
CÓDIGO
DE CONDUTA DA
ALTA ADMINISTRAÇÃO FEDERAL
Art. 1o Fica
instituído o Código de Conduta da Alta Administração Federal, com as
seguintes finalidades:
I - tornar
claras as regras éticas de conduta das autoridades da alta
Administração Pública Federal, para que a sociedade possa aferir a
integridade e a lisura do processo decisório governamental;
II - contribuir
para o aperfeiçoamento dos padrões éticos da Administração Pública
Federal, a partir do exemplo dado pelas autoridades de nível
hierárquico superior;
III - preservar
a imagem e a reputação do administrador público, cuja conduta esteja
de acordo com as normas éticas estabelecidas neste Código;
IV - estabelecer
regras básicas sobre conflitos de interesses públicos e privados e
limitações às atividades profissionais posteriores ao exercício de
cargo público;
V - minimizar a
possibilidade de conflito entre o interesse privado e o dever funcional
das autoridades públicas da Administração Pública Federal;
VI - criar
mecanismo de consulta, destinado a possibilitar o prévio e pronto
esclarecimento de dúvidas quanto à conduta ética do administrador.
Art. 2o As
normas deste Código aplicam-se às seguintes autoridades públicas:
I - Ministros e
Secretários de Estado;
II - titulares
de cargos de natureza especial, secretários-executivos, secretários ou
autoridades equivalentes ocupantes de cargo do Grupo-Direção e
Assessoramento Superiores - DAS, nível seis;
III - presidentes
e diretores de agências nacionais, autarquias, inclusive as especiais,
fundações mantidas pelo Poder Público, empresas públicas e
sociedades de economia mista.
Art. 3o No
exercício de suas funções, as autoridades públicas deverão
pautar-se pelos padrões da ética, sobretudo no que diz respeito à
integridade, à moralidade, à clareza de posições e ao decoro, com
vistas a motivar o respeito e a confiança do público em geral.
Parágrafo único. Os
padrões éticos de que trata este artigo são exigidos da autoridade
pública na relação entre suas atividades públicas e privadas, de
modo a prevenir eventuais conflitos de interesses.
Art. 4o Além
da declaração de bens e rendas de que trata a Lei no 8.730,
de 10 de novembro de 1993, a autoridade pública, no prazo de dez d??????t??ias
contados de sua posse, enviará à Comissão de Ética Pública - CEP,
criada pelo Decreto de 26 de maio de 1999, publicado no Diário Oficial
da União do dia 27 subseqüente, na forma por ela estabelecida,
informações sobre sua situação patrimonial que, real ou
potencialmente, possa suscitar conflito com o interesse público,
indicando o modo pelo qual irá evitá-lo.
Art. 5o As
alterações relevantes no patrimônio da autoridade pública deverão
ser imediatamente comunicadas à CEP, especialmente quando se tratar de:
I - atos de gestão
patrimonial que envolvam:
a) transferência de bens
a cônjuge, ascendente, descendente ou parente na linha colateral;
b) aquisição, direta ou
indireta, do controle de empresa; ou
c) outras alterações
significativas ou relevantes no valor ou na natureza do patrimônio;
II - atos de
gestão de bens, cujo valor possa ser substancialmente afetado por
decisão ou política governamental da qual tenha prévio conhecimento
em razão do cargo ou função, inclusive investimentos de renda
variável ou em commodities, contratos futuros e moedas para fim
especulativo.
§ 1o Em
caso de dúvida sobre como tratar situação patrimonial específica, a
autoridade pública deverá consultar formalmente a CEP.
§ 2o A
fim de preservar o caráter sigiloso das informações
pertinentes à situação patrimonial da autoridade
pública, uma vez conferidas por pessoa designada
pela CEP, serão elas encerradas em envelope lacrado,
que somente será aberto por determinação da Comissão.
Art. 6o A
autoridade pública que mantiver participação superior a cinco por
cento do capital de sociedade de economia mista, de instituição
financeira, ou de empresa que negocie com o Poder Público, tornará
público este fato.
Art. 7o A
autoridade pública não poderá receber salário ou qualquer outra
remuneração de fonte privada em desacordo com a lei, nem receber
transporte, hospedagem ou quaisquer favores de particulares de forma a
permitir situação que possa gerar dúvida sobre a sua probidade ou
honorabilidade.
