
Carta Aberta Sobre a Tortura
Cidadãos!
Autoridades!
A ACAT-Brasil (Ação dos Cristãos para a
Abolição da Tortura) e a Comissão de Direitos Humanos da
Câmara Municipal de São Paulo, por ocasião do encerramento da
Primeira Conferência sobre "A Tortura no Brasil",
realizada nesta Cidade, dirigem-se a todos os cidadãos de boa
vontade e às autoridades constituídas do país para alertá-los
sobre os seguintes pontos:
1. A tortura - crime que ataca a integridade
de uma pessoa em grupos sociais e étnicos, causando-lhes
sofrimento físico ou mental - existe no Brasil de hoje e é
praticada em grande escala pelos agentes do Estado, com a
conivência da sociedade, contra os mais fracos e os mais pobres de nossa população;
2. Os Meios de Comunicação Social,
principalmente nos últimos meses deste ano, vêm mostrando e
revelando ao público cenas cada vez mais frequentes de maus
tratos e torturas a que são submetidos os suspeitos, os presos e
os menores inflatores.
Apesar do relevante empenho da midia, esta brutalidade não
cessa, diminue um pouco na ocasião das denuncias.
3. É intolerável que um Estado
Democrático de Direito, como o Brasil, conviva com qualquer tipo
de tortura, como método habitual de investigação, disciplina e
punição, sofrida
por qualquer um dos cidadãos, evidenciando um divorcio entre o
discurso e a prática ;
4. Num país de pensamento pluralista e
pretensamente igualitário, não se pode conviver com práticas
discriminatórias, como registramos e denunciamos nesta
conferência : negros, travestis, mulher,
homosexuais, lésbicas, presos e criança e adolescente.
5. Em nossa Constituição Federal está bem
claro, no Título dos Direitos e Garantias Fundamentais, que
"ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano
ou degradante" (art. 5º, III). Além disso, a Lei n. 9.455,
de 7 de abril de 1997, que define e tipifica os crimes de tortura, pune
com rigor quem os pratica e não lhe permite a fiança nem o
benefício da graça ou anistia;
6. Apesar de nossas leis e da Convenção
internacional contra tortura e outros tratamentos, ou penas
cruéis, desumanas ou degradantes, ratificada pelo Brasil, o fato
é que os crimes de tortura continuam a ser cometidos e a desafiar
os cidadãos e as autoridades para dar um fim nesse estado de
coisas que mancha e envergonha toda a nação;
7. A ACAT-Brasil (Ação dos Cristãos para
a Abolição da Tortura), Organização Não Governamental,
fundada em 1999 e junto à
FI-ACAT (Federação Internacional da Ação dos cristãos para a
Abolição da Tortura) com sede em Paris – França, surgiu precisamente para
enfrentar esse gravíssimo problema, buscando mecanismos que
tornem possível a apuração ágil dos fatos e a punição
exemplar dos torturadores, divulgando acontecimentos e
pressionando as autoridades a sair de sua inércia para
esclarecê-los e responsabilizar os culpados, propondo aos Poderes
políticas públicas que inibam a prática da tortura, promovendo
seminários, encontros e conferências acerca deste assunto,
sugerindo às vítimas de violência, com o imprescindível apoio
das organizações, as providências que podem e devem tomar, sem
medo, para erradicar a tortura de nosso país, e, enfim, criando
condições e estímulos para que a Sociedade e a Educação,
formal e informal, incorporem em seu pensar e agir a pedagogia do
respeito absoluto à dignidade do ser humano e à construção da
fraternidade universal.
Por tudo isso, requeremos das autoridades,
na linha de seus Planos e Programas de Implementação dos
Direitos Humanos, a adoção de urgentes e eficazes medidas para
educar, prevenir, coibir e punir a prática da tortura, pronta e
modelarmente, observado o devido processo legal, visando a
mudança de mentalidade e abolição de tão horrendos métodos.
Finalmente, conclamamos todos os
interessados a compartilhar de nossas preocupações e a se unir a
nossos esforços e ideais de abolição, na raiz, da prática da
tortura, onde quer que se manifeste.
