Perguntas
e Respostas
Indagações
e Respostas
[O
TPI] promete, finalmente, suprir o que por muito tempo foi uma
lacuna no sistema jurídico internacional, um tribunal permanente
para julgar crimes gravíssimos concernentes à comunidade
internacional como um todo – genocídio, crimes contra a
humanidade e crimes de guerra. - KOFI ANNAN, SECRETÁRIO-GERAL, NAÇÕES
UNIDAS
1.
Por que nós necessitamos de outra corte internacional? Por
que não utilizamos a Corte Internacional de Justiça?
A
Corte Internacional de Justiça, principal órgão judicial das Nações
Unidas, foi destinada a tratar originalmente com disputas entre
Estados. E não possui jurisdição acerca de matérias que
envolvam responsabilidade penal individual.
O
século XX presenciou a mais extrema violência da história da
humanidade. Nos últimos cinqüenta anos mais de 250 conflitos
eclodiram ao redor do mundo; mais de 86 milhões de civis, na
maioria mulheres e crianças, morreram; e cerca de 170 milhões de
pessoas foram desprovidas de seus direitos, propriedades e
dignidade. A grande parte dessas vítimas foram simplesmente
esquecidas e poucos criminosos foram levados à justiça.
Apesar
de as normas e os direitos delimitarem e proibirem crimes de
guerras, crimes contra a humanidade e genocídio, ao longo de vários
tratados, convenções e protocolos que tudo vedam, de gases
venenosos a armas químicas, o que faltava até agora era algum
sistema para executar tais normas e para deter os indivíduos
penalmente responsáveis pelas violações.
A
Assembléia Geral das Nações Unidas pela primeira vez reconheceu
a necessidade de um mecanismo permanente para processar os
assassinos em massa e criminosos de guerra em 1948, após os
julgamentos de Nuremberg e de Tóquio, referentes à Segunda
Guerra Mundial, o que acabou por ser pauta de discussão desde então.
Até agora, entretanto, as tentativas de criar tal mecanismo
tinham fracassado em relação à necessidade de um tribunal penal
internacional para processar e punir aqueles indivíduos que
cometeram os mais graves crimes.
2.
Em que se diferenciará o Tribunal Penal Internacional dos
Tribunais ad hoc para a
Ex-Iugoslávia e Ruanda?
Os
dois Tribunais ad hoc, para a Ex-Iugoslávia e Ruanda, foram criados pelo Conselho
de Segurança com a finalidade de tratar dos conhecidos crimes
ocorridos naquela região durante determinado período de tempo;
eles não pretendem analisar violações ocorridas alhures ou
evitar violações futuras.
O
Tribunal Penal Internacional terá sede na Haia, Holanda, e será
uma instituição permanente não circunscrita a determinados períodos
ou locais. Será também capaz de agir mais rápido do que esperar
a criação de um tribunal ad
hoc. Como entidade permanente, sua mera existência será uma
dissuasão, enviando uma forte mensagem aos potenciais violadores.
Igualmente ele encorajará os Estados a investigarem e processarem
os crimes graves cometidos em seu território ou por seus
nacionais, caso contrário, o Tribunal Penal Internacional exercerá
sua jurisdição.
3.
Quão forte está o apoio à criação do Tribunal Penal
Internacional?
Cento
e sessenta Estados participaram da Conferência Diplomática das
Nações Unidas (realizada em Roma de 15 de Junho a 17 de Julho de
1998), que adotou o Estatuto do Tribunal Penal Internacional. O
texto do projeto submetido à Conferência Diplomática era
repleto de opções divergentes e tinha cerca de 1.400 colchetes
indicando desacordos sobre o texto. Mediante grupos de trabalho,
negociações informais e debates abertos, emergiu o texto em um
delicado equilíbrio; uma solução amplamente acordada foi
baseada em questões politicamente sensíveis e juridicamente
complexas. O Estatuto e a Ata Final foram conduzidos para a adoção
na forma de um “pacote” fechado. Esse pacote foi o produto de
intensas negociações e compromissos criteriosos destinados a
chegar a um amplo acordo. Índia e Estados Unidos tentaram emendar
o pacote. Em cada caso, uma “moção de não-ação” –
procedimento destinado a não análise das emendas – foi adotada
por esmagadora maioria. Na moção de não-ação que rejeitou a
emenda da Índia, a votação foi de 114 a 16, com 20 abstenções;
já a emenda dos Estados Unidos foi rejeitada por 113 a 17 votos,
com 25 abstenções. O pacote foi assim mantido e então acordado
em sua integridade por 120 votos favoráveis, 7 contra e 21 abstenções.