Parágrafo único. É
permitida a participação em seminários, congressos e eventos
semelhantes, desde que tornada pública eventual remuneração, bem como
o pagamento das despesas de viagem pelo promotor do evento, o qual não
poderá ter interesse em decisão a ser tomada pela autoridade.
Art. 8o É
permitido à autoridade pública o exercício não remunerado de encargo
de mandatário, desde que não implique a prática de atos de comércio
ou quaisquer outros incompatíveis com o exercício do seu cargo ou
função, nos termos da lei.
Art. 9o É
vedada à autoridade pública a aceitação de presentes, salvo de
autoridades estrangeiras nos casos protoc??????t??olares em que houver
reciprocidade.
Parágrafo único. Não
se consideram presentes para os fins deste artigo os brindes que:
I - não tenham
valor comercial; ou
II - distribuídos
por entidades de qualquer natureza a título de cortesia, propaganda,
divulgação habitual ou por ocasião de eventos especiais ou datas
comemorativas, não ultrapassem o valor de R$ 100,00 (cem reais).
Art. 10. No
relacionamento com outros órgãos e funcionários da Administração, a
autoridade pública deverá esclarecer a existência de eventual
conflito de interesses, bem como comunicar qualquer circunstância ou
fato impeditivo de sua participação em decisão coletiva ou em órgão
colegiado.
Art. 11. As
divergências entre autoridades públicas serão resolvidas
internamente, mediante coordenação administrativa, não lhes cabendo
manifestar-se publicamente sobre matéria que não seja afeta a sua
área de competência.
Art. 12. É
vedado à autoridade pública opinar publicamente a respeito:
I - da honorabilidade e
do desempenho funcional de outra autoridade pública federal; e
II - do mérito
de questão que lhe será submetida, para decisão individual ou em
órgão colegiado.
Art. 13. As
propostas de trabalho ou de negócio futuro no
setor privado, bem como qualquer negociação que
envolva conflito de interesses, deverão ser imediatamente
informadas pela autoridade pública à CEP, independentemente
da sua aceitação ou rejeição.
Art. 14. Após deixar o cargo,
a autoridade pública não poderá:
I - atuar em benefício ou em
nome de pessoa física ou jurídica, inclusive sindicato ou associação
de classe, em processo ou negócio do qual tenha participado, em razão
do cargo;
II - prestar consultoria a
pessoa física ou jurídica, inclusive sindicato ou associação de
classe, valendo-se de informações não divulgadas publicamente a
respeito de programas ou políticas do órgão ou da entidade da
Administração Pública Federal a que esteve vinculado ou com que tenha
tido relacionamento direto e relevante nos seis meses anteriores ao
término do exercício de função pública.
Art. 15. Na ausência de
lei dispondo sobre prazo diverso, será de quatro meses, contados da
exoneração, o período de interdição para atividade incompatível
com o cargo anteriormente exercido, obrigando-se a autoridade pública a
observar, neste prazo, as seguintes regras:
I - não aceitar cargo de
administrador ou conselheiro, ou estabelecer vínculo profissional com
pessoa física ou jurídica com a qual tenha mantido relacionamento
oficial direto e relevante nos seis meses anteriores à exoneração;
II - não
intervir, em benefício ?ou em nome de pessoa física ou jurídica, junto a órgão ou
entidade da Administração Pública Federal com que tenha tido
relacionamento oficial direto e relevante nos seis meses anteriores à
exoneração.
Art. 16. Para
facilitar o cumprimento das normas previstas neste Código, a CEP
informará à autoridade pública as obrigações decorrentes da
aceitação de trabalho no setor privado após o seu desligamento do
cargo ou função.
Art. 17. A
violação das normas estipuladas neste Código acarretará, conforme
sua gravidade, as seguintes providências:
I - advertência,
aplicável às autoridades no exercício do cargo;
II - censura
ética, aplicável às autoridades que já tiverem deixado o cargo.
Parágrafo único. As
sanções previstas neste artigo serão aplicadas pela CEP, que,
conforme o caso, poderá encaminhar sugestão de demissão à autoridade
hierarquicamente superior.
Art. 18. O
processo de apuração de prática de ato em desrespeito ao preceituado
neste Código será instaurado pela CEP, de ofício ou em razão de
denúncia fundamentada, desde que haja indícios suficientes.