PARA A ELIMINAÇÃO DA TORTURA É
IMPRESCINDIVEL :
l. Eliminar a impunidade desfrutada
pelos funcionários, guardas, carcereiros, policiais e outros
agentes do Estado que espancam e torturam presos, adultos,
crianças e jovens.
2. Garantir a integridade física e moral
dos presos que denunciam seus algozes.
3. Facilitar e garantir imediatamente
os exames médicos forenses-legais, de "corpo de delito"
4. Exigir que médicos trabalhando nas
prisões o façam em estrita conformidade e observância das
normas éticas, nacionais e internacionais de sua profissão e
juramento.
5. Pressionar os governos estaduais
para que haja de fato assistência jurídica para todos os presos
pobres e carentes. Que haja assistência judiciaria de qualidade.
6. Permitir inspeções livres e
desimpedidas por solidas ONGs de Direitos Humanos, nacionais e
internacionais, para garantir transparência no sistema
prisional-penitenciario.
7. Reconhecer a jurisdição do Comitê de
Direitos Humanos das Nações Unidas apresentando relatórios
periódicos e imparciais.
8. Federalizar os crimes contra as
violações de Direitos Humanos, de conformidade com o PL
4715-C/94, ampliando assim a autoridade do CDDPH (Conselho de
Defesa dos Direitos da Pessoa Humana)que poderá determinar os casos a serem
transferidos ä jurisdição da policia, ministério público e
justiça federal.
9. Garantir a autonomia dos Institutos
Médicos Legais.
10. Registrar e classificar todos os abusos
policiais.
11. Implementar o PROVITA - Proteção a
Vitimas e Testemunhas de Violência, estendendo-se aos familiares
de presos ameaçados de tortura.
12. Cumprimento e aplicaçao da Lei 9455/97,
que define e tipifica os crimes de tortura, tratamentos ou penas
cruéis, desumanas ou degradantes ;
Lida, aprovada e assinada conforme segue, no plenário da 1ª
Conferência Regional Sobre Tortura .
ACAT-Brfasil, Serviço a Mulher
Marginalizada, Comissão Justiça e Paz de S.Paulo, Pastoral
Operária, Movimento de Trabalhadores Cristàos, Pastoral da
Mulher Marginalizada, Casa de Apoio Olho D ‘Agua, ATRASP
– Associaçao de Travestis de S.Paulo, Centro de Defesa da
Criança e do Adolescente Indiara Felix Santos Afonso, Anistia Internacional -
seção brasileira, Centro de Direitos Humanos Carlos Alberto
Pazzini, Casa de Convivência da Mulher, Pastoral Carcerária da Diocese de
Guarulhos, Secretaria Municipal de Cidadania e Assistência Social
de Caçapava, Comitê Teodoro-Dirley de Direitos Humanos,
Movimento Nacional de Direitos Humanos/SP, Centro Oscar Romero de
Direitos Humanos,. Pastoral da Criança de Guarulhos,
Organização Paulista para Ações de Cidadania,. Pastoral
Carcerária de Taubate,. Comissão da Campanha da Fraternidade de
Taubate, Comissão
Diocesana de Leigos de Taubate,
Pastoral Carcerária da Diocese de Santos, Procuradoria Geral do
Estado de São Paulo, Associação
Feminina da Zona Norte, CEDECA – ABC, PROMOVE e IPA Brasil, Conselho da Comunidade de
Taubate, Pastoral Carcerária de Caçapava, Pastoral da Educação de
Caçapava, Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal de
Santo André, Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente de
Santo André, Instituto
do Negro Padre Batista, Comissão
de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de S.Paulo, Comissão de Direitos
Humanos da Câmara Municipal de S.Paulo, Fala Preta, Projeto ETECETRA E TAL,
Pastoral Cvarceraria de São Paulo,
Pastoral Carcerária de Botucatu, Pastoral Carcerária de
Avaré, Comissào Justiça e Paz – Missionarios da Consolata.
São Paulo, 30 de novembro de 1999
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