O
artigo 125 do Estatuto de Roma dispõe que esse permaneceria
aberto para a assinatura nas Nações Unidas até 31 de Dezembro
de 2000; como essa data já expirou, os Estados que não o
assinaram só possuem a opção de aderi-lo. Em 31 de Dezembro de
2000, os Estados Unidos, Irã e Israel foram os últimos a
assinarem o Estatuto, totalizando 139 assinaturas. Em 30 de Abril
de 2001, a marca da metade do quorum necessário foi alcançada
quando Andorra tornou-se o 30º Estado a ratificar o Estatuto.
Espera-se que a grande maioria dos Estados que assinaram o
Estatuto irá ratificá-lo. É necessário que sessenta Estados
ratifiquem o Estatuto para o Tribunal começar suas atividades.
4.
Por que alguns Estados votaram contra o Estatuto?
Sete
Estados votaram contra o Estatuto em uma votação secreta; os
nomes desses países não foram registrados. Três Estados –
China, EUA e Israel – declararam suas razões por estarem
votando contra o tratado. China expôs sua opinião de que o poder
dado ao Juízo de Instrução para analisar a iniciativa do
Procurador não era suficiente e que a adoção do Estatuto
deveria ser por consenso, não por votação.
A
principal objeção dos Estados Unidos foi sobre a aplicação da
jurisdição do Tribunal sobre Estados não-Partes. Também
declarou que o Estatuto deveria reconhecer o papel do Conselho de
Segurança na determinação do ato de agressão.
Israel
afirmou que não conseguia compreender porque o ato de transferência
de populações em um território ocupado foi incluído como crime
de guerra.
5.
O Tribunal terá competência para julgar quais crimes?
O
Tribunal versará sobre os mais graves crimes cometidos por indivíduos:
genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra. Esses
crimes foram especificados no Estatuto e cuidadosamente definidos,
a fim de evitar ambigüidade ou imprecisão. O crime de agressão,
que também está sob a jurisdição do Tribunal, somente poderá
ser analisado pelo Tribunal quando a Assembléia dos Estados
Partes acordarem sobre sua definição, seus elementos
constitutivos e as condições sob as quais o Tribunal exercerá
sua jurisdição. É importante notar que o Estatuto de Roma não
criou nenhum crime, mas refletiu o direito internacional
consuetudinário e convencional já existente.
O
Genocídio envolve
aqueles atos proibidos, que estão especificadamente listados (e.
g., assassinato, lesões graves), cometidos com a intenção de
destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial
ou religioso.
Os
crimes contra a humanidade envolvem aqueles
atos proibidos, também especificadamente listados, quando
cometidos como parte de um ataque sistemático ou generalizado
dirigido contra uma população civil. Tais como o homicídio, o
extermínio, o estupro, a escravidão sexual, o desaparecimento
forçado de pessoas e o crime de apartheid.
O
genocídio e os crimes contra a humanidade são puníveis tanto se
cometidos em tempo de “paz” quanto em de guerra.
Os
crimes de guerra abrangem as violações graves das Convenções
de Genebra de 1949 e outras sérias violações do direito dos
conflitos armados, cometidos em larga escala em conflitos de caráter
internacional ou não. A inclusão de conflitos não-internacionais
está de acordo com o direito internacional consuetudinário e
reflete a realidade ocorrida nos últimos 50 anos, em que as mais
sérias violações dos direitos humanos ocorreram não em um
conflito internacional, mas no interior dos Estados.
