
As
mulheres à margem no ano 2000
Samantha
Buglione e
Virgínia Feix?*
Introdução
O
que significa reservar um espaço para pautar a situação das
mulheres? Quais mulheres, quais direitos? É importante ressaltar
que a partir de 1993, com a Conferência
Mundial de Direitos Humanos, em Viena, os direitos das
mulheres passaram a ser reconhecidos como direitos humanos. O fato
é fundamental para a
compreensão do que são os direitos humanos. Esse reconhecimento
amplia o objeto de proteção dos direitos humanos e, por conseqüência,
práticas, principalmente, em relação às políticas públicas,
garantia de direitos e demandas individuais.
Outra importante conquista refere-se a já antiga Convenção
sobre eliminação de todas as formas de discriminação contra à
mulher (CEDAW), de 1979, ratificada pelo Brasil, na íntegra,
apenas em 1994. A Cedaw pode ser compreendida como um novo
paradigma para os direitos? humanos, principalmente por que além
de "declarar" direitos imputa aos estados ações de
erradicação da discriminação, como as ações afirmativas.
Sobre
discriminação vamos usar a idéia da professora Rebecca Cook
que afirma ser a discriminação multifuncional, ou seja, não é
uma prática que elege apenas uma categoria de raça ou etnia,
tampouco de classe, mas tende a se promover conjugando todos os
elementos de maior vulnerabilidade. Ao pensar políticas de
erradicação ou diminuição de práticas discriminatórias é
fundamental ter o pressuposto da multifuncionalidade sob o risco
de promover políticas estéreis e não funcionais. Isso significa
que é necessário dimensionar todas as
"especificidades" para a promoção de estratégia de
garantia de direitos, ou seja, a raça/etnia, gênero, classe
social, idade.
A
partir destas duas idéias: 1. dos direitos das mulheres como
direitos humanos e da responsabilidade (leia-se obrigação) legal
dos estados em promover ação de erradicação da discriminação
e 2. desta como uma prática multifuncional é que vamos procurar
co?ntribuir para dimensionar
a situação das mulheres no ano 2000. Cabe, como sempre, falar da
fragilidade das informações,
em termos de
estatística no
Brasil, e da importância
da sua leitura
enquanto
definidora e justificadora de políticas públicas ou estratégias
de direitos humanos. Os dados mais recentes ainda são de 1996,
com algumas atualizações em 2000, como na saúde.
Para
falar da situação das mulheres é importante contextualizá-la.
Em linhas gerais, o Relatório sobre Desenvolvimento Humano da
ONU, versão 1999, aponta que 26 milhões de brasileiros vivem à
margem do desenvolvimento humano, sem condições mínimas de saúde,
educação, saneamento básico ou serviços essenciais. O Brasil
é o campeão mundial em concentração da riqueza: enquanto os
20% mais ricos acumulam bens e capital, 18% da população detém
a miséria absoluta, numa diferença de 32 vezes entre os opostos.
De
acordo com estudos realizados pelo Núcleo Interdisciplinar de
Estudo sobre Desigualdades, da Universidade Federal do Rio de
Janeiro, se adotássemos como cálculo a razão entre a renda média
dos 10% mais ricos e a renda média dos 40% mais pobres,
conclui-se que o país, nesta razão, se aproxima de 30.
Calcula-se que 7% das crianças no Brasil sofram de subnutrição,
enquanto a produção nacional de grãos é suficiente para
alimentar uma vez e meia a população total. Quanto à erradicação
da pobreza, percebe-se que os recursos necessários para seu fim,
estariam na ordem de 5% da renda nacional para a sua completa
eliminação.
Mas
qual a relação direta entre essas informações e a idéia da
multifuncionalidade, para destacar a informação sobre a situação
das mulheres? A população feminina, segundo estimativas do IBGE,
representa mais de 51% da população brasileira. Isso significa
que a pobreza exerce maiores encargo sobre as mulheres.
As
mulheres brasileiras representam 40,4% da população
economicamente ativa, sendo que na Administração? Pública
Federal este percentual é de 43,8%, segundo dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, de 1997. Estudos
sobre a participação feminina no mercado de trabalho têm
mencionado o expressivo aumento do número de mulheres entre a
População Economicamente Ativa (PEA), de 20% em 1970 para 43% em
1997.
