
Fundamentos
Teóricos Sobre a Violência
Maria de Nazaré
Tavares Zenaide
1.
APRESENTAÇÃO
Este texto trata dos
fundamentos teóricos que explicam o fenômeno da violência,
a partir da contribuição da Psicologia, da Antropologia e da
Ciência Política, de modo a oferecer
aos participantes do Curso Formação de Agentes para o
Programa Paz nas Escolas e no Bairro, elementos para uma
compreensão da violência enquanto fenômeno e prática
social.
2.
EXPLICAÇÕES TEÓRICAS SOBRE
O FENÔMENO DA VIOLÊNCIA
Atualmente,
as formas de manifestações da violência alcançam
um
amplo leque de comportamentos, relações e práticas. Essas
formas plurais e multifacetadas foram ao longo da história,
sendo formuladas e reformuladas, de modo que qualquer
compreensão mais abrangente do fenômeno hoje, requer uma
aproximação com as diferentes correntes teóricas. Aspectos
distintos interferem portanto na dialética da violência:
fatores intrapsíquicos, estruturais, culturais, sócio-políticos,
éticos e outros.
2.1.
Explicações Psicológicas
A agressão
para a psicanálise, é um componente da pulsão sexual, de
afirmação e conservação do eu. É um modo da pulsão de
morte, não introjetada como culpa, ou sublimada, ser
orientada para um objeto fora da psiquê, como um recurso à
força ou à coerção, de modo a causar dano físico, psicológico
e ético. Para esta abordagem da psicologia, o fenômeno da
violência é explicado como “o emprego desejado da
agressividade com fins destrutivos”, seja como uma forma de
desrespeito e de negação do outro”.(COSTA, 1991 in: LUCINDA e
outros, 1999)
As
explicações psicológicas apontam no campo das ações, para
práticas que considerem: o processo de construção da
individualidade, da identidade social e da sociabilidade.
2.2.
Explicações Sociológicas
Cada
sociedade num determinado período
histórico produz normas sociais e culturais de
relacionamento que servem de parâmetro para a compreensão do
fenômeno da violência.
Para
Santos (1986), as noções de solidariedade social, consciência
coletiva, crime e anomia fornecem um ponto de partida para o
estudo da violência. Segundo Durkheim in Santos, a violência
seria definida como, “um estado de fratura nas relações de
solidariedade social e em relação às normas sociais e jurídicas
vigentes em dada sociedade”.
Santos
(1986) ainda destaca a interferência no mundo atual dos
conflitos relacionais que agregam às relações de dominação.
A violência nesta
perspectiva poderia ainda ser explicada, como “um ato de
excesso, qualitativamente distinto, que se verifica no exercício
de cada relação de poder presente nas relações sociais de
produção social”.
Segundo
COSTA( 1996), a
violência “ é uma particularidade do viver social, um tipo
de negociação, que pelo emprego da força ou da
agressividade visa encontrar soluções para conflitos que não
se deixam resolver pelo diálogo e a cooperação”.
2.3.
Explicações Antropológicas
Para a
Antropologia, a violência apresenta uma pluralidade de
manifestações que precisam ser analiticamente investigadas.
Para RIFIÓTIS(
), o discurso denunciatório centraliza sua observação
e intervenção no campo da defesa, incorporando e
centralizando uma posição catastrófica e alarmista do fenômeno.
Nesse sentido, os estudos atuais
focalizam a atenção no estudo sobre a criminalidade,
os conflitos de gerações e a violência institucional.
Alerta essa corrente, da necessidade de estudos no campo da
micro relações, da subjetividade dos sujeitos, como uma
forma de compreensão analítica do fenômeno, de modo a
alargar a leitura, para aspectos positivos do fenômeno, como
elemento instaurador de identidades sociais, como força face
os processos de controle e homogeneização e como construção
de subjetividades.
Para
RIFIÓTIS, a violência “ nas suas múltiplas formas, é
representada como um domínio da experiência social que
permeia as brechas da crise da modernidade e a busca de
alternativas interpretativas para a sociedade contemporânea
“.
2.4.
Implicações sobre a Violência
Uso da coerção ou força –
um dispositivo de poder sobre o outro;
Com produção de danos;
Em
dimensões distintas: materiais, corporais e simbólicas;
Inserindo
rede de dominações – de classe, gênero e etnia;
No
limite da negociação;
Que
implica numa teia de excursões;
Com
caráter instrumental ( chegar a um fim) com efeitos imprevisíveis.
2.5.
Dimensôes da Violência
2.5.1.
Dimensões Econômicas e Sociais – formas
de violências
que se manifestam e se expressam no plano material
e da reprodução do homem ;
2.5.2.
Dimensões Simbólicas - formas
de violências
que se expressam no plano do psíquico, da
subjetividade, dos afetos, das idéias, dos valores, das relações
interpessoais e sociais;
2.5.3.