A
tipificação dos crimes no Estatuto é o produto de anos de árduo
trabalho, que envolveu muitas delegações e seus especialistas.
Os juízes do Tribunal estarão limitados a essa estrita compreensão
de tipos penais e não poderão estendê-los por analogia. O
objetivo é o de estabelecer valores internacionais objetivos, não
dando espaço para decisões arbitrárias. Em casos de ambigüidade,
os tipos serão interpretados em favor do suspeito ou do acusado.
6.
E o que dizer sobre os crimes de agressão, terrorismo e tráfico
de drogas?
Havia
na Conferência de Roma um apoio generalizado, tanto dos Estados
quanto do conjunto das ONGs, para que o crime de agressão fosse
incluído como parte da jurisdição do Tribunal. Entretanto, não
havia tempo para acordar acerca de uma definição de agressão
aceitável para todos. Como resultado, o Estatuto incluiu esse
crime, porém estabelecendo que o Tribunal não poderia sobre ele
exercer sua competência até ser feito um acordo pelos Estados
Partes na Conferência de Revisão, versando sobre a definição,
os elementos constitutivos e as condições sob as quais o
Tribunal exercerá sua competência a respeito desse crime.
De
acordo com a Carta das Nações Unidas, o Conselho de Segurança
tem competência para determinar se um ato de agressão foi
cometido. Assim, foi previsto no Estatuto que o texto final sobre
o crime de agressão deve ser coerente com as disposições da
Carta da ONU.
Apesar
de ter havido grande interesse em incluir o terrorismo e o tráfico
de drogas na competência do Tribunal, os Estados não acordaram
em Roma sobre a definição de terrorismo e alguns países
acreditavam que a investigação do tráfico estava além dos
recursos do Tribunal. Consentiram então por uma resolução que
recomenda aos Estados Partes relevar a inclusão desses crimes em
uma futura conferência de revisão.
7.
O Tribunal processará crimes sexuais?
Sim.
O Estatuto incluiu crimes de violência sexual, como o estupro,
escravidão sexual, prostituição forçada e gravidez à força,
como crimes contra a humanidade quando são cometidos como parte
de um ataque generalizado ou sistemático dirigido contra uma
população civil. Eles também serão considerados crimes de
guerra quando cometidos em conflitos armados internacionais ou
internos.
Em
Ruanda e na Ex-Iugoslávia, estupro e violência fundada em gênero
foram amplamente utilizadas como armas para espalhar o terror e
para humilhar e aviltar mulheres de um grupo étnico particular ou
comunidades inteiras a que eles pertenciam. Ao processar casos de
estupro ou violações fundadas no gênero, os Tribunais ad hoc
acreditaram que as vítimas freqüentemente temiam levar
adiante suas histórias e até mesmo tinham medo de serem
vitimadas por esse fato.
Para
ajudar as vítimas e testemunhas diante o processo judicial, o
Tribunal Penal Internacional terá uma Divisão de Vítimas e
Testemunhas para oferecer medidas de proteção e de segurança,
assistência psicológica ou de outro tipo para vítimas e
testemunhas, sem contudo deixar de assegurar os direitos do
acusado em sua totalidade. O Tribunal deve também tomar todas as
medidas necessárias para proteger a privacidade, a dignidade, o
bem-estar físico e mental e a segurança das vítimas e
testemunhas, especialmente quando os crimes envolvam violência
sexual ou de gênero.
8.
As vítimas terão direito à reparação?
O
Tribunal estabelecerá princípios para reparações às vítimas,
incluindo restituição, compensação e reabilitação. O
Tribunal tem a prerrogativa de determinar o âmbito e a extensão
de algum dano, perda e ofensa às vítimas, assim como determinar
à pessoa condenada a fazer alguma reparação específica. Um
Fundo em favor das vítimas e seus familiares deve ser
estabelecido. Devem estar incluídos como recursos para o Fundo o
dinheiro e os bens recolhidos mediante multas e penalidades
impostas pelo Tribunal.
9.