§ 1o A
autoridade pública será oficiada para manifestar-se no prazo de cinco
dias.
§ ?;2o O
eventual denunciante, a própria autoridade pública,
bem assim a CEP, de ofício, poderão produzir prova
documental.
§ 3o A
CEP poderá promover as diligências que considerar necessárias, bem
assim solicitar parecer de especialista quando julgar imprescindível.
§ 4o Concluídas
as diligências mencionadas no parágrafo anterior, a CEP oficiará a
autoridade pública para nova manifestação, no prazo de três dias.
§ 5o Se
a CEP concluir pela procedência da denúncia, adotará uma das
penalidades previstas no artigo anterior, com comunicação ao
denunciado e ao seu superior hierárquico.
Art. 19. A
CEP, se entender necessário, poderá fazer recomendações ou sugerir
ao Presidente da República normas complementares, interpretativas e
orientadoras das disposições deste Código, bem assim responderá às
consultas formuladas por autoridades públicas sobre situações
específicas.
Publicado no D.O. de
22.8.2000
EXPOSIÇÃO
DE MOTIVOS Nº 37, DE 18.8.2000
APROVADO EM 21.8.2000
Excelentíssimo Senhor
Presidente da República,
Submeto à elevada
consideração de Vossa Excelência a anexa proposta de Código de
Conduta da Alta Administração Federal, elaborado tendo em conta os
traba??????t??lhos e a importante contribuição da Comissão de Ética Pública
- CEP, criada pelo Decreto de 26 de maio de 1999, que, por seus ilustres
membros, os Drs. João Geraldo Piquet Carneiro, que a preside, Célio
Borja, Celina Vargas do Amaral Peixoto, Lourdes Sola, Miguel Reale
Júnior e Roberto Teixeira da Costa, prestou os mais relevantes e
inestimáveis serviços no desenvolvimento do tema.
Este Código, antes de
tudo, valerá como compromisso moral das autoridades integrantes da Alta
Administração Federal com o Chefe de Governo, proporcionando elevado
padrão de comportamento ético capaz de assegurar, em todos os casos, a
lisura e a transparência dos atos praticados na condução da coisa
pública.
A conduta dessas
autoridades, ocupantes dos mais elevados postos da estrutura do Estado,
servirá como exemplo a ser seguido pelos demais servidores públicos,
que, não obstante sujeitos às diversas normas fixadoras de condutas
exigíveis, tais como o Estatuto do Servidor Público Civil, a Lei de
Improbidade e o próprio Código Penal Brasileiro, além de outras de
menor hierarquia, ainda assim, sempre se sentirão estimulados por
demonstrações e exemplos de seus superiores.
Além
disso, é de notar que a insatisfação social com
a conduta ética do governo – Executivo, Legislativo
e Judiciário – não é um fenômeno exclusivamente
brasileiro e circunstancial. De modo geral, todos
os países democráticos desenvolvidos, conforme
demonstrado em recente estudo da Organização para
Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE,
enfrentam o crescente ceticismo da opinião pública
a respeito do comportamento dos administradores
públicos e da classe política. Essa tendência
parece estar ligada principalmente a mudanças
estruturais do papel do Estado como regulador
da atividade econômica e como poder concedente
da exploração, por particulares, de serviços públicos
antes sob regime de monopólio estatal.
Em conseqüência, o
setor público passou a depender cada vez mais do recrutamento de
profissionais oriundos do setor privado, o que exacerbou a possibilidade
de conflito de interesses e a necessidade de maior controle sobre as
atividades privadas do administrador público.
Nesse novo cenário, é
natural que a expectativa da sociedade a respeito da conduta do
administrador público se tenha tornado mais exigente. E está claro que
mais importante do que investigar as causas da insatisfação social é
reconhecer que ela existe e se trata de uma questão política
intimamente associada ao processo de mudança cultural, econômica e
administrativa que o País e o mundo atravessam.
A resposta ao anseio por
uma administração pública orientada por valores éticos não se
esgota na aprovação de leis mais rigorosas, até porque leis e
decretos em vigor já dispõem abundantemente sobre a conduta do
servidor público, porém, em termos genéricos ou então a partir de
uma ótica apenas penal.