No
entanto, a segregação ocupacional e os rendimentos inferiores
aos dos homens,
permanecem como obstáculos a serem superados. As mulheres são
maioria nos subempregos e
no setor informal da economia, especialmente na categoria das
empregadas domésticas. O emprego doméstico continua sendo a
principal fonte de ocupação. Estimativas para 2000 apontam que
tal ocupação significa 19% da PEA feminina – algo em torno de
cinco milhões de mulheres, das quais 56% são negras.
No
setor formal, as mulheres, de modo geral, recebem menos que os
homens para um mesmo tipo de trabalho e o acesso a treinamento é
? muito difícil. Mesmo sendo preferidas no emprego parcial, em
trabalhos com base no domicílio, tal preferência não pode ser
considerada como benéfica às mulheres, pois não contam com
proteção contra doenças relacionadas à automação. Apesar de
ter crescido o número de mulheres chefes de família, este fato não
as favorece nesta condição. Ao contrário, é um dos fatores
para o reconhecimento da feminilização
da pobreza, principalmente pela omissão masculina nas
responsabilidades paternas. A separação do casal geralmente
significa para o homem o fim de qualquer obrigação com os
filhos.
Apesar
das mulheres possuírem níveis educacionais superiores aos dos
homens, seus rendimentos são significativamente inferiores. Entre
as mulheres ocupadas que tiveram entre 1 e 3 anos de estudos,
22,5% ganham até ½ salário mínimo, sendo este rendimento a
soma de todos os trabalhos realizados. No que
diz respeito aos homens ocupados, com igual número de anos
de estudo e rendimento, este percentual cai abruptamente para
9,4%. Considerando o nível de formação entre 8 e 10 anos de
estudos, 22,7% das mulheres ocupadas recebem ente ½ e 1 salário
mínimo. O mesmo percentual é de 8,5% no caso dos homens.
A
discriminação da mulher trabalhadora se acentua com relação à
raça negra. Análise da AMB (Associação de Mulheres
Brasileiras) destaca que as mulheres negras são particularmente vítimas
de violências simbólicas, através da imposição de um critério
único e estereotipado de beleza. As mulheres negras têm
denunciado práticas contemporâneas de racismo, como a exigência
de “boa aparência”, entendida como padrão étnico branco,
para o exercício de certas ocupações, principalmente no comércio
e no setor de serviços. Em outras palavras, o racismo é fator de
exclusão no mercado de trabalho, ocorrendo de forma mais
acentuada com relação às mulheres negras.
A
mulher trabalhadora rural sofre maior impacto de discriminação
que a mulher urbana. Além de trabalhar uma média de seis horas
mais que os homens, têm desconsiderada sua mão-de-obra em termos
econômicos/financeiros, haja vista que o trabalho de cultivo de
horta, cuidado com os animais e aves domésticas para o consumo da
família não são considerados produtivos. As mulheres que
trabalham na lavoura geralme?nte ganham menos que os homens.
Acesso
ao poder
A
distribuição desigual de poder nas relações de gênero marca a
vida de mulheres e homens de forma complexa e cria inúmeras situações
que dificultam o exercício pleno da cidadania pelas mulheres, com
conseqüências diretas para a conquista de sua autonomia e para
sua participação em processos de tomada de decisão, tanto no âmbito
privado quanto no público.
A
pouca inserção das mulheres em instâncias de poder não decorre
da capacitação, tanto que os níveis de escolaridade formal das
mulheres brasileiras é superior ao dos homens. Esta situação
ocorre principalmente em decorrência da existência de uma
cultura patriarcal que permeia nossa sociedade, colocando a mulher
em estado de subordinação. Por exemplo, as mulheres participam
ativamente dos movimentos populares e sindical e são militantes
dos partidos políticos, entretanto, raramente ocupam suas instâncias
de decisão. Cabe ressaltar que as mulheres não brancas,
igualmente qualificadas, enfrentam ainda o preconceito racial.?