Os comandantes militares e os agentes governamentais de alto posto
poderão ser processados pelo Tribunal?
Sim. A
responsabilidade penal será aplicada igualmente a todas as
pessoas, sem distinção em razão de ele ou ela ser um Chefe de
Estado ou de governo, um membro do governo ou do parlamento, um
representante eleito ou um funcionário público. Também não será
possível alegar esse caráter oficial como constitutivo de um
motivo de redução da pena.
O
fato de um crime ter sido cometido por uma pessoa sob ordens de
superiores não será em regra capaz de eximi-la de responsabilidade penal. Um comandante
militar poderá ser responsabilizado penalmente por crimes
cometidos por suas forças sob seu comando e controle. A
responsabilidade penal pode também ser reconhecida se o
comandante militar sabia ou deveria ter sabido que essas forças
estavam cometendo ou se preparavam para cometer tais crimes, mas
nada fez para prever ou reprimir tal comissão.
Ademais,
civis agindo efetivamente como comandantes militares podem ser
penalmente responsabilizados quando eles sabiam ou deliberadamente
ignoraram claros indicativos que os crimes estavam sendo cometidos
ou preparados para tal.
10.
Pode processar-se um cidadão de um país que não é parte no
tratado que constituiu o Tribunal?
Sim,
desde que o país onde ocorreu o alegado crime é um Estado Parte,
ou esse país aceitou a jurisdição do Tribunal especificamente
para a situação em questão, ou o Conselho de Segurança
submeteu o caso ao Tribunal. Entretanto, em nome do princípio da
complementaridade, o Tribunal somente agirá se a jurisdição
nacional não processar o(a) acusado(a).
11.
Como serão os acusados levados diante o Tribunal?
Todos
os Estados Partes no Estatuto estarão obrigados a cumprir com as
ordens e pedidos do TPI. O descumprimento de tais solenes
compromissos será uma violação do direito internacional,
estando o Estado sujeito a fortes pressões para cumpri-los. Por
mais de um século, têm os Estados cumprindo com quase todos os
julgamentos oriundos de cortes internacionais que eles
estabeleceram por tratado, tais como a Corte Internacional de
Justiça na Haia e a Corte Européia de Direitos Humanos, além de
o custo político de recusar-se a fazê-lo ser normalmente tão
alto a ponto de não mais permitir a desobediência. O punhado de
casos em que os Estados recusaram-se a cumprir as sentenças são
notícias de capa.
Alguns
países estão impedidos por suas leis de extraditarem um acusado
de crime de guerra para outro Estado processá-lo. Entretanto,
durante as negociações do Tribunal, muitos países declararam
que seus direitos internos não os impediam de enviar um suspeito
a um tribunal internacional, que seria considerada uma entrega,
e não uma extradição. Outros países indicaram que
mudariam suas leis.
12.
O Tribunal poderá impor a pena de morte?
Coerente com a
proteção internacional dos direitos humanos, o Tribunal Penal
Internacional não tem competência para impor uma pena de morte.
O tribunal pode no máximo impor a privação de liberdade de 30
anos ou a prisão perpétua, quando justificada pela gravidade do
crime. O Tribunal pode, além disso, estipular multas, perda de
vantagens, bens e haveres provenientes do crime.
13.
Quando o Tribunal exercerá a jurisdição sobre os crimes?
A
jurisdição do Tribunal não será retroativa. Somente poderão
ser denunciados crimes cometidos depois da entrada em vigor do
Estatuto, o que ocorrerá depois de 60 ratificações. Depois da
entrada em vigor, o Tribunal terá jurisdição sobre nacionais
dos Estados que ratificaram ou aderiram o tratado. Essa jurisdição
automática representa um grande avanço no direito internacional,
pois no passado a aceitação de jurisdição era, na maioria dos
casos, sujeita a declarações estatais adicionais. No caso de
crimes de guerra, o Estado que se torna parte do Estatuto pode
retirar seu consentimento, por um período de sete anos.
Entretanto, isso não afeta a jurisdição do Tribunal se for
acionada pelo Conselho de Segurança.
