangelho
conhece dois caminhos de realização e planificação
humana no amor. Cada qual com o seu próprio dom (cf. 1 Cor
7,7), ordena-se um ao outro, complementando-se na construção
do Reino de Deus aqui no mundo, com vistas ao destino
eterno. Um deles, o casamento em que dois seres humanos,
significando o pacto indissolúvel de amor de Deus com a
humanidade, concretizado no tempo pela doação total de
Cristo, obediente até a morte de cruz (Filp 2,9; Jo 3,16;
Jo 15,13; Ef 5,22-32), caminham juntos para Deus, numa só
carne, produzindo frutos preciosos de vida, destinados a
alegrar eternamente a casa do Pai.
O
outro, o do celibato ou castidade por causa do Reino de Deus
[cf. Ml 19,12), que, numa tensão constante pelas coisas do
Senhor (1 Cor 7,32), esforça-se por conservar aceso nos
corações humanos o fogo de amor divino trazido por Cristo
à terra (Lc 12,49) difundido em todos os corações pelo
dom do Espírito Santo (Rom 5,5). Este amor celibatário,
também marcado pela renúncia e pela cruz, relembra às
criaturas humanas, em suas várias condições existenciais,
que só perdendo a vida por Cristo é que ela será de fato
encontrada (Ml 10,37-39).
3.
TAREFAS OUE SE IMPÕEM PARA PROMOÇÃO DA FAMÍLIA
3.1
- Requisitos
para uma política familiar 42. A palavra da
Igreja não pode expressar a sua preocupação tão somente
com relação ao vínculo conjugal. Esta preocupação se
insere necessariamente na pronta e irrestrita defesa de
muitas outras reivindicações ditadas pelo seu compromisso
fundamental com a sociedade aberta pluralista e em busca
do ideal democrático.
43.
A defesa da indissolubilidade do vínculo conjugal, por
parte da Igreja, vai, pois, ao encontro do mais fundamental
dos Sinais dos Tempos que nos mostram o sentido querido por
Deus da evolução da sociedade contemporânea, que é o
serviço do homem. Ao avanço tecnológico, à melhoria da
vida de relação, ao aperfeiçoamento dos mecanismos
institucionais, deve corresponder o serviço ao homem e ao
humanismo.
44.
Na perspectiva de uma política familiar global, a defesa do
caráter institucional, e não meramente contratual, do
casamento, não pode dissociar-se do empenho relativamente a
outras exigências da política global da família, quais
sejam principalmente:
a)
Imediata promoção da igualdade da posição dos cônjuges
dentro da família mediante eliminação das restrições
ainda existentes, características da sociedade patriarcal.
O projeto do novo Código Civil conserva traços de desequilíbrio,
perante a lei dos direitos e deveres dos cõnjuges, no
matrimônio. A eliminação desse desequilíbrio, em
conformidade com o que preconizam os documentos do Concílio
Vaticano II e dos Sínodos Episcopais de 1971 e 1974
mereceria o encômìo da Igreja.
b)
Valorização do papel da família na educação de seus
membros dentro de sua filosofia de vida. c) A reiteração
do primado da família nas de
terminações
relativas à prole, face às políticas do controle demográfico.
45.
No contexto mais amplo das relações e interdependências
sociais em que se insere a família, dever-se-ia levar em
conta uma série de condiçôes para sua promoçâo e
dignidade.
46.
Entre estas condições, mencionamos as seguintes:
-
A extensão progressiva do salário-família,
vinculado à Previdência Social, a novos setores de
beneficiários, entre os quais, especialmente, os trabalhadores
rurais e alguns setores de trabalhadores inativos.
-
A melhoria substancìal do respectivo benefício sob várias
formas alternativas ou acumulativas, implicando na elevação
progressiva dos valores do salário-família e sua maior
discriminação.
-
A amplìação do grupo dos dependentes a ser beneficiado
pela Previdência Social.
-
Novas formas de amparo à mão de obra feminina,
transferindo para a Previdência Social, como foi feito a
respeito da indenização à gestante, outros ônus que
ainda recaem sobre empresas isoladas, afetando
negativamente a contratação de mulheres.
