
O Tribunal Penal Internacional e sua
Importância
para os Direitos Humanos
Tarciso Dal Maso Jardim
1. A
criação do Tribunal Penal Internacional – TPI: marco diplomático
O TPI foi criado
na “Conferência Diplomática de Plenipotenciários
das Nações Unidas sobre o Estabelecimento de um
Tribunal Penal Internacional”, realizada na cidade
de Roma, entre os dias 15 de junho a 17 de julho
de 1998. Precisamente, essa criação ocorreu no
último dia da Conferência, mediante a aprovação
do Estatuto do Tribunal (“Rome Statute of the
International Criminal Court”, doravante Estatuto),
que possui a natureza jurídica de tratado e entrará
em vigor após sessenta Estados manifestarem o
consentimento em vincularem-se ao TPI (art. 126
do Estatuto), de acordo com suas normas de competência
interna para a celebração de tratados.
Haveria alguma previsão para o
Tribunal começar suas atividades? Evidentemente, não podemos prever,
mas apenas lembrar que a Convenção de “Montego Bay”, sobre o
direito do mar, também previa o quorum de sessenta Estados e levou doze
anos para entrar em vigor (de 1982 a 1994). Cremos que o Estatuto do
Tribunal pode entrar em vigor em um período bem inferior a doze anos,
principalmente pela atuação das Organizações Não-Governamentais e
pelo clamor internacional diante incessantes atentados à consciência
da humanidade. Atualmente, seis Estados ratificaram o Estatuto e noventa
e quatro já assinaram-no (o que significa que acordaram com o texto
final do mesmo e irão submetê-lo a procedimentos internos que
objetivam o comprometimento do Estado em relação a esse tratado). O
Brasil, no último dia 7 de fevereiro, justamente foi o nonagésimo
quarto Estado a assinar.
Com futura sede em Haia – Holanda
(art. 3º do Estatuto), o Tribunal terá personalidade jurídica
internacional, podendo exercer sua capacidade jurídica para o
exercício de suas funções e para a manutenção de suas finalidades
(art. 4º do Estatuto), o que inclui a possibilidade de celebrar
tratados com outras organizações internacionais ou com Estados.
2. A importância do TPI
Desde o fim da Primeira Guerra Mundial
pretende-se consagrar a responsabilidade penal internacional, quando o
Tratado de Versalhes clamou, sem sucesso, pelo julgamento do Kaiser
Wilhelm II, por ofensa à moralidade e à inviolabilidade dos tratados,
e o Tratado de Sèvres, jamais ratificado, previa a responsabilidade do
Governo Otomano pelo massacre dos armênios. As razões para essa
pretensão não eram imparciais ou universais, mas unilaterais, fundadas
em um critério principal: só o vencido pode ser julgado. Esse
critério também seria o instituído, de maneira preliminar, pelo
Acordo de Londres (“London Agreement”)
e pelo “Control Council Law N. 10”
ao estabelecerem o chamado Tribunal de Nuremberg. Com isso,
evidentemente, não se pretende defender que não houvesse o julgamento
de nazistas como Hermann Göring, Rudolf Hess, Joachim von Ribbentrop,
Erich Raeder, entre os 24 primeiros a serem julgados (a partir de 20 de
novembro de 1945, sob a égide do “London Agreement”), ou o
julgamento de médicos que produziam experiências em campos de
concentração, entre os outros 185 indivíduos julgados, nos próximos
12 julgamentos que seguiram (sob a égide do “Control Council Law N.
10”). Também não se pretende abonar japoneses julgados pelo segundo
Tribunal Militar Internacional instituído após a
Segunda Guerra Mundial. Defende-se, ao contrário,
a inexistência de seletividade na condução de julgamentos e atitudes
internacionais, bem como lembrar que o princípio da reciprocidade não
deve ser aplicado na esfera da proteção internacional da pessoa
humana. Assim, os responsáveis pelo lançamento de armas nucleares
sobre Hiroshima e Nagasaki ou pela manutenção dos “Gulags”
deveriam, também, serem julgados, além de outros criminosos de ambos
os lados.
Um ano antes da última sessão do
Tribunal do Japão, a Assembléia Geral das Nações Unidas solicitou à
CDI, mediante a resolução nº 177 (II), de 21 de novembro de 1947, que
formulasse os princípios de direito internacional reconhecidos pelos
instrumentos e julgamentos do Tribunal de Nuremberg, bem como preparar
um “draft” de Código de ofensas contra a paz e segurança da
humanidade. Em 1950 a CDI adotou a formulação desses princípios,
submetendo à Assembléia Geral, e em 1954 submeteu o projeto de
Código, sendo esse último inviabilizado por não haver acordo sobre a
definição de agressão — resolução nº 897 (IX) de 4 de dezembro
de 1954. O consenso sobre a definição de agressão só aconteceria
vinte anos depois, com a resolução da Assembléia nº 3314 (XXIX), de
14 de dezembro de 1974, mas a viabilidade política da instalação da
responsabilidade penal só seria realidade no final do século XX, após
muitos relatórios e resoluções. Entretanto, importantes instrumentos
internacionais sobre essa temática foram elaborados nessa segunda
metade de século, como, por exemplo, a “Convenção para a
Prevenção e a Sanção do Delito de Genocídio” (1948), as quatro
Convenções de Genebra sobre o direito humanitário (1949) e seus dois
protocolos adicionais (1977), a “Convenção sobre a
Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes de Lesa Humanidade”
(1968) e os “Princípios de Cooperação Internacional para
Identificação, Detenção, Extradição e Castigo dos Culpáveis de
Crimes de Guerra ou de Crimes de Lesa Humanidade” (1973).
Mas, afinal, qual a importância desse
longo processo de formulação de um Tribunal Penal Internacional
permanente? Em resposta à essa indagação, a ONG nova-iorquina “Lawyers
Comittee for Human Rights” apontou seis pontos. Primeiro, acabar com a
impunidade dos grandes violadores dos direitos da pessoa humana, em
termos repressivos e preventivos. Segundo, proporcionar a
reconciliação social e a tranqüilidade e confiança às vítimas,
suas famílias, e à comunidade afetada, mediante a investigação e o
julgamento dos responsáveis pelos crimes internacionais. Terceiro,
sanar possíveis insucessos de Cortes Nacionais, que deixam impunes os
criminosos, principalmente quando esses são autoridades políticas ou
militares, o que se verifica com freqüência em casos de crimes de
guerra ou de desestruturação do sistema legal interno. Quarto,
remediar limitações políticas e jurídicas inerentes aos tribunais
internacionais criminais ad hoc,
como a instalação em alguns casos e não em outros, o viés político
das escolhas do Conselho de Segurança para instaura-los (além do
questionamento de sua autoridade para tanto) e o perigo do excesso de
tribunais instaurados (“tribunal fatigue”), sem consistência na
interpretação e aplicação do direito internacional, já que são
criados para um situação específica e com um corpo de juizes
distinto. Quinto, criar um mecanismo com poder para condenar pessoas que
ofendem gravemente os direitos humanos e o direito humanitário. E, por
fim, o sexto ponto seria tornar o Tribunal Penal Internacional um modelo
de justiça penal e de julgamento justo, constituindo um patamar
institucional (“standard-setting institution”) para a
implementação interna ou internacional das normas de proteção da
pessoa humana.