Embora
representem a maioria do eleitorado, poucas mulheres se candidatam
e são eleitas para cargos públicos. Poucos dias após as eleições
municipais de 2000, a Folha
de São Paulo publicou uma reportagem sobre o nível de
aproveitamento das candidaturas femininas. A matéria informa que,
segundo dados do IBAM (Instituto Brasileiro de Administração
Municipal), nenhum partido conseguiu atingir a cota de 30% de
candidaturas femininas. Embora totalizem 50,48% do eleitorado, as
mulheres representaram 7,54% das 14.806 candidaturas a prefeito/a
e conquistaram 5,7% das 5.559 prefeituras. Uma análise publicada
na última edição do boletim do Cfemea,
indica que a quantidade de mulheres eleitas manteve-se estável
desde a adoção do sistema de cotas, em 1997.
Direitos
Reprodutivos e Saúde
O
Brasil formulou o PAISM – Programa de Assistência Int?egral à
Saúde da Mulher, em 1983, que até hoje não foi implementado na
sua íntegra, tampouco em todas as cidades brasileiras. São
poucas as unidades de saúde a oferecer este serviço e muitas que
oferecem o fazem de forma precária ou desvinculadas da realidade
da comunidade onde atuam. Os recursos para a área de saúde estão
muito aquém do necessário, afetando a infra-estrutura sanitária,
a cobertura da qualidade dos serviços, incidindo diretamente nas
possibilidades de enfrentar os riscos de saúde/enfermidade.
A
morbi-mortalidade materna
tem elevados índices no Brasil, sendo que 98% destas mortes são
evitáveis, uma vez que decorrem basicamente da falta de acesso à
serviços de saúde no período de gestação e de condições de
partos precárias e desumanas. O número de cesarianas representa
hoje a prática corrente dos partos e, na maioria dos casos,
desnecessária, bem como as cirurgias de mama efetivadas como
supostas “prevenção de câncer de mama”.
Segundo
dados do Minis?tério da Saúde,
no Brasil, a cada duas horas, morre uma mulher por complicações
na gravidez, parto e pós-parto. Em 1997 ocorreram 55,1 mortes por
100 mil nascidos vivos. Este número, devido ao grande nível de
sub-informações (que variam regionalmente), deve, segundo a
Organização Mundial de Saúde, ser multiplicado por um fator de
correção entre 2 e 3, o que nos daria o índice de 134 mortes
por 100 mil nascidos vivos.
Ainda
em relação aos direitos reprodutivos, é fundamental destacar a
situação da esterilização de mulheres. O alto índice desta prática
concentra-se entre as mulheres na faixa reprodutiva (de 14 a 49
anos de idade), sendo muitas vezes realizada sem o conhecimento da
mulher – principalmente entre as mulheres pobres. A vinculação
entre escolaridade e esterilização demonstra que a queda da
fecundidade está associada à generalização do conhecimento e
do uso de métodos contraceptivos na sociedade brasileira. Apesar
da existência de uma maior diversidade de métodos
contraceptivos, a esterilização continua sendo muito utilizada.
As regiões mais pobres concentram as mais altas taxas de
esterilização, sendo que esta prática aumenta conforme diminuem
os anos de escolarização.
As mulheres pobres têm dificuldade de acesso a serviços de
contracepção, acabando por ter que optar entre esterilização,
aborto clandestino ou gravidez não planejada.
O
estatuto jurídico da esterilização nunca foi muito claro no
Brasil, sendo que parte da doutrina considerava a esterilização
cirúrgica como ilícito penal, a teor do art. 129 x
2º, III do Código Penal, já que dela resulta a inutilização
de função orgânica, configurando-se, portanto, lesão corporal
? de natureza gravíssima. Nessa linha de raciocínio, a autorização
do paciente não afastaria a ilicitude do ato. Outros
doutrinadores preferiam enquadrar a esterilização voluntária no
campo dos direitos privados da personalidade.
Em
1999, a Portaria 048/99 do Ministério da Saúde, derrubou os
vetos aos artigos 10, 11, 14 e 15 da Lei 9.263/96 que regulamenta
o x
7º do artigo 226 da CF/88, retornando à lei os dispositivos
referentes à esterilização cirúrgica do homem e da mulher.