-
Aperfeiçoamento dos mecanismos securitários e
assistenciais, no que tange, por exemplo, às
aposentadorias, cujo nível ainda independe da existência
e do vulto dos compromissos do segurado com a manutenção
dos seus familiares.
-
Expansão do serviço social, no setor público e no setor
privado, no sentido de levá-Io não só a indigentes
avulsos como a famílias mais desfavorecidas.
-
Assistência social à infância subnutrida, mendicante,
abandonada e delinqüente.
-
Atenção especial ao problema do desemprego e da colocação
de trabalhadores casados, particularmente daqueles que têm
pesadas obrigações familiares e que por motivo de idade
encontram maior dificuldade de emprego.
-
Defesa da capacitação do menor e do seu problema legal.
-
Medídas de incentivo à fixação da família ao solo,
através de uma política de autêntica reforma agrária.
-
Incentivo à legislação cooperativa com base familiar.
-
Defesa dos interesses da família no acesso à comunidade
escolar.
-
No plano habitacional, deverão ser assegu· radas, a todos,
condições dignas de moradia, compatíveis com as
necessidades impostas pela dimensão e característica de
cada família e o exercício de suas funções essenciais.
Assim, não poderão ser impostas soluções de moradia
baseadas unicamente na renda familiar, mas, inversamente,
sejam oferecidas condições de financiamento adaptáveis
às possibilidades econômicas de cada família, que permitam
assegurar-Ihe moradia com um mínimo de condições de espaço
e conforto, indispensáveis a uma forma digna de convivência
familiar.
-
Controle da inflação monetária e correção da iniquidade
na repartição das rendas, fatores dos mais erosivos da
estabilidade econõmica da família.
47.
São estes alguns dos aspectos mais urgentes de uma ampla
política familiar, e que constituem, evidentemente, mais do
que o divórcio, objetivos prioritários para todos os que
estão sinceramente empenhados em salvaguardar a famílìa
brasileira.
Está
nas mãos dos Congressistas uma grave responsabilidade
quanto ao destino da família brasileira. Esperamos que
sua lucidez conduza o problema segundo os legítimos
anseios da coletividade nacional.
Ove
deste debate, a família saia glorificada na afirmação de
sua unidade e estabilidade.
3.2
- Algumas
sugestões para a Pastoral da Família 48. A Igreja
e, em particular, seus movimentos leigos na área familiar,
empenhar-se-ão na elaboração de uma pastoral familiar
realmente eficaz, concreta e objetiva, que ajude a
construir a indissolubilidade, através do amadurecimento
do vínculo conjugal e da superação ou neutralização das
causas de desagregação familiar. Os programas devem tender
a oferecer à família os meios para que ela seja uma
comunidade realmente personalizante, pela formação e
promoção daqueles que a integram, e possa desempenhar sua
missão de evangelizadora e de promotora de um
desenvolvimento humano e integral.
49.
Inicialmente, é urgente a elaboração de uma ação
pastoral eficiente de educação para o amor, que deve começar
nas famílias, nas atividades catequéticas orientadas
para as crianças e pré-adolestentes,
nos programas de formação de jovens e adolescentes
realizados por movimentos especializados nessas áreas.
50.
Os cursos de preparação ao casamento, se bem realizados,
podem se constituir em preparação imediata extremamente
eficaz, por encontrarem terreno partìcularmente fértil e
receptivo, nessa fase pré-matrimonial. Mas a realização
destes cursos não deve fazer esquecer a necessidade de uma
preparação remota, que deverá ser ministrada através
dos movimentos de jovens, nas aulas de religião dos últimos
anos do curso, e em outras ocasiões, dentro de uma visão
vocacional.
51.
Programas concretos de apoio à família deverão ser
desenvolvidos, de modo especial, logo após o casamento.
Para
tanto, deverão ser aproveitadas todas as oportunidades
naturais de encontro da Igreja com as famílias que dela se
aproximam. Oportunidade válida e adequada para tanto
deveriam ser os encontros realizados com pais e padrinhos
de crianças que vão se batizar.