Os pontos argumentativos levantados
pelo “Lawyers Comittee” são de extrema pertinência, mas a
eficácia das argumentações dependerá de uma série de fatores, como
a dificuldade de atingir a ratificação universal do Estatuto. Creio,
independente disto, que a criação do TPI, mediante a participação
equânime dos Estados em uma conferência internacional e não por ato
unilateral do Conselho de Segurança ou de vencedores de conflitos, é
um marco na história do direito internacional e da diplomacia. Trata-se,
realmente, de uma oportunidade de acabar com a seletividade na
determinação de quem são os criminosos; de eliminar de forma
definitiva o argumento de competência nacional exclusiva em matéria de
proteção internacional da pessoa humana; de evitar ou sancionar o
terrorismo estatal em matéria de direitos humanos e de direito
humanitário, geralmente aliciados por atos de poder internos, como
repressão militar ou leis de anistia; de constituir no plano
internacional, na matéria em tela, um suporte aos métodos de
supervisão e investigação e um aprimoramento dos sistemas de
petição ou comunicação; de representar o complemento dos sistemas
regionais de direitos humanos (como o interamericano); de frear atitudes
desumanas durante conflitos armados; de ser base para o princípio da
legalidade ou simbolicamente representar o rechaço às grandes
violações à dignidade humana.
3. A diferença entre a jurisdição universal e a
do TPI
A jurisdição universal consiste, a
princípio, na possibilidade de a jurisdição interna poder julgar
crimes de guerra ou contra a humanidade cometidos em territórios
alheios. Trata-se, portanto, de extraterritorialidade, que pode ser
admitida em razão de o criminoso (ver art. 7º, II, b, do Código Penal brasileiro)
ou as vítimas serem nacionais ou residentes (ver art. 7º, §3º, do
CP), ou o local do crime possuir regime internacional (pirataria em alto
mar, por exemplo, ver art. 7º, II, c, do CP), ou o crime atingir interesses nucleares do Estado (ver
art. 7º, I, a, b e c, do CP) ou, por fim,
se os fatos envolverem violações graves ao direito internacional,
atingindo a consciência universal (ver art. 7º, I, d, e II, a, do CP). A jurisdição
universal seria a admissão desta última hipótese, independente se no
crime estão envolvidos nacionais ou interesses internos. No Brasil, o
art. 7º, II, a, do CP seria
expressão da jurisdição universal, ao admitir que estão sujeitos à
lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro, os crimes que, por
tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir.
A jurisdição universal tem sido
admitida desde o fim da Segunda Guerra Mundial, quando as cortes dos
Aliados passaram a julgar os crimes de guerra e contra a humanidade
cometidos durante o grande conflito (Austrália, Canadá, Israel, Reino
Unido, por exemplo, julgaram muitas pessoas), sendo atualmente admitida
para muitos outras situações. O caso recente mais célebre é, sem
dúvida, o do general Pinochet, quando se admitiu que a tortura é um
crime internacional e que a Convenção contra a Tortura
conferiu jurisdição universal a seus Estados partes.
Segundo a Anistia Internacional, a
prática da jurisdição universal pelos Estados seria de extrema
importância para preencher vácuos deixados pelo Estatuto do TPI.
Lembre-se que o art. 12 do Estatuto consagrou, como condição prévia
ao exercício da competência do TPI, a necessidade de ser parte do
Estatuto (art. 12, 2, a) o
Estado em cujo território, incluindo navios ou aeronaves por ele
matriculados, teve lugar a conduta ou (art. 12, 2, b) o Estado a que pertença o
acusado do crime. Tais restrições só se aplicariam para as hipóteses
de o Estado comunicar ao
Promotor uma situação que envolveria crimes, de competência do TPI
(art. 13, a do Estatuto), ou o
próprio Promotor instaure um inquérito (art. 13, c do Estatuto). Se for o Conselho
de Segurança que comunicar ao Promotor uma situação, entretanto, tal
ato estará sob a égide do capítulo VII da Carta das Nações Unidas,
o que significa abrangência universal (não esqueça que tal poder
possibilitou a criação dos tribunais ad hoc para Ruanda e
Ex-Iugoslávia). Além disso, um Estado não Parte pode, mediante
declaração, aceitar a jurisdição do TPI para casos específicos
(art. 12, 3, do Estatuto).
De qualquer forma, há um vácuo, pois
o Conselho de Segurança age sob seletividade política. A proposta da
República da Coréia, não aprovada in toto na Conferência de Roma, envolveria também as alternativas,
como condição ao exercício de jurisdição, de a vítima ser nacional
de um Estado Parte ou, ainda, se o suspeito estiver sob custódia em um
Estado Parte. Entretanto, como tais alternativas não foram aprovadas,
defende a Anistia Internacional a jurisdição universal.
Ademais, o TPI é complementar às
jurisdições penais nacionais (preâmbulo e art. 1º do Estatuto). A
jurisdição não retroativa
do TPI está submetida, em nome da complementaridade, a requisitos de
admissibilidade. Esse mecanismo concede, como é de praxe no direito
internacional, a oportunidade de as cortes internas solucionarem o caso
de forma satisfatória. As autoridades e cortes nacionais terão a
responsabilidade primária de investigar e solucionar o caso.
Entretanto, se o Estado não for capaz ou não esteja disposto a levar a
cabo a investigação ou o processo, ou teve o propósito de não
responsabilizar penalmente o acusado, o TPI poderá exercer sua
jurisdição, desde que o caso seja grave (ver art. 17 c/c 20 do
Estatuto). Na verdade, como veremos, a competência material do TPI gira
somente sobre crimes considerados graves.
Incapacidade ou impossibilidade para
investigar ou processar determinado caso significa, segundo o parágrafo
3º do art. 17, que o Estado não pode, devido ao colapso total ou
substancial de seu sistema judiciário nacional ou por indisponibilidade
deste, fazer comparecer o acusado, reunir os meios de prova e os
depoimentos necessários ou não está, por outras razões, em
condições de levar a cabo o processo. Já a verificação da vontade
de agir ou não, em determinado caso, depende de o processo ter o
propósito de não responsabilizar penalmente a pessoa em questão por
crimes de competência do TPI (impunidade); ou de demora injustificada
no processo ou de ausência de independência e imparcialidade, em ambos
relevando as circunstâncias fáticas (parágrafo 2º do art. 17).
4.
A competência material do TPI: da política da intencionalidade
a conquistas parciais das Organizações Não-Governamentais
4.1.
Crime de genocídio
O século XX transborda violências
contra massas. Como pontuou Hobsbawn,
“[...] o mundo acostumou-se à expulsão e matança
compulsórias em escala astronômica, fenômenos tão conhecidos que foi
preciso inventar novas palavras para eles: “sem Estado” (“apátrida”)
ou “genocídio”. A Primeira Guerra Mundial levou à matança de um
incontável número de armênios pela Turquia – o número mais
habitual é de 1,5 milhão –, que pode figurar como a primeira
tentativa moderna de eliminar toda uma população. Foi seguida depois
pela mais conhecida matança nazista de cerca de 5 milhões de judeus
[..]”
Independente dos números, que ainda
permanecem em discussão, a destruição étnica apavorou a humanidade.
Não é por acaso que o genocídio foi uma das principais preocupações
após a Segunda Guerra Mundial, sendo tal animus convertido em instrumento
internacional em 9 de dezembro de 1948: a “Convenção para a
Prevenção e a Sanção do Delito de Genocídio”.
Essa Convenção, em seu Art. 2º, identifica o genocídio em qualquer
ato, em tempo de paz ou de guerra,
com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional,
étnico, racial ou religioso, tal como o assassinato ou dano grave à
integridade física ou mental de membros do grupo; subjugação
intencional do grupo a condições de existência que lhe ocasione a
destruição física total ou parcial; medidas destinadas a impedir os
nascimentos no seio do grupo e a transferência forçada de crianças do
grupo para outro grupo.