Dimensões Corporais - formas
de violências
que se manifestam no plano físico (agressões físicas,
estupro, abuso sexual, falta de respeito, sexualidade
precoce);
3.
FATORES DE PRODUÇÃO DA VIOLÊNCIA
3.1
Fatores Estruturais:
-As
desigualdades Sociais, as disparidades regionais e os
indicadores sociais e econômicos tem interferido
no aumento da criminalidade urbana;
-A
fragmentação do espaço e da vida urbana com implicação no
transito, transportes de massas, degradação das condições
de vida de setores populares, e precarização do emprego e
dissolução das relações de trabalho, nos indicadores sociais
de saúde e educação e outros;
-A
concentração da terra e da riqueza
tem reproduzido a violência rural, o êxodo rural e
ampliado os indicadores de pobreza;
-O
modo como historicamente as elites dirigentes exerceram o
controle e o domínio de grupos étnicos e grupos sociais
subalternos, sedimentou uma subjetividade autoritária. Esta
cultura autoritária tem se revelado, na forma como se tem
exercido as práticas de controle e manutenção da ordem, o
modo como se interage com
os conflitos sociais e os atores coletivos, a forma
como se tem sujeitado vontades coletivas;
3.2.
Fatores Culturais:
-
Para VELHO( 1996), a pobreza não tem explicado a perda de
referenciais éticos
nas interações entre indivíduos e grupos. A imagem, tão
bem explorada e comercializada nos meios de comunicação de
massas, vem reforçando a cultura do medo e a banalização da
violência;
-Os
valores individualistas tem influenciado no processo de
rotinização da violência;
-Tem
crescido as formas de sociabilidade violentas (segregação
social e especial,
cultura do medo, processos
de afastação social, cultura do extermínio, aumento do
sentimento de insegurança social);
-O
tratamento do outro como objeto ( a reificação do ser
humano), em detrimento de sua condição de sujeito de
direitos e de ser humano tem se reforçado com o aumento da
exclusão econômica. O processo de exclusão social ( o não
reconhecimento do outro como sujeito de direitos) e a exclusão
moral ( a perda da indignidade com a dor do outro e a aceitação
da violência contra grupos excluídos);
3.3
Fatores Ético-políticos
-A
crise atual do Estado no tocante aos aspectos éticos-sócio-político
tem se manifestado através
da:
-A
crise do Estado garantiu a efetivação da legalidade sobre os
interesses privados, clientelísticos
e oliguárquicos;
-Manutenção
dos privilégios de classes, de setores econômicos e políticos
reproduzidos em mecanismos de repressão e práticas autoritárias;
- Crise
dos valores republicanos (respeito à lei em detrimento dos privilégios
e o respeito com o que é público e
a responsabilidade no exercício da coisa pública) e
dos valores democráticos ( respeito a
maioria , amor a igualdade e respeito aos direitos
humanos);
-Crise
em manter o monopólio legal da força para manter a ordem pública,
cedendo espaço para práticas de privatização do Estado ,
práticas ilegais e arbitrárias;
-Baixa
intensidade do exercício da cidadania;
-Manutenção
de experiências conservadoras de repressão e manutenção do
status quo como manutenção da ordem;
-Ampliação
de formas capitalistas empresariais de violência no espaço
urbano (crime organizado, narcotráfico, contrabando de armas,
seqüestro e corrupção, mobilizando jovens e agentes do
Estado para a deliquencia;
-Falta
de vontade política para apurar a responsabilidade penal de
agressões, agentes do Estado;
-Falta
de controle do aparelho repressivo do Estado por parte da
sociedade civil.
Bibliografia Consultada
ADORNO,
Sérgio. A violência na sociedade brasileira: um painel
inclocuso em uma democracia não consolidada in: Estado
e Sociedade. Brasília. UNB, 1986.
BATISTA,
Nilo. A Violência do estado e os aparelhos policiais in:
Discursos Sediciosos – crime, direito e sociedade.
Rio de Janeiro. Instituto de Criminologia. Ano 2. No. 04,
1997.
DORNELLES,
João Ricardo Wanderley. Violência urbana, direitos da
cidadania e políticas públicas de segurança no contexto de
consolidação das instituições democráticas e das reformas
econômicas neoliberais in: Discursos Sediciosos –
crime, direito e sociedade. Rio de Janeiro. Instituto de
Criminologia. Ano 2 No. 04. 1997
LUCINDA,
Maria da Consolação e
NASCIMENTO, Maria das Graças e CANDAU, Vera Maria. Escola e
Violência. Rio de Janeiro. DP&A, 1999.
PIRES,
Cecília. A Violência no Brasil. 9ª edição. São
Paulo. Ed. Moderna. 1985.
RIFIÓTIS,
Theóphilos. Nos campos da violência: diferença e
positividade. Florianópolis, UFSC.
SANTOS,José
Vicente Tavares dos. A Violência como dispositivo de excesso
de poder in: Estado
e Sociedade. Brasília. UNB, 1986.
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