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Novo risco para a humanidade: a globalização do inimigo

Leonardo Boff

Como reação aos tentados da Terça Feira Triste de 11 de setembro de 2001 nos EUA, o Presidente George W. Busch fez uma série de pronunciamentos que implicam alto risco para o futuro das relações entre as nações: o terrorismo será enfrentado em qualquer parte do mundo; atarcar-se-ão também aqueles países que dão guarida às redes do terror. Quem não aceita esta luta é contra os EUA e a favor do terrorismo.


Aqui há uma manifesta globalização do inimigo e uma globalização da guerra com características singulares, combinando a brutalidade da guerra tecnológica moderna, mostrada na intervenção norte-americana no Afeganistão, com a guerra suja da inteligência que implica atos de terror e o assassinato planejado de lideranças tidas por terroristas.


Esta estratégia nos projeta cenários sombrios e altamente perigosos para a convivência da humanidade no processo inexorável da globalização, fase nova da história da Terra (Gaia) e da espécie homo sapiens e demens.


O primeiro efeito ocorreu nos EUA: a criação do Conselho de Defesa Interna, dotado de uma Força-Tarefa de Rastreamento de Terroristas, fundos específicos e de sua correspondente ideologia justificadora. Nós conhecemos o que significa o Estado de Segurança Nacional cujo ideólogo-mor Carl von Clausewitz (1780-1831) conferiu normalidade à guerra como "continuação da política com outros meios". Em nome da segurança inverte-se o sentido básico do direito: todos são supostamente terroristas até prova em contrário. Em consequência disso, surgem inexoravelmente serviços de contrôle e repressão, espionagens, grampos, prisões para interrogatórios, violências por parte dos corpos de segurança e torturas. Cria-se o império da suspeita e do medo e a quebra da confiança societária, base de qualquer pacto social. Há o risco do terror de Estado.


Dois temores bem fundados acolitam semelhante universalização do inimigo: a delimitação do que seja terrorismo e a identificação dos nichos alimentadores de terrorismo.


A formulação de bem-mal, amigo-inimigo do Presidente Bush nos remete a um dos grandes teóricos modernos da filosofia política de transfundo nazi-fascita, Carl Schmitt (1888-1985). Em seu O Conceito do Político (1932, Vozes 1992) diz: "a essência da existência política de um povo é sua capacidade de definir o amigo e o inimigo"(p.76). Quem é inimigo? "É aquele existencialmente outro e estrangeiro, de modo que, no caso extremo, há possibilidade de conflitos com ele…Se a alteridade do estrangeiro representa a negação da própria forma de existência do povo, deve ser repelido e combatido para a preservação da própria forma de vida. Ao nivel da realidade psicológica, o inimigo facilmente vem a ser tratado como mau e feio"(p.52).


Bush interpretou a barbárie de 11 de setembro de guerra contra a humanidade, contra o bem e o mal, contra a democracia e a economia globalizada de mercado que tantos benefícios (na presssuposição dele) trouxeram para a humanidade. Quem for contra tal leitura, é inimigo, o outro e o estrangeiro que cabe combater e eliminar. Tal estratégia pode levar a violência para dentro dos EUA e para todos os quadrantes do mundo. É a violência total do sistema contra todos os seus críticos e opositores. A lógica que preside aos atentados terroristas é assumida totalmente pelas estratégia do Estado norte-americano, apenas com sinais invertidos. Terror é enfrentado com terror, gerando-se a espiral da violência sem fim. Nessa solução não há nenhuma sabedoria, apenas expressão de vindita e de retaliação do olho por olho, dente por dente. Só políticos medíocres, sem a estatura de estadistas, podem adotar semelhantes estratégias.


O segundo problema aventado é a identificação dos nichos fomentadores de inimigos. Na atual estratégia são países tidos por párias ou bandidos e identificados por seus nomes, a Líbia, o Sudão e Iraque e outros.


Dentro de pouco percerberce-á que mais importantes que estas nações, são ideologias libertárias e religiões de resistência e libertação como se tem mostrado na oposição ao regime soviético e nas regiões do Terceiro Mundo, dominadas por governos repressores.Elas criam verdadeiras místicas de engajamento e fazem surgir militantes altamente comprometidos com a superação da presente ordem social mundial, devido às altas taxas de iniquidade social que produz. Entre eles se contam as históricas esquerdas anti-capitalistas, os movimentos transnacionais contra o tipo hegemônico de globalização econômico-financeira e os setores religiosos ligados à mudanças sociais como o cristianismo de libertação nascido na América Latina e ativo na Africa, na Asia e em setores importantes da sociedade civil norte-americana e européia. A estes se soma ainda grupos fortes do islamismo popular, de cunho fundamentalista e setores teológicos islâmicos que resgatam as origens libertárias da gesta de Maomé e o sentido original do Alcorão francamente ligado aos estratos pobres da população seja do deserto seja das cidades. Todos esses serão considerados inimigos eventuais pois serão vistos como forças auxiliares do terrorismo. Conhecemos as consequências de tais identificações: a vigilância, a tentativa de desqualificação pública, os sequestros, as torturas, os assassinatos. Será que os EUA não acolheram uma lógica que os condenará repetir com mais furor o que ocorreu na América Latina nos anos 60 sob os Regimes de Segurança Nacional (bem entendido, segurança do capital)?


Tais espectros não são fantasias sinistras. As medidas já tomadas de criação de tribunais especiais contra terroristas, em qualquer parte do mundo, o segrêdo dos julgamentos, a incomunicabilidade com seus advgoados e os julgamentos sumários apontam para formas de exceção, perigosas para uma consciência de cidadania e de observância dos direitos fundamentais da pessoa humana. Os ninhos de serpentes foram criados. E elas crescem, se multiplicam e podem morder letalmente, agora em nivel global.

ALAI, América Latina en Movimiento
2001-11-26
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