
Manual de Denúncia da Tortura
Camille Giffard
Como documentar e apresentar denúncias
de tortura no âmbito do sistema
internacional para a proteção dos direitos humanos
PARTE
I - QUESTÕES PRELIMINARES
1. INTRODUÇÃO
2. COMO UTILIZAR ESTE MANUAl
2.1. Exposição geral dos principais
capítulos
2.2. Terminologia
2.3. Questões essenciais de política
3. CONTEXTO
3.1. Introdução
3.2. O que se pode esperar conseguir com a apresentação de denúncias
de tortura?
3. O que é tortura?
3.4. Como ocorre a tortura?
3.5. Em quais contextos é possível receber ou obter denúncias de
tortura?
3.6. É possível denunciar agentes não-governamentais?
PARTE
II – DOCUMENTAÇÃO DAS DENÚNCIAS
1. INTRODUÇÃO
2. PRINCÍPIOS BÁSICOS DA
DOCUMENTAÇÃO
2.1. Por que são importantes esses
princípios?
2.2. Em que consiste informação de boa qualidade?
2.3. O que pode se pode fazer para maximizar a exatidão e a
confiabilidade da informação?
3. ENTREVISTA COM A PESSOA QUE
DENUNCIA TORTURAS
3.1. Introdução
3.2. Considerações gerais
3.3. Como realizar a entrevista
4. INFORMAÕES QUE DEVEM SER
REGISTRADAS
4.1. Informação modelo
4.2. Contextos específicos
5. PROVAS
5.1. Prova médica
5.2. Declaração da pessoa que faz a denúncia
5.3. Prova testemunhal
5.4. Outros tipos de provas
PARTE
III - AÇÕES DIANTE DA INFORMAÇÃO COLETADA
1. INTRODUÇÃO ÀS POSSÍVEIS LINHAS DE
AÇÃO
2. O QUE SE DEVE SABER SOBRE OS
MECANISMOS INTERNACIONAIS DE DENÚNCIA E COMO USÁ-LOS
2.1. Que tipo de características gerais
deve ter seu comunicado?
2.2. Apresentação de informação a um órgão de monitoramento: o que
seu comunicado deve conter?
2.3. Apresentação de informação no contexto do procedimento de
relatório estatal
2.4. Apresentação de informação a um órgão de apuração de fatos
3. O QUE SE DEVE SABER SOBRE OS
PROCEDIMENTOS INTERNACIONAIS DE RECLAMAÇÃO E COMO USÁ-LOS
3.1. O que se pode procurar obter com os
procedimentos de reclamação particular?
3.2. Quais tipos de reclamação os procedimentos de reclamação
particular podem examinar?
3.3. Como funcionam os procedimentos de reclamação particular?
3.4. O que deve conter uma requisição a um procedimento de
reclamação particular?
3.5. Dicas práticas para utilização dos procedimentos de reclamação
particular
4. MECANISMOS e PROCEDIMENTOS:
NAÇÕES UNIDAS
4.1. Introdução ao sistema das Nações
Unidas
4.2. Mecanismos de denúncia no âmbito do sistema das Nações Unidas
4.3. Procedimentos de reclamação no âmbito do sistema das Nações
Unidas
5. MECANISMOS E PROCEDIMENTOS: ESFERA
REGIONAL
5.1. O Sistema Europeu
5.2. O Sistema Interamericano
5.3. O Sistema Africano
5.4. Outras regiões
6. TABELAS DE AVALIAÇÃO COMPARATIVA
DOS PROCEDIMENTOS INTERNACIONAIS
7. ONDE SE PODE BUSCAR MAIS AJUDA?
7.1. Por que seria desejável buscar mais
ajuda?
7.2. Algumas fontes específicas de ajuda
APÊNDICES
APÊNDICE I - LISTA DE INSTRUMENTOS
RELEVANTES
APÊNDICE II –DADOS PARA CONTATO E
OBTENÇÃO DE MAIORES INFORMAÇÕES
APÊNDICE III – FORMULÁRIOS DE
SOLICITAÇÃO PADRÃO
APÊNDICE IV – DIAGRAMAS DO CORPO
ABREVIATURAS SELECIONADAS
ACNUR: Alto Comissariado das Nações
Unidas para Refugiados
CADH: Convenção Americana de Direitos Humanos
CADHP: Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos
CCT: Comitê Contra a Tortura
CDC: Comitê dos Direitos da Criança
CEDH: Convenção Européia de Direitos Humanos
CEDM: Comitê para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher
CEDR: Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial
CEPTC: Comitê Europeu para a Prevenção da Tortura
CIADH: Comissão Interamericana de Direitos Humanos
CICV: Comitê Internacional da Cruz Vermelha
CNADH: Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos
CNUCT: Convenção das Nações Unidas Contra a Tortura
CNUDC: Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança
CNUDH: Comissão das Nações Unidas sobre Direitos Humanos
CNUEDM: Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação da
Discriminação Contra a Mulher
CNUEDR: Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação da
Discriminação Racial
CoADHP: Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos
CPT: Comitê Europeu para a Prevenção da Tortura
DICA: Direito Internacional de Conflito Armado
EACDH: Escritório do Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos
OEA: Organização de Estados Americanos
ONG: Organização Não-governamental
ONU: Organização das Nações Unidas
OSCE Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa
OUA: Organização da Unidade Africana
PD: Pessoas Deslocadas
PIDCP: Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos
REP: Relator Especial sobre Prisões e Condições de Detenção na
África
RET: Relator Especial das Nações Unidas sobre Tortura
TEDH: Tribunal Europeu de Direitos Humanos
TIADH Tribunal Interamericano de Direitos Humanos
TPI: Tribunal Penal Internacional
ÍNDICE DE TABELAS
TABELAS COMPARATIVAS:
Tabela 1: Resumo de Mecanismos
Internacionais – Por Origem e Função
Tabela 33: Avaliação Comparativa I - CCT, CDH e CEDR (Geral)
Tabela 34: Avaliação Comparativa II - CDC, CEDM, RE-CDH e 1503 (Geral)
Tabela 35: Avaliação Comparativa III - CPT, CIADH e TIADH (Geral)
Tabela 36: Avaliação comparativa IV - CNADH e REP (Geral)
Tabela 37: Avaliação Comparativa IV - CCT, CDH e CEDR (Procedimento de
Reclamação Particular)
Tabela 38: Avaliação Comparativa V - TEDH, CIADH, TIADH e CoADHP
(Procedimento de Reclamação Particular)
INTERNATIONAL MECHANISMS - BASIC FACTS:
Table 5: Basic Facts: UN Commission on Human Rights
Table 6: Basic Facts: UN Sub-Commission on the Promotion and Protection
of Human Rights
Table 8: Basic Facts: 1503 Procedure
Table 10: Basic Facts: UN Special Rapporteur on Torture
Table 12: Basic Facts: Committee Against Torture
Table 13: Basic Facts: Human Rights Committee
Table 14: Basic Facts: Committee on the Rights of the Child
Table 15: Basic Facts : Committee on the Elimination of Discrimination
against Women
Table 16: Basic Facts: Committee on the Elimination of Racial
Discrimination
Table 21: Basic Facts: European Committee for the Prevention of Torture
Table 22: Basic Facts: European Court of Human Rights
Table 25: Basic Facts: Inter-American Court of Human Rights
Table 26: Basic Facts: Inter-American Commission on Human Rights
Table 29: Basic Facts: African Commission on Human and Peoples’ Rights
Table 30: Basic Facts: Special Rapporteur on Prisons and Conditions of
Detention in Africa
INDIVIDUAL COMPLAINT PROCEDURES - PRACTICALITIES OF USE:
Table 18: Practicalities of Using
Individual Complaint Procedure: CAT
Table 19: Practicalities of Using Individual Complaint Procedure:
Optional Protocol to the ICCPR
Table 20: Practicalities of Using Individual Complaint Procedure: CERD
Table 24: Practicalities of Using Individual Complaint Procedure: ECHR
Table 28: Practicalities of Using Individual Complaint Procedure:
Inter-American System
Table 32: Practicalities of Using Individual Complaint Procedure: ACHPR
PROCEDURES - BASIC CHRONOLOGY:
Table 7: Basic Chronology: 1503 Procedure
Table 17: Basic Chronology of Individual Complaint Procedure: CAT
Table 23: Basic Chronology of Individual Complaint Procedure: ECHR
Table 27: Basic Chronology of Individual Complaint Procedure:
Inter-American
System
Table 31: Basic Chronology of Individual Complaint Procedure: ACHPR
MISCELLANEOUS OTHER TABLES:
Table 2: Suitability of Types of Mechanisms to Possible Objectives
Table 3: Checklist For Submitting General Information To A Reporting
Mechanism
Table 4: Checklist For Submitting An Individual Allegation To A
Reporting Mechanism
Table 9: Relevant Thematic Procedures of the UN Commission on Human
Rights
Table 11: Country Rapporteurs of the UN Commission on Human Rights
(1999)
Table 39: Possible Sources of Help
GLOSSÁRIO DE TERMOS ESPECIALIZADOS
Admissibilidade
Estágio de um procedimento de reclamação particular no qual o órgão
judicial ou quase-judicial decide se existem as condições para que ele
possa examinar uma reclamação. Se uma reclamação for inadmissível,
não se pode examiná-la.
Agentes não-governamentais
Pessoas que atuam independentemente das autoridades.
Apresentação
Ver COMUNICADO / REQUSIÇÃO
Apresentar uma reclamação
Registrar ou protocolar uma reclamação.
Apuração dos fatos
Investigação realizada para apurar os fatos.
Artigo de tratado
Termo usado para denominar as seções de um tratado.
Asilo
Petição por parte de pessoas que não querem voltar a um país,
normalmente o seu, onde correm perigo. Em caso de concessão,
outorga-se-lhes o direito de permanecerem em um país que não o seu.
Pode ser provisório ou permanente.
Caráter consultivo
As ONGs podem solicitar participação na ONU em caráter consultivo;
isso significa que estão oficialmente registradas como organização
que a ONU pode consultar. As ONGs que atuam em caráter consultivo gozam
de certos privilégios em relação a outras ONGs, como, por exemplo,
ter permissão para assistir às sessões da Comissão da ONU sobre
Direitos Humanos.
Carta
Ver TRATADO
Competência
Ver JURISDIÇÃO (de um órgão judicial)
Comunicado
Carta ou outra forma de apresentação que transmite informação a um
organismo internacional. A ONU costuma empregar o termo para se referir
a requisições apresentadas em um procedimento de reclamação
particular. A pessoa que redige um comunicado geralmente é denominada o
autor do comunicado.
Convenção
Ver TRATADO
Corroboração
Prova que sustenta ou confirma a veracidade de uma denúncia.
Declaração
Documento de direito internacional que não tem caráter juridicamente
vinculante, mas que estabelece normas que os Estados se comprometem a
respeitar.
Denúncia (de tortura)
Afirmação (ainda não comprovada nem refutada) de haver ocorrido um
incidente tortura.
Deportação
Expulsão de um país.
Descumprimento (de obrigações)
Ver VIOLAÇÃO
Detenção incomunicada
Ser detido pelas autoridades em condições de incomunicabilidade, sem
que se possa ter contato com o mundo exterior ou sem que seja
reconhecida a detenção.
Direito nacional ou sistema jurídico
Direito ou ordenamento jurídico de um país; sistema legal ou jurídico
específico de um determinado país.
Entrada em vigor (de um tratado)
Momento em que as obrigações de um tratado começam a ser aplicadas.
Estado parte (de um tratado)
Estado que concordou em se obrigar a um tratado.
Execução (de obrigações)
Colocar em vigor as obrigações; assegurar que sejam respeitadas.
Extrajudicial (p. ex., execução)
Não imposto por um juiz ou resultante de um processo legal.
Implementação (de obrigações)
Modo pelo qual as obrigações são executadas ou respeitadas, ou
medidas destinadas a tal fim.
Impunidade
Capacidade de evitar a punição por um comportamento ilegal ou
indesejável.
Instrumento
Termo geral que denomina os documentos de direito internacional, quer
sejam juridicamente vinculantes ou não.
Intervenção de terceiras partes
Ver RELATO AMICUS CURIAE
Juridicamente vinculante
Se algo é juridicamente vinculante para um Estado, isso significa que o
Estado está obrigado a agir em conformidade com tal coisa e que pode
haver conseqüências jurídicas caso não o faça. Por exemplo, o
Estado pode ser acionado perante um tribunal internacional ou pode-se
ordenar que ele efetue o pagamento de uma indenização à vítima.
Jurisdição (de um Estado)
Área ou pessoas sobre as quais um Estado exerce sua autoridade.
Jurisdição (de um órgão judicial)
As matérias que cabem à jurisdição de um órgão judicial ou
quase-judicial são aquelas que ele tem o poder de examinar. Também se
pode usar a expressão ser competente para examinar uma matéria.
Licença (p. ex., solicitar uma licença
para apresentar um relato amicus curiae)
Permissão.
Litígio
Processo de apresentação e condução de um caso perante um tribunal.
Mandato
Fonte dos poderes de um mecanismo; documento que explica o poder do
mecanismo.
Medidas provisórias
Medidas temporárias que um órgão judicial ou quase-judicial pode
solicitar antes de haver concluído sua deliberação sobre um caso, com
a finalidade de evitar dano irreparável.
Mérito do caso
Estágio de um procedimento de reclamação particular no qual o órgão
judicial examina os fatos de um caso e decide se foi cometida uma
violação.
Monitoramento
Busca e recebimento de informações com a finalidade de apresentar um
relatório sobre uma causa ou situação.
Observações
Comentários, avaliação.
Organismo intergovernamental
Organismo ou organização composta de representantes governamentais de
mais de um país.
Organismos de tratado
Organismo criado por um tratado.
Órgão de supervisão
Órgão criado para supervisionar como um Estado cumpre suas
obrigações assumidas nos termos de um tratado.
Pacto
Ver TRATADO
Perpetrador
Pessoa que cometeu um ato.
Petição
Solicitação de medidas judiciais, por exemplo, solicitação para que
se investigue uma matéria.
Processo quase-judicial
Processo que tramita perante um órgão que examina casos de modo
semelhante a um órgão judicial, porém que não é composto de juízes
e cujas decisões não são juridicamente vinculantes.
Processo judicial
Processo que tramita perante um órgão judicial.
Ratificação
Processo mediante o qual um Estado concorda em se obrigar a um tratado.
Reclamação particular
Reclamação relativa a uma série específica de fatos que afeta uma ou
mais pessoas.
Reclamamante
Pessoa que apresenta uma reclamação em um procedimento de reclamação
particular.
Recomendação
Ação sugerida. As recomendações não têm caráter juridicamente
vinculante.
Regulamento
Regras pormenorizadas adotadas por um órgão judicial ou quase-judicial
que estabelecem o modo pelo qual devem se realizar os processos perante
tal órgão.
Relato amicus curiae
Apresentação por uma parte alheia ao processo judicial destinada a
informar o órgão judicial sobre uma matéria relativa ao processo.
Reparação
Medidas destinadas a reparar um dano causado.
Requisição
Carta ou outra forma de apresentação que solicita que um órgão
judicial considere um caso em um procedimento de reclamação
particular.
Requisitante
Pessoa que apresenta uma requisição em um procedimento de reclamação
particular.
Reserva
Quando da adesão a um tratado, um Estado pode expressar uma reserva:
declaração que de algum modo modifica suas obrigações oriundas do
tratado.
Resolução
Decisão oficial de um órgão internacional, geralmente adotada após
uma votação. Geralmente é uma recomendação e, portanto, não é
juridicamente vinculante.
Responsabilidade estatal
Responsabilização de um Estado nos termos do direito internacional.
Sanção
Penalidade imposta a um Estado por não respeitar suas obrigações.
Sentença judicial
Decisão juridicamente vinculante na qual um tribunal expressa suas
conclusões sobre um caso.
Transmissão (de uma denúncia)
Envio da denúncia, por exemplo, ao Estado envolvido.
Tratado
Documento de direito internacional que estabelece obrigações
juridicamente vinculantes para os Estados.
Violação (de obrigações)
Descumprimento das obrigações de um Estado nos termos do direito
internacional.
Violações graves dos direitos humanos
Violações particularmente graves dos direitos humanos, por exemplo,
torturas ou execuções extrajudiciais.
PARTE I - QUESTÕES PRELIMINARES
1. Introdução
2. Como Utilizar Este Manual
2.1. Exposição geral dos principais
capítulos
2.2. Terminologia
2.3. Questões essenciais de política
3. Contexto
3.1. Introdução
3.2. O que se pode esperar conseguir com
a apresentação de denúncias de tortura?
