Militantes
Brasileiro(a)s dos Direitos Humanos
Luiz
Gonzaga Cortez
Textos
e Reflexões
ABC de Textos Militantes
1935
– um a opinião pessoal ou “1935,
distorções dos fatos
e adulteração de documentos”.
*
Luiz Gonzaga Cortez.
segunda-feira, 14 de fevereiro de 2005
Oriundo
e educado numa família católica
e integralista, desde menino ouvia comentários
sobre a cognominada intentona comunista
de 1935. Ouvia relatos de parentes próximos
que participaram da luta contra a revolta
na Serra do Doutor ( aos 15 anos, levado
por um tio, fui ver o local do célebre
tiroteio) e de outras pessoas que estavam
em Natal entre os dias 23/27 de novembro
de 35. A minha bisavó, dona Zefinha,
ficava nervosissima quando nós, garotos
sapecas, imitávamos os ruídos
de metralhadoras atirando. Ouvi muitas “estórias”
sobre pessoas que enriqueceram com os despojos
e dos dinheiros abandonados pelos líderes
do movimento na Vila Cincinato, na praça
Pedro Velho, assim como também de
relatos verídicos sobre os acontecimentos.
Mas isso é outra história...
O fato é que eu resolvi pesquisar
sobre a chamada intentona por volta de 1984,
já com quase 35 anos de idade, incentivado
por dois editores do Diario de Natal, Manuel
Barbosa e Carlos Jorge. O diretor geral
do jornal, Luiz Maria Alves, autorizou a
publicação das matérias
após ler a primeira da série.
O mesmo que autorizou foi o mesmo que guilhotinou
o seu prosseguimento, em dezembro de 1985.
Mesmo assim, tivemos oportunidade de publicar
relatos de testemunhas, participantes e
sobreviventes daqueles acontecimentos que
hoje os comunistas do PC do B estão
reverenciando. A investigação
nos propiciou o conhecimento das versões
distorcidas e mentirosas da historiografia
oficial sobre o movimento de 35.
A revolta dos militares do 21 Batalhão
de Caçadores de Natal, única
unidade do Exército no Estado, foi
conseqüência da luta política
local, da demissão de policiais civis
e de dezenas cabos e soldados. O clima era
de conspiração geral e os
comunistas se aproveitaram da situação
política caótica para darem
o golpe. Foram derrotados e os seus principais
adversários não foram os militares
da Polícia Militar do Estado, mas
os sertanejos de vários municípios
do Seridó, principalmente de Parelhas,
Carnaúba dos Dantas, Caicó,
Currais Novos, Acari, entre outros, tendo
à frente diversos integralistas que,
vestidos com camisas-verdes atiraram e jogaram
bombas nos veículos dos revoltosos
que que pretendiam tomar a cidade de Caicó.
Os revoltosos saíram de Natal para
dominar o Seridó, sem um pelotão
de reconhecimento na vanguarda de suas tropas,
o que representou um erro primário
e fatal para a derrocada do movimento no
interior.
A respeito da Serra do Doutor, conseguimos
desmontar o edifício de mentiras
que erigiram em torno desse tiroteio, não
somente sobre a não participação
no mesmo de políticos proeminentes
no Seridó e no Estado, desmascarando
a existência do “General da
Serra do Doutor”. Também descobrimos
que o então delegado de polícia
de Currais Novos foi o responsável
pela prisão e execução
de diversos militares que pretendiam tomar
Caicó.
Também constatamos uma grotesca adulteração
no relatório policial sobre a revolta
comunista em Natal, elaborado pelo delegado
Enock Garcia e concluído quase seis
meses depois, no qual ele não citou
a existência de mortes no interior
do quartel da Polícia Militar, entre
os dias 23 e 27 de novembro de 1935. O relatório
foi publicado em 1937 e nele não
havia nenhuma referência ao suposto
soldado Luiz Gonzaga de Souza. O “herói”
criado anos depois pelos vitoriosos.
Comandado e executado por militares do Exército,
sargento, cabos e soldados ligados ao Partido
Comunista do Brasil-PCB, com a colaboração
e participação efetiva de
civis – operários, funcionários
públicos, estivadores, sapateiros,
etc -, dentre eles elementos do cafeísmo
e partidários de Mário Câmara,
interventor derrotado por Rafael Fernades
e o Partido Popular, o movimento insurrecional
foi precipitado, portanto, sem coordenação
e sem planejamento adequados. Não
obedeceu ordens do Partido, de Prestes e
dos enviados da Internacional Comunista,
com sede em Moscou.
A documentação existente sobre
aquele período comprova que até
elementos do Partido Popular, como o foi
o caso de Alfredo Mesquita e Paulo Teixeira,
em Macaíba, andaram armados e defendendo
o governo comunista na vizinha cidade. Mais
tarde, eles disseram que pensavam que era
um movimento para derrubar Getúlio
Vargas. ( João Maria Furtado, no
seu livro Vertentes, publicado em 1975,
assegura o fato, jamais desmentido. Em 1997,
Paulo Teixeira, sem desmentir que andou
armado, disse, rindo, que João Maria
Furtado tinha exagerado...) O mesmo ocorreu
com o vendedor de jornais, Gastão
Nunes, cafeísta, que chegou a comandar
uma pequena tropa fardada e armada em Natal
durante os três dias do Governo Popular
Revolucionário. Por isso, ele passou
quase 10 anos preso, inclusive no Rio de
Janeiro, na companhia de nomes importantes
da insurreição que se pretendia
nacional, como bem retrata Graciliano Ramos,
em Memórias do Cárcere.
A Igreja não aderiu ao movimento,
mas ficou omissa e há informações
de que o vigário de Caicó
abrigou rebeldes foragidos na igreja local,
o que causou irritação no
coronel Juvenal Lamartine de Faria, ex-governador
da província do Rio Grande do Norte.
Decorridos 66 anos da revolta vermelha,
um doente mental que perambulava nos arredores
do quartel da polícia e comia restos
de comida da soldadesca foi transformado
em herói e nome da principal comenda
do Governo do Estado do Rio Grande do Norte.
As elites políticas dominantes não
gostam mesmo da verdade histórica,
preferindo reverenciar um doido que morreu
baleado na lama do mangue da Salgadeira
ou Passo( ou Paço? ) da Pátria
pelo tiro certeiro de Sizenando Filgueira.
Prefiro ficar ao lado dos que reverenciam
os que tombaram na defesa de um ideal, dos
direitos de Ter um emprego, uma vida digna,
da solidariedade humana, do que ao lado
dos pusilânimes, dos que executaram
presos amarrados, dos que adulteraram documentos
oficiais para alterar a verdade histórica.
*Luiz Gonzaga Cortez é
jornalista
^
Subir
História
dos Direitos Humanos no Brasil
Projeto
DHnet / CESE Coordenadoria Ecumênica
de Serviço
Centro de Direitos Humanos e Memória
Popular CDHMP |
 |
 |
 |
<
Voltar
|