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Comentários ao artigo 25

Vicente Paulo da Silva (Vicentinho)

Na primeira metade deste século XX, duas grandes e sangrentas guerras marcaram, abalaram e destruíram parte do nosso mundo. Milhões de seres humanos, crianças, homens, mulheres, milhões foram mortos barbaramente. Estúpida, covarde e cruelmente. Sonhos foram cortados na raiz. Esperanças não resistiram às armas poderosas, à fome, à miséria. Liberdade, justiça e paz deixaram de ser palavras presentes no dia-a-dia. Terror e sangue. Uma humanidade envergonhada olhava para si mesma, perplexa, ante tantos crimes, dores e mortes. Saía-se do nazismo e do fascismo. Terminava a horrenda Segunda Guerra, que dividiu o mundo em dois lados.

Era 1948, e em poucos anos anteriores cerca de 6 milhões de judeus haviam sido mortos, exterminados, além de sindicalistas, homossexuais, comunistas, religioso e maçons, entre outros.

Hitler, conduzido ao poder pelo voto dos alemães, perpetrara um impiedoso processo de eugenia. Tentava, a qualquer custo, fazer prevalecer uma pretensa supremacia da raça branca.

A Segunda Guerra terminara há apenas três anos. Estarrecidos homens e mulheres perguntavam-se, discutiam, debatiam: qual é o limite da crueldade humana?

Apesar de tanta desesperança, surge a boa notícia trazida pela Assembléia Geral das Nações Unidas (ONU): foi proclamada, a 10 de dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, importantíssimo instrumento colocado como norma de conduta para os países envolvidos.

A Declaração, afirmo com convicção, é um dos mais belos documentos já produzidos pelo ser humano. Escrita em um momento delicado e crucial da história da humanidade, a Declaração é a bonança surgida após terríveis tumultos, é um arco-íris iluminando os céus do mundo depois de uma catastrófica tempestade.

A Declaração prega a liberdade, defende o direito, clama por justiça, exige ética, propõe saídas, pede compreensão, manifesta-se pelo amor, elenca sentimentos nobres – solidariedade, união, fraternidade.

Enfim, se seguida, reside na Declaração Universal dos Direitos Humanos um sério e suficiente caminho para uma real transformação da dura realidade em que vivemos.

Em um mundo dividido entre ricos e pobres, poderosos e oprimidos, exploradores e espoliados, devemos lutar, intransigentemente, para que nasçamos livres e iguais em dignidade e direitos, como prega, poeticamente, o primeiro artigo da Declaração.

Lamentavelmente, entretanto, a realidade na qual vivemos mostra-nos uma outra face da Declaração, ou seja, um absoluto desrespeito ao seu cumprimento. Lutar para que saia do papel é tarefa cotidiana, incansável e solidária de todos os que defendem os direitos humanos. Mas em inúmeros lugares esse conjunto de normas não é respeitado!

No Brasil, a situação não é diferente. Presenciamos, constatamos e denunciamos a exploração da mão-de-obra de milhares de trabalhadores e trabalhadoras e o não pagamento de direitos trabalhistas. Enfim, enfrentamos uma onda neoliberal que retira os direitos essenciais dos trabalhadores. O ser humano deixa a sua condição de igual em direitos e deveres e passa a ser valorizado somente se puder consumir, com uma conta bancária significativamente alta. Uma lógica perversa que exclui, afasta, aparta os pobres de seus mais legítimos direitos, consagrados na Declaração.

Mas não podemos perder a esperança e não vamos deixar que isso aconteça!

Cabe às entidades do movimento social, aos milhares de grupos que se espalham Brasil afora, um compromisso histórico: lutar por uma nova sociedade, propondo caminhos diferentes e alternativos, tendo em vista a chegada do novo milênio. Temos de nos unir para impedir que entremos em um novo milênio com tantas injustiças sociais, sérias desigualdades e dolorosas exclusões. Precisamos e queremos defender a vida, em todos os instantes e em todos os lugares.

O poeta amazonense Thiago de Mello, em sua versão da Declaração Universal dos Direitos Humanos, propõe que “todos nós confiemos uns nos outros como um menino confia em outro menino”. Queremos viver em um mundo no qual “as mais feias manhãs de terças-feiras transformem-se em radiosas manhãs de domingos”, como também defende o poeta do Amazonas, que traduz em versos a beleza da vida, a esperança de um novo dia, a alegria de nos sabermos vivos.

Mas há mais poesia que nos mostram a importância da união e da solidariedade.

O dramaturgo alemão Bertolt Brecht escreveu que os poderosos podem matar uma, duas, três rosas, mas não conseguirão deter a primavera.