3.3. O que é tortura?
3.4. Como ocorre a tortura?
3.5. Em quais contextos é possível
receber ou obter denúncias de tortura?
3.6. É possível denunciar agentes
não-governamentais?
1. INTRODUÇÃO
Para a maioria das pessoas, falar sobre
tortura invoca imagens das mais cruéis formas de sofrimento físico e
psíquico: unhas arrancadas, choques elétricos, simulação de
execuções, obrigar uma pessoa a presenciar a tortura de pais ou
filhos, estupro. Essas imagens geram sentimentos de intensa repulsa em
uma pessoa normal e pouquíssimas pessoas podem permanecer indiferentes
quando tais sofrimentos são impostos a um ser humano. Publicamente, a
condenação da tortura tem se generalizado e, com efeito, é
terminantemente proibida por todos os instrumentos atuais de direitos
humanos, desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. A
violação dessa proibição é considerada um ato tão grave que não
pode haver qualquer justificativa legal, nem mesmo em circunstâncias
excepcionais ou tempos de conflito. Porém, se examinarmos qualquer
relatório do Relator Especial das Nações Unidas sobre a Tortura ou do
Comitê Europeu para a Prevenção da Tortura, ou, ainda, muitos
jornais, fica patente que a Tortura não é um fenômeno do passado.
Ainda que atualmente seja inaceitável a defesa pública da tortura por
parte de um agente estatal, é inegável que a tortura e outros atos a
ela relacionados, tais como castigo e tratamento cruel, desumano e
degradante, continuam a ser praticados à surdina, longe da visibilidade
pública e a portas fechadas.
No entanto, a chave dessa porta está ao
alcance de todas as pessoas que tenham sofrido, presenciado ou sido
informadas sobre um incidente de tortura. Essa chave é a informação.
Somente se esses incidentes forem trazidos à luz da comunidade
internacional é que a erradicação pode ter uma chance de êxito.
Existe uma série de órgãos cujo objetivo consiste precisamente em
garantir que a tortura seja uma coisa do passado. Porém, na ausência
de informação, esses órgãos ficam de mãos atadas. Raramente podem
examinar uma situação com seus próprios olhos: seus poderes de
investigação em primeira mão são, na maioria das vezes, muito
limitados. Assim, como pode o Relator Especial das Nações Unidas
elaborar um relatório sobre o alcance do problema em todo mundo, ou em
um país específico, se ninguém lhe enviar informações? Como pode o
Comitê Europeu para a Prevenção Contra a Tortura saber quais
categorias de detentos correm maior risco em um determinado país se
não receber nenhum relatório? A resposta para essas duas perguntas é
a mesma e é muito simples: não podem.
Se a informação é a chave, logo segue
que as organizações não-governamentais (ONGs) são as que a possuem.
Tal é a dependência que os organismos internacionais têm delas que a
falta de liberdade de atuação das ONG0s em um determinado país pode
muito bem significar que não será possível atraia a atenção da
comunidade internacional para a situação desse país, ainda que as
violações dos direitos humanos ocorridas em tal país a mereçam. Isso
se deve ao fato de que é mais simples prestar atenção e dedicar
recursos aos Estados sobre os quais existe muita informação. A única
forma de abrir os olhos da comunidade internacional para as situações
menos conhecidas é garantindo que informações confiáveis cheguem
até elas. Nesse contexto, é impossível superestimar a importância da
função desempenhada pelas ONGs na batalha em prol da erradicação da
tortura. Embora algumas ONGs especializadas tenham adotado excelentes
métodos de denúncia, muitas ONGs menos experientes não são
conscientes da importância da informação que fornecem ou nunca
tiveram a oportunidade de aprender como apresentá-la da melhor forma.
No contexto específico de denúncias de tortura, infelizmente acontece
de uma parte significativa da informação recebida dessas ONGs se
perder, não porque as denúncias sejam infundadas, mas porque são
omitidos fatos importantes, porque a denúncia é redigida em uma
linguagem excessivamente política ou porque é apresentada em um idioma
que a pessoa que recebe a informação não compreende e não dispõe de
recursos para sua tradução. Em outros casos, talvez devido à falta de
familiaridade com as diferentes funções, e muitas vezes funções
paralelas, dos diversos organismos internacionais, as ONGs enviam sua
informação unicamente para uma autoridade que não tem o poder
necessário à consecução dos resultados desejados. O Relator Especial
das Nações Unidas Contra a Tortura, por exemplo, não pode ordenar a
um Estado que pague uma indenização a uma vítima de tortura, porém o
Tribunal Europeu de Direitos Humanos, por sua vez, pode fazê-lo.
O presente manual destina-se
principalmente às ONGs com menos experiência, sobretudo as ONGs
menores, que atuam no âmbito nacional ou comunitário e que desejam se
desenvolver e participar mais ativamente da denúncia de casos de
tortura. Não se trata de proporcionar uma formação jurídica nem
médica, mas sim oferecer informações centradas mais no processo de
denúncia propriamente dito. Desse modo, este manual tem por objetivo
capacitar essas ONGs para que produzam informações de alta qualidade
sobre incidentes e padrões sistemáticos da prática da tortura, a fim
de melhorar a utilidade da informação para os organismos
internacionais, bem como ajudar essas ONGs a selecionar o procedimento
ou os procedimentos mais adequados aos quais dirigir a informação à
luz do próprio resultado que se deseja. O tema central do manual é a
tortura, mas boa parte do que nele se explica seria igualmente relevante
no contexto de outras violações dos direitos humanos. Ainda que uma
denúncia não seja uma violação da proibição da tortura, pode ser
uma violação de outra norma dos direitos humanos, por exemplo, do
direito à liberdade e à segurança da pessoa, ou o direito a um
julgamento justo. Apesar de essas violações não serem o objeto
central do presente manual, os leitores devem ter presente que também
existem recursos para as violações de direitos humanos que não a
tortura.
Cabe lembrar que seguir as orientações
estabelecidas no presente manual não constitui garantia de obtenção
de um determinado resultado de um organismo internacional específico, e
que muitas vezes poderá parecer que se conseguiu-se muito pouco em um
determinado caso. Ainda que não se possa evitar a frustração e a
decepção nessas ocasiões, convém lembrar que a luta pela
erradicação da tortura é um processo longo e lento e que não deve
ser medido unicamente em função de resultados específicos. Toda
informação confiável, coletada meticulosamente, constitui uma arma
nessa luta e cada porta que se abre é uma porta a menos para que os
torturadores se escondam atrás dela.
2. COMO UTILIZAR ESTE MANUAl
IMPORTANTE:
Não se sinta intimidado pelo volume
deste manual. Não é preciso ler todo o livro do começo ao fim para se
beneficiar dele, nem é necessário ser um especialista para
utilizá-lo.
Se você tomar conhecimento de que foram
cometidos maus tratos mas não puder ou não desejar tomar as medidas
você mesmo, passe a informação a alguém que o possa.
A fim de adquirir um bom conhecimento do
processo geral de preparação e apresentação de uma denúncia de
tortura, será necessário ler todo o volume. No entanto, todas as
seções podem ser lidas separadamente e não precisam ser lidas
necessariamente em seqüência. Desse modo, é possível consultar o
manual de acordo as necessidades específicas do leitor. Recomenda-se,
entretanto, que qualquer pessoa que realmente pretende apresentar uma
denúncia formal de tortura leia atentamente cada seção tão logo
possível.
Como se verá à medida que se for lendo
este manual, sua intenção é a de ser o mais prático possível.
Assim, evitou-se aprofundar excessivamente na natureza técnica ou
teórica dos conceitos. Existe um grande número de estudos teóricos
sobre a tortura e outros temas relacionados e entendeu-se que o que
faltava era um manual de natureza mais prática para aqueles que querem
apresentar denúncias de tortura sem ter de concluir longos estudos
médicos e jurídicos para começarem a entender o assunto. Além disso,
para que um manual desse tipo tenha uma utilidade prática em campo, é
preciso que tenha um tamanho de fácil utilização e ofereça pronto
acesso à informação que se busca, sem que se tenha de extraí-la de
textos longos e densos. Por essa razão, foi necessário ser
extremamente seletivo na escolha do conteúdo deste manual. Há muitas
áreas que as pessoas interessadas em aprender mais sobre o assunto
poderão querer aprofundar. O Apêndice 2 apresenta uma seleção de
contatos e referências para as organizações ou pessoas que desejem
buscar mais informação ou assistência.
Não se esqueça que, à exceção dos
procedimentos específicos da tortura, muitos dos mecanismos descritos
também podem receber reclamações ou denúncias relativas a uma ampla
gama de violações dos direitos humanos que não a tortura. Boa parte
do que aqui se explica também vale para essas reclamações. Como este
manual se concentra na denúncia de casos de tortura, sua análise
enfatizará os requisitos para a apresentação de informação
relacionada à tortura, mas nos casos em que não se cumprirem esses
requisitos, pode, ainda assim, ser pertinente apresentar uma
reclamação com base em outro direito.
2.1. Exposição geral dos principais
capítulos
A apresentação de uma denúncia de
tortura não consiste somente em redigir uma carta a um organismo
internacional. É preciso saber onde olhar e o que procurar, e isso
começa pela primeira palavra da entrevista com a pessoa que alega ter
sido torturada. Isso se deve ao fato de que a qualidade e a conseqüente
credibilidade da denúncia dependerão quase inteiramente da
informação registrada. Isso significa saber quais perguntas formular e
prestar muita atenção aos detalhes quando da tomada de notas durante a
entrevista, porque nem sempre haverá uma segunda possibilidade de
preencher as lacunas. Também é necessária uma certa familiaridade
tanto com os contextos jurídicos como práticos da tortura, além de um
conhecimento dos objetivos e prováveis resultados da apresentação da
denúncia. As três principais seções que tratam dos diversos
estágios do processo são:
Parte I, Capítulo 3 - Contexto: Esse
capítulo proporciona informação geral para apresentação de uma
denúncia: analisa o que se pode conseguir comunicando denúncias de
tortura, explica brevemente o conceito de tortura e outras formas de
maus tratos, identifica lugares e situações em que é mais provável a
prática da tortura e destaca as circunstâncias mais favoráveis para o
recebimento de denúncias. Por último, trata do espinhoso tema dos atos
praticados por agentes não-governamentais e levanta a questão sobre o
que se pode fazer a respeito das denúncias que os envolvem.
Parte II - Documentação das Denúncias:
O objetivo dessa parte é oferecer orientações sobre como reunir
informações sobre incidentes de tortura e outras formas de maus
tratos. Essa parte enfatiza a informação indispensável a qualquer
denúncia, apresenta indicações sobre como realizar uma entrevista com
uma vítima ou testemunha e identifica o tipo de provas de apoio que
podem ser reunidas para se reforçar uma denúncia ou possibilitar a
instauração de um processo judicial.
Parte III – Ação Diante da
Informação Coletada: Essa parte apresenta os diferentes mecanismos
existentes para a apresentação de denúncias de tortura e outras
formas de maus tratos, sobretudo no âmbito internacional, proporciona
uma orientação para a escolha de um mecanismo e explica o melhor modo
de preparar e adaptar sua apresentação ao mecanismo escolhido. Também
reconhece que é possível haver situações em que não se queira fazer
uma denúncia em caráter pessoal, em que seja necessário apoio ou
aconselhamento sobre como proceder ou situações em que se queira tomar
medidas políticas e judiciais. Essa parte apresenta algumas sugestões
sobre onde obter assistência em tais casos.
2.2. Terminologia
Ele/ Ela: Via de regra, no presente
manual procurou-se usar o gênero neutro, salvo nos casos em que foi
necessária uma maior precisão em determinado contexto. Em tais casos,
a terminologia neutra foi substituída pelo gênero masculino ou
feminino. As referências excepcionais ao gênero masculino ou feminino
(em um contexto não relacionado ao gênero específico) devem ser
interpretadas como inclusivas tanto do gênero masculino como do
feminino.
Tortura/ Maus tratos: Como se verá no
Capítulo 3, o termo "tortura" tem um significado muito
específico na legislação de direitos humanos como forma
particularmente grave de maus tratos. O uso do termo "tortura"
no texto não tem o propósito de ser interpretado no sentido jurídico,
a menos que assim se depreenda claramente do contexto. Caso não seja
especificado em contrário, as considerações válidas para o termo
tortura valerão igualmente para outras formas de maus tratos.
Termos especializados: Os leitores devem
ter presente que alguns termos podem ter significados especializados ou
jurídicos em seu país, porém podem ter um significado diferente em
outro sistema nacional. A terminologia empregada no presente manual não
pretende ter implicações jurídicas e deve ser interpretada em um
sentido geral; o termo "prisão", por exemplo, não é
empregado em referência a uma prisão oficial, que pode exigir a
acusação de uma pessoa pela prática de um delito, mas meramente a
privação de liberdade ou a detenção de uma pessoa pela polícia,
inclusive para fins de interrogatório extra-oficial. De igual modo, os
nomes utilizados para certas instituições prisionais, tais como
presídios, podem se referir a um tipo muito diferente de instituição
em um determinado país, mas ser utilizados de modo mais genérico em
outro.
2.3. Questões essenciais de política
Os leitores devem estar cientes de que
há muitos aspectos sobre os quais é impossível falar adequadamente em
um manual desta natureza e dimensão, mas que devem ser mantidos
presentes à medida que lerem este manual, devido a suas importantes
implicações. É recomendável que se dedique certo tempo a uma
reflexão sobre esses aspectos e, se necessário, no caso das
organizações, à adoção das medidas cabíveis.
Segurança: Os entrevistadores deverão
ter muito cuidado no sentido de não criar um risco desnecessário para
as pessoas, quer sejam eles mesmos, quer sejam outros membros de sua
organização ou as pessoas entrevistadas. Talvez seja óbvio constatar
que há certos riscos inerentes ao trabalho na área dos direitos
humanos, sobretudo para o pessoal das ONGs locais, mas é importante que
os investigadores e trabalhadores dos direitos humanos que não sejam do
país ou que sejam provenientes de outras regiões do mesmo país não
se esqueçam de que pode haver conseqüências para aqueles que ali
ficarem. Ninguém deverá correr qualquer risco por culpa de uma pessoa
excessivamente entusiasmada. Raras são as vezes em que é possível
oferecer proteção às pessoas que apresentam denúncias, mas aqueles
que não têm muito medo de falar muitas vezes acreditam que fazê-lo
com pessoas de fora lhes garante algum tipo de proteção. É preciso
assegurar que eles tenham a oportunidade de expressar seu consentimento
informado (ver abaixo) à entrevista e ao possível uso da informação
registrada.
Ética profissional: Muito se escreveu
sobre os conflitos entre os deveres para com a comunidade no sentido
mais amplo e a relação entre os profissionais, sejam eles médicos ou
advogados, e seus clientes. Nos casos que envolvem maus tratos, esses
deveres podem entrar em conflito, porque, enquanto o dever para com a
comunidade em geral pode significar que todas as violações devem se
tornar públicas pelo bem da maioria, a ética profissional costuma
ditar que a confidencialidade entre advogados ou médicos e seus
clientes deve ser respeitada pelo bem da pessoa. Esse é um dilema que
mais provavelmente dirá respeito aos médicos, e existem muitas
declarações e códigos de ética da profissão médica, mas é um
dilema igualmente presente em todas as relações profissionais, entre
as quais se inclui a de um trabalhador de direitos humanos e um
entrevistado.
Os médicos e outros profissionais da
saúde que desejam buscar assessoramento sobre como tratar tais
conflitos éticos devem entrar em contato com uma organização médica,
seja ela nacional ou internacional, que deverá prestar assistência e
orientação sobre a melhor forma de se atuar. Outras organizações
profissionais deverão estar em condições de prestar uma assistência
semelhante a seus membros, além de redes de assistência profissional
de natureza menos fomal ou ONGs especializadas.
Consentimento informado: Significa
garantir que quando alguém dá seu consentimento a algo, por exemplo,
quando alguém concorda conceder uma entrevista ou apresentar uma
denúncia, a pessoa está plenamente informada dos possíveis
benefícios conseqüências negativas da ação proposta. A questão é
o que significa "plenamente informado"? Trata-se de um assunto
em que não é aconselhável adotar uma abordagem sistemática, mas sim
avaliar cada situação específica individualmente.
