
PERGUNTAS E RESPOSTAS SOBRE O
TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL
1) O que é o Tribunal Penal
Internacional (TPI) e qual será a sua atuação?
O TPI será um tribunal penal internacional permanente, criado
por um estatuto (tratado) ratificado pelos Estados, através do qual
serão processados os responsáveis por crimes de genocídio, de guerra
e outros crimes contra a humanidade.
Em sua condição de tribunal permanente, ele estará aberto à
participação de todos os Estados, diferentemente dos Tribunais de
Nuremberg e Tóquio, estabelecidos pelas potências aliadas vencedoras
da Segunda Guerra Mundial. O TPI complementará as atividades dos
tribunais nacionais e terá jurisdição universal, ao invés de estar
limitado a um só país.
2) Por que necessitamos de um TPI?
Desde que os Tribunais de Nuremberg e Tóquio concluíram seus
trabalhos, há meio século, milhões de pessoas voltaram a ser vítimas
de crimes de genocídio, de guerra e de outros crimes contra a
humanidade.
Apesar disso, apenas em alguns poucos
casos os responsáveis por essas atrocidades foram processados e julgados por tribunais nacionais. O TPI
deverá exercer sua competência independentemente do lugar onde os
crimes tenham sido perpetrados e estará capacitado a atuar quando os
Estados não possam ou não estejam dispostos a processar os criminosos.
3) Sobre que crimes o TPI terá
competência?
A princípio, o TPI terá competência para julgar os crimes de
genocídio, de guerra e outros crimes contra a humanidade, além de
agressão externa.
Considera-se genocídio a prática, por qualquer pessoa, de uma
série de atos, como massacre ou a lesão grave de membros de um grupo nacional,
étnico, racial ou religioso, com a intenção de destruí-lo, total ou
parcialmente.
São crimes contra a humanidade o assassinato, o extermínio, a
escravidão, a deportação (entre fronteiras nacionais) e o
deslocamento forçado de população (dentro de um país), a detenção
arbitrária, a tortura, o estupro, a prostituição forçada e outras
formas de abuso sexual, a perseguição por motivos políticos, raciais
ou religiosos, o desaparecimento forçado de pessoas e outros atos
desumanos realizados em massa.
Crimes de guerra (violações da legislação humanitária) são
cometidos no contexto de conflitos armados, sejam nacionais - os mais
comuns hoje em dia - ou internacionais.
4) O TPI garantirá justiça às
mulheres?
A Anistia Internacional considera que o Tribunal Penal
Internacional deverá tratar, de modo eficiente, as violações dos
direitos humanos das mulheres, especialmente os crimes específicos do
seu gênero que constituam genocídio, crime de guerra ou outros crimes
contra a humanidade. Na hora de investigá-los, o TPI também deverá
levar em conta as circunstâncias especiais envolvendo casos de
violência contra a mulher.
5) Quem será processado pelo
Tribunal? Somente os subordinados ou também seus superiores? Os
soldados não se limitam a cumprir ordens?
O TPI deverá processar qualquer pessoa responsável pela
prática de crimes fundamentais, independentemente do lugar em que foram
cometidos e do cargo ou posição que ele ocupe, seja soldado raso,
comandante, ministro da Defesa, primeiro-ministro, presidente ou rei.
Esse mesmo princípio integrou os documentos constituintes dos Tribunais
de Nuremberg e Tóquio. Meio século depois, toda pessoa adulta deve
saber que as ordens de um superior não a eximem de responsabilidades em
relação a crimes de genocídio, de guerra e de outros crimes contra a
humanidade.
6) Como os acusados serão
processados? Nada aconteceu com Radovan Karadi, por exemplo, embora o
Tribunal Penal Internacional para a ex-Iuguslávia tenha aberto um
processo contra ele.
Todos os Estados-partes no estatuto terão que comprometer
formalmente a cumprir as ordens e pedidos do TPI. O não cumprimento
desse compromisso solene constituirá uma violação da legislação
internacional, fazendo com que o Estado sofra grandes pressões para
atuar em conformidade com as obrigações que assumiu. Durante mais de
um século, os Estados têm acatados todas as resoluções dos tribunais
internacionais que eles mesmos criaram através de tratados, como a
Corte Internacional de Justiça de Haia e o Tribunal Europeu de Direitos
Humanos. O custo político de negar-se a obedecer é freqüentemente
alto demais para que os Estados se arrisquem a um desprestígio
permanente.
