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Ditadura constitucional
Uma boa parcela do Poder Judiciário está sendo exercida,
na realidade, pelo presidente da República

DALMO DE ABREU DALLARI

O Brasil só tem Constituição e democracia quando isso não atrapalha as contas do governo ou os interesses políticos do presidente da República.
A Constituição diz que o Brasil é um "Estado democrático de Direito", no qual a democracia está assegurada, sobretudo pela existência de uma Constituição e pela separação dos Poderes.

Mas a prática brasileira mostra que o projeto político pessoal do chefe do Executivo e a submissão aos grandes interesses econômicos e financeiros são o que realmente conta.

O presidente, associando esse seu projeto político pessoal à boa convivência com instituições financeiras internacionais, condiciona o respeito à Constituição e aos direitos dos brasileiros aos interesses de "investidores externos", que investem no Brasil usando dinheiro brasileiro, e à plena satisfação de credores internacionais, muitos de duvidosa legitimidade.
Para impedir os brasileiros de usar seus direitos legalmente protegidos, especialmente quando eles implicam receber dinheiro ou serviços do governo, o chefe do Executivo descumpre, simplesmente, suas obrigações constitucionais ou cria barreiras editando medidas provisórias que agridem a Constituição e os direitos que ela assegura.

O Senado e a Câmara, amolecidos por generosa entrega de dinheiro público a muitos de seus membros, não reagem nem mesmo para a defesa de suas competências constitucionais. Graças a isso, as MPs, que só deveriam ser usadas raramente, em emergências graves, substituem a legislação normal.
O verdadeiro Poder Legislativo, aquele que realmente se exercita, está nas mãos do presidente. E o Supremo Tribunal Federal, que tem hoje entre seus membros um "líder do governo", mais serviçal do chefe do Executivo do que juiz, além de outros membros tradicionalmente submissos ao Executivo, não cumpre sua função primordial de guarda da Constituição. Logo, também uma boa parcela do Poder Judiciário está sendo exercida, na realidade, pelo presidente da República.

Uma situação concreta, que revela claramente essa deformação antidemocrática e inconstitucional, está pendente de alguns votos no Supremo Tribunal Federal. O caso teve início com a publicação da medida provisória número 1.570, de 26 de março de 1997.

Em artigo publicado nesta Folha sob o título "Caricatura jurídica" (25/4/1997), denunciei e apontei claramente os absurdos contidos naquela medida, incluindo afirmações erradas ou maliciosas na justificativa, bem como o uso de técnica legislativa que só se explica por má-fé ou incompetência, pois seria necessário consultar grande número de leis, entre as quais algumas do período ditatorial, para saber que direitos estavam sendo atingidos.
Valendo-se dos métodos de corrupção que já são de conhecimento público, especialmente depois das revelações feitas com precisão e competência pelo jornalista Fernando Rodrigues, o governo conseguiu converter aquela MP na lei 9.464, de 10 de setembro, que, entre outras aberrações jurídicas, proíbe juízes e tribunais brasileiros de conceder medida liminar contra atos do governo relacionados com finanças públicas, mesmo que esses atos sejam claramente ilegais ou inconstitucionais.

Desse modo, ficam proibidas as liminares que reconheçam a ilegalidade da exigência de um imposto, assim como aquelas que reconheçam o direito de um servidor de receber quantia que legalmente lhe cabe.

Para dar aparência de legalidade a esse absurdo jurídico, o presidente ingressou no Supremo com ação declaratória de constitucionalidade, para que o STF diga que a roda é quadrada -ou seja, que é constitucional impedir os juízes de dar proteção eficaz aos direitos, como lhes impõe a Carta.
Confirmando o que foi dito acima, essa petição do presidente da República foi assinada também pelos presidentes do Senado e da Câmara, com a curiosa particularidade de que este último é professor de... direito constitucional.
Acumulando uma série de absurdos, pretende-se que por meio daquela ação declaratória todas as decisões já proferidas sejam revogadas e todas as ações em andamento no Brasil sejam sustadas, para impedir que haja decisão liminar contra a Fazenda Pública.

Além de se dar efeito executório a uma ação que se chama declaratória, estará sendo introduzido aí um "efeito vinculante", não previsto na legislação. E, submetendo todas as ações já em andamento ao que for decidido pelo STF, estará sendo restaurada a antidemocrática "avocatória", que já existiu durante as ditaduras militares e que não teve acolhida na Carta de 1988.
Advogados, juízes, membros do Ministério Público e todos os brasileiros realmente desejosos de liberdade e conscientes de que, eliminado o direito, o que resta é o arbítrio devem reagir vigorosamente. É necessário e urgente denunciar e rejeitar essa farsa constitucional, esse "faz-de-conta" jurídico, que significa, em essência, uma tentativa de impor ao Brasil o absurdo de uma "ditadura constitucional".


Dalmo de Abreu Dallari, 65, advogado, é professor titular da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo) e vice-presidente da Comissão Internacional de Juristas. Foi secretário dos Negócios Jurídicos do município de São Paulo (gestão Luiza Erundina). (Folha de S. Paulo)

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