No estudo de especialistas sobre a
implementação de instrumentos como a Convenção Internacional sobre a
Eliminação e a Punição do Crime do Apartheid, incluindo a idéia de
estabelecer um tribunal internacional, divide-se os
instrumentos conexos com essa Convenção de 1973 em duas categorias. A
primeira composta por instrumentos que declaram direitos humanos
específicos sob a égide do direito internacional dos direitos humanos,
como a Declaração Universal dos Direito do Homem, o Pacto
Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção
Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
Racial. A segunda categoria englobaria convenções que implicariam criminalizar violações de
direitos humanos nos direitos internos, investigar os violadores ou
alternativamente prever a extradição; inclusive algumas considerando
condutas como crime sob o direito internacional. Nessa última categoria
seriam exemplos as Convenções de Genebra sobre o direito humanitário
e a Convenção de 1948 sobre o genocídio. Entretanto, as semelhanças
entre a Convenção sobre o Apartheid de 73 e a do Genocídio de 48 não
se concentram somente no fato de pertencerem a mesma categoria, segundo
os “experts”, mas também por vaticinarem a criação de um tribunal
penal internacional nos artigos V e VI respectivamente.
Antes da Conferência de Roma, apesar
de um grande número de delegações apoiarem o conceito da Convenção
de 1948, houve a crítica de que essa tipificação era limitada.
Primeiro, por não incluir a proteção de grupos sociais e políticos,
ou de grupos destacados de um grupo, em que não há homogeneidade (por
exemplo, as elites culturais), embora houvesse o reconhecimento da
conexão dessa extensão conceitual com Crimes de Lesa Humanidade. Outra
sugestão seria esclarecer, como elemento de caracterização, a
intenção específica de quem planeja ou decide da intenção genérica
ou conhecimento de quem comete atos de genocídio, pois a dificuldade da
prova sobre esses elementos de intencionalidade concederia argumento a
dirigentes ou a quem obedece ordens. Então foi sugerido, de um lado,
que “a intenção de destruir um grupo, total ou parcialmente”,
fosse considerada como sendo a intenção concreta de destruir além de
um grupo reduzido de pessoas, analisando-se a escala da ofensa ou o
número de vítimas. Ou, de outro lado, que a questão da
intencionalidade fosse trabalhada genericamente para todos os crimes.
Ademais, houve a observação a respeito de estender a idéia da alínea
“e”, sobre a transferência de crianças de um grupo a outro,
também para transferências de pessoas em geral, não esquecendo de
incluir a idéia de membros de um grupo particular.
De qualquer forma, por ser admitida
como norma costumeira (idéia consolidada na Corte Internacional de
Justiça) e incluída em muitas
legislações internas, durante as reuniões preparatórias a
Conferência de Roma o crime de genocídio foi discutido por
representações governamentais com base na referida Convenção. E as
principais considerações das delegações acabaram sendo ligadas a
clarificações de termos, como o significado de destruição “em
parte” de um grupo, de lesões mentais
e de medidas destinadas a impedir nascimentos (sugeriu-se os
termos “preventing births within the group”).
Entretanto, apesar dessas discussões,
consagrou-se os termos da Convenção de 1948 no artigo 6º do Estatuto,
como uma espécie de presente pelo cinqüentenário da mesma.
4.2. Crimes de Lesa Humanidade
A origem do termo “crimes against
humanity”, aqui traduzido por Crimes de Lesa Humanidade, está ligado,
curiosamente, ao caso de genocídio dos armênios, provocado pelos
turcos na Primeira Guerra Mundial, que Hobsbawn colocou como sendo a
primeira tentativa moderna de eliminar toda uma população. Refiro-me
à Declaração para o Império Otomano, feita pelos governos russo,
francês e britânico em maio de 1915 (Petrogrado), qualificando o
massacre como crimes da Turquia contra a humanidade e a civilização.
Posteriormente, esse conceito de forma gradativa assume o caráter de
norma costumeira, de caráter imperativo (jus cogens), reportando-se a
graves violações da dignidade humana. O Tribunal de Nuremberg
reconheceu esse tipo de violações, confirmado sobre a forma de
princípio pela resolução da Assembléia Geral na resolução 95 (I)
de 11 de dezembro de 1946.
Em relação ao TPI, o §1º, do art.
7º do Estatuto, dispõe que por Crimes de Lesa Humanidade teríamos os
seguintes atos: a. assassinato; b. extermínio; c. escravidão; d.
deportação ou traslado forçado de populações; e. encarceramento ou
outra privação grave da liberdade física em violação de normas
fundamentais de direito internacional; f. tortura; g. violação,
escravidão sexual, prostituição forçada, gravidez forçada,
esterilização forçada ou outros abusos sexuais de gravidade
comparada; h. perseguição de um grupo ou coletividade com identidade
própria fundada em motivos políticos, raciais, nacionais, étnicos,
culturais, religiosos, de gênero ou outros motivos universalmente
reconhecidos como inaceitáveis pelo direito internacional, em conexão
com qualquer ato mencionado no presente parágrafo ou com qualquer crime
de competência do Tribunal; i. desaparecimento forçado de pessoas;
j. “apartheid”; k. outros atos desumanos de caráter similar que
causem intencionalmente grandes sofrimentos ou atentem gravemente contra
a integridade física ou à saúde mental ou física. Esses atos, para
serem considerados como um Crime de
Lesa Humanidade, devem ser cometidos como parte de um ataque
generalizado ou sistemático contra uma população civil e com o
conhecimento de tal ataque, conforme prescreve o §1º, do art. 7º do
Estatuto. Já o §2º, do mesmo artigo, aclara que por “ataque contra
uma população civil” entende-se uma linha de conduta que implique a
comissão múltipla de atos, mencionados no §1º, contra uma
população civil, sendo tais atos cometidos ou promovidos por
políticas de um Estado ou de uma organização.
Esse conceito de Crime de Lesa
Humanidade, cujos termos já estavam presentes no pacote de acordos do
dia 6 de julho de 1998, passou também por muitas controvérsias. O
Projeto Final de Estatuto sintetizava tais controvérsias em duas
opções, repletas de colchetes. A primeira opção afirmando que é
crime de lesa humanidade qualquer dos atos (enumerados nas alíneas) que
se cometam: [como parte da comissão generalizada [e] [ou] sistemática
de tais atos contra qualquer população]. E a segunda opção: [como
parte de um ataque generalizado [e] [ou] sistemático contra uma
população [civil] [em escala maciça] [em um conflito armado] [por
motivos políticos, filosóficos, nacionais, étnicos ou religiosos ou
por qualquer outro motivo arbitrariamente definido]. Os pontos
específicos, que estavam sendo discutidos sobre o conceito de crime de
lesa humanidade, poderiam ser traduzidos nas seguintes indagações:
Conceituar ou não o que se entende por “generalizado” e “sistemático”?
Essa categoria de crimes seria aplicada para situações de paz e de
guerra? Incluir ou não motivações para conceituar essa categoria de
crimes?
O conceito final, consagrado no Art. 7
do Estatuto, é, em parte, produto dessas controvérsias. O conceito de
“ataque contra uma população civil”, exposto na alínea “a”,
do §2º do Art. 7, é a síntese dos conceitos de generalizado (“widespread”)
e sistemático (“sistematic”) trabalhados nas reuniões
preparatórias (ver, por exemplo, o Relatório do Comitê Preparatório,
volume II, compilação de propostas).