Atualmente, conforme o artigo 10 da lei, é permitida a esterilização
voluntária, desde que cumprida uma série de formalidades
previstas para desencorajar a opção por tal método, em homens e
mulheres com capacidade civil plena e maiores de vinte e cinco
anos. A lei proíbe, ainda, a esterilização no período do parto
e aborto, e através de histerectomia (remoção do útero, em
extensão variável) e ovoforectomia (extirpação de ovário em
? extensão variável). O artigo 12 da lei proíbe a indução ou
instigamento individual ou coletivo à prática da esterilização
cirúrgica. O art. 13,
reafirma a proibição existente na Lei 9.029/95 de exigir-se
atestado de esterilização ou teste de gravidez para quaisquer
fins. No capítulo II, arts. 15 a 21, a lei cuida dos crimes e
penalidades para o caso de descumprimento das previsões nela
contidas. Passam a ser crimes: a) a omissão por parte do médico
de notificação à autoridade sanitária das esterilizações cirúrgicas
que realizar, art. 16; b) induzir ou instigar dolosamente a prática
de esterilização cirúrgica, art. 17; ou c) exigir atestado de
esterilização para qualquer fim, art. 18. O artigo 14, parágrafo
único da Lei 9263/96, apresenta os critérios para autorização
das instituições interessadas em fornecer os serviços de
esterilização.
O
aborto é outro grave problema enfrentado pela população
feminina, representando a terceira causa de mortalidade materna no
Brasil. Sendo criminalizado pela legislação penal, e inexistindo
um programa efetivo de planejamento familiar (apesar de constar em
nossa legislação a obrigatoriedade de oferecimento do
planejamento familiar para homens e mulheres), proliferam as clínicas
clandestinas onde o aborto é praticado com grande risco e péssimas
condições de higiene.
?
O
Dossiê da RedeSaúde
apresenta o seguinte quadro sobre a Violência
nos serviços de Saúde: “Muitas mulheres que se dirigem aos
serviços de saúde enfrentam um atendimento marcado pela violência.
Não são raros os relatos de casos de curetagem sem anestesia,
quando em início de aborto; tratamento preconceituoso, negligência
e maus-tratos nas situações de aborto provocado; falta de
esclarecimentos e orientação adequada; exames ginecológicos
feitos com pouco cuidado; falta de privacidade quando examinadas;
abuso sexual por parte dos profissionais e tratamento
preconceituoso em casos de violência sexual".
Violência
Uma
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre violência contra
a mulher constatou que: “existem dados comprovando que mais de
? 50% dos estupros ocorrem dentro da própria família”. Os homicídio
de mulheres apresentam uma informação que descortina a prática
seletiva e preconceituosa do Estado nos casos de violência contra
a mulher. Pesquisa realizada pela Themis
demonstra que os casos de homicídios contra as mulheres, na
cidade de Porto Alegre/RS, em regra, são tipificados como lesões
corporais seguidas de morte, o que reitera uma menor
responsabilização do autor, e do próprio Estado, sobre esta
violência.
Outro
problema grave é a exploração sexual de mulheres e meninas, e o
turismo sexual, que ocorre principalmente nos estados costeiros
nordestinos, onde existe um envolvimento de traficantes de drogas,
donos de hotéis, taxistas, agentes de viagens, entre outros
profissionais, muitas vezes com a anuência ou cumplicidade
policial. O maior número de “clientes” das
meninas-prostitutas são estrangeiros.
A
violência sexual, recebeu, em 1998 tratamento especial do Ministério
da Saúde, com a promoção da Norma Técnica de Violência
Sexual, tendo sido amplamente divulgada entre 1999 e 2000. Este
documento informa os ?serviços de saúde da ação necessário
para os casos de violência sexual, seja na prevenção de DST/HIDS,
seja para evitar a gravidez, através da pílula contraceptiva de
emergência. Cabe ressaltar,
porém, a falta de sintonia entre os serviços de polícia e saúde,
além da grande represália que a Norma Técnica vem recebendo dos
setores mais conservadores da Igreja e da sociedade.
Ações
do Brasil no período de janeiro de 1998 a setembro de 2000:
Poder
Legislativo
>
Apresentação e aprovação de emendas do Projeto de Orçamento
da União, para assegurar políticas na área da violência contra
a mulher, nos anos de 1996 a 1999.
