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A ARTE DE VENCER SEM MATAR

Luciano Mariz Maia ** 

 “Lutar e vencer em todas as batalhas não é a glória suprema.
A glória suprema consiste em quebrar a resistência do inimigo sem lutar”.
 

Este ensinamento é atribuído a Sun Tzu, general chinês que teria desenvolvido importante papel há 2.5000 anos. Seus ensinamentos, registrados em livro com o nome de “A Arte de Guerra”, nos foram trazidos pelo escritor americano James Clavel, autor, entre outras obras, de Xógum e Casa Nobre.

Os americanos, com seus cinemas fantásticos, nos trazem heróis imaginários também fantásticos, que lutam pelo bem contra o mal e tem todos os códigos de honra todo próprio, como que a lhes autorizar, em nome do bem, destruir o mal, destruindo os maus, ou os malfeitores. É mais que a vingança privada. É a vingança privada exercida através do desempenho de funções públicas. Ordinariamente de polícia. Kojaks, Rambos, McGivers, são desses personagens que se incorporam no dia-a-dia de nossas vidas, como sendo defensores de lei e da ordem, autorizados a ampliar os limites da legalidade, e tornar legal, no nosso imaginário, o que, em mão ou gatilhos alheios, não passariam de crime.

Não sei até que ponto essas situações influenciam os “policiais de verdade”, brasileiros, de carne e osso. Não sei quantos se mirariam nessas miragens, quantos comprariam essas ilusões. O certo é que muitos parecem fazê-lo, e desaparecem por vê-lo feito.

Quero, antes de tudo, repetir o que tenho dito que segurança pública é um dever de cada cidadão e cidadã. Todos somos responsáveis por ela. Alguns, irresponsáveis, não cuidam dela, ou, mais grave ainda, destroem-na, com suas condutas violentas, que geram e jorram insegurança sobre a população. Sim, somos nós, os civis, os que, devendo responsáveis pela segurança, terminamos sendo os responsáveis pela insegurança coletiva. Não todos os civis, mas os civis desajuizados, que decidem pela criminalidade. Os de índole violenta, que desrespeitam a vida, que não reconhecem limites, que abusam da sua liberdade. Que livres, querem aprisionar os outros em medos e temores de malefícios.

Por que existem os maus, e porque os maus causam inseguranças aos bons, defendo a existência das polícias. Que fazem muito mais bem do que mal. E que, ultimamente, além de fazerem o bem, querem fazer bons os que ostentam suas fardas ou portam suas insígnias. Defendo os cidadãos. Defendo as polícias para defenderem os cidadãos, em sua cidadania.

Mas vejo que, assim como os políticos, a polícia tem a cara do povo. E o povo, nós, como um todo, não sabemos qual cara devemos ter. não sabemos qual cara nos é cara, e qual cara nos envergonha. Cito alguns episódios. Todos de São Paulo.

Diadema chocou o Brasil, e chocou o mundo. Policiais foram flagrados matando, a queima roupa, alguém que não praticara crime algum, e que estava indefeso dentro de um carro.

Conjunto habitacional de São Paulo. Sem-tetos invasores. Diriam ocupantes. Ordem judicial de despejo. Juiz ausente, como ausentes costumam estar em ordens dessa gravidade. Não querem sujar suas togas nem com a lama das ruas, nem com o sangue que sempre respinga. Presente a polícia. Muitas vezes, a única presença do Estado, ao alcance de sem-nadas como estes. Querem expulsar à força. Tentam, não conseguem. 3 morrem. 3 sem-nome. Agora, 3 sem-vida. E com tetos de terra.

Dia seguinte, surgem em cena um negociador. Conversa. Conversa. Na conversa que vai e que vem, vêm os sem-tetos, sem que a polícia precise ir além. A palavra construiu o que o silêncio destruiu. Houve desocupação. Não houve a morte.

Campinas. Sequestro de crianças. Finalmente uma tomada como refém. Carregada nos braços, sob ameaça de faca, por mais de 5 quilômetros, e mais de 4 horas. Dezenas de policiais acompanharam passo a passo a fuga para o nada e a lugar nenhum. Nervoso, estressado, exaurido, o sequestrador quase nada vale de forças. Visivelmente, sua atenção é só tensão, sua possibilidade de resistência se esgotou. Distrai-se o policial. Do policial, contrai-se o dedo. Termina um sequestro, termina mais uma vida, teria sido inevitável atirar? Teria sido inevitável atirar em sede fatal? Não teria sido possível atirar-se sobre o malfeitor? Para salvar uma vida, fora essencial eliminar outra?

É difícil dizer o que fazer em momentos-limite como esses. Mas, é possível dizer o que fazer, antes de chegarmos a tais limites. A preparação de grupos de elite, que capacita os policiais para missões de altíssimo risco, não pode deixar de incorporar um elemento essencial: a preservação da vida humana. Além de destreza nas armas, e nas artes marciais, talvez seja a hora de incluir alguém que seja destro nas armas de persuasão e do convencimento, da antiga arte de ouvir e falar. De negociar.

Talvez seja um sentimento comum todos desejarmos a glória, em nossas profissões. Mas, na “arte da guerra”, a glória suprema é vencer sem lutar. É prender sem matar.

** (Procurador da República, presidente Cons. Est. De Defesa do Homem e do Cidadão - PB)

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