Deve haver um equilíbrio entre a
garantia de que o entrevistado está ciente de todos os riscos em
potencial envolvidos ao se fornecer informação e obter toda a
informação possível (porque esse, afinal, é o propósito principal
da entrevista, a não ser que realizada por razões terapêuticas).
Enfatizar os riscos em potencial pode fazer com que o entrevistado
desista de falar, mas seria inaceitável dar mais prioridade à
informação do que ao risco real que uma pessoa pode correr. Uma
tática poderia ser tomar uma decisão em função do fim para o qual se
pretende utilizar a informação. A regra de ouro deve ser que ninguém
jamais deverá ser nomeado nem identificado como fonte, a menos que
tenha dado seu consentimento expresso; se sua intenção é a de citar o
nome de uma pessoa, é preciso obter seu consentimento para tanto, bem
como para todas as implicações, tanto positivas como negativas. No
entanto, se seu propósito é, por exemplo, fazer uma entrevista
informal com alguém, não é necessária a identificação do
entrevistado; se estiver buscando somente a corroboração da
declaração de uma pessoa entrevistada anteriormente ou de informação
geral, pode ser contraproducente e desnecessário enfatizar os riscos em
potencial. Os riscos reais nunca devem ser ocultados, mas é importante
avaliar qual é o risco real em cada caso, em vez de sobrestimá-lo e
reduzir desnecessariamente o valor da entrevista.
Não se esqueça que o consentimento não
só deve ser informado mas também dado com liberdade. As pessoas não
devem ser pressionadas a dar seu consentimento quando estiver claro que
elas não querem fazê-lo após terem sido plenamente informadas das
implicações.
Apoio e reabilitação da vítima: O
trabalhador de direitos humanos tem um inevitável sentimento de
entusiasmo quanto à apuração dos fatos, a coleta de denúncias e a
descoberta de provas. No entanto, para a vítima, falar de semelhante
sofrimento pessoal e muitas vezes tão horroroso pode gerar reações
muito diferentes. De certo modo, pode ter um efeito terapêutico, mas
também pode voltar a abrir feridas muito profundas e provocar uma
enorme tensão psicológica e até física. É absolutamente
imprescindível oferecer todo o apoio real e eficaz possível à vítima
durante e após a entrevista. Em se tratando de entrevistas com pessoas
que ainda estão detidas, isso pode ser difícil, mas pelo menos o
entrevistador pode realizar a entrevista com tato e habilidade (Ver
Parte II, Capítulo 3.2). Em se tratando de vítimas entrevistadas fora
de um contexto de detenção, é preciso procurar oferecer-lhes apoio e
reabilitação. Isso pode significar colocar à sua disposição
assessoramento profissional ou simplesmente informar a vítima que a
porta sempre estará aberta. As organizações devem avançar nessa
questão junto aos organismos especializados relacionados no Apêndice
2. A reabilitação deve ser considerada como parte integral do trabalho
com as vítimas da tortura. Afinal, essas pessoas estão compartilhando
com o entrevistador algo que é profundamente pessoal e doloroso e,
embora este possa entender que a entrevista esteja contribuindo para uma
mudança positiva ou para fomentar uma causa, a situação pode criar
sofrimento para os entrevistados; portanto, cabe ao entrevistador
garantir que lhes seja oferecido o apoio de que necessitam para lidar
com seu sofrimento e converter o processo em um processo de cura.
3. CONTEXTO
3.1. Introdução
O presente capítulo procura responder a
algumas perguntas básicas que se pode ter sobre o processo de
apresentação de denúncias de tortura e outras formas de maus tratos.
Em primeiro lugar, qual é o objetivo do
processo? É possível conseguir algo com os procedimentos e os
mecanismos explicados neste manual? [Parte I, Capítulo 3.2]
Em seguida, cabe perguntar o que queremos
dizer por "denúncias de tortura". O que exatamente é a
tortura? Existe uma fórmula que diga em que ela consiste? Como se pode
ter certeza de que a informação coletada evidencia que foram
praticados atos de tortura? Você precisa saber disso? [Parte I,
Capítulo 3.3]
Como ocorre a tortura? Para encontrar uma
resposta, perguntamos quem são seus autores, onde e quando é mais
provável que ajam e quem são suas vítimas mais prováveis. [Parte I,
Capítulo 3.4]
Existe alguma situação típica em que
se possa obter informação relativa a incidentes de maus tratos? Existe
algum fator específico que se deva conhecer em tais situações? E
quanto às fontes de informação menos habituais? [Parte I, Capítulo
3.5]
O que acontece quando as violações são
cometidas por pessoas que não têm relação com as autoridades
estatais, por exemplo, forças rebeldes em um conflito interno? Também
é possível apresentar denúncias contra elas? [Parte I, Capítulo 3.6]
3.2. O que se pode esperar conseguir com
a apresentação de denúncias de tortura?
A apresentação de denúncias de tortura
aos mecanismos internacionais pode ser benéfica para a situação geral
de um país e para a vítima da tortura.
Atrair a atenção para uma situação/
estabelecer um padrão de violações
Os governos cujos agentes cometem
violações dos direitos humanos preferem manter essas práticas longe
da visibilidade pública, a fim de, assim, escapar da condenação. A
apresentação de denúncias aos mecanismos internacionais contribui
muito para evitar essa situação, uma vez que aumenta a consciência da
situação real existente em um determinado país. É mais provável que
a comunidade internacional tome medidas com relação a situações
sobre as quais recebe muitas informações. A única forma de aumentar a
possibilidade de o resto do mundo tomar medidas contra violações dos
direitos humanos é assegurando que o mundo esteja a par da situação.
Se a informação disponível assim
corroborar, deve-se procurar apresentar provas de um padrão
sistemático de violações. Informações coerentes e regulares
constituem prova desses padrões e suscitarão uma maior preocupação
da comunidade internacional do que relatos de incidentes isolados. Isso
porque demonstra que o problema é grave e dificulta a possibilidade de
um Estado argumentar que não está envolvido ou que desconhece as
práticas alegadas.
Buscar mudanças positivas em uma
situação geral
Atrair a atenção para uma situação
não só consiste em buscar a condenação ou responsabilização de um
Estado. Ainda mais importante, consiste em buscar melhoras construtivas
e duradouras que contribuirão para a eliminação definitiva da tortura
em um país. Esse objetivo muitas vezes exigirá mudanças no arcabouço
legislativo e nas atitudes oficiais para com a tortura. Muitos dos
mecanismos internacionais fazem sugestões aos Estados sobre as formas
pelas quais podem melhorar a situação geral, por exemplo, mediante a
introdução de garantias jurídicas e práticas que ofereçam uma maior
proteção aos detidos. Isso pode passar por uma legislação que reduza
o período pelo qual um detento pode ser retido sem ter acesso a um
advogado, a introdução de exames médicos periódicos por parte de
médicos independentes para todas as pessoas sob custódia ou medidas
para se eliminar a impunidade (discutidas mais adiante). Normalmente, as
recomendações dos organismos internacionais são apenas o início de
um diálogo com o Estado em questão, cujo propósito é garantir que
sejam implementadas as recomendações.
3.2.3. Combater a impunidade
Levar a tortura à atenção da opinião
pública para responsabilizar os Estados é resultado da apresentação
de denúncias de tortura. Em outro nível, a denúncia de casos de
tortura também pode ajudar a lançar luz sobre as pessoas que praticam
tais atos, para que tenham certeza de que não podem continuar com essa
conduta impunes, sem arcar com suas conseqüências. O ideal seria que
isso se desse mediante a instauração de um processo no âmbito do
sistema jurídico nacional. No entanto, quando a instauração de um
processo não é ou não pode ser eficaz, muitos dos organismos
internacionais condenam rapidamente a tolerância oficial da tortura e
exigem ou recomendam ao Estado que adote medidas destinadas a eliminar a
impunidade. Enquanto os torturadores puderem escapar impunes (e, com
efeito, em alguns casos suas chances de promoção aumentam com o
emprego da tortura para a obtenção de resultados em investigações),
não haverá incentivos para abandonarem a prática da tortura e outras
formas de maus tratos.
Se um Estado permite a impunidade para os
autores da tortura, também se origina um problema de responsabilidade
estatal nos termos do direito internacional. Muitos Estados têm a
obrigação, em virtude de uma série de convenções, tais como a
Convenção das Nações Unidas contra a Tortura, de assegurar que as
pessoas que tenham perpetrado atos de tortura sejam responsabilizadas
por suas ações. Se um Estado não processa as pessoas que sabidamente
estão envolvidas em atos de tortura, ou não permite que outro Estado o
faça, tal Estado pode estar incorrendo em um descumprimento de suas
obrigações assumidas nos termos do direito internacional.
3.2.4. Buscar um recurso jurídico para
uma vítima em particular
Os objetivos anteriores podem parecer um
tanto indiretos e de longo prazo e podem parecer não proporcionar uma
reparação às vítimas. Além dos benefícios de longo prazo para as
pessoas por viverem em um país com um melhor histórico de direitos
humanos, existem vários benefícios imediatos ou diretos que podem ser
obtidos mediante a apresentação de denúncias.
3.2.4.1. Constatação de violação
Muitos organismos de tratados
internacionais descritos podem se pronunciar sobre a questão de se
realmente foram praticados atos de tortura ou violações a eles
relacionadas. Isso significa que eles podem emitir uma declaração
autorizada de que o Estado violou suas obrigações nos termos do
direito internacional com relação a uma determinada pessoa. Ainda que
isso não ofereça uma reaparação para a pessoa em questão, o efeito
é que foi revelado publicamente a culpabilidade do Estado e que o
Estado foi obrigado a prestar contas de seu comportamento.
3.2.4.2. Responsabilização dos
torturadores
Alguns dos mecanismos podem requisitar ou
ordenar que se realize uma investigação eficaz sobre uma denúncia de
tortura e que o torturador seja processado por sua conduta. Da mesma
forma que no caso para se eliminar a impunidade em geral, isso é
importante para garantir a uma vítima que um torturador não pode
praticar a tortura sem ter de arcar com as conseqüências de seu ato.
3.2.4.3. Reparação
A reparação consiste em reparar o dano
causado a uma pessoa. Muitos órgãos judiciais internacionais têm o
poder de ordenar a um Estado que repare o dano causado nos casos em que
se dá a constatação de uma violação. A reparação pode ser
concedida de diversas formas. Tradicionalmente, muitas vezes consistiu
em uma compensação econômica (indenização), porém cada vez mais
também são comuns outros tipos de reparação. As compensações
econômicas são calculadas, via de regra, segundo a perda econômica
real, bem como os danos morais, o que equivale a calcular o sofrimento
causado à pessoa ou a sua família, ou a ambas, e atribuir-lhe um valor
econômico. Entre as formas menos tradicionais de reparação, que, em
muitos sentidos, são uma forma muito mais apropriada e eficaz de
compensar as conseqüências das violações, poderiam incluir-se a
inauguração de uma escola ou hospital em uma comunidade que tenha
sofrido violações, requerer que o Estado informe os familiares de
pessoas desaparecidas ou assassinadas acerca da localização dos corpos
das vítimas mortas, ordenar que o Estado contribua financeiramente para
a reabilitação da vítima ou até mesmo que o Estado apresente um
pedido de desculpas público pelo ocorrido.
3.2.4.4. Impedir a deportação de uma
pessoa para um país onde ela poderia correr o risco de tortura
Muitos dos mecanismos estão preparados
para tomar medidas urgentes a fim de evitar a deportação de pessoas
para países em que se acredita que elas correm o risco de sofrer
torturas. A pessoa deve poder demonstrar que corre esse risco e que o
risco é permanente; se for possível demonstrar isso, o organismo pode
requerer que o Estado ao qual se solicita asilo não deporte a pessoa, a
menos até que o mecanismo em questão tenha tido a oportunidade de
considerar o caso. Tais requerimentos não são necessariamente
vinculantes para o Estado, mas, muitas vezes, são respeitados.
3.3. O que é tortura?
3.3.1. Introdução
A decisão sobre se uma série de atos
constitui ou não tortura pode ser complicada. Existem certos tipos de
tratamento que a maioria das pessoas reconhece instintivamente como
inaceitáveis. Entretanto, existem outros que não são tão claros ou
que dependem de fatores culturais. É importante lembrar que quando se
apresenta uma denúncia a um mecanismo internacional, procura-se
evidenciar que os fatos constituem tortura ou maus tratos em um sentido
jurídico, e não só na opinião de quem faz a denúncia. Esta seção
analisará o que isso significa e quais são as implicações para
aqueles que desejam apresentar uma denúncia.
3.3.2. O que o direito internacional diz
sobre o significado da tortura?
A definição básica de tortura é a que
consta da Convenção das Nações Unidas contra a Tortura (1984). De
acordo com o Artigo 1(1), o termo significa:
"qualquer ato pelo qual se inflige
intencionalmente um sofrimento ou uma dor grave, seja física ou mental,
a uma pessoa para fins tais como a obtenção de informação sobre uma
terceira pessoa ou uma confissão, um castigo por ato que essa pessoa ou
uma terceira pessoa tenha cometido ou se suspeite que ela tenha
cometido, ou a intimidação ou coerção dessa pessoa ou de uma
terceira pessoa, ou por qualquer razão com base em qualquer tipo de
discriminação, quando tal dor ou sofrimento for infligido por parte ou
por instigação ou com o consentimento ou a aquiescência de um
representante público ou outra pessoa que atua em capacidade oficial.
Não inclui dor ou sofrimento decorrente, inerente ou próprio
unicamente de sanções jurídicas."
A partir dessa distinção, é possível
depreender três elementos essenciais que constituem tortura:
A imposição de um sofrimento ou uma dor
mental ou física grave
Por parte das autoridades estatais ou com
seu consentimento ou aquiescência
Por um motivo determinado, por exemplo,
extrair informação, castigar ou intimidar
"Tortura" é uma palavra que
suscita emoções, mas que não deveria ser usado de modo
inconseqüente. Como se depreende da definição anterior, a tortura se
caracteriza e se distingue de outras formas de maus tratos pelo grau de
sofrimento grave. Por essa razão, é importante reservar o termo às
formas de maus tratos objetivamente mais graves.
Tratamento cruel e punição ou
tratamento degradante ou desumano também são termos jurídicos que
constituem maus tratos que provocam diversos graus de sofrimento menos
intenso que no caso da tortura. As formas de maus tratos que não a
tortura não precisam ser impostas por um motivo específico, mas é
preciso haver uma intenção de submeter as pessoas a condições que
constituem ou resultem em maus tratos. Portanto, os elementos essenciais
que constituem maus tratos que não representam tortura devem se limitar
a:
Exposição intencional ou a uma dor ou
sofrimento mental ou físico consideráveis
Por parte das autoridades estatais ou com
seu consentimento ou aquiescência
Para que os órgãos internacionais
distingam entre as diferentes formas de maus tratos e avaliem o grau de
sofrimento, devem levar em consideração as circunstâncias
específicas de cada caso e as características de cada vítima. Isso
dificulta a identificação das fronteiras exatas entre as diferentes
formas de maus tratos, uma vez que essas circunstâncias e
características variarão, porém não torna a lei mais flexível por
permitir que ela se adapte às circunstâncias. A questão importante a
se ter presente é que todas as formas de maus tratos são proibidas
pelo direito internacional. Isso significa que, até mesmo nos casos em
que o tratamento não for considerado suficientemente grave (em termos
jurídicos) a ponto de constituir tortura, é possível declarar que o
Estado violou a proibição de maus tratos.
3.3.3. O que isso significa em termos
práticos?
O direito internacional nos fornece duas
principais orientações a serem aplicadas na avaliação de se um
conjunto de fatos constitui tortura, a saber:
Os fatos devem corroborar os elementos
essenciais contidos na definição de tortura.
A tortura pode ser distinguida de outras
formas de maus tratos por seu grau de sofrimento grave e a necessidade
de um elemento de intencionalidade.
3.3.3.1. Elementos essenciais
Como se verá no excerto da citada
Convenção das Nações Unidas contra a Tortura, a definição
jurídica de tortura tem uma natureza muito abstrata. Não se refere a
tipos específicos de maus tratos nem proporciona uma lista de técnicas
proibidas. Em vez disso, estabelece uma série de elementos essenciais
para que um incidente seja considerado como um possível caso de tortura
na acepção jurídica. Os elementos necessários para que um tratamento
constitua maus tratos que não a tortura também são abstratos. Esses
elementos podem ser recapitulados da seguinte forma:
QUAL ATO FOI PRATICADO? : Dor ou
sofrimento mental ou físico grave (tortura) foi imposto deliberadamente
ou ocorreu uma exposição intencional a uma dor ou sofrimento mental ou
físico considerável (maus tratos que não tortura).