As
atividades catequéticas paroquiais costumam incluir
contatos sistemáticos com os pais. É esta uma oportunidade
insubstituível para o aprofundamento do estudo das
realidades da família para que enfrentem, com maiores
possibilidades de êxito, as causas da desagregação
familiar.
Tais
encontros se prestam a debates sérios sobre os problemas
familiares; ao desenvolvimento do
espírito
crítïco que prepare a família para a sua função de síntese
das influências externas; à melhor compreensão dos pais
em relação às funções essenciais da família num
mundo em transformação, especialmente as funções
afetivas e formadoras de pessoas; à coerência entre a fé
que procuram transmitir aos filhos e os compromissos éticos
que a fé supõe.
52.
Outras oportunidades de contato deverão ser incentivadas,
através da realização de encontros de casais, cursos,
ciclos de debates, com recursos a técnicas modernas de
comunicação, que motivem a participação ativa das famílias
num processo de crescimento e maturaçâo com abertura
crescente para a realidade social em que estão mergulhadas.
53. Uma pastoral que se dirigisse somente às famílias
consideradas cristãs, marcadas pelo vínculo sacramental,
seria uma pastoral imperfeita, desvinculada da realidade.
Grande
número de famílias brasileiras não podem ser
consideradas "famílias-cristãs", no sentido
estrito da expressão, mas grupos familiares nem sempre
completos, aos quais faltam muitas vezes o vínculo jurídico
ou sacramental. São grupos que preenchem os requisitos
oficiais necessários, mas Ihes falta o amor como base do
inter-relacionamento pessoal:
Todas
essas famílias, quaisquer que sejam suas imperfeições e
deficiências, deverão ser atingidas pela ação pastoral\
da Igreja, levando-se em conta carências, limitações e
necessidades.
54.
Um dos recursos para que sejam atingidas todas as famílias
será a presença atuante da Igreja e seus agentes de
pastoral, nos meios de comunicação social, especialmente na
TV, no rádio e no cinema. 55. Por outro lado, devem ser
incentivados e apoiados os institutos familiares e centros
de orientação, dedicados ao aconselhamento conjugal e
familiar, e a terapia psicológica, nos casos que o exijam.
56.
A complexidade da vidá moderna e a diversidade de pressões
internas e externas a que está sujeita a família, gerando
tensões, torna cada vez mais necessária esta forma de apoìo.
57.
Ouanto aos recursos humanos, sempre escassos, cabe à Igreja
e, em particular, aos seus movimentos familiares leigos,
descobrir novas formas de engajamento apostólico, através da
compreensão crescente, por todos os cristãos, de que a fé
supõe o compromisso com a justiça e o amor ao próximo, que
se consubstancia pelo serviço.
CO(VCLUSÃO
58. A Igreja, fiel a Cristo, defendendo a família, nâo luta
por seus interesses, mas primeira e essencialmente pelo
homem, e isto ela o faz em nome de Deus, que nos amou primeiro
e nos deu a fé que nos ultrapassa. O remédio contra os males
da sociedade não pode consistir em Ihe subtrair o amparo e
a proteção da Lei, mas em ensinar a todos e em estimular os
fracos a terem a coragem de buscar sua própria dignidade.
59.
O próprio Deus, fazendo-se homem para realizar o desígnio
de nossa salvaçâo, quis nascer em uma família, pobre e
humilde, e nela viver obscuramente a maior parte de sua
vida. Foi numa família que Ele quis realizar sua experiência
humana, participando plenamente de suas alegrias e
sofrimentos e se identificando em tudo com nossa condicão humana,
menos no pecado. Foi a família que Ele quis consagrar como a
mais pura expressão humana do mistério trinitário de três
Pessoas em um só Deus, mistério da maìs perfeita distinção
das pessoas na mais absoluta comunhão da natureza.
60.
É este mistério trinitário, em última análise, o protótipo
da intercomunicação de amor que deve unir indissoluvelmente
os que, no mundo, devem ser também a expressão vìva da íntima
comunhão divina.
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