Militantes
Brasileiros dos Direitos Humanos
João Baptista Herkenhoff
Justiça e Movimentos
Sociais
A mais violenta represália
aos movimentos sociais, no plano jurídico,
é a tentativa de criminalizar as ações
coletivas.
Não
há um procedimento rigorosamente uniforme
por parte dos diversos atores jurídicos,
nesta matéria. Constatamos tendências
diferentes, tanto na Justiça de primeiro
grau, quanto nos tribunais.
A
orientação mais comum do Poder Judiciário
é a de insensibilidade, incompreensão
ou mesmo repulsa aos movimentos sociais. Percebo,
entretanto, que essa visão não é
tão hegemônica hoje, quanto foi há
algum tempo atrás. Vemos, aqui e ali, decisões
de juízes e mesmo de tribunais compreendendo
a legitimidade das postulações e
procedimentos dos Movimentos Sociais.
Citemos
um exemplo.
O
art. 163 do Código Penal define nestes
termos o crime de dano:
"Destruir,
inutilizar ou deteriorar coisa alheia”.
Para
esse crime, o Código estabelece pena de
um a seis meses de detenção, ou
multa.
Chocam-se
na jurisprudência duas correntes na interpretação
deste artigo: a que exige para a configuração
do crime o dolo genérico; a que entende
bastar o dolo específico para que o crime
de dano esteja presente.
Para
haver dolo genérico é necessária
a vontade e a consciência de danificar.
O
fim das ocupações fundiárias
de terras que não cumprem sua função
social é reivindicar a Reforma Agrária.
Não existe nesse procedimento a intenção
ou fim de danificar a propriedade alheia, se dano
à propriedade ocorre. Trata-se de pressionar
o Governo para que cumpra a Constituição
Federal e dê à terra seu destino
social. Essa conduta é desprovida de dolo
genérico, não podendo ser considerada
criminosa, segundo entendo.
Há
um componente ideológico nisto de "fechar
os ouvidos" aos pleitos dos Movimentos Sociais.
É uma ideologia conservadora que pretende
que "tudo fique no lugar onde sempre esteve",
ou seja, que os que estão por baixo se
conformem com sua situação, disciplinadamente.
A
desqualificação da atuação
dos movimentos sociais sobre as demandas por eles
apontadas dificulta um equacionamento racional
e justo do problema. Quando se coloca uma etiqueta
de "crime" numa ocupação,
absolutamente legítima, de uma terra improdutiva,
desloca-se o problema de sua real posição.
Ele deixa de ser um problema social, econômico,
de Justiça (como realmente é), para
ser um "caso de Polícia".
A
questão dos Direitos Humanos hoje, no Brasil,
é muito mais uma questão de "direitos
humanos coletivos" do que "direitos
humanos individuais". Não haverá
vigência real de Direitos Humanos se não
houver reconhecimento e acolhimento dos "direitos
humanos coletivos". Daí a fundamental
importância dos Movimentos Sociais, na construção
da Cidadania e na efetivação dos
Direitos Humanos.
A
política de contenção e repressão
das lutas dos movimentos sociais tem impacto negativo
na promoção dos Direitos Humanos
e retarda o advento da Justiça Social que
se deve advogar para nosso país. |