QUEM O PRATICOU? : As próprias
autoridades estatais impuseram esse sofrimento, ou dele sabiam ou
deveriam ter sabido, porém nada fizeram para evitá-lo.
POR QUE O PRATICARAM?: O sofrimento foi
imposto com uma finalidade específica, por exemplo, para se obter
informação, castigar ou intimidar a vítima (somente tortura).
O que constitui exatamente esses
elementos fica a cargo da interpretação dos organismos internacionais
de monitoramento. Estes têm a responsabilidade de elaborar
interpretações coerentes da definição da tortura e outras formas de
maus tratos e devem assegurar que suas interpretações apliquem, em
cada caso, as mesmas normas. Isso significa que uma pessoa ou
organização (ONG) não deve decidir se os maus tratos impostos a uma
pessoa constituem tortura ou outro tipo de tratamento, mas sim que,
documentando os fatos que corroboram os elementos essenciais, é
possível fornecer as provas para que os organismos internacionais
decidam.
3.3.3.2. Grau de sofrimento
A tortura se distingue de outras formas
de maus tratos menores por seu grau de sofrimento grave. Talvez seja
esse o aspecto mais difícil para se avaliar a tortura. Os outros dois
elementos essenciais podem ser verificados, em grande medida,
objetivamente: em geral, é objetivamente possível estabelecer que o
torturador tinha um vínculo com o Estado ou que a tortura foi imposta
com um propósito específico. A natureza e o grau do sofrimento
experimentado por uma pessoa são outra questão. Podem depender de
muitas características pessoais da vítima: do sexo, idade, crenças
religiosas ou culturais, estado de saúde, por exemplo. Em outros casos,
certas formas de maus tratos ou certos aspectos da detenção, que, por
si sós, não constituiriam tortura, podem constituir tortura em
combinação um com outro.
Certos tipos de tratamento parecem se
inserir objetivamente na categoria de tortura - por exemplo, choques
elétricos aplicados nos órgãos genitais ou a extração de unhas. A
tortura, entretanto, não se limita a esses exemplos mais conhecidos;
inclui muitas formas de sofrimento, de natureza tanto física como
psicológica. É muito importante não esquecer as formas psicológicas
de maus tratos; muitas vezes essas formas podem ter conseqüências mais
duradouras para as vítimas, que podem se recuperar das lesões físicas
mas, ainda assim, continuarão sofrendo de profundas cicatrizes
psicológicas. Entre as formas de maus tratos que foram demonstradas
como equivalentes à tortura, por si sós ou em combinação com outras
formas de tratamento, incluem:
Falaka/ falanga: golpes nas solas dos
pés
Forca palestina: suspensão pelos braços
amarrados nas costas
Espancamentos violentos
Choques elétricos
Estupro
Simulação de execução
Ser enterrado vivo
Simulação de amputações
Entretanto, também existem muitas
"áreas cinzentas" que não constituem tortura de uma forma
clara, ou sobre as quais ainda existe desacordo, mas que representam uma
grande preocupação para a comunidade internacional. Entre os exemplos
incluem-se:
Castigo corporal imposto como pena
judicial
Certas formas de pena capital e o
fenômeno do corredor da morte (presos condenados à morte)
Reclusão em cela solitária
Determinados aspectos de más condições
de encarceramento, sobretudo se combinados vários elementos
Desaparecimentos, inclusive o efeito que
provocam nos familiares próximos da pessoa desaparecida
Tratamento infligido a uma criança que
pode não ser considerado tortura se infligido a um adulto
Um fator particularmente significativo
que pode afetar a avaliação da gravidade do grau de sofrimento
experimentado pela vítima é o fator cultural. É importante ter
presente que as diferentes culturas e, com efeito, as pessoas de uma
determinada cultura, têm diferentes percepções do que constitui
tortura. Isso pode ter dois aspectos importantes: por um lado, pode
significar que o comportamento que uma cultura ou uma vítima consideram
como tortura, pode não constituir tortura para os organismos
internacionais. Por outro lado, também pode significar que o tratamento
que a comunidade internacional considera constitui tortura não é visto
como tal pela pessoa que o sofreu. Por exemplo, em um país,
espancamentos, ainda que violentos, podem não ser considerados tortura,
mas uma prática normal, ao passo que rasgar a roupa de uma mulher (sem
mais) pode sê-lo. Também pode acontecer de o tratamento considerado
ilegal no âmbito internacional ser legal no âmbito nacional. Em tais
casos, não se deve deixar de apresentar a denúncia, porque os
organismos internacionais seguirão as orientações do direito
internacional. Lembre-se que mesmo quando o tratamento não for
considerado como tortura, poderá, ainda assim, constituir outra forma
de maus tratos proibidos.
A fim de assegurar-se de que sejam
levadas em conta as possíveis variações culturais ao apresentar uma
acusação de tortura, deve-se:
Explicar o significado das atitudes
culturais quanto a certos tipos de tratamento em suas denúncias e
relatos, uma vez que isso pode afetar a avaliação, por parte do
organismo internacional, do grau de sofrimento.
Certificar-se de não omitir qualquer
detalhe do tratamento a que foi submetida a pessoa, porque os fatos que
você não considera importantes podem na verdade ser muito relevantes
para a denúncia.
Lembrar-se de que as vítimas também
podem omitir detalhes que não acreditam ser importantes; você deve
estimulá-las a dar todos os detalhes possíveis sobre o que aconteceu.
(Ver Parte II, Capítulo 4 para uma consulta das orientações sobre
qual informação pode ser mais importante)
3.3.4. Conclusão: o que é tortura?
Todos esses comentários levam à
seguinte pergunta: como é possível ter certeza de que os fatos sobre
os quais se dispõe de informação constituem tortura ou maus tratos? A
resposta é muito simples: não se pode ter certeza, mas não é
necessário tê-la.
Sua responsabilidade, como indivíduo ou
ONG que apresenta uma denúncia de tortura, é garantir que a
informação a ser apresentada corrobore os três elementos essenciais
que constituem a definição jurídica de tortura (ou dois, em caso de
denúncia de maus tratos).
É da responsabilidade dos organismos
internacionais determinar exatamente o que constitui e o que não
constitui tortura ou maus tratos.
A interpretação do que constitui
tortura está em constante evolução. Isso pode parecer complicar as
coisas, mas, na verdade, permite que os organismos internacionais tenham
uma relativa liberdade ao avaliarem as formas de maus tratos que
anteriormente não foram consideradas como formas que constituem
tortura. Para a pessoa que vai apresentar uma denúncia de tortura, isso
significa que não é necessário que se tenha certeza de que um ato
constitui tortura ou não, mas, ao mesmo tempo, não significa que não
existam certos critérios mínimos. Lembre-se que sua tarefa é procurar
estabelecer os elementos essenciais.
Deve-se demonstrar que:
Dor ou sofrimento mental ou físico grave
(tortura) foi imposto deliberadamente ou ocorreu uma exposição
intencional a uma dor ou sofrimento mental ou físico considerável
(maus tratos que não tortura).
As próprias autoridades estatais
impuseram esse sofrimento ou dele estavam cientes ou deviam ter estado
cientes, porém nada fizeram para evitá-lo.
No caso de tortura (ainda que não seja
requisito para documentar outras formas de maus tratos), o sofrimento
foi imposto com um propósito específico, por exemplo, com o fim de
extrair informação, castigar ou intimidar a vítima.
3.4. Como ocorre a tortura?
3.4.1. Quem são os torturadores?
Conforme enfatiza a seção que descreve
o que é a tortura, é necessário que o comportamento em questão tenha
sido praticado por um representante de uma autoridade investida no poder
ou com sua aprovação. Isso significa que qualquer agente estatal pode
estar potencialmente envolvido em torturas ou maus tratos. No entanto,
considerando os motivos comuns da tortura, que podem ser a obtenção de
informação durante um interrogatório ou, cada vez mais, com a
finalidade de intimidar a população em geral diante de uma
insurreição ou um distúrbio, não é surpreendente que os principais
agentes sejam os representantes envolvidos no processo de investigação
criminal e as pessoas responsáveis pela segurança do Estado.
Isso significa que entre as pessoas com
maior probabilidade de estarem envolvidas em atos de tortura e outras
formas de maus tratos incluem-se:
A polícia
A gendarmerie (nos países onde essa
instituição existe)
O exército
As forças paramilitares que atuam em
conexão com as forças oficiais
Forças de contra-guerrilha controladas
pelo Estado
Mas também:
Agentes penitenciários
Esquadrões da morte (tortura após o
desaparecimento e antes do assassinato)
Qualquer representante do governo
Profissionais da saúde: médicos,
psiquiatras ou enfermeiros podem participar da tortura tanto por ação
(participação direta que pode incluir a certificação de que alguém
está apto para um interrogatório) como por omissão (falsificando
laudos médicos ou deixando de prestar atendimento adequado)
Outros detentos que atuam com a
aprovação ou sob ordens de agentes públicos
Além disso, a tortura muitas vezes se
dá no contexto de conflitos armados, principalmente em conflitos
internos dos quais participam forças contrárias à autoridade no poder
e que controlam parte do território. Em tais circunstâncias, a tortura
e outras formas de maus tratos também podem ser impostas por:
Forças de oposição
A população em geral
(Ver Parte I, Capítulo 3.6 para uma
análise das denúncias contra agentes não-estatais)
3.4.2. Quem são as vítimas?
Qualquer pessoa pode ser vítima de atos
de tortura: homens ou mulheres, jovens ou velhos, religiosos ou ateus,
intelectuais ou campesinos. Muitas vezes o fator determinante pode ser o
fato de se pertencer a uma minoria ou grupo político, religioso ou
étnico. No entanto, ninguém deveria ser considerado imune.
Existe a tendência entre as pessoas que
apresentam denúncias de tortura e outras formas de maus tratos de se
concentrar na informação relativa a "presos políticos",
pessoas envolvidas na política e que costumam se opor às autoridades
que detêm o poder. No entanto, os criminosos comuns, principalmente os
acusados de crimes graves, tipicamente são vítimas de tortura, talvez
com o objetivo de se obter informação ou uma confissão ou,
simplesmente, para fins de extorsão ou intimidação. Quando o objetivo
é espalhar o terror entre uma população, todos correm perigo. É
muito importante não dar a impressão de que só os "presos
políticos" estão em situação de risco, centrando-se a atenção
neles e excluindo-se as outras vítimas que também podem estar muito
expostas ao risco.
A identidade da vítima é importante
porque:
Determinados grupos, tais como crianças,
mulheres, pessoas idosas ou religiosos, podem ser mais vulneráveis aos
efeitos dos maus tratos, de modo que é mais fácil considerar que o
grau de sofrimento é tão grave que constitui ato de tortura.
Contribui para a identificação de
padrões de violação contra um determinado grupo de vítimas.
Podem ser utilizados mecanismos
internacionais complementares específicos para determinados grupos, por
exemplo, o Relator Especial da ONU sobre Violência Contra as Mulheres.
Entre os exemplos em que a identidade da
vítima pode ser importante incluem-se:
Crianças: Considera-se que as crianças
são um grupo especialmente vulnerável. Em particular, cabe ressaltar
que os efeitos de um certo tipo de maus tratos sobre uma criança podem
ser diferentes dos efeitos que esses mesmos tratos teriam para um
adulto. Também convém destacar que uma forma de maus tratos que pode
ter seqüelas traumáticas para uma criança é obrigá-la a presenciar
a tortura de um pai ou familiar próximo. De igual modo, ameaçar ou
forçar os pais a presenciarem a tortura de seus filhos pode ter graves
efeitos psicológicos para os pais.
Tortura em razão do sexo: Estupro ou
violação como método de tortura não é exclusivo contra as vítimas
do sexo feminino, mas é comumente usado contra as mulheres como meio de
acentuar os sentimentos de fraqueza e subordinação na vítima ou na
comunidade. Os casos de violação masculina não costumam ser
denunciados por muitas razões, dentre as quais a falta de informação
do entrevistador. Entre outros exemplos em que o sexo da vítima pode
ser importante inclui-se o caso de mulheres gestantes, que são
particularmente vulneráveis, e as mulheres em idade reprodutiva, que
podem engravidar como efeito agravante do estupro.
Religiosos: Há exemplos em que os maus
tratos constituem tortura ou tratamento desumano por causa do caráter
religioso da vítima, por exemplo, pessoas devotas submetidas a
escárnio religioso; por exemplo, arrancar a barba de um sacerdote
ortodoxo.
Maus tratos dirigidos à profissão de
uma pessoa: Em um caso, considerou-se que houve tortura psicológica
quando se submeteu um pianista à simulação de amputação de suas
mãos.
A Parte II, Capítulo 4.1 apresenta uma
relação mais completa dos tipos de características que devem ser
registradas.
3.4.3. Onde é mais provável que ocorra
a tortura?
A tortura pode ocorrer em qualquer lugar,
principalmente em países onde se vive um clima generalizado de
violência. Os lugares de alto risco são aqueles em que é provável
que ocorram interrogatórios, tais como delegacias de polícia ou
gendarmerie, e qualquer outro estabelecimento de detenção, sobretudo
de detenção anterior ao julgamento.
Embora a maioria desses lugares sejam
conhecidos dos que vivem na área local e sejam estabelecimentos de
detenção oficiais, também é relativamente comum haver outros locais
de detenção não reconhecidos. Esses locais podem incluir desde
instalações utilizadas regularmente para esses fins (por exemplo, uma
fábrica abandonada ou prédios do governo) até instalações
utilizadas em determinados casos porque são convenientes para a
ocasião (por exemplo, um prédio escolar usado como área de
detenção, ou mesmo um terreno aberto).
Lembre-se de que a tortura não se limita
a um estabelecimento de detenção e que pode ocorrer na própria casa
da vítima ou durante o trajeto para um estabelecimento de detenção
oficial.
3.4.4. Quando é mais provável que
ocorra a tortura?
Em vez de centrar a atenção
demasiadamente nos locais propriamente ditos, talvez seja mais útil
pensar em termos do estágio do processo de prisão e detenção em que
os detidos correm mais risco.
O maior risco de as sofrerem tortura e
outras formas de maus tratos ocorre durante a primeira fase da prisão
ou detenção, antes de terem acesso a um advogado ou comparecerem
perante o tribunal. O risco persiste enquanto durar a investigação,
independentemente de onde o suspeito estiver sendo detido.
A detenção em condições de
incomunicabilidade (isto é, detenção não-reconhecida de alguém ou
detenção em que não se permite que a pessoa detida fale com alguém,
seja um advogado ou familiar) provavelmente é o mais alto fator de
risco de tortura porque não há um monitoramento externo do
interrogatório. Às vezes, as forças de segurança só registram
oficialmente o indivíduo uma vez concluído o interrogatório inicial.
A tortura costuma ser menos freqüente
nas prisões normais para presos condenados, uma vez que a
investigação já foi concluída, porém cabe sublinhar que muitos
presídios mantêm presas pessoas que estão pendentes de julgamento,
bem como presos já sentenciados. Não deve ser descartado o risco para
os presos sob prisão preventiva, principalmente nos casos em que as
mesmas forças de segurança dirigem a prisão ou quando se sabe que
mantêm com ela uma estreita relação. O risco para os presos sob
prisão preventiva pode não existir necessariamente dentro da própria
instituição, mas sim na possibilidade de que sejam transferidos de
volta para a custódia das autoridades que conduzem a investigação.
Tanto na fase inicial de detenção
quanto após a transferência para uma prisão, convém lembrar que as
próprias condições de detenção podem constituir um tratamento
desumano ou degradante e, portanto, também devem ser documentadas (Ver
Parte II, Capítulo 4.1)
A tortura também pode ocorrer após
seqüestros. Nos seqüestros temporários, a vítima é libertada após
várias horas ou vários dias. No caso de um
"desaparecimento", as provas indicam que a vítima está
detida por autoridades ou com sua aquiescência, porém as autoridades
não o reconhecem. A vítima pode não ser encontrada ou ser encontrada
morta. As duas formas de seqüestro ou rapto podem envolver tortura e
são utilizadas como meio para infundir medo ou intimidar a comunidade.
Ainda que os casos de desaparecimento envolvam violações que não a
tortura (por exemplo, violação do direito à vida, do direito à
liberdade e à segurança da pessoa), qualquer indício de que ocorreu
um ato de tortura durante o desaparecimento deve ser documentado. O
próprio desaparecimento poderia ser considerado como tortura, tanto da
vítima como dos familiares da vítima.