O
Tribunal pode exercer sua jurisdição sobre um determinado caso
quando o Estado em cujo território ocorreu o crime ou o da
nacionalidade do acusado for parte do Estatuto. Estados não-partes
podem aceitar a jurisdição do Tribunal sobre uma base ad hoc.
O Tribunal terá
jurisdição sobre casos submetidos pelo Conselho de Segurança
independente de o Estado interessado for parte do Estatuto.
14.
O Tribunal Penal Internacional infringirá a jurisdição de
cortes nacionais?
Não.
O Tribunal Penal Internacional não se superpõe, mas complementa
jurisdições nacionais. Cortes nacionais continuarão a ter
prioridade nas investigações e processamentos de crimes sob suas
jurisdições. Sob o princípio de complementaridade, o Tribunal
Penal Internacional agirá somente quando as cortes nacionais são
incapazes ou indispostas de exercerem suas competências. Se uma
corte nacional dispõe-se e é capaz de exercer sua competência,
o Tribunal Penal Internacional não pode intervir nem os nacionais
daquele Estado poderão ser levados até ele. Os
requisitos para admitir um caso no Tribunal são
especificados no Estatuto e as circunstâncias de incapacidade ou
indisponibilidade são cuidadosamente definidas, a fim de evitar
decisões arbitrárias. Ademais, o acusado e os Estados
interessados, se forem partes no Estatuto ou não, podem impugnar
a competência do Tribunal ou a admissibilidade do caso concreto.
Eles têm também o direito de recorrer de qualquer decisão
mencionada.
15.
O Tribunal violará o direito internacional por ter jurisdição
sobre membros de forças nacionais ou de missões de manutenção
da paz? Isso não provocará a indisposição dos Estados em
participar de operações de manutenção da paz?
Não. De acordo
com o atual direito internacional, o Estado em cujo território são
cometidos genocídios, crimes de guerra ou crimes contra a
humanidade, ou cujos nacionais são vítimas desses crimes, tem o
direito e está legalmente obrigado a investigar e processar os
acusados de cometerem tais crimes. O Estatuto do Tribunal não
viola nenhum princípio do direito dos tratados e não criou
nenhuma obrigação jurídica ou direito que já não existisse no
direito internacional. A cooperação dos Estados não-partes é
puramente voluntária e nenhuma obrigação lhes é imposta.
O
Estatuto do Tribunal prevê uma proteção especial para pessoas
em operações de paz ao proibir ataques deliberados contra o
pessoal, instalações, material, unidades ou veículos envolvidos
em assistência humanitária ou missões de manutenção da paz.
Tais violações constituem crimes de guerra e, sob determinadas
circunstâncias, também crimes contra a humanidade. Além disso,
o Estatuto não afeta acordos existentes, por exemplo, a respeito
de missões de manutenção da paz da ONU, desde que os países de
envio de tropas continuem a manter a jurisdição penal sobre seus
membros em cada missão.
16.
Que papel terá o Conselho de Segurança da ONU no trabalho do
Tribunal?
O
trabalho do Conselho de Segurança e o do Tribunal Penal
Internacional serão complementares. O Estatuto do Tribunal
reconhece o papel do Conselho de Segurança na manutenção da
segurança e da paz internacionais sob a égide da Carta da ONU ao
aceitar que o Conselho de Segurança, agindo nos termos do Capítulo
VII da Carta, poderá denunciar uma “situação” ao Tribunal
quando um ou mais crimes previstos no Estatuto pareçam terem sido
cometidos. Isso será uma base para o Procurador iniciar um inquérito.
Desde
que a denúncia de uma situação feita pelo Conselho de Segurança
é baseada em sua competência sob o Capítulo VII, que é obrigatório
e legalmente executável em todos os Estados, o exercício da
jurisdição do Tribunal torna-se parte das medidas impostas. Essa
jurisdição torna-se obrigatória independente se é parte do
Estatuto o Estado em cujo território ocorreram os crimes ou o
Estado de nacionalidade do acusado. Nesses casos, o Tribunal Penal
Internacional, mediante o inquérito e o processo, auxilia o
Conselho de Segurança a manter a paz e a segurança. Essa jurisdição,
resultante da denúncia do Conselho de Segurança, aumenta o papel
do Tribunal em fazer cumprir o direito internacional penal. Ao
mesmo tempo, nesses exemplos a jurisdição do Tribunal é
expandida para abranger até mesmo Estados não-partes.