Por “generalizado” entendia-se o ataque maciço em natureza e
dirigido contra um grande número de pessoas. Por “sistemático”
entendia-se o ataque constituído, ao menos em parte, por atos cometidos
ou promovidos por uma política ou um plano, ou por uma prática
repetida por um período de tempo. Ora, o conceito de generalizado está
assegurado na chamada “comissão múltipla de atos” e, por sua vez,
o conceito de sistemático está consagrado no que se chamou de “linha
de conduta” ou de “atos cometidos ou promovidos por políticas de um
Estado ou de uma organização”. Então, embora o conceito do §1º,
do Art. 7 do Estatuto, enquadra o crime de lesa humanidade a partir de
atos cometidos como parte de um ataque “generalizado” ou “sistemático”, na
realidade deve ser entendido como parte de um ataque “generalizado” e “sistemático”, pois é o
que se infere da alínea “a”, do §2º do Art. 7 do Estatuto.
Outra questão seria se tal crime
ocorre em época de paz ou também em de guerra. Creio que a
possibilidade de se cometer esse tipo de crime reporta-se a qualquer
situação, desde que as vítimas sejam civis, e não militares. Para
estes últimos, tem-se a proteção em relação aos crimes de guerra (Art. 8 do
Estatuto). Embora o direito internacional não proteja somente militares
fora de combate, seu plano de proteção possui lógica e níveis
diferentes da proteção dos direitos humanos, no Estatuto representada
especialmente pelo Crimes de Lesa Humanidade. Vejam que o Tribunal Penal
Internacional significa um ponto de união entre os direitos humanos e o
direito humanitário, fato que também se comprova pela inclusão, na
competência desse Tribunal, dos crimes de guerra ocorridos em conflitos
internos, e não somente em conflitos internacionais.
A última questão, diz respeito a
motivações específicas (políticas, filosóficas, de nacionalidade,
étnicas ou religiosas ou por qualquer outra arbitrariamente definida)
que, felizmente, não foram incluídas no Estatuto. Entretanto, tem-se
no Art. 7 do Estatuto os indesejáveis termos “com o conhecimento do
ataque”, no caso, generalizado ou sistemático contra uma população
civil. Seria o conhecimento do plano ou da política estatal ou de uma
organização? Seria o conhecimento de todos os crimes envolvidos na
noção de “generalizado”? Do nosso ponto de vista, esse conteúdo
do crime de lesa humanidade deve ser deslocado para a análise dos
elementos subjetivos do crime. O Art. 30 do Estatuto, que versa sobre
tais elementos de intencionalidade, determina que os elementos materiais
do crime devem ser cometidos com intenção e conhecimento, sendo esse
último definido como a consciência de que as circunstâncias existem
ou que a conseqüência ocorrerá no curso ordinário dos fatos.
4.3.
Crimes de Guerra
Os crimes de guerra são, sem dúvida,
preocupações milenares que confluem, hoje, no estabelecimento de um
TPI. Timothy McCormack, por exemplo, demonstra que desde o século VI
a.C., com o guerreiro chinês Sun Tzu, há preocupações com o
comportamento dos beligerantes no conflito. O Código de Manu (direito
hindu feito cerca de 200 a. C.), por exemplo, é emblemático ao fixar
armas proibidas (como flechas envenenadas) ou pessoas que não deveriam
ser mortas (como espectadores).
O Estatuto, em seu artigo 8, consagra
esta longa evolução do direito internacional humanitário que, desde o
século passado, vem sendo impulsionado pelo Comitê Internacional da
Cruz Vermelha. Os crimes
aqui mencionados são, primeiro, as chamadas “infrações graves”
consagradas nas quatro Convenções de Genebra de 12 de agosto de 1949;
segundo, outras violações graves a leis e costumes pertinentes a
conflitos armados internacionais e, terceiro, violações graves em
conflitos de caráter não internacional.
Para o primeiro grupo, as infrações graves
seriam: i. homicídio doloso; ii. tortura ou tratamento
desumano, inclusive as experiências biológicas; iii. provocar grandes sofrimentos ou atentar gravemente contra a
integridade física ou a saúde; iv.
a destruição e a apropriação de bens, não justificadas por
necessidades militares e executadas de maneira ilícita e arbitrária; v. compelir um prisioneiro de guerra ou outro indivíduo protegido a
servir em forças inimigas; vi.
privar um prisioneiro de guerra ou outro indivíduo dos direitos de um imparcial e
regular julgamento; vii. submeter à deportação, transferência ou confinamento
ilegais e; viii. tomar
reféns.
Para o segundo, as violações seriam: i. dirigir ataques contra a
população civil enquanto tal ou civis que não participem diretamente
das hostilidades; ii. dirigir
ataques contra bens civis; iii.
dirigir ataques contra pessoal, instalações, material, unidades ou
veículos participantes de uma missão de manutenção da paz ou de
assistência humanitária, em conformidade com a Carta das Nações
Unidas; iv. lançar ataque sabendo que causará perdas de vidas, lesões em
civis ou danos a bens de caráter civil ou danos extensos, duradouros e
graves ao meio ambiente que sejam excessivos em relação à vantagem
militar geral, concreta e direta prevista; v. atacar ou bombardear, por
qualquer meio, cidades, aldeias, povoados ou prédios que não estejam
defendidos e que não sejam objetivos militares; vi. causar a morte ou lesões a um inimigo que tenha deposto as
armas ou não tenha meios de defesa; vii. utilizar de modo indevido a
bandeira branca, a bandeira ou as insígnias militares ou o uniforme do
inimigo ou das Nações Unidas, bem como os emblemas previstos nas
Convenções de Genebra, e causar assim a morte ou lesões graves; viii. transferência pela
Potência ocupante de parte de sua população para o território que
ela ocupa, ou a deportação ou transferência de toda ou parte da
população do território ocupado; ix. fazer ataque a prédios
destinados ao culto religioso, às artes, às artes, às ciências ou à
beneficência, monumentos históricos, hospitais e lugares onde se
agrupam doentes e feridos, sempre que não sejam objetivos militares; x. submeter indivíduos da parte
adversária a mutilações físicas ou experiências médicas ou
científicas de qualquer tipo, que não estejam associadas a tratamento
médico, dental ou hospitalar, nem levadas a cabo em seu interesse e que
causem mortes ou ponham em risco a saúde de tais indivíduos; xi. matar ou ferir de modo
traiçoeiro os inimigos; xii. declarar que não dará quartel; xiii. destruir ou confiscar bens do inimigo, a menos que as
necessidades da guerra o tornem imperativo; xiv. declarar como abolidos,
suspensos ou inadmissíveis em um tribunal os direitos e ações dos
nacionais da parte inimiga; xv.
obrigar nacionais da parte inimiga a participar de operações bélicas
dirigidas contra o seu próprio país; xvi. saquear uma cidade ou uma
localidade, inclusive quando tomada de assalto; xvii. utilizar veneno ou armas
envenenadas; xviii. utilizar
gazes asfixiantes, tóxicos ou similares ou qualquer líquido, material
ou dispositivo análogo; xix.
utilizar balas que se abram ou amassem facilmente no corpo humano, como
balas de camisa dura que não cubra totalmente a parte interior ou que
tenha incisões; xx. empregar armas, projéteis, materiais e métodos de guerra
(proibidos por emenda – arts. 121 e 123 do Estatuto) que, por sua
própria natureza, causem danos supérfluos ou sofrimentos
desnecessários ou produzam efeitos indiscriminados em violação ao
direito internacional dos conflitos armados; xxi. cometer ultrajes contra a
dignidade de indivíduos, em particular tratamentos humilhantes e
degradantes; xxii. cometer
estupro, escravidão sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, esterilização forçada ou qualquer outra forma de
violência sexual que constitua uma violação grave das Convenções de
Genebra; xxiii. utilizar a
presença de civis e outras pessoas protegidas para que fiquem imunes
às operações militares determinados pontos, zonas ou forças militares; xxiv. dirigir intencionalmente
ataques contra prédios, materiais, unidades e veículos médicos e
contra pessoal que esteja utilizando emblemas previstos nas Convenções
de Genebra, de acordo com o direito internacional; xxv. provocar intencionalmente a inanição da população civil
como método de fazer a guerra, privando-a dos bens indispensáveis para
a sua sobrevivência, inclusive por meio da obstrução intencional da
chegada de suprimentos de socorro, de acordo com as Convenções de Genebra; xxvi. recrutar ou alistar
crianças menores de 15 anos nas forças armadas nacionais ou
utilizá-las para participar ativamente das hostilidades.