3.5. Em quais contextos é possível
receber ou obter denúncias de tortura?
As denúncias de tortura e outras formas
de maus tratos podem ser recebidas em vários contextos e lugares. Em
geral, é pouco provável que sejam recebidas no lugar onde foram
praticados os atos de tortura e muitas vezes são recebidas no local em
que a vítima da tortura sente que pode falar com liberdade. Esse
momento poderia ser após a transferência para um presídio, se a
vítima foi torturada enquanto estava sob custódia policial; no
tribunal, após sua soltura e retorno à comunidade, ou mesmo após a
saída do país.
Entre os contextos gerais em que é
possível receber ou obter denúncias incluem-se:
Situações de agitação política ou
violência generalizada
Zonas de conflito
Entre os contextos específicos em que se
pode receber ou obter denúncias de tortura incluem-se:
Visitas a instituições prisionais
Contextos médicos
Campos e centros de refugiados e pessoas
deslocadas
Pedidos de asilo
A maioria desses contextos é evidente.
No entanto, às vezes também é possível encontrar informação em
lugares incomuns, que não nos ocorreriam de imediato, e convém
pesquisar os recursos disponíveis. É particularmente o caso de
informações que podem corroborar ou fornecer provas de uma denúncia
feita oralmente durante uma entrevista ou em outra situação. Entre os
possíveis lugares em que se pode buscar informações ou pessoas com
quem falar incluem-se:
Arquivos de tribunais
Arquivos da promotoria
Laudos médicos
Registros de entrada e soltura em
delegacias de polícia e presídios (incoerências e lacunas nesses
registros costumam ser são um sinal de irregularidade)
Registros de comparecimento a um local de
trabalho ou estabelecimento educacional (isso pode ajudar a confirmar
uma reclamação de que um indivíduo não pôde comparecer ao local por
um determinado período devido a lesões causadas pela tortura)
Jornais ou noticiários locais
Grupos de assistência comunitária, tais
como grupos de jovens
Pessoal religioso
Outros detentos
Os contextos típicos em que é possível
receber denúncias de tortura não exigem muita explicação. No
entanto, há alguns contextos em que seria útil estar ciente de certos
fatores específicos:
Zonas de conflito: Deve-se ter presente
que as violações nessas áreas provavelmente são perpetradas pelas
duas partes do conflito, sejam elas governamentais ou não, e é
importante manter registros precisos dos torturadores acusados em cada
caso, ou das características que possam ajudar a identificá-los.
Lembre-se também que o fator medo e intimidação pode ser muito
grande, uma vez que os civis muitas vezes são perseguidos pelas duas
partes para dissuadir-lhes de oferecer seu apoio e ajuda à parte
oposta. Ver Parte I, Capítulo 3.6 para possíveis ações diante de
denúncias de tortura por parte de agentes não-governamentais.
Visitas a instituições prisionais:
Naturalmente, os detentos se mostram
menos dispostos a fazer denúncias de maus tratos enquanto continuam sob
a custódia das forças que realizam a investigação (detenção
anterior ao julgamento) e, em tais circunstâncias, deve-se ter especial
consciência da segurança da pessoa. Como regra geral, os detentos se
mostram mais dispostos a comentar suas experiências nas mãos das
autoridades que realizam a investigação quando já foram condenados e
estão reclusos em uma prisão normal.
A distinção entre as duas categorias de
centros de detenção e seu respectivo sentido de segurança pode ser um
tanto vaga por dois fatores: em alguns países, tanto os presos
pendentes de julgamento como os já condenados podem estar detidos na
mesma instituição; em outros, o pessoal de um ou de ambos tipos de
instituição pode fazer parte da mesma autoridade encarregada da
investigação, como a polícia. Nesses casos, deve-se estar ciente de
que a transferência para outro centro de detenção não implica
necessariamente uma transferência fora do alcance das autoridades
investigadoras.
O acesso a instituições prisionais é
difícil, mas certas ONGs podem ter um acesso privilegiado mediante um
acordo com as autoridades, normalmente restrito a presos condenados,
para prestar assistência médica, fornecer alimentos ou como parte de
um regime de visitas carcerárias. No entanto, nesses casos é preciso
ter presente que a confidencialidade pode ser uma condição de acesso
(Ver, em particular, as atividades do Comitê Internacional da Cruz
Vermelha, Parte III, Capítulo 7.2). Outras pessoas que podem ter acesso
a presídios e penitenciárias são os advogados e os profissionais da
saúde.
Nessas circunstâncias, três grandes
categorias de denúncias podem ser recebidas.
Em primeiro lugar, particularmente no
caso dos recém-chegados, é possível receber denúncias sobre o
tratamento recebido antes da chegada à instituição, quando estavam
nas mãos das autoridades que conduzem a investigação.
Em segundo lugar, é possível receber
denúncias sobre incidentes ocorridos dentro da instituição, por
exemplo, maus tratos a uma pessoa por parte de um agente de segurança
carcerária ou de outros presos com a aprovação ou por incitação dos
agentes de segurança, um acontecimento específico tal como um motim em
que determinados indivíduos foram atacados por agentes de segurança
carcerária, um caso particularmente grave de isolamento em cela
solitária ou o caso de um indivíduo a quem se tenha negado tratamento
médico adequado para um problema de saúde grave.
Por último, é possível obter
informação sobre as condições gerais da instituição, tais como o
espaço habitável, higiene - um aspecto particularmente angustioso dos
sistema penitenciário -, métodos inaceitáveis de punição, tal como
o uso de correntes ou grilhões, ou isolamento prolongado. Quando
possível, a entrevista individual de presos, mais do que em grupos,
permite corroborar melhor as denúncias sobre a instituição. Vale a
pena ter presente que os presos que já estiverem na instituição por
muito tempo estarão mais familiarizados com as condições gerais do
que os recém-chegados.
Uma conversa com o médico da
instituição pode gerar muita informação, principalmente se ele
estiver disposto a mostrar-lhe os arquivos médicos dos presos.
Naturalmente, o acesso aos arquivos médicos deve ser consistente com a
necessidade de se proteger a identidade das pessoas quando se faz
necessária a confidencialidade (Ver comentário sobre confidencialidade
na Parte I, Capítulo 2). Nos casos em que os exames médicos são
realizados após a chegada à prisão, é particularmente útil
solicitar vistas do laudo médico desse primeiro exame, uma vez que ele
pode fornecer provas de lesões sofridas enquanto o detento se
encontrava sob a custódia da polícia ou demonstrar que a pessoa gozava
de boa saúde quando chegou e que pode ter sofrido lesões ou ter ficado
doente posteriormente. Os médicos poderão se mostrar mais dispostos a
mostrar-lhe provas de fatos que ocorreram fora de sua instituição, uma
vez que é menos provável que isso tenha implicações para eles.
IMPORTANTE: Deve-se estar ciente de que o
modo como você pretende usar essa informação médica pode trazer
conseqüências para o médico. Se possível, deve-se comentar esse
assunto com o médico ou outro profissional de saúde e obter seu
consentimento em caso de necessidade de uso do nome de alguém da equipe
ou o nome da vítima (Ver nota sobre consentimento informado na Parte I,
Capítulo 2).
Contextos médicos:
Nos países em que a tortura ocorre com
certa freqüência os médicos são, às vezes, as primeiras testemunhas
quando são chamados para tratar as lesões ou o trauma psicológico
causados pelos maus tratos. Em alguns países existe uma área da
medicina, conhecida como medicina forense, na qual os médicos têm um
conhecimento especializado dos tipos e das prováveis causas de lesões
ou enfermidades. Por razões jurídicas, a polícia ou os tribunais
costumam solicitar que o médico forense examine as vítimas da
violência e mantenha relatórios circunstanciados. Ainda que os
médicos possam ter muito medo de denunciar, eles mesmos, os casos de
tortura, solicitar um laudo médico do médico forense, do médico de
família, do hospital ou do médico da prisão, se possível, pode
contribuir com informação de grande valia. Também devem ser
analisadas as questões de consentimento e confidencialidade (Ver Parte
I, Capítulo 2).
A ética profissional exige que os
médicos produzam relatórios precisos, porém, em alguns casos, pode
ocorrer haver uma forte pressão para que omitam algumas conclusões ou
até mesmo falsifiquem relatórios. Uma das dificuldades dos relatórios
médicos pode ser o fato de que as lesões, muitas vezes, são descritas
sem serem relacionadas com uma provável causa. Nesse caso, é possível
solicitar a um especialista independente que interprete as conclusões
para ver se são coerentes com as denúncias de tortura.
Campos e centros de refugiados e pessoas
deslocadas:
Os campos e centros para pessoas
deslocadas força, dentro ou fora de seu país, sobretudo em zonas de
conflito, inevitavelmente abrigam muitas pessoas profundamente
traumatizadas que sofreram e presenciaram atos de tortura e que talvez
desejem fazer denúncias. Quando se busca informação relativa a um
incidente específico ou a uma série de acontecimentos, esses campos
costumam abrigar pessoas originárias de uma mesma região ou povoado
que podem corroborar as informações. No entanto, é preciso proceder
com certo cuidado; em primeiro lugar, porque pode haver a possibilidade
de se obter um relato tendencioso dos eventos se a população do campo
for majoritariamente composta de um grupo, e, em segundo lugar, porque
os torturadores também podem se esconder no campo e fornecer
informação enganosa. Quando a informação obtida dos refugiados
parecer indicar que a tortura generalizada é uma das causas do fluxo de
refugiados, deve-se pensar em transmitir a informação ao Alto
Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Ver Parte III,
Capítulo 7.2).
Pedidos de asilo: As denúncias de
tortura de um indivíduo em seu país natal podem formar a base de uma
petição de asilo em outro país. Ainda que o tempo decorrido desde os
maus tratos denunciados possa dificultar a coleta de provas, será
necessário seguir os princípios básicos expostos neste manual (Ver
Parte II, Capítulo 5). Também convém levar em conta que, às vezes,
há pessoas que afirmam falsamente haver sido torturadas com o único
objetivo de evitar a deportação.
3.6. É possível denunciar agentes
não-governamentais?
Muitas violações dos direitos humanos,
tais como a tortura, ocorrem em contextos de agitação política,
tensões e conflitos. Nessas circunstâncias, é comum que os
torturadores não somente sejam representantes do Estado mas também
pessoas que não têm relação com o Estado (geralmente denominados
agentes não-governamentais ou não-estatais). Trata-se de um problema
muito difícil e muito real de muitos pontos de vista, mas, para os
objetivos deste manual, a questão é: É possível tomar medidas em
resposta a denúncias de tortura por parte de agentes
não-governamentais?
3.6.1. É possível tomar medidas com
base na legislação de direitos humanos?
O leitor já terá visto neste capítulo
que a definição básica de tortura da Convenção da ONU contra a
Tortura faz referência a ações de "um representante público ou
outra pessoa que atua em uma capacidade oficial". Isso significaria
que a legislação de direitos humanos considera que os atos de
crueldade particulares são aceitáveis? Não; a definição se limita a
pessoas que atuam em capacidade oficial porque os Estados devem se
ocupar das ações das próprias pessoas particulares por meio de sua
legislação nacional.
No entanto, a legislação de direitos
humanos prevê a possibilidade de os Estados não se omitirem.
Consequentemente, um Estado pode ser considerado responsável não só
por seus atos (a prática deliberada de atos de tortura), mas também
por suas omissões (não tomar medidas efetivas para prevenir a tortura,
não processar judicialmente contra os autores de atos de tortura/ não
investigar denúncias).
Quais conseqüências isso tem para a
possibilidade de se recorrer a medidas judiciais em resposta a
denúncias de tortura por parte de agentes não-governamentais? Vejamos:
Os organismos internacionais
responsáveis pela implementação da legislação internacional de
direitos humanos não podem, em princípio, analisar a possível
responsabilidade de um agente não-governamental por um ato de tortura.
Isso se aplica particularmente aos organismos de tratados que somente
podem avaliar a responsabilidade dos Estados Parte das convenções por
eles criadas.
Podem analisar a possível
responsabilidade do Estado em que ocorreu o ato porque não tomou
medidas efetivas para prevenir o ato de tortura.
Também podem analisar a possível
responsabilidade de um Estado que queira expulsar uma pessoa para um
país onde ela correrá o risco de sofrer torturas, inclusive nas mãos
de agentes não-governamentais.
3.6.2. É possível aplicar outro tipo de
legislação que proíbe a tortura a agentes não-governamentais?
3.6.2.1. Direito internacional de
conflito armado
O direito internacional de conflito
armado (DICA) é um tipo de direito que se aplica unicamente em
situações de conflito armado, tanto internacional (conflito envolvendo
dois ou mais Estados) e não-internacional (o conflito ocorre dentro do
território de um Estado e pode envolver as forças governamentais e uma
ou mais forças de oposição, ou somente forças não-governamentais
divididas em facções que se opõem).
O DICA proíbe a tortura, o tratamento
cruel, desumano ou degradante de qualquer pessoa em poder da outra parte
de um conflito, ainda que, no caso de conflito armado
não-internacional, essa parte não seja governamental (Artigo Comum 3
das Convenções de Genebra de 1949).
Isso parece promissor, ou seja, existe
uma obrigação jurídica que obriga agentes não-governamentais a não
praticarem atos de tortura. Infelizmente, a implementação dessa
obrigação esbarra em dificuldades porque o DICA depende do direito
penal nacional para sua implementação, o que significa que o governo
deve capturar os perpetradores de torturas e julgá-los, ou as forças
não-governamentais precisam fazer com que seu próprio sistema
jurídico incorpore essas obrigações.
Certas violações particularmente graves
do DICA são consideradas tão graves que um Estado também pode julgar
um torturador em seus tribunais nacionais (jurisdição universal), mas
somente se sua legislação nacional assim o permitir. Até o momento,
poucos Estados têm se mostrado dispostos a fazê-lo, mas isso pode
mudar no futuro. Nos últimos anos, viu-se, em duas ocasiões, que é
possível constituir tribunais internacionais para examinar possíveis
violações do DICA, quais sejam, nos casos da ex-Iugoslávia e de
Ruanda. No entanto, esses tribunais somente podem examinar os problemas
decorrentes desses conflitos em particular. Um novo passo, inclusive
mais recente, foi a criação de um Tribunal Penal Internacional (TPI)
permanente, que poderá examinar, entre outras coisas, questões
relacionadas a violações do DICA. No entanto, o TPI ainda não
começou a funcionar e ainda não está clara qual será a função que
as ONGs terão nesse processo, se tiverem alguma.
3.6.2.2. Crimes contra a humanidade
Os crimes contra a humanidade são
violações particularmente graves dos direitos humanos cometidos em
grande escala. Como regra geral, considera-se que compreendem torturas e
outros atos desumanos quando cometidos como parte de um ataque
sistemático ou generalizado dirigido contra uma população civil, com
conhecimento do ataque. Os crimes não precisam ser cometidos no
contexto de um conflito armado e a política de execução do ataque
pode ser empreendida por um grupo não-governamental. Desse modo, é
possível responsabilizar agentes não-governamentais por atos de
tortura cometidos no contexto de uma política mais ampla.
Da mesma forma que no âmbito do DICA,
existem dificuldades na implementação das disposições relativas aos
crimes contra a humanidade. O TPI poderá examinar denúncias desses
crimes quando começar a funcionar, mas é difícil prever como isso
funcionará. Essa categoria de crimes é considerada tão grave que os
Estados também podem exercer jurisdição universal sobre eles, porém
somente nos casos em que sua legislação nacional o permitir, da mesma
forma que com violações graves do DICA. Outra conseqüência da
gravidade desses crimes é que não existe um prazo para instauração
de processo judicial contra os autores envolvidos (em alguns crimes, os
julgamentos devem ser iniciados antes de um determinado período de
tempo, por exemplo, até 10 anos após o incidente, mas tais limites
prescricionais não se aplicam a crimes contra a humanidade).
3.6.2.3. Legislação nacional
A exemplo dos representantes públicos,
os agentes não-governamentais causadores de tortura e outras formas de
maus tratos podem ser processados em conformidade com a legislação
nacional do país onde foram praticados os atos de tortura ou os maus
tratos. A legislação específica com base na qual é possível ajuizar
ação contra os torturadores pode variar de um país para outro e pode
incluir legislação de implementação do DICA ou de disposições
sobre crimes contra a humanidade, conforme mencionado acima. O mais
comum é que se adote a forma, por exemplo, de uma ação judicial por
lesão corporal grave ou estupro.