O
Conselho de Segurança ao adotar uma resolução sob o Capítulo
VII da Carta da ONU pode solicitar que o Tribunal suspenda um inquérito
ou processo por um período renovável de 12 meses. Essa suspensão
é para assegurar que os esforços de promover a paz do Conselho
de Segurança não sejam dilatados pelos inquéritos ou processos
do Tribunal.
Com
a intenção de assegurar a independência do Tribunal, a suspensão
do Conselho de Segurança é somente um dos três caminhos para o
Tribunal obter jurisdição: uma matéria também pode ser
provocada por iniciativa de um Estado Parte ou de um Procurador independente.
17.
Quão independente será o Procurador?
Um Procurador
independente, com o poder de iniciar inquéritos quando
suficientes provas apontam violações graves, era amplamente
defendido durante as negociações na Conferência de Roma.
Enquanto dava-se ao Procurador a iniciativa de tais inquéritos,
detalhados dispositivos foram incluídos no Estatuto para
assegurar uma apropriada balança de poder a respeito dessa função.
Em primeiro lugar, o Procurador deve analisar se os Estados
estejam dispostos e sejam capazes de levar a cabo seus próprios
inquéritos. Antes de
iniciar um inquérito, é necessário o Procurador submeter todo o
material probatório e obter a permissão para seguir adiante ao
Juízo de Instrução, composto por três juízes. O suspeito e os
Estados interessados também têm o direito de impugnar a competência
do Tribunal ou a admissibilidade do caso antes ou após começar o
julgamento. Essas medidas dão ampla oportunidade para assegurar
que o caso é significante e justifica o inquérito e o
processamento pelo Tribunal.
O
Procurador será eleito por votação secreta pela Assembléia dos
Estados Partes e deve reunir rigorosas qualificações: ela ou ele
devem possuir o mais alto caráter moral, competência e experiência
em processar ou julgar casos criminais. Não será tolerado que o
Procurador participe
de algum caso em que sua imparcialidade esteja posta em dúvida.
Qualquer questão concernente à desqualificação será decidida
pelo Juízo de Recursos do Tribunal. A Assembléia dos Estados
Partes tem o poder de remover o Procurador se acreditar que ela ou
ele cometeram faltas graves ou descumpriram gravemente das funções.
18.
Quais garantias há que os suspeitos receberão o devido processo
legal e um julgamento
justo?
O Estatuto do
Tribunal criou um verdadeiro sistema de justiça penal
internacional. Ele proporcionará juízes qualificados e
imparciais, devido processo legal e julgamentos justos aos indivíduos
acusados de crimes submetidos à jurisdição do Tribunal. O
Estatuto reconhece uma série completa de direitos ao acusado,
inclusive alargando o padrão requerido pela maioria dos
instrumentos de direitos humanos.
Há
algumas vantagens particulares no Estatuto. Uma delas é o
mecanismo de monitoramento entre o órgão investigativo ou de
processamento e o órgão judicial do Tribunal, que é designado
para proteger indivíduos inocentes de processos penais ou inquéritos
frívolos, vexatórios ou politicamente motivados. Ademais, as
pessoas encarregadas de tomar decisões a respeito de iniciar um
inquérito penal ou julgar devem possuir elevadas qualificações
de competência, independência e imparcialidade.
Por
fim, o Estatuto também contém elaborados dispositivos (cerca de
60 artigos) sobre princípios de direito penal, inquérito,
processo, julgamento, cooperação, assistência judicial e execução
da pena. Esses dispositivos representam a harmonização de
divergentes e por vezes diametralmente opostos procedimentos e
direitos penais nacionais. Foi uma importante proeza o fato de o
acordo ter versado sobre matérias tão técnicas.