>/font>
Projeto de Lei 4.370, de 1998, de autoria do Deputado Paulo Paim,
"dispõe sobre a representação racial e étnica nos filmes
e peças publicitárias veiculadas pelas emissoras de televisão".
Encontra-se na Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e
Informática, com parecer favorável, desde 10 de junho de 1999.
>
Lei 9.797, de 06.05.99 – Sancionada na íntegra pelo Presidente
da Republica. Dispõe sobre a obrigatoriedade da cirurgia plástica
reparadora da mama pela rede de unidades integrantes do SUS nos
casos de mutilação decorrentes de tratamento de câncer.
>
Lei 9.601/98, de 21.01.98 – Dispõe sobre o contrato de trabalho
por prazo determinado. Estabelece o contrato temporário, fixando
o período mínimo em três meses e o máximo em dois anos. O
prazo mínimo e a existência de um banco de horas contratuais,
normalmente inviabilizam duas das “garantias” previstas neste
mesmo instrumento às mulheres trabalhadoras: o gozo da li?cença-gestante
e a estabilidade provisória das gestantes.
>
Emenda Constitucional 20, de 15.12.98 – Dispõe sobre o Regime
Geral da Previdência Social, alterando, entre outras coisas, os
direitos das mulheres à aposentadoria. A emenda enfraquece o
conceito de seguridade social que permeia o sistema previdenciário
e reforça o seu caráter contributivo;
>
Lei 9.799 de 26.05.99 – Insere na Consolidação das Leis do
Trabalho, regras para assegurar o acesso igualitário da mulher ao
mercado de trabalho, proibindo e punindo diferentes formas de
discriminação. A matéria sofreu veto parcial da Presidência da
República, mas este veto ainda não foi analisado pelo Congresso
Nacional.
>?
Lei 9.807, de 13.07.99 – Dispõe sobre proteção e auxílio às
vítimas de violência e testemunhas ameaçadas. É importante
ressaltar que tal lei não foi promulgada visando a proteção
específica da mulher, mas é um instrumento valioso, devendo ser
melhor estudado e analisado visando sua aplicabilidade específica
para a questão.
>
A equipe da Themis elaborou e encaminhou à Secretaria de Estado
dos Direitos Humanos uma proposta para constituição de um grupo
de trabalho junto ao Ministério da Justiça para elaboração de
uma lei especial sobre violência intrafamiliar, adequando a
Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência
contra à Mulher, à realidade brasileira, propondo mudanças nos
serviços ora existentes. A proposta foi aceita e, através da
Portaria 97, de 09.03.99, a comissão foi formalizada.
Poder
Executivo
>
Em março de 1998 foi assinada, pelo Ministério do Planejamento e
Orçamento, uma portaria que dá prioridade às famílias
chefiadas por mulheres na seleção para os empreendimentos
financeiros habitacionais, e determina a criação de programas de
treinamento que permitam a participação das mulheres na construção
de suas casas; estimula também a inclusão, nos projetos, de
equipamentos comunitários de educação, saúde e lazer que
atendam às necessidades profissionalizantes e assistências das
mulheres e seus dependentes.
>
Em 1998 foi aprovada pelo Congresso a Norma Técnica elaborada
pelo Ministério da Saúde, para a Prevenção e Tratamento de
Agravos Resultantes da Violência Sexual contra Mulheres e
Adolescente; diretriz para a atenção nos casos de violência
sexual, que aborda tanto a contracepção de emergência quanto o
procedimento do aborto exclusivamente nos casos de violência
sexual. Esta norma foi elaborada por técnicos/as do MS, com
consulta a diversas instituições que reúnem conhecimento/experiências
nesta temática.
>
Em setembro de 1999 o Ministério da Saúde elaborou a Norma Técnica
sobre Gestação de Alto Risco, que inclui a interrupção da
gravidez em caso de risco de vida para a mulher.
>
A partir de 1997 foi considerada prioritária a prevenção da
transmissão do HIV da gestante para o bebê com as seguintes
iniciativas: a) recomendação do teste HIV em todas as gestantes
atendidas nos serviços; b) realização de treinamento em todo o
território nacional, de equipes ambulatoriais e de saúde básica;
c) acompanhamento de gestante infectadas pelo HIV, com os
procedimentos terapêuticos indicados na prevenção da transmissão
vertical do vírus.