3.6.3. Conclusão: Como se pode usar
informação em denúncias de tortura por parte de agentes
não-governamentais?
Isso dependerá daquilo que se espera
conseguir com a informação. As ações possíveis são muito mais
limitadas do que quando a denúncia implica uma ação oficial, e
deve-se levar em conta que é baixa a probabilidade de se obterem
resultados concretos. No entanto, se a informação for apresentada
corretamente, aumentam as possibilidades de se conseguir algo.
Se você busca um recurso particular:
Você deve começar buscando um recurso
nos termos previstos na legislação nacional do Estado em que ocorreu a
tortura (como se verá na Parte III, este geralmente é o primeiro passo
na busca de um recurso particular). Lembre-se de verificar se existe uma
legislação de implementação válida que permita a instauração de
processo com base no DICA ou por crimes contra a humanidade.
Se você não obtiver êxito por essa
via, poderá recorrer a um organismo internacional. Segundo a
legislação de direitos humanos, os agentes não-governamentais não
podem ser considerados responsáveis diretos, razão pela qual deve-se
proceder contra o Estado, como seria o caso em uma denúncia formal, mas
será necessário fundamentar sua denúncia no argumento de que o Estado
não cumpriu suas obrigações por omissão: que não tomou qualquer
medida para evitar a tortura nem para investigar a denúncia
adequadamente, nem para processar o torturador.
Também é possível recorrer a um
organismo internacional para evitar a expulsão de uma pessoa para um
país onde se acredita que ela correrá o risco de sofrer torturas,
ainda que esse risco se deva a agentes não-governamentais. Essa
possibilidade só se confirmou muito recentemente e tem sido aplicada
tanto pelo Comitê contra a Tortura como pelo Tribunal Europeu de
Direitos Humanos no caso das expulsões propostas para a Somália. É
possível que esse caso se converta em um caso especial, dada a absoluta
ausência de autoridade governamental central naquele país, de modo que
se poderia considerar que os agentes não-governamentais desempenham ali
as funções de um Governo e, portanto, "atuam em uma capacidade
oficial". De qualquer forma, esses são precedentes encorajadores
que indicam que o fator importante é o risco propriamente dito, não a
origem do risco.
Se você busca um recurso de natureza
mais geral:
Da mesma forma que os organismos que
examinam casos particulares, os organismos internacionais que examinam a
situação geral de direitos humanos de um Estado não estão em uma
posição que lhes permita recorrer a medidas judiciais com relação
às violações por parte de agentes não-governamentais, mas é muito
importante que estejam informados da função dos agentes
não-governamentais nesse panorama geral. Isso lhes ajuda a compreender
o contexto e a saber exatamente por que o governo deveria ser
responsabilizado. Muitas vezes, os governos procuram demonstrar que
todas as violações ocorridas são perpetradas pelas forças da
oposição; se for possível fornecer informação precisa sobre o que
fazem e o que não fazem essas forças, o organismo internacional
estará melhor preparado para responder a esses argumentos.
Em última análise, pode ser que a
ação mais eficaz seja garantir que os atos praticados pelos agentes
não-governamentais sejam de conhecimento público, quer seja enviando a
informação aos organismos internacionais para o fim de se
estabelecerem as circunstâncias contextuais, quer seja mediante lobby
ativo (Ver Parte III, Capítulo 7 para sugestões sobre lobby). Quando a
legislação internacional de direitos humanos não puder proporcionar
boa parte da assistência nos casos que envolvam agentes
não-governamentais, a pressão pública poderá desempenhar esse papel.
RESUMO
PARTE I – QUESTÕES PRELIMINARES
O que se pode esperar conseguir com a
apresentação de denúncias de tortura?
Atrair a atenção para uma situação/
estabelecer um padrão
Buscar mudanças positivas na situação
geral
Combater a impunidade
Buscar um recurso para as vítimas:
Constatação de uma violação
Responsabilização dos torturadores
Reparação
Impedimento da deportação de uma pessoa
para um país onde se acredita que ela corre risco de tortura
O que é a tortura?
A tortura pode ser difícil de se
definir, mas não é necessário defini-la para se apresentar uma
denúncia. No mínimo, deve-se poder demonstrar que:
Dor ou sofrimento mental ou físico grave
foi imposto deliberadamente (tortura) ou ocorreu uma exposição
intencional a dor ou sofrimento mental ou físico considerável (maus
tratos que não tortura).
As próprias autoridades estatais
impuseram esse sofrimento ou dele estavam cientes ou deveriam ter estado
cientes, porém nada fizeram para evitá-lo.
No caso de torturas (ainda que não seja
um requisito para outras formas de maus tratos), o sofrimento foi
infligido com um propósito específico, por exemplo, para extrair
informação, castigar ou intimidar a vítima.
Como ocorre a tortura?
Quem são os torturadores?
Qualquer pessoa que atua em uma
capacidade oficial: Esta categoria pode incluir a polícia, gendarmes,
forças de segurança, agentes carcerários, militares, representantes
do governo ou funcionários públicos, superiores na hierarquia
política, "esquadrões da morte", pessoal médico.
Membros de grupos armados da oposição
Quem são as vítimas?
Qualquer pessoa
Onde é mais provável que ocorra a
tortura?
Em qualquer lugar (por exemplo, durante a
transferência de uma vítima ou em seu próprio domicílio), mas,
sobretudo, no lugar onde é provável que ocorra um interrogatório .
Quando é mais provável que ocorra a
tortura?
Nos primeiros estágios da detenção,
principalmente se o detento estiver sendo mantido em condições de
incomunicabilidade (sem acesso a um advogado ou à família). O risco
persiste enquanto durar a investigação.
Em quais contextos é possível receber
ou obter denúncias de tortura?
Contextos gerais: Podem incluir
situações de agitação política ou violência generalizada, ou ainda
zonas de conflito.
Contextos específicos: Podem incluir
visitas a instituições prisionais, contextos médicos, campos e
centros para refugiados e pessoas deslocadas, ou solicitações de
asilo.
Não se esqueça de procurar também
lugares menos comuns. Consulte o texto principal para sugestões.
É possível denunciar agentes
não-governamentais?
A responsabilidade dos agentes
não-governamentais é limitada pelo direito internacional, porém:
No caso de se buscar um recurso
particular, é possível:
Buscar um recurso com base na
legislação nacional: Pode incluir a instauração de processo nos
termos do Direito Internacional de Conflito Armado ou nas disposições
sobre crimes contra a humanidade, se existir uma legislação nacional
que o permita.
Recorrer a um organismo internacional de
direitos humanos: Uma vez que os agentes não-governamentais não podem
ser considerados diretamente responsáveis nos termos da legislação de
direitos humanos, deve-se denunciar o Estado em que ocorreu o incidente,
com base no argumento de que tal Estado não cumpriu suas obrigações
para evitar a tortura, investigar a denúncia adequadamente ou processar
os torturadores.
No caso de se buscar um recurso de
natureza mais geral, é possível:
Manter os organismos internacionais de
direitos humanos informados sobre as atividades dos agentes
não-governamentais
Exercer lobby
PARTE II – DOCUMENTAÇÃO DAS
DENÚNCIAS
1. Introdução
2. Princípios Básicos da Documentação
2.1. Por que são importantes esses
princípios?
2.2. Em que consiste uma informação de
boa qualidade?
2.3. O que se pode fazer para maximizar a
precisão e a confiabilidade da informação?
3. Entrevista com a Pessoa que Denuncia a
Tortura
3.1. Introdução
3.2. Considerações gerais
3.3. Como realizar a entrevista
4. Informações que Devem Ser
Registradas
4.1. Informação modelo
4.2. Contextos específicos
5. Provas
5.1. Provas médicas
5.2. Declaração da pessoa que faz a
denúncia
5.3. Provas testemunhais
5.4. Outros tipos de provas
1. INTRODUção
O objetivo deste capítulo é fornecer
orientações sobre a forma como documentar uma denúncia de tortura.
Este manual trata, especialmente, da documentação e denúncia de
torturas, mas desaparecimentos, execuções extrajudiciais e outras
violações dos direitos humanos também podem ser documentados com
informações muito parecidas, reunidas segundo essas mesmas
orientações.
A denúncia particular constitui a base
de toda a apresentação. Mesmo que o objetivo final seja elaborar um
relatório que analise a situação geral de um país, o primeiro passo
deverá ser a compilação de denúncias particulares, visto ser esta a
melhor maneira de identificar situações e estabelecer tendências
gerais. As acusações particulares não precisam ser, necessariamente,
apresentadas pela vítima; nos casos em que a vítima desapareceu, foi
assassinada ou está em prisão incomunicável, a denúncia pode ser
apresentada por testemunhas ou familiares que viram por última vez a
pessoa e constataram lesões ou um comportamento alterado que indica a
prática de maus tratos.
A fim de identificar as diretrizes para
documentar denúncias de torturas e outras formas de maus tratos, este
capítulo examinará as seguintes questões:
Existem alguns princípios básicos que
devem ser levados em conta quando são documentadas denúncias de
violação dos direitos humanos. O principal para a apresentação
dessas denúncias é contar com uma informação precisa, confiável e
de boa qualidade. O que significa isso exatamente? Pode variar em
função dos mecanismos ou procedimentos aos quais se deseja submeter a
informação? Quais as medidas a serem tomadas para garantir que a
informação possui as características devidas? [Parte II, Capítulo 2]
Em muitos casos, será preciso
entrevistar a pessoa que faz a denúncia. Essa pessoa pode ser a
vítima, um familiar da vítima, uma testemunha do incidente de tortura
ou outra pessoa que quer denunciar o incidente. Existe alguma
consideração especial que deva ser levada em conta durante a
realização da entrevista? [Parte II, Capítulo 3]
Que tipo de detalhe é preciso registrar
durante uma entrevista? Deve-se obter uma quantidade mínima de
informações sempre que possível? Que tipo de pergunta deve-se
formular? Como é possível ter certeza de que se obteve a informação
necessária? [Parte II, Capítulo 4]
Por que é tão importante a
documentação comprobatória? Que tipo de provas deve-se procurar e
onde encontrá-las? [Parte II, Capítulo 5]
2. PRINCÍPIOS BÁSICOS DA DOCUMENTAção
O principal objetivo da documentação de
uma denúncia de violação dos direitos humanos é criar um registro
exato, confiável e preciso dos fatos. Esses registros podem ser usados
de inúmeras maneiras, mas todas elas dependem da qualidade do registro
estabelecido. Assim sendo, ao documentar uma denúncia, será preciso:
Buscar obter uma informação de boa
qualidade
Tomar as medidas necessárias para
maximizar a exatidão e a confiabilidade da informação
2.1. Por que são importantes esses
princípios?
A não ser que a apresentação de uma
denúncia seja baseada na própria experiência do entrevistador, pode
ser difícil ter sempre a certeza da qualidade, exatidão e
confiabilidade da informação reunida. As violações dos direitos
humanos costumam acontecer em circunstâncias onde prevalecem emoções
e lealdades muito fortes, que podem influir nos relatórios e nas
acusações recebidas. É importante fazer o possível para manter a
objetividade no momento de avaliar a natureza da informação; qualquer
que seja a opinião que se tenha da situação geral, ou por mais certo
que se esteja quanto ao conteúdo da acusação, é preciso levar em
consideração, objetivamente, se a informação é suficientemente
precisa, confiável e de boa qualidade para iniciar uma ação perante
uma autoridade nacional ou um organismo internacional. Como será
mostrado a seguir, o nível de qualidade, exatidão e confiabilidade
necessário pode variar em função da forma de agir selecionada, mas é
preciso tentar obter a melhor qualidade possível em cada situação. O
rigor é uma decisão que compete ao entrevistador ou à sua
organização determinar, mas é necessário lembrar que a informação
a ser encaminhada é um reflexo da credibilidade do entrevistador: isso
afetará sua reputação nos organismos internacionais e a seriedade com
a qual serão consideradas suas denúncias.
2.2. Em que consiste informação de boa
qualidade?
A qualidade da informação necessária a
uma determinada denúncia depende do objetivo para o qual ela será
utilizada. Por exemplo, os procedimentos judiciais, quer nacionais ou
internacionais, costumam exigir uma prova de alta qualidade. Por sua
vez, os procedimentos de denúncia requerem pouca ou nenhuma
documentação comprobatória e menos detalhes. Deve-se tentar compilar
a melhor informação possível, segundo as circunstâncias; isso não
significa, entretanto, que se deva obter sempre a melhor qualidade antes
submeter a informação; deve-se, porém, fazer todo o possível para
estruturar uma denúncia sólida reunindo toda a informação
disponível.
Os fatores que contribuem para a
qualidade da informação incluem:
A fonte da informação: Onde foi obtida
a informação? Diretamente da vítima, da família da vítima, de seus
amigos, de uma testemunha presente no local dos acontecimentos, de
alguém que a ouviu de outra pessoa, de uma reportagem dos meios de
comunicação? Quanto mais a informação se afastar da vítima ou do
incidente, tanto menos confiável ela será.
O nível de detalhe: A acusação é
muito detalhada? Existem lacunas inexplicáveis no relato? Conhecem-se
apenas os dados básicos? Quanto mais detalhes forem obtidos, melhor,
porque isso ajudará os demais a entenderem o que aconteceu.
A ausência ou presença de
contradições: A explicação é coerente do princípio ao fim? A
explicação contém contradições ou elementos sem sentido? A boa
informação deve ser coerente, ou pelo menos apresentar um motivo para
todas as incoerências; por exemplo, se uma vítima ou testemunha fez
duas declarações contraditórias, isso pode ser conseqüência de uma
intimidação. Incoerências menores são comuns e não costumam alterar
a qualidade geral da informação, mas incoerências maiores devem
estimular o entrevistador a verificar novamente a informação.
A ausência ou presença de elementos que
corroborem ou refutem a denúncia: Existem declarações de testemunhas
que confirmem a explicação da vítima? Existe um laudo médico ou uma
autópsia que confirme as lesões da vítima? Quanto maior o volume de
documentação obtido que sustente a denúncia, mais digna de crédito
ela será.
A capacidade da informação de
demonstrar um padrão: A denúncia é uma dentre muitas que denunciam
casos parecidos? É do mesmo tipo que outras já recebidas em uma
determinada área? Quando existem provas de uma prática habitual,
pode-se partir da suposição de que a informação é real.
A época da informação: A informação
é muito recente? Está relacionada a fatos ocorridos há vários anos?
Quanto mais recente for a informação, mais fácil será investigar ou
comprovar os fatos denunciados.
Primeira mão + detalhada + consistente
internamente + corroborada por vários ângulos + demonstra um padrão +
recente = ótima qualidade
Deve-se ter em mente que isto é uma
indicação do que seria a ótima qualidade. Com freqüência, não é
possível obter informação dessa qualidade; mas isso não quer dizer
que ela não possa ser utilizada. Antes pelo contrário, a qualidade
será um fator quando chegar o momento de selecionar o procedimento ou
procedimentos para os quais se deseja enviar a informação. Este
capítulo ressalta a importância de se documentar a denúncia de modo
que, em princípio, ela possa ser submetida a praticamente todos os
procedimentos disponíveis. Todos os requisitos mínimos ou as
restrições específicas de um procedimento particular são comentados
na Parte III.
2.3. O que pode se pode fazer para
maximizar a exatidão e a confiabilidade da informação?
A verificação da precisão e
confiabilidade da informação pode ser uma tarefa difícil e delicada,
e é verdade que, em grande medida, o entrevistador depende da boa fé
daqueles que fornecem a informação, do mesmo modo que os organismos
internacionais dependem da dele. Contudo, é possível tomar certas
precauções gerais para aumentar a probabilidade de que a informação
seja precisa e confiável, buscando a corroboração de casos concretos,
tanto no momento de uma entrevista quanto posteriormente, e usando o bom
senso.
Precauções gerais a serem tomadas para
aumentar a confiabilidade incluem:
conhecer as fontes e estar familiarizado
com o contexto no qual são feitas as denúncias
manter contato com as fontes: talvez seja
preciso obter ou verificar pormenores em uma etapa posterior
solicitar os nomes e os dados de contato
das vítimas, embora o entrevistador deva mantê-los confidenciais
ser mais prudente e minucioso com a
informação imprecisa ou geral
evitar basear as denúncias somente em
reportagens dos meios de comunicação ou em boatos, sem buscar
corroboração
No momento das entrevistas, é possível
aumentar a precisão e a confiabilidade mediante:
a formulação de perguntas precisas
o enfoque cronológico da explicação
para que seja mais fácil eliminar e corrigir as incoerências
a revisão das incoerências aparentes a
partir de diferentes ângulos, reformulando as perguntas, se for o caso:
o entrevistado pode estar confuso ou não compreender a pergunta
a formulação de perguntas sobre a
existência de testemunhas do incidente denunciado ou de documentação
que sustente a denúncia, tal como um relatório médico ou uma cópia
de uma petição apresentada em decorrência do incidente: deve-se
explicar que a documentação que respalda a acusação pode ajudar a
formular uma denúncia mais sólida e aumentar as oportunidades
existentes para buscar uma reparação.
a observação da linguagem corporal e do
comportamento do entrevistado, perguntando-se a si mesmo se essa pessoa
parece confiável. Nesse contexto, é preciso ter presente a influência
da cultura, o sexo e o estado mental.
