
Origem
dos Direitos do Homem e dos Povos
Ligia Bove *
Introdução
Os direitos sempre
surgiram das necessidades de cada tempo e da luta empreendida para
conseguir efetivá-los através de leis.
Quando o homem vivia em
pequenos grupos, as dificuldades que emergiam eram resolvidas ou pela
ardilosidade ou pela força bruta. Conforme as sociedades foram se
tomando mais complexas, foi se evidenciando a necessidade do
estabelecimento de normas, de pactos para a sua organização econômica,
política, social e até religiosa.
O conjunto de regras
transmitidas oralmente de geração em geração corria o risco de
desvirtuamento. Com a escrita, surgiu a possibilidade de se perpetuar as
conquistas do espirito humano no Tento caminho da justiça, da,
liberdade e da equidade.
A contextura de normas
que regiam o comportamento dos homens teve, durante séculos, um caráter
religioso, provido de inspiração divina. Assim foram elaborados o Código
de Hamurabi, a Lei Mosaica, O Código de Manu. Depois o direito foi se
laicizando: a Lei das XII tábuas foi a expressão do povo através dos
tribunos romanos (mas a lei que rege os povos islâmicos é de caráter
religioso). Com o correr dos tempos cada povo foi adotando uma lei de
acordo com as suas necessidades especificas, embora incorporando os
direitos que foram sendo conquistas da humanidade como um todo.
O Direito moderno
Desde Rousseau
(1712-1778) estava se expandindo a noção dos direitos e das liberdades
humanas. ao afirmar que o homem é naturalmente bom, Rousseau quis negar
o pecado original portanto a noção de que o mal lhe é inerente -
sugerindo que se o homem se torna fraco, ansioso ou infeliz é porque o
meio no qual vive não é adequado à sua natureza. O homem nasce com
potencialidades que ele luta por realizar: se é impedido de fazê-lo,
torna-se ambicioso, cheio de necessidades que o colocam em conflito com
os outros homens por não poder satisfazê-las.
Rousseau estabelece uma
estreita correlação entre a estrutura social e as condições morais e
psicológicas do indivíduo, acreditando que a discórdia entre os
homens advém da excessiva desigualdade de riqueza e do tamanho e da
complexidade da sociedade moderna. O homem não poderia ser livre e
feliz se não pudesse estabelecer uma boa relação consigo mesmo e com
os outros, o que somente poderia acontecer numa comunidade pequena e
simples, onde todos pudessem participar em igualdade de condições das
mesmas crenças, dos mesmos princípios, do estabelecimento das suas
leis e do seu governo. Aí, haveria a possibilidade de um mundo inteligível.
Numa comunidade grande e complexa, segundo ele, surgem inevitavelmente a
desigualdade e o controle de poucos sobre uma maioria passiva.
A importância de
Rousseau está na denúncia apaixonada e radical que fez da sociedade,
dos seus males, o que desvelou a ordem estabelecida como algo odioso.
Declaração da Independência
dos Estados Unidos da América
Embora fazendo parte do
Império Britânico, as colônias da América desde cedo foram
conquistando o direito de se auto-governar, assim como assumiram o dever
de se tornarem auto-suficientes. No entanto, a Inglaterra impunha restrições
séria, sucessivas e cada vez maiores à vida econômica das colônias,
através da obrigatoriedade do pagamento de taxas à Grã-Bretanha sobre
o comércio exterior. Isto fomentou nos colonos um forte espírito de
desobediência e insubordinação.
Vários incidentes
ocorreram através dos quais os colonos demonstraram a sua hostilidade
às medidas do rei.
As colônias se unem, se
organizam para efetuarem uma rebelião aberta. Medidas repressivas
são tomadas pela coroa. Alastra-se o anseio
de libertação das colônias, que culminou com a Declaração de Independência dos Estados Unidos.
As treze colônias declararam-se Estados Livres e Independentes, expondo as razões fundamentais que
levaram à separação:
- todos os homens foram
criados iguais;
- Os direitos inalienáveis
conferidos pelo Criador, entre os quais o de vida e de liberdade e o de
os homens procurarem a própria felicidade;
- sempre que qualquer
forma de governo tenta destruir esses fins, assiste ao povo o direito de
mudá-la ou aboli-la e instituir um novo governo.
Este Documento tem
servido de referencial para todos os movimentos de independência dos
povos colonizados.
Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão
A Revolução Francesa
criou um direito novo, fonte fundamental do direito constitucional
moderno: A declaração dos direitos do Homem e do cidadão. Em seu
primeiro artigo já foi estabelecido um direito social: O fim da
sociedade é a felicidade comum.
O ponto essencial é que,
ao lado dos direitos do homem e do cidadão, vem apontada a obrigação
de o Estado respeitar esses direitos e de os garantir.
O inciso Lei deve ser a
mesma para todos foi integrado em quase todas as constituições européias
do século XX, assim como em várias de outros povos.
Declaração Universal
dos Direitos Humanos
Através dos tempos, em vários
conclaves internacionais, continuaram sendo elaborados documentos
visando a melhoria nas relações entre os homens e os povos:
A Declaração Universal
dos Direitos humanos (DUDH) - aprovada a 10 de dezembro de 1948 pela
Assembléia Geral das Nações Unidas - foi o mais amplo documento
concebido em favor da humanidade até essa data. Nos seus 30 artigos,
essa Declaração de caráter internacional contém uma súmula dos
direitos e deveres fundamentais do homem, sob os aspectos individual,
social, cultural e político.
Outros Documentos
Reconhecendo que, de
acordo com a DUDH, o ideal do ser humano livre, libertado do temor e da
miséria, não pode ser realizado a menos que se criem condições que
permitam a cada
um gozar dos seus
direitos econômicos, sociais e culturais, assim como dos seus direitos
civis e políticos, os plenipotenciários autorizados dos estados Partes
da ONU assinaram, em 1966, o Pacto Internacional de Direitos Econômicos,
sociais e Culturais e o Pacto Internacional de direitos Civis e Políticos.
Nesses documentos, que entraram em vigor a partir de 1976, os Estados
partes se comprometem a garantir os direitos neles enunciados.
Além desses pactos
outras declarações e convenções internacionais, procurando assegurar
direitos gerais e específicos, foram enunciadas. Entre elas cabe
destacar:
- Convenção para Prevenção
e Sanção do Delito de Genocídio;
- Convenção sobre
direitos políticos da Mulher;
- declaração dos
Direitos da Criança;
- Declaração e convenção
sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial;
- Proclamação de
Teheran, na qual a conferência Internacional de Direitos Humanos,
consciente de que, apesar do rápido progresso da ciência e da
tecnologia em muitas partes do mundo, prevalecem os conflitos e as violências,
declara que a crescente disparidade entre os países economicamente
desenvolvidos e os países em desenvolvimento impede a realização dos
direitos civis e políticos, tornando-se necessária a implementação
de políticas nacionais e internacionais eficazes para se atingir a paz,
que é uma aspiração universal da humanidade;
- Pacto de San José de
Costa Rica, que visa estabelecer meios para o cumprimento dos
compromissos assumidos pêlos Estados Partes da Convenção Americana
sobre Direitos Humanos.
Deve-se notar, no entanto,
que emborca esses instrumentos e as leis denotem grande apreço
pêlos direitos individuais e sociais, na vida concreta das nações
há um distanciamento - em grau variável - entre a lei escrita
e a prática cotidiana. Mas resta a esperança de chegue brevemente
o tempo em que haja sincronismo entre o direito e o fato sociais.
* Ligia Bove é artista
plástica e membro da CJP-SP |