Mais de um terço (27) das pessoas contra as quais o Tribunal
Penal Internacional para a ex-Iuguslávia abriu processos foram
colocados à disposição dessa corte. É muito provável que a pressão
que se mantém sobre os demais fará com que se entreguem ou sejam
detidos. Além disso,
aquelas pessoas que ainda não foram postas sob a custodiado Tribunal
Penal Internacional para a ex-Iuguslávia e do seu congênere para
Ruanda, acham-se escondidas ou estão excluídas, de uma maneira ou de
outra, da possibilidade de exercerem cargos de mando em seus países.
7) O que acontecerá com o
terrorismo?
Diferentemente dos crimes de genocídio, de guerra e de outros
crimes contra a humanidade, o “terrorismo” nunca foi definido em um
tratado apoiado por toda a comunidade internacional. Por isso, a maioria
dos Estados é contrária à inclusão do “terrorismo” na
competência do tribunal Penal Internacional.
8) Qual será o grau de
independência do Tribunal? Ele não será demasiadamente político?
Certos Estados não poderiam impedir que seus cidadões comparecessem
perante o TPI? Não seria, uma instituição parcial?
O estatuto reconhece a necessidade de se ganhar independência do
TPI e inclui, por exemplo, referências à independência do promotor e
ao modo como haverão de processar-se os caos. Como já foi dito, os
Estados que são partes em tratados que criaram instituições judiciais
internacionais normalmente cumprem suas resoluções. Na medida em que o
TPI for imparcial ao selecionar as causas que investigará e
processará, sua atuação será considerada justa, ainda que certos
Estados possam obstaculizar temporariamente a entrega de cidadões seus
ou de membros de certos grupos.
9) Que função terá o TPI em
relação aos tribunais nacionais?
O Tribunal Penal Internacional terá jurisdição compartilhada
com os tribunais nacionais. Porém, o TPI só atuará quando esses
tribunais nacionais não
possam ou não queiram investigar, e quando as evidências exigirem a
abertura de processos contra os responsáveis.
10) Quais serão as obrigações dos
Estados que não ratificarem o tratado referente ao Tribunal?
Todos os Estados, sejam ou não partes do estatuto, estão
obrigados a processar, através dos seus tribunais nacionais, os
responsáveis por crimes de genocídio, de guerra e outros crimes contra
a humanidade, ou a extraditá-la para um país que possa ou esteja
disposto a fazê-lo através de um julgamento justo. Outrossim, em
dezembro de 1973, a Assembléia Geral da ONU adotou a Resolução 30 74
(XXVIII) (Princípios da cooperação internacional na identificação,
detenção, extradição e punição dos culpados por crimes de guerra
ou crimes de lesa humanidade), na qual convencionou-se que todos os
Estados colaborarão bilateral e multilateralmente para processar os
responsáveis por tais crimes.
É certo que os Estados que não sejam partes no estatuto
estarão desobrigados de cooperar com o TPI. Contudo, se não
processarem os responsáveis por crimes fundamentais em seu território
ou jurisdição, não os extraditarem para outro Estado, não o
transladarem por solicitação do TPI ou não responderem às
solicitações de assistência do TPI, estarão descumprindo um dever
internacional, reconhecido por todos os Estados naquela resolução das
Nações Unidas.
11) Por que o TPI não tem caráter
retroativo? Qual a postura da Anistia em relação a grupos como o Khmer
Vermelho do Camboja?
O Tribunal Penal Internacional terá competência sobre os crimes
fundamentais apenas depois que seu estatuto for ratificado por um
número mínimo de Estados (60) e entrar em vigor. Muitos Estados consideram que,
desse modo, o TPI jamais poderá ser acusado - como ocorreu com os
Tribunais de Nuremberg e Tóquio - de aplicar critérios retroativos de
justiça. Há quem argumente que o TPI deveria ter competência sobre os
crimes cometidos desde a Primeira Guerra Mundial, naqueles casos que os
suspeitos ainda estivessem vivos; de
qualquer forma, seria pouco provável que os Estados chegassem a um
acordo sobre uma data passada.
A Anistia Internacional acredita que todo aquele que comete crime
de genocídio, de guerra ou outros crimes contra a humanidade deve ser
processado, seja através de tribunais nacionais (que t6em jurisdição
universal sobre esses crimes) ou por tribunais penais internacionais. A
organização formulou um apelo para que todos os responsáveis por
crimes dessa natureza, como os cometidos no Camboja pelo Khmer Vermelho,
sejam processados em tribunais nacionais ou em um tribunal
internacional.