Sempre que possível, quando um
entrevistado indicar a existência de documentação comprobatória
potencial, deve-se tentar obtê-la.
Por último, é necessário atuar com bom
senso: quando houver dúvidas quanto à exatidão ou veracidade de uma
denúncia, deve-se dedicar mais tempo à corroboração dos fatos do que
quando se estiver convencido de sua sinceridade. Se o entrevistador tem
reservas quanto à denúncia, é provável que outros também as tenham,
porque só podem vê-la através da perspectiva dele. Se não se
consegue dissipar as dúvidas, pode-se estar perdendo mais tempo e
recursos preparando a acusação do que se perderia dirimindo-as ou
confirmando-as.
Deve-se ter presente que quando houver um
motivo real para crer que uma pessoa está em perigo e é preciso tomar
medidas urgentes, talvez seja necessário atuar com rapidez, embora
algumas dúvidas ainda persistam quanto à confiabilidade; é óbvio que
em tais circunstâncias, a prioridade deve ser a segurança da pessoa.
3. ENTREVISTA COm A PESSOA QUE DENUNCIA
TORTURAS
3.1. Introdução
Em muitos aspectos, o modo registrar a
denúncia de torturas é o passo mais importante de todo o processo de
denúncia, porque determinará o que se pode fazer com a informação
nas etapas posteriores. Entretanto, também pode ser o mais difícil de
aprender ou de explicar de uma forma a ser aplicada universalmente. A
formação de pessoal nas técnicas de entrevista deve ser parte
integrante da preparação de qualquer ONG, antes de passar a documentar
denúncias, e vai além do conteúdo deste manual. As orientações e
sugestões a seguir foram elaboradas para serem utilizadas como um aide
memoire, e não pretendem substituir a devida formação do pessoal.
Lembre-se de que quem apresenta uma
denúncia de tortura pode ser:
a vítima
os familiares da vítima
as testemunhas, como o médico que
reconheceu a pessoa, ou pessoas que viram a detenção da vítima ou
estavam presentes durante o incidente de tortura.
Em qualquer dos casos, a informação
pode ser obtida por meio de uma entrevista com a pessoa que faz a
denúncia. A entrevista pode fazer com que se tenha que procurar novas
testemunhas, tal como outros presos, ou um médico que tenha reconhecido
a pessoa (Ver Parte II, Capítulo 5.3)
3.2. Considerações gerais
Ao realizar uma entrevista, deve-se ter
em mente as seguintes considerações gerais:
Deve-se ponderar dois requisitos
importantes, que deveriam ser complementares, mas que às vezes se
chocam: a necessidade de obter um relato útil e a importância de
respeitar as necessidades da pessoa entrevistada.
Por um lado, o princípio orientador deve
ser tentar obter a explicação mais lógica, precisa e detalhada
possível do incidente, de modo a permitir que o entrevistador ou a
pessoa que analisar a denúncia compreenda o que aconteceu, e tornar
possível a comprovação ou investigação da informação.
Por outro lado, pode acontecer de um
entrevistador, decidido a reconstruir uma seqüência de fatos, esquecer
que a própria entrevista pode ser algo desagradável para a pessoa que
sofreu uma experiência traumática e a quem se solicita, agora, que
conte os detalhes. Os entrevistadores devem mostrar delicadeza em suas
perguntas e estar atentos a demonstrações de cansaço ou angústia.
Também devem estar conscientes dos tabus culturais, especialmente do
abuso sexual. Não apenas a entrevista pode ser desagradável para a
pessoa entrevistada, como também a explicação pode ser menos
confiável se a pessoa estiver cansada ou transtornada.
É preciso, igualmente, lograr um
equilíbrio entre a necessidade de obter o maior número de pormenores
possível e a importância de não direcionar em excesso a explicação
ou influir na mesma. As anotações devem espelhar os fatos ocorridos, e
não os que se acha que ocorreram.
Cada pessoa entrevistada —quer seja a
vítima, um familiar ou uma testemunha — é uma pessoa com uma
história particular. Embora conheça pormenorizadamente os padrões de
violações que predominam em sua área ou esteja muito seguro do que
aconteceu com uma vítima determinada, o entrevistador não deve partir
do princípio de que cada pessoa terá a mesma história para contar.
Deve-se tratar cada entrevista como um registro único.
Os integrantes da equipe de
documentação podem achar que a entrevista das vítimas de torturas
lhes causa muita tensão. Devem estar preparados para analisar suas
respostas e tratar seus sentimentos entre eles mesmos e, se necessário,
buscar ajuda profissional.
3.3. Como realizar a entrevista
3.3.1. Antes de começar
Não se deve esquecer de revisar
minuciosamente os comentários da Parte I, Capítulo 2.3, relativos ao
consentimento informado, a ética profissional e a segurança. São
vitais para a entrevista e existem certos aspectos que deverão ser
explicados detidamente ao entrevistado.
3.3.2. Como se deve começar a
entrevista?
No início, o entrevistador deve se
apresentar, bem como sua organização e seus objetivos, e explicar os
possíveis usos da informação reunida. Caso cite uma determinada
pessoa pelo nome, deve informar como conseguiu esse nome. É necessário
assegurar-se de que o entrevistado não coloca objeções ao uso de
gravadores ou de intérpretes, nem a anotações. Deve-se falar sobre o
consentimento informado e insistir no caráter confidencial da própria
entrevista, cuja utilização está sujeita ao consentimento da pessoa.
É importante não criar expectativas que não obedeçam à realidade do
entrevistado; é necessário assegurar-se de que ele compreende que todo
processo de denúncia pode demorar e vir a produzir poucos resultados.
3.3.3. Deve-se tomar notas da entrevista
?
Tomar notas pormenorizadas da entrevista
é importante para garantir precisão, mas deve-se explicar à pessoa de
que modo serão utilizadas essas anotações e quem terá acesso à
informação ali constante. Em alguns casos, pode ser mais adequado
escutar apenas (por exemplo em uma delegacia pequena) e tomar notas
imediatamente depois.
3.3.4. Quem deve realizar a entrevista?
Entrevistar uma pessoa, sobretudo
tratando-se de uma vítima, sobre um incidente de tortura provoca
cansaço físico e emocional. É particularmente difícil quando o
entrevistador está sozinho, pois é necessário ter habilidade para
formular perguntas, escutar, criar um relacionamento com o entrevistado,
mencionar situações emocionais difíceis, tomar notas e estar atento
às omissões e incoerências, tudo ao mesmo tempo, uma tarefa quase
impossível. Quando as circunstâncias o permitam, é melhor que a
entrevista esteja a cargo de duas pessoas: uma formula as perguntas e a
outra toma notas. É ainda melhor se as duas pessoas têm habilidades
complementares, por exemplo, conhecimentos médicos e jurídicos. Isso
ajuda a ter certeza de que não se perderam aspectos importantes e que
foram feitas as perguntas corretas. Entretanto, para evitar confundir o
entrevistado e para facilitar a criação de um vínculo, é necessário
que um dos entrevistadores tenha a responsabilidade principal de
formular as perguntas, dando ao segundo entrevistador a oportunidade de
intervir mais para o final.
Deve-se ter presente alguma
consideração especial quando são utilizados intérpretes?
Deve-se ter absoluta certeza de que o
entrevistado está de acordo com o uso de um intérprete e de que saiba
que o intérprete tem o dever profissional de respeitar a natureza
confidencial da entrevista.
Deve-se estar ciente de que o conteúdo
da entrevista pode ser difícil para o intérprete.
Deve-se assegurar que o intérprete
esteja informado da necessidade de confidencialidade absoluta; isso é
muito importante no caso de contratação de intérpretes
não-profissionais.
Deve-se ter em mente que os intérpretes
não-profissionais podem entrar na conversa mais facilmente do que os
profissionais; é importante explicar que o trabalho solicitado requer a
interpretação das palavras exatas do entrevistado. Se eles também
passaram por uma experiência pessoal que queiram explicar, deve-se
informar que é possível concertar outra entrevista com eles.
Deve-se evitar utilizar pessoas locais a
menos que seja absolutamente necessário. Isso pode causar a
desconfiança do entrevistado e colocar o intérprete em perigo. O mesmo
vale para outros presos, familiares e outros parentes, e para toda
pessoa implicada de um modo ou de outro na situação. Deve-se recordar,
igualmente, que embora em determinadas culturas os familiares sejam
considerados como um apoio, em outras pode ser muito inoportuno falar de
certos assuntos em sua presença. Por exemplo, para uma mulher pode ser
um tabu cultural falar de temas sexuais em presença de um membro
masculino de sua família. Se o entrevistador ou sua organização é de
origem local, provavelmente conhecerá todos os aspectos delicados;
deve-se sempre ter isso em mente.
O entrevistador não deve se distrair
durante a interpretação: embora não esteja falando diretamente com o
entrevistado, é importante estabelecer uma relação com ele e
demonstrar interesse pelo que ele explica.
3.3.6. O que se deve fazer para que o
entrevistado se sinta mais à vontade?
As entrevistas sobre experiências
pessoais, por exemplo de maus tratos, podem ser extremamente
intimidadoras. Talvez não se tenha muito controle sobre o ambiente no
qual tem lugar a entrevista, mas inclusive os pequenos detalhes da parte
do entrevistador podem contribuir para que um entrevistado se sinta mais
a vontade.
É preciso criar um ambiente o mais
cômodo e privado possível; de preferência deve-se estar sozinho, a
menos que o entrevistado se sinta mais a vontade com outra pessoa
presente e que esta pessoa esteja de acordo em não interferir na
conversa.
Se não for possível realizar a
entrevista privadamente, deve-se garantir pelo menos que os demais não
possam escutar o que é dito.
Deve-se ter presente que a postura e a
forma de sentar diante do entrevistado podem afetar sua comodidade; por
exemplo, em um espaço limitado, uma inclinação para a frente pode
parecer ameaçadora, ao passo que, em outras circunstâncias, o não
fazê-lo pode transmitir falta de interesse. Existem pessoas que
preferem sentar mais perto do entrevistador, outras são muito ciosas de
seu espaço pessoal ou fogem do contato físico. Deve-se reparar no
ambiente circundante e observar a linguagem corporal do entrevistado
para chegar à conclusão do que é mais apropriado em cada caso.
É preciso contar com intervalos para
descanso.
3.3.7. Como se deve tratar as pessoas que
têm medo de falar?
Algumas entrevistas podem ser realizadas
em um lugar relativamente protegido, mas em muitos casos o ambiente não
será seguro. Esse costuma ser o caso quando os entrevistados continuam
sob custódia das autoridades. Não é possível garantir sua segurança
(Ver Parte I, Capítulo 2.3, para uma consideração geral sobre temas
de segurança), mas podem ser tomadas medidas para que as pessoas não
tenham que enfrentar um risco maior do que o necessário.
O entrevistador deve se certificar de que
as pessoas dêem seu consentimento informado à entrevista (Ver Parte I,
Capítulo 2.3).
Jamais se deve fornecer às autoridades o
nome das pessoas que denunciam maus tratos sem seu consentimento
expresso.
Deve-se evitar identificar as pessoas,
até mesmo por descuido, como aquelas que forneceram a informação; por
exemplo, em um centro de detenção com um número muito pequeno de
presos, como uma delegacia de polícia, deve-se entrevistar todas as
pessoas detidas da mesma maneira, e não se deve reagir imediatamente
às denúncias de uma forma que permita às autoridades identificar a
fonte de informação. Se, por exemplo, o entrevistador achar que deve
tratar imediatamente de um tema com um delegado, primeiro deve consultar
os entrevistados, e nunca ir falar com o funcionário sem seu
consentimento.
Deve-se deixar muito claro para os
entrevistados que se eles, seus familiares ou amigos estiverem sofrendo
coações ou pressões em decorrência da informação que forneceram,
devem dizê-lo; deve-se entregar um cartão de visitas com os dados para
contato e ressaltar a importância de que o façam se necessário.
Se o entrevistador achar que podem estar
correndo algum risco, deve fazer o possível para acompanhar cada caso;
deve manter os registros de todas as pessoas que entrevistou e perguntar
pessoalmente por elas; pode realizar novas visitas.
3.3.8. É preciso ter presente alguma
consideração especial quando se realizam entrevistas em prisões ou em
outros centros de custódia?
Quando for necessário selecionar a
maneira de abordar a entrevista nesse ambiente, será importante
conhecer a dinâmica de grupo e a estrutura da prisão.
Quando existir um representante de
pavilhão ou de presos, pode ser útil entrevistar e buscar
primeiramente a colaboração dessa pessoa; da mesma forma, é possível
que exista uma certa hierarquia entre as pessoas que estão detidas há
muito tempo, e poderia ser vantajoso conhecê-la.
Se for viável, deve-se tentar
entrevistar todos os presos. Em uma instalação grande isso talvez não
seja possível, mas pelo menos deve-se tratar de entrevistar um grupo
significativo de detidos de uma categoria determinada.
Se as entrevistas tiverem de ser
realizadas em um pavilhão ou em um dormitório, pode ser proveitoso
começar com uma entrevista geral de grupo onde o entrevistador se
apresentará e indicará o que procura, mas também será necessário
entrevistar todas as pessoas privadamente. Embora existam outras pessoas
na mesma área e não seja possível ter intimidade, deve-se tratar de
falar com todos, um por um.
3.3.9. Qual a melhor forma de tratar um
tema tão sensível?
As entrevistas sobre experiências de
torturas podem ser muito delicadas e dolorosas, mas pode-se dar alguns
passos para minimizar o risco de traumatizar as vítimas. Assim sendo,
é aconselhável:
Demonstrar respeito e consideração pelo
entrevistado no tom de voz, nas expressões e nas atitudes.
Conhecer os fatores culturais e agir com
especial delicadeza em relação aos tabus culturais.
Aconselhar o entrevistado sobre a
possibilidade de obter assistência ou visitar um especialista.
Escutar e permitir a manifestação de
preocupações pessoais e familiares.
Reconhecer a dor e a angústia, mas
manter uma fronteira profissional; não criar expectativas exageradas
quanto à possibilidade de atender suas necessidades.
Não pressionar os entrevistados caso
sintam angústia; deve-se saber que algumas vítimas não estão
preparadas para falar sobre suas experiências.
Quando possível, realizar várias
entrevistas mais curtas ao invés de uma entrevista longa e intensa.
Não encerrar uma entrevista
repentinamente, sem levar a conversa para um tema menos delicado.
O que se pode fazer para maximizar a
confiabilidade da informação?
Evitar perguntas que sugiram a resposta
desejada. Por exemplo: "foi torturado enquanto esteve preso?"
seria uma dessas perguntas, mas "aconteceu alguma coisa?" não
seria. É importante que o entrevistado dê sua própria explicação e
não a do entrevistador.
Estimular o entrevistado a usar suas
próprias palavras.
Evitar o emprego de listas sempre que
possível, visto que podem levar a equívocos quando os elementos da
lista não corresponderem exatamente à experiência do entrevistado.
Saber que as incoerências não
significam necessariamente que a denúncia é falsa. O entrevistado pode
estar confuso ou ter dificuldade para entender a pergunta. Às vezes
pode-se solucionar essas incoerências fazendo a mesma pergunta de forma
diferente.
Observar o entrevistado detidamente;
tomar nota da impressão que mereceu sua credibilidade.
3.3.11. No momento da seleção, deve-se
ter alguma consideração especial quanto ao sexo de um entrevistador ou
de uma equipe de entrevista?
Não existe uma regra estrita sobre esse
ponto, e dependerá da pessoa entrevistada e de quem realizar a
entrevista. As preferências podem se basear em fatores culturais ou
pessoais. Em geral, é melhor ter uma entrevistadora mulher presente
quando se entrevista uma mulher, sobretudo se há uma possibilidade de
que a explicação se refira a questões sexuais. Não é tão claro em
relação aos homens: também podem preferir falar com uma mulher sobre
questões sexuais, mas em certas culturas isso seria inaceitável. Não
se deve esquecer de levar em consideração o sexo do intérprete.