>
A Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por
acidentes e violências está sendo elaborada pelo Comitê
Nacional de Prevenção de Acidentes e Violência e a área Técnica
de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde que, em abril de
1999, instalaram a Câmara Temática sobre Violência Domé?stica e
Sexual. Esta instância tem como objetivo propor e acompanhar o
desenvolvimento de políticas de atenção às mulheres em situação
de violência, como o Plano Nacional de Assistência à Mulher Vítima
de Violência.
>
Em 12 de janeiro de 1999, o Poder Executivo enviou ao Congresso
Nacional Medida Provisória facultando aos empregadores domésticos
o pagamento de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço aos seus
empregados domésticos. O eventual pagamento deste benefício
assegurará o direito ao seguro-desemprego. A Medida Provisória
foi reeditada em 13 de dezembro de 1999.
>
Portaria 048/99 do Ministério da Saúde que regulamenta a Lei
sobre Planejamento Familiar (Lei 9263/96). A lei contempla a
esterilização masculina e feminina, proibindo a realização da
laqueadura durante a cesárea e estabelecendo um prazo de 60 dias
entre a solicitação e a realização da mesma; além do
pagamento, pelo SUS da vasectomia e laqueadura.
>
Em 1999 o Ministério da Saúde investiu recursos para assegurar a
ampliação da oferta e distribuição de pílula, DIUs, hormônios
injetáveis e diafragmas, além de camisinhas, inclusive
femininas.
>
Criação, em maio de 1997, na Câmara dos Deputados, da Comissão
Parlamentar Especial da IV Conferência Mundial da Mulher, com
objetivo de estudar medidas legislativas para facilitar a
implementação da Plataforma de Ação. Usando metodologia de
consultas, seja a órgãos do Poder Executivo, como do Judiciário
e entidades da sociedade civil e do movimento de mulheres, esta
comissão elaborou um relatório com 60 recomendações para as três
esferas de poder, estabelecendo prioridades para o trabalho no
Congresso. Este processo de consultas incluiu 15 audiências
dirigidas a organismos do Poder Executivo.
>
Anteprojeto de Reforma do Código Penal – em discussão no
Ministério da Justiça, este anteprojeto amplia os permissivos de
aborto legal. O Código atual admite apenas o aborto nos casos de
estupro e risco de vida para a gestante. O projeto prevê a ampliação
para casos em que a gestação coloca em risco de dano grave e
irreversível a saúde da mulher, e para casos de anomalia fetal
grave. Após o resultado da discussão do MJ, o anteprojeto será
ainda encaminhado ao Congresso Nacional para aprovação.
Considerações
Finais
Ao
final do último ano do segundo milênio, retomando a idéia do
caráter multifuncional da discriminação, considera-se
fundamental que a luta pela construção da igualdade entre homens
e mulheres seja tomada pelo sentimento de universalidade. O modelo
econômico neoliberal tem causado o acirramento das desigualdades
econômicas e, portanto, somente a partir do princípio da
universalidade dos direitos humanos, poderemos combater as
diversas formas de desigualdade em nossa sociedade.
Art. 4º da Convenção
sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
contra a Mulher dispõe expl?icitamente sobre ações
afirmativas: A
adoção pelos Estados-partes de medidas especiais de caráter
temporário destinadas a acelerar a igualdade de fato entre o
homem e a mulher não se considerará discriminação na forma
definida nesta Convenção, mas de nenhuma maneira implicará,
como conseqüência, a manutenção de normas separadas; essas
medidas cessarão quando os objetivos de igualdade de
oportunidade e tratamento houverem sido alcançados. A adoção
pelos Estados-partes de medidas especiais, inclusive as
previstas nesta Convenção, destinadas a proteger a
maternidade, não se considerará discriminatória.
BERQUO, Elza. Ainda a questão da
Esterilização Feminina no Brasil. In:
GIGGIN, K., Costa, S.H. (orgs). Questões da Saúde
Reprodutiva. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 1999. P.
113-126.
*
Samantha Buglione
e Virgínia Feix são advogadas, assessoras e coordenadoras
executivas da Themis – Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero.
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