12) Como o trabalho do TPI poderá
ser afetado por anistias concedidas a pessoas que violaram os direitos
humanos, como no Chile, El
Salvador, Haiti, Argentina e África do Sul?
No Tribunal Penal Internacional não serào aceitas quaisquer
anistias, indultos ou medidas semelhantes, de caráter nacional, em
relação a crimes cometidos contra a humanidade e que constituam uma
violação da legislação internacional. Medidas como essas
desrespeitam inclusive o disposto na resoluçào de 1973 da Assembléia
Geral das Nações Unidas, acima mencionada, que dispõe: “Os Estados
nào adotarão disposições legislativas nem tomarão medidas de outra
índole que possam desobedecer as obrigações internacionais
contraídas referentes à identificação, detenção, extradição e
punição dos culpados por crimes de guerra ou crimes de lesa-humanidade”.
13) Quais as questões estatutárias
que ainda podem impedir o eficaz funcionamento do Tribunal?
1) O chamado “Estado de nacionalidade” - o TPI deverá pedir
autorização a um país para julgar cidadões seus;
2) Os cinco membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas
(EUA, Rússia, França, Reino Unido e China) poderao, em conjunto,
bloquear uma investigação por períodos renováveis de doze meses
quando a questão sob judice estiver sendo tratada policamente pelo
Conselho;
3) A cláusla “opting out”, que permite aos Estados a
exclusão voluntária da jurisdição do Tribunal para crimes de guerra
durante sete anos.
PONTOS
FUNDAMENTAIS PARA A JUSTIÇA INTERNACIONAL
A Anistia Internacional publicou vários documentos com
recomendações acerca do Tribunal Penal Internacional e sobre seu
funcionamento, que sintetizou em 16 princípios essenciais:
1) O Tribunal deve ter competência
sobre o crime de genocídio.
2) O Tribunal deve ter comeptência
sobre os crimes contra a humanidade.
3) O Tribunal deve ter competência
apara apreciar graves violações do direito
humanitário, ocorridas no contexto de conflitos
armados nacionais ou
internacionais.
4) O Tribunal deve garantir que as
mulheres serão tratadas com justiça;
5) A competência do tribunal deve
ser automática.
6) O Tribunal deve ter a mesma
jurisdição universal que tem qualquer Estado-
parte no que diz respeito àqueles crimes
funamentais.
7) O Tribunal deve ter o poder de
determinar, em todos os casos e sem
qualquer tipo de ingerência política, se é competente para
julgá-lo e se
exercerá essa competência.
8) O Tribunal deve ocupar o lugar, de
forma eficaz, dos tribunais nacionais
quando estes nào puderem ou não quiserem
processar os responsáveis pelos
crimes fundamentais.
9) Um promotor independente deve
estar habilitado a iniciar investigações por
conta própria, baseando-se em informações de
qualquer fonte, e submetido
apenas ao devido processo judicial; além disso, deve estar
autorizado a
expedir ordens de vistoria e de detenção, bem como os decretos
de
processamanto para que o Tribunal aprove.
10) Nenhum organismo político,
incluindo o Conselho de Segurança da ONU, bem como os Estados
nacionais, pode paralisar ou mesmo adiar uma investigação ou um
processo, em qualquer circunstância.
11) Com o objetivo de garantir uma
boa e efetiva distribuição da justiça, o Tribunal deve organizar
programas eficazes para a proteção de vítimas e testemunhas, nos
quais todos os Estados-partes participarào e colaborarão, sem
prejuízo dos direitos dos suspeitos e acusados.
12) O Tribunal deve estar habilitado
a conceder reparações às vítimas e aos seus familiares, em forma de
restituição, indenização e reabilitação.
13) O Tribunal deve assegurar a
suspeitos e acusados o direito a um julgamento justo, de acordo com as
mais importantes normas internacionais pertinentes, em todas as feses do
processo.
14) Todos os Estados-partes, e
especialmente seus tribunais e autoridades, devem colaborar plenamente e
sem protelações com o Tribunal, em todas as feses do processo.
15) O Tribunal deve ser financiado
pelo orçamento ordinário das Nações Unidas, complementado, se for o
caso, pelo orçamento para a manutenção da paz e contribuições de um
fundo fiduciário voluntário.
16) Os Estados-partes não podem
fazer ressalvas ao estatuto do Tribunal.
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