O terceiro grupo de crimes, ao lado da
inclusão dos crimes sexuais, constituiu em grande vitória da sociedade
civil internacional em matéria de crimes de guerra, pois inclui as
violações em conflitos armados não internacionais, que atualmente
englobam a maioria dos conflitos. O perfil de vários conflitos
contemporâneos, como o da Ex-Iugoslávia e de Ruanda, são internos e
revelam toda sorte de sérias violações ao direito humanitário, além
de apresentar uma administração de justiça totalmente ineficaz e
indisponível. Lembre que, de um lado, não se deve confundir este tipo
de conflito com situações de distúrbios ou tensões internas, tais
como motins, atos isolados e esporádicos de violência ou outros atos
de caráter similar (art. 8, 2, d
e f) e, de outro lado,
menciona o parágrafo 3º do art. 8 que a previsão deste tipo de crime
não “afetará a responsabilidade que incumbe a todo governo de manter
e restabelecer a lei e a ordem pública no Estado e de defender a
unidade e integridade do Estado por qualquer meio legítimo”.
Feitas estas observações, diga-se que
esta categoria engloba o disposto no art. 3º comum às quatro
Convenções de Genebra e outras violações graves consagradas por
normas ou costumes internacionais. Com base no art. 3º das
Convenções, que é um verdadeiro elo de ligação entre o direito
humanitário e os direitos humanos,
temos: i. atos de violência contra a vida e a integridade corporal, em
particular o homicídio em todas as suas formas, as mutilações, os
tratamentos cruéis e a tortura; ii. os ultrajes contra a dignidade
pessoal, em particular os tratamentos humilhantes e degradantes; iii. a
tomada de reféns; iv. as sentenças condenatórias pronunciadas e as
execuções efetuadas sem julgamento prévio por tribunal constituído
regularmente, que ofereça todas as garantias judiciais geralmente
reconhecidas como indispensáveis.
As demais violações graves
reconhecidas pelo Estatuto para conflitos não internacionais são: i. dirigir intencionalmente
ataques contra a população civil enquanto tal ou contra civis que não
participem diretamente das hostilidades; ii. dirigir intencionalmente ataques contra prédios, material,
unidades e veículos sanitários, e contra pessoal habilitado para
utilizar emblemas previsto nas Convenções de Genebra, de acordo com o
direito internacional; iii.
dirigir intencionalmente ataques contra pessoal, instalações,
material, unidades ou veículos participantes em uma missão de
manutenção da paz ou da assistência humanitária em conformidade com
a Carta das Nações Unidas, sempre que tenham o direito à proteção
outorgada a civis ou bens civis, de acordo com o direito internacional
dos conflitos armados; iv.
dirigir intencionalmente ataques contra prédios dedicados ao culto
religioso, às artes, às ciências ou à beneficência, monumentos
históricos, hospitais e lugares onde se agrupam doentes e feridos,
sempre que não sejam objetivos militares; v. saquear uma cidade ou praça,
inclusive quando tomada por assalto; vi. cometer atos de estupro,
escravidão sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, esterilização forçada e
qualquer outra forma de violência sexual que constitua uma violação
grave dos Convênios de Genebra; vii.
recrutar ou alistar menores de 15 anos nas forças armadas ou
utilizá-los para participar ativamente das hostilidades; viii. ordenar a transferência da
população civil por razões relacionadas com o conflito, a menos de
que assim o exija a segurança dos civis de que se trate ou por razões
militares imperativas; ix.
matar ou ferir a traição um combatente inimigo; x. declarar que não se dará quartel; xi. submeter pessoas que estejam em poder de outra parte no conflito
a mutilações físicas ou a experiências médicas ou científicas de
qualquer tipo que não sejam justificadas em razão de um tratamento
médico, dental ou hospitalar da pessoa de que se trate, nem sejam
levadas a cabo em seu interesse, e que causem a morte ou ponham
gravemente em perigo a sua saúde; xii.
destruir ou confiscar bens do inimigo, a menos que as necessidades da
guerra o tornem imperativo.
Este rol de crimes são em si mesmos
suficientes para justificar este Tribunal, principalmente porque é de
conhecimento de todos que essa tipificação provém de inúmeras
situações reais.
4.4.
Crime de agressão
O crime de agressão sempre causou
polêmica na doutrina e prática internacionais. Primeiro, a discussão girava em
torno da licitude da guerra como meio de solução de controvérsias
internacionais. A
concepção de "guerra justa" de Santo Agostinho, em que seria
melhor os justos subjugarem os malfeitores do que o contrário,
influenciou muito o pensamento ocidental, ao ponto de os humanistas
"cívicos" (como Patrizi e Maquiavel) defenderem a guerra como
uma opção política a ser protagonizada pelos cidadãos, enquanto
dever cívico. Essa ragione di stato seria,
entretanto, contestada pelos humanistas do norte, como Erasmo, para quem
toda a guerra é fraticida.
Segundo, no plano internacional, em tom
de inspiração kantiana, a guerra fora considerada universalmente como
um meio ilícito de solução de controvérsia pelo Art. 2º, §4º, da
Carta das Nações Unidas, embora temos que recordar o precedente do
"Pacto de Briand-Kellog" (1928), de menor alcance.
A discussão da abrangência da
abstenção de recorrer à ameaça e ao uso da força, estabelecida pelo
referido artigo, rendeu várias correntes doutrinárias, como a do
direito de ingerência por razões humanitárias. A confusão se dá porque essa abstenção deve ser, segundo
o Art. 2º, §4º, contra a integridade territorial ou a independência
política de um Estado ou outro modo incompatível com os objetivos das
Nações Unidas. Discute-se, então, exceções à regra, embora
entendemos que o Art. 2º, §3º, resolve a questão ao determinar que
as controvérsias devem ser resolvidas por meios pacíficos, não
ameaçando a paz, a segurança e a justiça. Dessa forma, não haveria
possibilidade de uso unilateral da força por um Estado, resguardando a
legítima defesa e o direito de autodeterminação dos povos, assim como
as faculdades do Conselho de Segurança sob a égide do cap. VII da Carta.
Dentro desse contexto, houve duas
propostas de definição de agressão enquanto crime sob jurisdição do
futuro TPI. Uma das
alternativas define agressão como os atos cometidos por um indivíduo
que, como líder ou organizador, é envolvido no uso de força armada
por um Estado contra a integridade territorial ou independência
política de outro Estado ou em outro modo incompatível com a Carta das
Nações Unidas. A segunda alternativa define o crime de agressão como o
cometido por uma pessoa que está em posição de controle ou é capaz
de dirigir ações políticas ou militares em seu Estado, contra outro
Estado, em infração à Carta das Nações Unidas, recorrendo à força
armada e ameaçando ou violando a soberania estatal, integridade
territorial ou independência política.