Nada do que fizemos, portanto, pode ser uma ação individual, isolada do restante das pessoas e da nossa comunidade, que também clama por justiça e paz.

O arcebispo emérito de Recife e Olinda, Dom Hélder Câmara, escreveu uma poesia na qual ele ora pelos irmãos, pedindo que todos estejamos juntos, na vida e mesmo depois dela.

Pelo amor de Deus, respondam

Onde estão as crianças

Para contar-me de seus sonhos9

E os loucos

Para contar-me seus delírios

E os enfermos

Para contar-me seus sofrimentos

E os felizes e os infelizes

Os santos e os pecadores

As crianças e os velhos

Os mortos e os vivos

Os crentes e os descrentes

Os homens e os anjos

Os animais e as plantas,

As criaturas todas

De todos os mundos?

Ai de mim

Se subir sozinho

Ao altar de Deus.

Concordando com Dom Hélder, podemos afirmar que ai de nós se lutarmos sozinhos pelos direitos humanos.

Segundo o artigo 25, temos direito a um padrão de vida que assegure a nós e a nossa família saúde e bem-estar. Se temos esse direito, a quem cabe o dever?

No caso brasileiro, um Estado privatizado não pode oferecer aos seus cidadãos condições básicas que atendam aos cuidados 9essenciais a uma vida digna. Principalmente quando o governo federal realiza uma reforma previdenciária que na prática destrói a previdência pública solidária, facilitando, assim, o fortalecimento da previdência privada, que se pauta pelo lucro.

O movimento sindical, entretanto, ao lado de diversas entidades da sociedade civil, faz não só um diagnóstico diferente do momento pelo qual passa o Brasil, mas apresenta propostas, sempre em busca da necessária sustentabilidade da previdência pública, visando sempre à modernização e ao aperfeiçoamento do sistema.

Partimos de uma certeza: a previdência pública deve existir de maneira a combater privilégios, assegurar direitos e ser universal, de acordo com os preceitos deste artigo 25.

Este artigo trata de um tema que hoje afeta duramente o povo brasileiro: o desemprego. Afirma que todo ser humano tem direito à segurança em caso de desemprego. Somente na Grande São Paulo, cerca de 1 milhão e 600 mil homens e mulheres está desempregada, número terrível e assustador. Mas o desempregado não tem segurança no aspecto social. Muito pelo contrário, é sempre excluído.

A luta do movimento sindical, atualmente, extrapola a organização dos trabalhadores e trabalhadoras empregados, atingindo também os desempregados e os trabalhadores da economia informal. Reunidos em comitês de desempregados, a eles deve-se prestar a mais irrestrita solidariedade.

Solidariedade. É esta a mais importante palavra no que se refere à luta pelos direitos humanos. Solidariedade que se traduz em gestos concretos, sendo a prática muito mais importante que belos discursos. Podemos ter bem acabados conceitos a respeito da solidariedade, da justiça e da fraternidade. Mas pre9cisamos mais que isso: fazer com que os direitos humanos prevaleçam sobre a injustiça inclui, também, o acolhimento, a partilha, a presença ao lado dos que sofrem. Mas creio firmemente que o bem, a justiça, a paz e a vida vencem o desrespeito, a morte, a tristeza. O mal, felizmente, é exceção, não a regra, no mundo em que vivemos.

A recente divulgação dos vencedores do Prêmio Nobel de Literatura, da Paz e de Economia encheu-nos de esperanças.

O português José Saramago, ardoroso defensor da dignidade e da vida, o economista indiano Amartya Sem, que se preocupa em unir economia e ética junto aos pobres, e os líderes religiosos (o católico John Hume e o protestante David Trimble) que assinaram o acordo de paz para a Irlanda do Norte, na Sexta-feira Santa deste ano, comprovam que a esperança resiste.

Não podemos desanimar. Não devemos perder essa força que nos leva adiante. Não vamos permitir que o poder do mal consiga vencer o poder maior, qualquer é o bem. Esperança, sempre!

Gostaria de terminar homenageando duas personalidades queridas, cujo exemplo de vida sempre foi indiscutível, marcante e emocionante o compromisso com os direitos humanos: Herbert de Souza, o Betinho, que tinha a solidariedade como “profissão”. E Paulo Freire, que nos coloca a todos em condições de igualdade na concepção do saber, o que é revolucionário.

O contrário de viver não é morrer, mas é deixar-se dominar pela desesperança.

Que o artigo 25 e todos os demais artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos tenham poder suficiente para não serem apenas um sonho.

Como já cantava Raul Seixas, sonho que se sonha só é apenas um sonho. Mas sonho que se sonha juntos começa a ser realidade.

Presidente Nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT).

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