Militantes
Brasileiros dos Direitos Humanos
João Baptista Herkenhoff
Audiências virtuais
As invenções em
geral devem ser celebradas como conquista da Humanidade.
Não devemos, de forma alguma, recusar o
avanço tecnológico, que se manifesta
nos mais diferentes campos de atividade. Entretanto,
o progresso e o avanço tecnológico
devem estar sempre submetidos a critérios
éticos e humanos.
Por
esta razão, não vejo com simpatia
a supressão do contato de juízes
com as partes, inclusive nos interrogatórios,
através da substituição de
audiências presenciais por audiências
virtuais.
Em
determinados casos são razoáveis
as audiências on-line, como, por exemplo,
para evitar gastos dispendiosos com a condução
de presos até a presença do magistrado.
Foi isto o que aconteceu recentemente quando Fernandinho
Beira-Mar, conduzido por aviões militares,
teve de comparecer perante juízos distantes
do local em que se encontrava preso. A única
conseqüência dessa condução
aérea do preso foi a enorme repercussão
que o fato teve na imprensa, justamente pelo absurdo
da esdrúxula situação.
Também
é razoável que se prefiram as audiências
virtuais naquelas hipóteses em que se torna
inteiramente desnecessário o contato humano,
face a face.
Quando
o contato humano é necessário, a
audiência virtual é uma brutalidade.
Na
minha vida de juiz, em inúmeros processos,
somente a presença de réus ou rés
diante de mim, permitiu que eu pudesse aquilatar
os fatos com exatidão buscando a boa distribuição
da Justiça.
Teria
centenas de casos a mencionar, porém um
dos mais apropriados para referência neste
artigo parece-me que seja o de Edna. Prestes a
dar à luz, Edna estava presa há
meses porque fora encontrada com alguns gramas
de maconha.
Talvez
eu não tivesse libertado Edna, se a acusada
não estivesse diante de mim. Foi ao vê-la
grávida, incomodada com o peso do feto,
pois recusou sentar-se dizendo que ficava mais
à vontade de pé, que eu pude compreender
a dimensão do seu sofrimento. Foi diante
de Edna mulher, Edna ser humano, que pude perceber
o que significava para ela estar presa.
Por
outro lado, no reverso da situação,
foi devido ao fato de Edna ver o juiz na sua frente
que, ao ser solta, disse que a criança,
que ia nascer, teria o nome do juiz, se fosse
homem. Mas nasceu uma menina que se chamou Elke,
em homenagem a Elke Maravilha.
Foi
porque o juiz a libertou olhando nos seus olhos
que Edna, que era meretriz, mudou de vida. Disse
que poderia passar fome, mas que prostituta nunca
mais seria.
Uma
outra situação em que a audiência
presencial tem extrema importância é
na ausculta de testemunhas. Os magistrados experientes
sabem quando a testemunha está falando
a verdade e quando a testemunha está mentindo.
Somente o “olho no olho” é
que possibilita aquilatar a validade do depoimento
e surpreender o perjúrio. Acho que nenhum
juiz, calejado no seu ofício, deixa-se
enganar por um falso testemunho. Nas audiências
virtuais isso seria totalmente impossível.
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