Sobre essa última definição, houve a proposta de acréscimo de
infração ao direito internacional costumeiro. Ademais, discute-se o rol de
atos que, a princípio, caracterizaria a agressão. Entre outros, estão as
invasões, ataques, ocupações, bloqueios, permitir acesso para
agressão a um terceiro Estado ou enviar bandos, grupos, mercenários.
A diferença básica entre os dois
conceitos de agressão concentra-se na vinculação estrita aos termos
do Art. 2º, §4º, da Carta (primeira alternativa) ou o acréscimo da
violação à “soberania estatal” a esses termos, que se funda na
definição de agressão dada pela Resolução nº 3314 (XXIX) de 14 de
dezembro de 1974. Se, de um
lado, cremos ser insuficiente esse conceito quando as relações
internacionais são pautadas por coerções econômicas; de outro lado,
várias delegações governamentais sugestionaram não incluir o crime
de agressão, por vários motivos.
Destacamos o argumento de imprecisão da responsabilidade individual
criminal nessa seara. E, também, o argumento de possíveis confusões
entre as funções do futuro TPI e as do Conselho de Segurança.
Por esses fatores foi grande a
polêmica sobre a definição do crime de agressão. Assim, o art. 5º,
§1º, alínea “d”, do Estatuto, prevê o crime de agressão, mas o
§2º do mesmo artigo remete a definição desse crime para futura
emenda (segundo o art. 121 do Estatuto) ou revisão (prevista pelo art.
123 do Estatuto), pois durante a Conferência de Roma não houve
consenso sobre a tipificação desse crime, apenas consolidando de que o
tipo não deve ser contrário com o disposto na Carta das Nações
Unidas.
A controvérsia sobre este tipo de
crime permanece na Comissão Preparatória para o TPI (PrepCom), que
está discutindo os elementos dos crimes e as regras de procedimento e
prova. Nas duas primeiras, realizadas nos dias 16 a 26 de fevereiro e 26
de julho a 13 de agosto de 1999, tem-se três propostas sobre o crime de
agressão: a dos países árabes, a da Alemanha e a da Rússia. A
proposta mais abrangente foi a elaborada pelos países árabes (Bahrain,
Iraque, Líbano, Líbia, Omã, Sudão, Síria e Yemen), para os quais a
agressão envolve da privação da autodeterminação, liberdade e
independência à ameaça e uso de força armada para violar a
soberania, integridade territorial, independência política ou direitos
inalienáveis de outro povo. Este grupo de países elegem, ainda, uma
série de situações específicas de agressão, como bloqueios e uso de
mercenários e grupos irregulares.
No outro extremo está a proposta da Federação Russa que, de um lado,
condiciona esse crime à prévia determinação de um ato de agressão
pelo Conselho de Segurança e, de outro lado, limita o objeto à
concepção, preparação, início e execução de uma guerra de
agressão. Por fim, a Alemanha
propõe um meio termo, ao condicionar o crime de agressão a ataques
armados contra integridade territorial ou independência política de
outro Estado, segundo a Carta das Nações Unidas, ao mesmo tempo que
admite ingerência do Conselho de Segurança na determinação destes
atos. Como vemos, há muito o
que discutir sobre este tema.
5. As posições brasileiras sobre o TPI
Antes de tratar desse assunto, importa
reconhecer que o Ministério das Relações Exteriores estabeleceu
constante diálogo com a sociedade civil desde momentos preparatórios
à Conferência. Refiro-me em especial às respostas deferidas às
demandas da IIIª Conferência Nacional de Direitos Humanos, que teve
nesse particular o Movimento Nacional de Direitos Humanos e o Centro de
Proteção Internacional de Direitos Humanos como representantes. Nesses
contatos preliminares boa parte das reivindicações da sociedade civil
eram contempladas pelo MRE, embora alguns temas polêmicos ainda estavam
indefinidos, como o papel do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Essa boa relação persistiu na Conferência, tendo a delegação
brasileira comparecido na “Sudan Room”
logo no início da Conferência, a fim de dialogar com as ONGs.
O Brasil, no início da Conferência,
defendia a possibilidade de o promotor iniciar o processo proprio motu, tendo
independência em relação aos demais “triggering parties” (Estados
e Conselho de Segurança), o que era extremamente satisfatório. Tinha
posição flexível em relação ao papel do Conselho de Segurança -
CS, no sentido de admitir que pudesse esse órgão iniciar um processo,
mas era contrário à possibilidade de o CS criar novos tribunais ad hoc e, tampouco, considerar o
TPI como um órgão subsidiário daquele ou serem as investigações ou
processos suspensos pelo CS, exceto em circunstâncias excepcionais,
quando o CS agiria formalmente sob a égide do capítulo VII da Carta
das Nações Unidas, por um período limitado de tempo, o que era
razoável na avaliação das ONGs. Entretanto, o Brasil era favorável
à jurisdição inerente do TPI somente para o crime do genocídio,
sendo favorável ao chamado mecanismo “opt-in” para os demais
crimes, a fim de favorecer a ratificação universal do Estatuto. Isso
significava que, ao ratificar o Estatuto, o Estado só aceitaria a
competência do Tribunal para crimes de genocídio, podendo, para os
demais crimes (crimes de guerra, crimes de lesa humanidade e crimes de
agressão), não reconhecer essa competência ou submeter caso a caso.
Essa posição brasileira foi revertida publicamente em plenário
no início de julho de 1998, no sentido de aceitar a competência
automática do Tribunal para todos os crimes, o que muito agradou às
ONGs. Posteriormente, outras duas questões permaneceram pendentes em
relação ao Brasil: a extradição e a prisão perpétua.
Uma das questões centrais discutidas
em Roma, ligadas à efetividade da execução penal, foi a criação de
um instituto jurídico para apresentar a pessoa acusada diante o TPI,
chamado de “surrender”. Esse instrumento é similar à extradição,
porém distinto, embora existiam propostas de denominar esse instituto
justamente de extradição.
No art. 28 do Draft para o
estabelecimento de um tribunal penal internacional para o Apartheid e
outros crimes internacionais, criado no já mencionado estudo de
especialistas sobre a Convenção do Apartheid de 1973 e instrumentos
conexos,
o conceito de “surrender” era
realmente equivalente ao de extradição. No §2º desse artigo 28,
entretanto, taxativamente determina-se que não seriam obstáculos para
a entrega (a) alegações de que se trata da exceção de crime
político , (b) que o indivíduo é
nacional do Estado requerido e (c) por outras condições ou
restrições impostas pelos Estados requeridos na prática de
extradição em relação a outros Estados. Assim, teríamos uma
situação curiosa, pois o aspecto que nos leva a considerar que a
extradição e a entrega seriam equivalentes é justamente o elemento
que neutraliza os efeitos nocivos dessa equivalência e marca um
princípio de diferença entre os institutos. Ou, em outros termos,
quando a entrega prevê os aspectos práticos da extradição, evitando
empecilhos para o julgamento no então hipotético TPI (como o crime
político, a proibição de extradição de nacionais e os direitos
internos), iguala os institutos mas também estabelece um patamar de
diferenciação para a jurisdição internacional, não permitindo
escusas internas fundadas em política de extradição.