Na
realidade, grande parte das atuais questões éticas
surge na zona cinzenta – cada vez mais ampla –
que separa o interesse público do interesse privado.
Tais questões, em geral, não configuram violação
de norma legal mas, sim, desvio de conduta ética.
Como esses desvios não são passíveis de punição
específica, a sociedade passa a ter a sensação
de impunidade, que alimenta o ceticismo a respeito
da licitude do processo decisório governamental.
Por essa razão, o
aperfeiçoamento da conduta ética do servidor público não é uma
questão a ser enfrentada mediante proposição de mais um texto
legislativo, que crie novas hipóteses de delito administrativo. Ao
contrário, esse aperfeiçoamento decorrerá da explicitação de regras
claras de comportamento e do desenvolvimento de uma estratégia
específica para sua implementação.
Na formulação dessa
estratégia, partiu-se do pressuposto de que a base ética do
funcionalismo de carreira é estruturalmente sólida, pois deriva de
valores tradicionais da classe média, onde ele é recrutado.
Rejeita-se, portanto, o diagnóstico de que se está diante de um
problema "endêmico" de corrupção, eis que essa visão,
além de equivocada, é injusta e contraproducente, sendo capaz de
causar a alienação do funcionalismo do esforço de aperfeiçoamento
que a sociedade está a exigir.
Dessa forma, o ponto de
partida foi a tentativa de prevenir condutas incompatíveis com o
padrão ético almejado para o serviço público, tendo em vista que, na
prática, a repressão nem sempre é muito eficaz. Assim, reputa-se
fundamental identificar as áreas da administração pública em que
tais condutas podem ocorrer com maior freqüência e dar-lhes tratamento
específico.
Essa
tarefa de envergadura deve ter início pelo nível
mais alto da Administração – ministros de estado,
secretários-executivos, diretores de empresas
estatais e de órgãos reguladores – que detem poder
decisório. Uma vez assegurado o cumprimento do
Código de Conduta pelo primeiro escalão do governo,
o trabalho de difusão das novas regras nas demais
esferas da administração por certo ficará facilitado.
Outro objetivo é que o
Código de Conduta constitua fator de segurança do administrador
público, norteando o seu comportamento enquanto no cargo e protegendo-o
de acusações infundadas. Na ausência de regras claras e práticas de
conduta, corre-se o risco de inibir o cidadão honesto de aceitar cargo
público de relevo.
Além disso, buscou-se
criar mecanismo ágil de formulação dessas regras e de sua difusão e
fiscalização, além de uma instância à qual os administradores
possam recorrer em caso de dúvida e de apuração de transgressões –
no caso, a Comissão de Ética Pública.
Na verdade, o Código
trata de um conjunto de normas às quais se sujeitam as pessoas nomeadas
pelo Presidente da República para ocupar qualquer dos cargos nele
previstos, sendo certo que a transgressão dessas normas não
implicará, necessariamente, violação de lei, mas, principalmente,
descumprimento de um compromisso moral e dos padrões qualitativos
estabelecidos para a conduta da Alta Administração. Em conseqüência,
a punição prevista é de caráter político: advertência e
"censura ética". Além disso, é prevista a sugestão de
exoneração, dependendo da gravidade da transgressão.
A
linguagem do Código é simples e acessível, evitando-se
termos jurídicos excessivamente técnicos. O objetivo
é assegurar a clareza das regras de conduta do
administrador, de modo que a sociedade possa sobre
elas exercer o controle inerente ao regime democrático.
Além de comportar-se de
acordo com as normas estipuladas, o Código exige que o administrador
observe o decoro inerente ao cargo. Ou seja, não basta ser ético; é
necessário também parecer ético, em sinal de respeito à sociedade.
A medida proposta visa a
melhoria qualitativa dos padrões de conduta da Alta Administração, de
modo que esta Exposição de Motivos, uma vez aprovada, juntamente com o
anexo Código de Conduta da Alta Administração Federal, poderá
informar a atuação das altas autoridades federais, permitindo-me
sugerir a publicação de ambos os textos, para imediato conhecimento e
aplicação.
Estas, Excelentíssimo
Senhor Presidente da República, as razões que fundamentam a proposta
que ora submeto à elevada consideração de Vossa Excelência.
Respeitosamente,
PEDRO PARENTE
Chefe da Casa Civil da Presidência da República |