19.
Como garantir que os juízes serão qualificados e imparciais?
Quais salvaguardas foram incluídas para prevenir influências políticas
externas no Tribunal?
O
Tribunal terá 18 juízes, que devem possuir alto nível de competência
profissional, alta consideração moral, imparcialidade e
integridade e devem possuir qualificações exigidas em seus
respectivos Estados para ocupar as mais altas funções ou para
fazerem parte da Corte Internacional de Justiça. Eles devem também
ser independentes no desempenho de suas funções, não se
envolvendo em nenhuma atividade que possa interferir em suas funções
judiciais ou afetar a confiança em sua independência.
Cada
juiz deve ter competência em direito penal e direito processual
penal e a necessária experiência em processos penais, ou competência
em matérias relevantes de direito internacional, tais como o
direito internacional humanitário e direitos humanos. Para
assegurar que a composição será verdadeiramente equilibrada e
universal, as eleições devem relevar a necessidade de representação
dos principais sistemas jurídicos do mundo e garantir a inclusão
de juízes com representativa distribuição geográfica, uma
equilibrada representação feminina e masculina na magistratura e
a inclusão de juízes especializados em violência contra crianças
e mulheres. Não poderá haver dois juízes de mesma nacionalidade
e somente atuarão por um mandato de nove anos. Eles serão
eleitos em escrutínio secreto por maior número de votos, com
maioria de dois terços dos Estados Partes presentes e votantes.
Um juiz pode ser removido de suas funções se ele ou ela cometeu falta
grave ou descumpriu
gravemente suas funções. Todas essas salvaguardas foram feitas
para assegurar a independência, a integridade e a eficiência, além
de evitar influências políticas externas.
20.
A quem está o Tribunal vinculado? E como isso afetará sua
independência?
Os
Estados Partes supervisionarão o trabalho do Tribunal e farão o
controle de gestão da administração do Tribunal sobre o
Presidente, o Procurador e o Secretário; decidirão sobre o orçamento
do Tribunal; definirão a alteração do número de juízes e
decidirão acerca da falta de cooperação de Estados para com o
Tribunal. Os Estados Partes não podem interferir nas funções
judiciais do Tribunal. Todo litígio referente às funções
judiciais do Tribunal será resolvido por decisão do próprio
Tribunal.
21.
Quais obrigações os Estados que não ratificaram o tratado terão
perante o Tribunal?
Todos
os Estados, partes ou não do Estatuto, são obrigados diante o
atual direito internacional a julgar os responsáveis por genocídio,
crimes contra a humanidade e crimes de guerra em suas próprias
cortes ou extraditá-los par um Estado capaz e disposto a fazê-lo
mediante um julgamento justo. Além disso, em Dezembro de 1973, a
Assembléia Geral da ONU adotou os Princípios de cooperação
internacional na identificação, detenção, extradição e punição
de pessoas responsáveis por crimes de guerra e crimes contra a
humanidade na Resolução 3074, declarando que todos os
Estados devem cooperar reciprocamente no plano bilateral ou
multilateral para levar a julgamento os responsáveis por tais
crimes.
Não
há um expresso dispositivo no Estatuto requerendo a cooperação
geral dos Estados não-partes. Entretanto, o TPI pode convidá-los
a cooperar mediante um acordo ad hoc. Se os Estados optam
por celebrar tais acordos, eles estarão obrigados a cumprir com
os pedidos de auxílio. Ademais, se o Conselho de Segurança
submeter uma situação para o TPI, a qual implica uma ameaça à
paz e segurança internacionais, ele pode usar os poderes do Capítulo
VII da Carta da ONU para compelir os Estados não-partes a
cooperar com os pedidos de auxílio do TPI.
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As
informações contidas nesse documento derivam de documentos do
Departamento das Nações Unidas de Informações Públicas, da
Anistia Internacional e do Comitê de Advogados pelos Direitos
Humanos. Esse foi um produto do Secretariado do CICC e não
necessariamente representam os pontos de vista dessas organizações.
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