Assim, necessitou-se firmar a posição
de não admitir a confusão entre a extradição e “surrender”, o
que foi claramente diferenciado no Estatuto final. A delegação
brasileira, entretanto, tendo em vista a Constituição Federal de 1988,
que veta a extradição de brasileiros natos e de brasileiros
naturalizados antes do fato criminoso (nesse último caso com a
exceção dos crimes de tráfico de entorpecentes), defendeu que não
havia possibilidade de o Brasil “extraditar” os nacionais dessas
categorias para o futuro Tribunal, caso fosse necessário. E, apesar de
votar a favor do Estatuto no plenário final da Conferência, fez
declaração de voto no sentido das dificuldades constitucionais nessa
matéria.
Essa posição foi contestada pelo
presente autor, em artigo distribuído na Conferência, intitulado “The
International Criminal Court: Brazil and the Question of Extradition”,
pelos seguintes motivos:
a.
não se trata do antigo instituto da extradição, que se reporta
a entrega de uma pessoa, submetida à sentença penal (provisória ou
definitiva), de uma jurisdição soberana a outra. Trata-se de entrega sui generis, em que um Estado transfere determinada pessoa a uma
jurisdição penal internacional que ajudou a construir. A
Constituição brasileira certamente não se refere a esse caso
especial, por impossibilidade de lógica e de vaticínio;
b.
o parágrafo 2º, do art. 5º, da CF/88, afirma de forma
categórica que os direitos e garantias previstos na Constituição
brasileira não excluem outros decorrentes do sistema ou do regime por
ela adotados ou, ainda, provindo dos tratados em que o Brasil seja
parte. O Tribunal Penal Internacional está sendo formado mediante um
tratado, o que significa dar-lhe recepção constitucional. Sabemos, é
verdade, que o Supremo Tribunal Federal nega arbitrariamente esse
dispositivo constitucional, determinando que os tratados de direitos
humanos ou humanitário não se diferenciam dos demais tratados e,
portanto, possuem o mesmo status de
lei federal, o que significa dizer que uma lei posterior dessa natureza
pode derrogar tratados ratificados anteriormente pelo Brasil.
Entretanto, optamos pelo concebido na Constituição, e não no imposto
por interpretação;
c.
as disposições transitórias da CF/88 propugnam a criação de
um Tribunal Internacional dos Direitos Humanos, enquanto princípios
constitucionais direcionam as relações internacionais brasileiras
mediante a prevalência dos direitos humanos. Embora o Tribunal Penal
não seja exclusivamente um tribunal de direitos humanos,
possui aspectos intrínsecos aos mesmos e, o que é importante, vai de
encontro com o projeto constitucional brasileiro.
Denunciamos, então, a contraditória e
cômoda posição brasileira, evitando que criminosos brasileiros fossem
apresentados ao Tribunal e ao mesmo tempo impedindo que o Brasil se
transformasse em um reduto de criminosos estrangeiros.
Assim, o art. 102 do Estatuto
diferencia os termos “surrender” de “extradition”, sendo o
primeiro a condução de uma pessoa de um Estado ao Tribunal, de acordo
com o Estatuto, e o segundo a condução de uma pessoa de um Estado a
outro, de acordo com tratados, convenções ou legislação nacional.
Ressalta-se que a execução penal, mediante acordo entre os Estados e o
TPI, poderá ser no Estado que entrega. Ora, é inconcebível este tipo
de situação na extradição.
O Tribunal Penal Internacional é um
produto do esforço conjunto e democrático dos Estados, das
Organizações Internacionais e das ONGs. Portanto, é único, não
possui paralelo histórico, significando a primeira jurisdição
internacional permanente de caráter penal, que de forma não seletiva e
desvinculada de uma guerra específica procura por fim a era de
atrocidades que presenciamos. Como o próprio preâmbulo do Estatuto
menciona: “atrocidades que desafiam a imaginação e comovem
profundamente a consciência da humanidade”.
A nossa Constituição Federal é
perfeitamente adequada ao Estatuto do TPI, em especial pela abertura do
§2º, do Art. 5º, mas sobretudo pela principiologia que a rege e
orienta toda a sua estrutura segundo a dignidade humana, paz, direitos
humanos e direitos fundamentais. O TPI é uma necessidade, e não
sobreposição. É a respiração de uma Constituição como a nossa,
pois o TPI só atuará se ela for ultrajada. Aliás, pode significar a
respiração das pessoas que aqui vivem e sobrevivem, e não das
autoridades e poderosos que aqui são facínoras.
A proposta de emenda constitucional que ora apresentamos é a
expressão desse espírito, afirmando a construção garantista e humana
do nosso sistema jurídico, ao resguardá-lo com as possibilidades do
TPI. A PEC em questão tem o seguinte teor:
“Art. 5º [...] §3º - A
República Federativa do Brasil poderá reconhecer a jurisdição do
Tribunal Penal Internacional, nas condições previstas no Estatuto
aprovado em Roma no dia 17 de julho de 1998.”
Sobre o outro problema constitucional
(prisão perpétua), diga-se que segundo o art. 77 do Estatuto, uma
pessoa condenada, por algum crime de competência do Tribunal, poderá
ser reclusa por um período não superior a 30 anos (o mesmo limite
será imposto em caso de cometimento de mais de um crime). Todavia, em
casos de extrema gravidade do crime e relevando as características
pessoais do condenado, a reclusão poderá ser de perpetuidade. A
prisão perpétua é a exceção da exceção, pois a competência do
TPI sempre diz respeito a crimes graves (é uma condição de
admissibilidade) e a extrema gravidade deve ser entendida como
situação limite.
Um exemplo recente dessa situação
limite foi a decisão histórica do Tribunal Penal Internacional para
Ruanda, proferida no dia 4 de setembro de 1998. Pela primeira vez um
tribunal penal internacional aplicou a Convenção sobre o Genocídio de
1948, ao condenar Jean Kambanda à prisão perpétua. Réu confesso,
Kambanda foi ministro do governo provisório de Ruanda em 1994, quando
cerca de um milhão de pessoas foram assassinadas. O Tribunal Ad Hoc de Ruanda determinou a pena máxima em razão da natureza
dos crimes e do cargo ocupado por Kambanda.
Além de prevista para situações
limites, a prisão perpétua disposta no Estatuto não é perpétua em
todos os seus termos, já que o §3º, do art. 110, prevê a revisão da
pena após 25 anos de cumprimento, a fim de saber se essa pode ser
reduzida. Neste caso, o
recluso poderá ter sua pena reduzida se uma ou mais condições
estiverem presentes (§4º, do art. 110): a) O recluso manifestou, desde
o princípio e de forma continuada, vontade de cooperar com o Tribunal
em suas investigações e processo; b) O recluso facilitou, de forma
voluntária, a execução das decisões e ordens do Tribunal em outros
casos, em particular auxiliando na localização de bens sobre os quais
incidam multas, seqüestro ou reparação que possam ser utilizados em
benefício das vítimas; ou c) Outros fatores previstos nas Regras de
Procedimento e Prova que permitam determinar uma mudança nas
circunstâncias suficientemente clara e importante para justificar a
redução da pena. E se durante tal revisão o TPI não alterar a pena, há
possibilidade de voltar a examinar a questão posteriormente (§5 do
mesmo art. 110).
Apesar de a prisão perpétua ser prevista nestas condições e,
para muitos crimes previstos na competência do Tribunal, o Brasil
prever pena de morte por fuzilamento (ver Código Penal Militar, Livro
II, Dos Crimes Militares em Tempo de Guerra, arts. 355-408), devemos
lutar, após nossa ratificação, para que se emende ou revise o
Estatuto (arts. 121 e 123, respectivamente), no sentido de abolir este
tipo de pena, que reputo desumana em si mesma.
Importa considerar que a diplomacia
brasileira e boa parte da intelectualidade deste país demonstrou claro
ânimo, consentimento e desejo, em relação à ratificação do TPI
pelo Brasil, no seminário oficial do Ministério das Relações
Exteriores sobre o assunto, organizado em conjunto com o Conselho da
Justiça Federal. E por este fato a
sociedade civil brasileira agradece, principalmente porque esse processo
de discussão, que incluiu outros seminários e também audiências
públicas na Câmara dos Deputados, culminou na inicialmente mencionada
assinatura do Estatuto pelo Brasil. Esperamos, agora, que as
convicções do Executivo, após acalorado e profundo debate, inspirem a
pronta aprovação deste Estatuto pelo Congresso Nacional.
Por fim, acredito que a construção do
TPI é um dos mais belos projetos construídos pela humanidade, no
sentido que o poeta pode nos dar:
“Belo porque
é uma porta
abrindo-se em mais saídas.
Belo como a última onda
que o fim do mar sempre adia”
João Cabral de Melo Neto
Coordenador do Curso de Relações Internacionais do Centro
Universitário de Brasília. Diretor do Centro de Proteção
Internacional de Direitos Humanos. Foi observador internacional na
Conferência de Roma, que instituiu o TPI, representando o Movimento
Nacional de Direitos Humanos.
Assinado pelos Estados Unidos, Grã-Bretanha, França e União
Soviética, em 8 de agosto de 1945. Estabelecia o Tribunal Militar
Internacional, a fim de julgar crimes contra a paz (v.g., envolvendo
planejamento, instigação e provocação de agressão), crimes de
guerra (v.g., contra direitos e costumes humanitários -
Convenções de Haia, geralmente reconhecidos pelas forças
militares de nações civilizadas) e crimes contra a humanidade
(v.g., extermínio racial, étnico e religioso; atrocidades em larga
escala contra a civis).
Instrumento da cúpula dos Aliados (“Allied Control Council”),
promulgado em 20 de dezembro de 1945.
O “International Military Tribunal for the Far East” teve por
base uma carta promulgada pelo General Douglas MacArthur, comandante
das Forças Aliadas, em 19 de Janeiro de 1946, inspirada no “London
Agreement”.
Sobre os tribunais de
Nuremberg e do Japão, bem como o direito internacional
humanitário, ver MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direitos Humanos e Conflitos
Armados. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 1997.
LAWYERS COMITTEE FOR HUMAN RIGHTS. Establishing an International
Criminal Court: Major Unresolved Issues in the Draft Statute.
New York: LCHR, International Criminal Court Briefing Series, volume
I, number I, august, 1996.
O Brasil ratificou este tratado em 28 de setembro de 1989.
Ver Universal Jurisdiction:
14 principles on the effective exercise of universal jurisdiction.
London: Amnesty International, may 1999, AI Index: IOR 53/01/99.
O TPI terá jurisdição somente sobre crimes cometidos após sua
entrada em vigor e, para os Estados que ratificarem após este fato,
só exercerá suas faculdades após este consentimento (ver art.
11).
HOBSBAWN, Eric. Era dos
Extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia
das Letras, 1995, p. 57.
Aprovada pela Assembléia
Geral das Nações Unidas, res. 260 A (III).
O preceito que coloca o
genocídio como um crime passível de ser cometido em tempos de
guerra e de paz é o art. 1º da mesma Convenção.
Doc. E/CN.4/1426, 1981: Study on Ways and Means of Ensuring the
Implementation of Internacional Instruments Such as the
International Convention on the Suppression and Punishment of the
Crime of Apartheid, Including the Establishment of the International
Jurisdiction Envisaged by the Convention.
Ver doc G. A., 50th Sess., Supp. No. 22, A/51/22, 1996.
Report of the Ad Hoc Comittee
on the Establishment of an International Criminal Court, Volume II.
Refiro-me à Opinião Consultiva da CIJ, emitida em 28 de maio de
1951, sobre Reservas à Convenção para a Prevenção e a Sanção
do Delito de Genocídio. Nessa oportunidade a CIJ afirmou que: “As
origens da Convenção indicam que as Nações Unidas tinham a
intenção de condenar e sancionar o genocídio como “um crime do
direito internacional” que consiste em uma negação do direito de
existência a grupos humanos inteiros, negação que comove a
consciência humana, causa uma grande perda à humanidade e é
contrária à lei moral e ao espírito e objetivos das Nações
Unidas (resolução 96 (I) da Assembléia Geral, 11 de dezembro de
1946). A primeira conseqüência que deriva desse conceito é que os
princípios implícitos nessa Convenção são princípios
reconhecidos pelas nações civilizadas como vinculantes para os
Estados, ainda quando não exista uma obrigação convencional”.
Ver doc G. A., 50th Sess., Supp. No. 22, A/51/22, 1996.,
Volume II.
BASSIOUNI, Cherif. Crimes
Against Humanity in International Law. 1992, p. 168.
Sobre detalhes da definição desse crime no Estatuto do Tribunal e
em outros instrumentos internacionais, ver JARDIM, Tarciso Dal Maso.
O Crime do Desaparecimento Forçado de Pessoas: aproximações e
dissonâncias entre o sistema interamericano de direitos humanos e a
prática brasileira. Brasília: Brasília Jurídica, 1999.
Doc. G. A., 51st Sess., Supp. No. 22, A/51/22, 1996.
McCORMACK, Timothy L. H. From Sun Tzu to the Sixth Comittee, p.
31-63. In The Law of War
Crimes: National and International Approaches. Neetherland:
Kluwer Law International, 1997.
Inspirado principalmente no Art. 50 da Convenção para a Melhoria
da Sorte dos Feridos e Enfermos dos Exércitos em Campanha, no Art.
51 da Convenção para a Melhoria da Sorte dos Feridos, Enfermos e
Náufragos das Forças Armadas no Mar, no Art. 130 da Convenção
Sobre o Tratamento aos Prisioneiros de Guerra e no Art. 147 da
Convenção Sobre a Proteção das Pessoas Civis em Tempos de
Guerra.
CANÇADO TRINDADE et alli. As
Três Vertentes da Proteção Internacional dos Direitos da Pessoa
Humana. San José, Costa Rica / Brasília: IIDH, CICV, ACNUR,
1996, p. 69.
Sobre a violência contra a mulher em conflitos armados ver SAJOR,
Indai Lourdes (ed.). Common
Grounds: violence against women in war and armed conflict situations. Asian Center
for Women´s Human Rights, 1998.
Ver doc. Pcnicc/1999/dp. 11, 26 february 1999.
Ver doc. Pcnicc/1999/dp. 12, 29 july 1999.
Ver doc. Pcnicc/1999/dp. 13, 30 july 1999
A “Sudan Room” é uma sala da sede da FAO (local da
Conferência), onde a CICC (Coalização de ONGs para o
estabelecimento do TPI) estabeleceu-se e, por via de consequência,
transformou-se numa espécie de quartel-general das ONGs
credenciadas para a Conferência.
Lembre que o art. VII da Convenção de Genocídio de 1948 determina
que, para efeito de extradição, o genocídio não seria
considerado delito político, como de resto os demais crimes
previstos nesse “draft” eram protegidos por cláusulas similares
em algum tratado já existente na época.
Pois também envolve o direito internacional humanitário.
Seminário Internacional realizado no Superior Tribunal de Justiça,
entre os dias 8 a 10 de Setembro de 1999, e intitulado “O Tribunal
Penal Internacional e a Constituição Brasileira”.
NETO, João Cabral de Melo. Morte
e Vida Severina e outros poemas em voz alta. 31ª ed. Rio de
Janeiro: Ed. José Olympio, 1992, p. 111.
|