3.3.12. É preciso alguma consideração
especial quando se entrevista uma criança?
O principal objetivo quando se entrevista
uma criança é tentar não magoá-la. É muito diferente entrevistar
uma criança do que um adulto, e deve-se agir com muita cautela. Os
entrevistadores devem ter experiência de trabalho com crianças; caso
contrário, o efeito de uma entrevista pode ser mais prejudicial do que
benéfico. O ideal seria ter experiência e conhecimentos, e se nunca o
fizeram antes, é aconselhável fazer uma entrevista simulada com outro
integrante da equipe de entrevistadores para saber qual o caminho a
seguir. Deve-se levar em conta que:
Além de terem sido torturadas, ou em vez
de terem sido torturadas, as crianças foram forçadas a presenciar
outras torturas, sobretudo de seus pais ou de crianças. Não se deve
subestimar os efeitos que isso pode ter sobre elas.
É importante fazer com que as crianças
se sintam seguras e apoiadas durante a entrevista. Isso pode ser logrado
com a presença de um dos pais, de um familiar ou tutor, ou de um
conselheiro, caso a criança esteja sendo assistida por um.
É muito importante observar o
comportamento da criança durante a entrevista: sua capacidade de
expressão verbal depende de sua idade e etapa de desenvolvimento, e o
comportamento pode revelar mais sobre o que aconteceu do que suas
palavras.
As crianças são particularmente
sensíveis ao cansaço e não se deve pressioná-las.
Se a criança pode ter sido vítima de
uma agressão física ou sexual, não se deve realizar um exame
exaustivo por parte de um médico não-especializado.
Deve-se tentar garantir que a criança
disponha de uma rede de assistência após a entrevista.
4. INFORMAçÕES QUE DEVEM SER
REGISTRADAS
OBSERVAÇÃO IMPORTANTE:
As orientações apresentadas a seguir
indicam a informação ideal que se pode reunir. De qualquer maneira,
não se trata de uma lista de verificação rígida e deve ser utilizada
com flexibilidade, e adaptada a um contexto particular. É importante
não haver uma concentração excessiva na obtenção de um número
concreto de detalhes, que podem ser inadequados em um determinado caso
ou impedir que sejam selecionados outros aspectos importantes
inesperados. É inclusive mais importante respeitar a pessoa e não
considerá-la como uma fonte de informação porque, caso contrário, a
própria entrevista pode degenerar e se converter em uma forma de
interrogatório.
É preciso deixar-se guiar pela
impressão quanto à clareza da explicação. Deve-se perguntar do
princípio ao fim se existe algum aspecto não compreendido ou que
pareça pouco claro, vago ou contraditório. O entrevistador deve se
certificar de que a explicação faça sentido para ele. Deve ter
cuidado com as lacunas na reconstrução cronológica, quando alguns
períodos de tempo ficarem sem explicação. Voltar sobre essas lacunas
e contradições aparentes pode revelar elementos não detectados no
momento devido. O ideal seria que as anotações permitissem explicar os
acontecimentos ordenadamente, não deixando grandes perguntas sem
resposta.
Não se pode atrasar o envio da denúncia
devido à ausência de alguns detalhes como os apresentados a seguir
(talvez não sejam importantes ou essenciais), mas a pessoa que
apresenta a denúncia deve se assegurar de que é possível demonstrar
um mínimo de elementos para formular uma acusação de maus tratos (Ver
Parte I, Capítulo 3.3): que uma vítima sofreu ou corre o risco de
sofrer maus tratos em mãos de uma autoridade do Estado ou com seu
conhecimento e anuência.
4.1. Informação modelo
DEVE-SE SABER:
QUEM FEZ O QUE EM QUEM?
QUANDO, ONDE, POR QUE e COMO?
4.1.1. Que tipo de detalhes são
necessários para responder a essas perguntas básicas?
A informação deve:
1. Identificar a vítima ou vítimas
2. Identificar o torturador ou
torturadores
3. Descrever como chegou a vítima às
mãos dos representantes públicos
4. Explicar onde foram presas/mantidas as
vítimas
5. Descrever as condições de reclusão
6. Descrever a forma dos maus tratos
7. Descrever qualquer resposta oficial do
incidente (incluindo a afirmação de que tal incidente não ocorreu)
Identificar a vítima ou vítimas
Quanto maior o número de detalhes
obtidos sobre a pessoa, mais clara poderá ser a identificação:
Nome completo (e o nome do pai;
importante em algumas culturas).
Sexo (pode não ficar claro somente com o
nome)
Data de nascimento/idade
Ocupação
Endereço
Aparência, especialmente as
características pouco comuns
Fotografias da vítima viva ou morta
(podem ajudar os especialistas a interpretar qualquer sinal evidente de
maus tratos observados nas fotografias)
Alguma indicação sobre o estado de
saúde da vítima antes de ser presa ou detida: relatórios médicos,
declarações de testemunhas, etc.
É necessário lembrar que normalmente é
impossível tomar medidas urgentes sem um nome.
Identificar o torturador ou torturadores
É bom lembrar que para admitir a
ocorrência de uma violação, deve-se demonstrar que a vítima esteve
sob custódia das autoridades ou detida com sua anuência, ou que as
autoridades não a protegeram. Não é preciso, necessariamente,
identificar os autores de torturas (embora se possível, deve-se
fazê-lo), desde que se possa demonstrar que têm uma relação com o
Estado.
Quem prendeu a vítima? O ideal seria o
número de pessoas e seus nomes, patentes e unidade. Se essa
informação não for conhecida, os seguintes detalhes podem ajudar a
identificação:
A que unidade das forças de segurança,
exército ou força paramilitar pertenciam?
O que trajavam? Estavam uniformizados ou
a paisana?
Qual o seu aspecto? Possuíam alguma
característica incomum?
Que tipo de arma carregavam? Algumas
armas podem ser específicas de uma corporação.
Que veículos usavam? Com marcas ou sem
marcas; foi anotado o número da placa?
Descrever como a vítima chegou às mãos
dos agentes públicos
O método de seqüestro ou de detenção,
e o posterior tratamento, podem ser característicos de um determinado
grupo que opera em uma área (o que pode ter sido demonstrado por
denúncias anteriores aos organismos internacionais), e ajudam a
demonstrar que a vítima foi detida por autores de torturas.
Onde foi presa a pessoa? Em casa, na rua,
em um lugar de culto, fora de uma base militar, etc.
Quando foi presa a pessoa? A data
aproximada ou o mês ou a estação do ano. Em que momento do dia ou, se
pela manhã, à tarde ou à noite.
Como aconteceu? Foi utilizada alguma
forma de controle? Havia outras pessoas presentes que tenham visto o que
ocorreu? Se não se conhece nenhum detalhe, onde e quando foi a última
vez que a vítima foi vista e em companhia de quem? Houve algum aviso, a
vítima foi chamada a uma delegacia de polícia; havia manifestação na
rua, etc.?
Foi dada alguma razão para a prisão?
Embora não tenha sido dada qualquer razão oficial, o tipo de perguntas
formuladas ou as circunstâncias da prisão podem sugerir a razão.
Explicar onde foram detidas/mantidas as
vítimas
As vítimas podem ter sido mantidas em um
lugar determinado ou talvez somente transferidas para uma área da
cidade e logo soltas, ocorrendo os maus tratos durante a transferência.
Qual o nome e onde está situada a
delegacia de polícia/quartel, instituição, área ou campo militar?
Quanto tempo foram mantidas lá?
Foram transferidas para algum lugar? Em
caso afirmativo, para onde, por quem e em que data aproximadamente? Como
chegaram lá? Foi dada alguma razão para a transferência? Se foi
temporária, quanto tempo durou?
Descrever as condições de reclusão
As condições de detenção podem fazer
parte dos maus tratos, mas isso deve ser decidido pelo organismo ao qual
serão apresentadas as denúncias. No que se refere aos centros secretos
de detenção, os testemunhos combinados de diferentes pessoas podem
demonstrar que o centro existe e ajudar a identificá-lo. Pode ajudar,
igualmente, na elaboração de uma planta da instalação. Nesse caso,
deve-se tomar nota de todos os detalhes possíveis.
Deve-se solicitar à vítima que descreva
minuciosamente o centro onde foi mantida, sobretudo a cela ou lugar onde
dormiu e todas as demais salas onde esteve, por exemplo para um
interrogatório. É possível que os olhos das vítimas tenham sido
vendados; nesse caso, deve-se pedir que descrevam com outros sentidos
que não a vista: o que escutaram, cheiraram ou tocaram? A seguir,
mostramos o tipo de documento necessário para documentar as
condições:
Localização da sala dentro da
instituição: Foi preciso subir ou descer? O que escutaram e cheiraram?
Notaram alguma peculiaridade do terreno no caminho? Se havia uma janela
na sala, era possível ver algo através dela?
A própria sala: Quais as suas
dimensões? De que eram feitas as paredes, o piso, o teto e a porta? Que
forma tinha? Havia algo incomum?
Outros presos na sala: Havia outras
pessoas detidas lá? Em caso afirmativo, quantas? Alguma delas pode
testemunhar? Observaram alguma coisa sobre o estado de saúde da
vítima? Qual estado de saúde das demais pessoas detidas?
Isolamento: Se a vítima estava isolada,
durante quanto tempo e de que maneira esteve isolada?
Conteúdo da sala: O que havia na sala:
camas, móveis, pia, lavabo, etc.?
Ambiente da sala: Qual a temperatura?
Havia algum tipo de ventilação? Era úmida?
Luz: Havia luz? Era luz natural de uma
janela ou luz elétrica? Se era luz elétrica, quanto tempo permanecia
acesa? Que aspecto tinha a luz ou que sensação dava, por exemplo, cor,
intensidade?
Higiene: Havia instalações para a
higiene pessoal? Onde e como iam ao banheiro? Como era a higiene geral
do centro? Havia algum tipo de infestação?
Roupas: Que roupas usavam e era possível
lavá-las ou mudá-las?
Alimentação e água potável: Com que
freqüência se distribuía comida e água e em que quantidade? Qual era
a qualidade? Era distribuída gratuitamente?
Exercício: Era dada a oportunidade de
sair da cela? Em caso afirmativo, durante quanto tempo e com que
freqüência?
Regime: Havia algum aspecto do regime
particularmente estrito ou monótono?
Serviços médicos: Estava presente ou
disponível um médico ou outro profissional de saúde? Algum dos presos
pôde ser examinado ou tratado em uma instalação médica independente,
por um médico de família ou em um hospital? Havia disponibilidade de
medicamentos? Quem os fornecia?
Visitas familiares: Eram permitidas
visitas familiares? Em caso afirmativo, onde eram realizadas? Era
possível escutar as conversas? A família sabia onde estava a pessoa?
Representação legal: Era permitido o
acesso a um representante legal? Quando ocorreu a primeira entrevista,
ou seja, quanto tempo depois da detenção da vítima? Qual a
freqüência? Onde eram realizadas as visitas? A conversa podia ser
ouvida por terceiros?
Comparecimento perante um representante
judicial: A vítima compareceu perante um magistrado ou tribunal?
Quando, ou seja, quanto tempo depois da detenção da vítima?
Subornos: Era preciso pagar algum suborno
por obter qualquer um desses serviços?
Descrever a forma dos maus tratos
Deve-se lembrar que os maus tratos podem
ser físicos e psicológicos, e que ambos podem constituir tortura. As
formas de maus tratos são limitadas apenas pela imaginação do
torturador, e não é possível nem desejável proporcionar uma lista. A
data e o lugar no qual foram praticados os maus tratos podem ajudar a
identificar o torturador, por exemplo, possibilitando a comprovação de
quem estava de serviço naquele momento.
Deve-se solicitar à vítima ou à
testemunha que explique a natureza exata do tratamento infligido:
Onde ocorreu, o que aconteceu, com que
freqüência, que efeitos causou à vítima na ocasião e
posteriormente?
Pode-se perguntar:
O que podem lembrar sobre a identidade do
torturador ou torturadores.
Se havia algo característico na sala
onde ocorreram os maus tratos.
Se havia outros presos presentes na
ocasião, se viram o que ocorreu com a vítima e se aconteceu algo com
eles.
Se foi feita alguma pergunta à vítima
durante os maus tratos ou se lhe disseram qualquer outra coisa; isso
pode dar algum indício sobre o motivo, caso exista algum, dos maus
tratos.
Pedir uma descrição exata do que
ocorreu e com que freqüência; quando os maus tratos forem físicos,
deve-se pedir uma descrição de todos os instrumentos usados e as
partes do corpo onde foram aplicados. Quando o tratamento for
psicológico, deve-se perguntar à vítima se pode descrever exatamente
como se sentiu, tanto naquele momento quanto depois.
Quais foram os efeitos imediatos de cada
forma de maus tratos sobre a pessoa.
Se a vítima recebeu tratamento médico,
imediatamente ou algum tempo depois, inclusive após ter sido solta.
Se havia pessoal médico presente um
pouco antes, durante ou depois dos maus tratos; em caso afirmativo, eles
se identificaram? Qual era sua função?
Se há ou houve conseqüências de longo
prazo (físicas ou mentais) que a vítima atribui aos maus tratos.
qual foi a resposta oficial, caso tenha
havido resposta, sobre o incidente?
A família da vítima dirigiu-se às
autoridades, em qualquer momento, a fim de obter informações sobre a
vítima, por exemplo, durante as primeiras etapas da detenção? Obteve
alguma resposta?
Se a vítima compareceu perante um
magistrado ou tribunal em algum momento durante o período de
detenção, foram-lhe comunicadas as acusações? Havia algum
representante legal? Nesse momento, a vítima tinha algum sinal visível
de lesão?
A vítima pôde ser atendida por um
médico durante a detenção ou após ter sido solta? Que tipo de
médico era, por exemplo, um médico independente, um médico da prisão
ou um médico do Estado? Como chegou a vítima ao médico? Alguém a
acompanhou? Uma vez lá, o médico realizou um exame? Havia alguém
presente durante o exame? O médico preparou um relatório médico? O
que dizia o relatório? A vítima tinha sinais evidentes de lesões na
ocasião?
A vítima queixou-se a alguém de ter
sofrido maus tratos ou contou a alguém com autoridade? Que resposta
recebeu?
Foi realizada um inquérito? Do que
constou? Foram entrevistadas testemunhas? Foram entrevistados os autores
das torturas? Se a vítima faleceu enquanto estava detida, foi feita uma
autópsia?
A vítima teve algum contato com os
funcionários que a detiveram (ou com outros funcionários da mesma
força ou corporação) desde o incidente?
O que se pode fazer para obter esses
detalhes sem modificar o conteúdo da explicação?
A descrição exaustiva e
cronologicamente precisa dos fatos não é fácil para as vítimas. Elas
necessitarão de orientação para saber sobre quais aspectos devem
falar mais detidamente; deve-se lembrar que a função do entrevistador
é exatamente essa, ou seja, proporcionar uma orientação, e não
colocar palavras na boca do entrevistado. É preciso começar sempre com
perguntas gerais ou abertas (perguntas cuja resposta é ilimitada, por
exemplo, "aconteceu-lhe alguma coisa?", ao invés de "foi
torturado?"), e ir tornando-se mais específico à medida que a
informação for sendo prestada.
Estudo de caso:
A seguir, duas formas de apresentar a
mesma história:
relatório 1 - Básico:
José Torres, de 23 anos, declarou que
foi preso em 23 de janeiro de 1999, transferido para a delegacia central
de polícia de Pueblo e posto em liberdade, sem qualquer acusação, em
25 de janeiro. Denunciou que, enquanto se encontrava preso, recebeu
repetidos golpes na cabeça e, em uma ocasião, foi submetido a choques
elétricos por parte de agentes desconhecidos enquanto era interrogado.
relatório 2 - Elaborado:
José Torres, de 23 anos, declarou ter
sido preso em sua casa às 5 da manhã do dia 23 de janeiro de 1999 e
transferido para a delegacia central da polícia de Pueblo, onde chegou
às 7 da manhã. Foi colocado sozinho em uma cela, no sótão, sem
janelas nem lavabo e infestada de ratos.
Aproximadamente 4 horas mais tarde, dois
agentes vestidos a paisana retiraram José da cela e subiram com ele no
elevador até o terceiro andar, onde entraram em um escritório à
direita de um longo corredor. No escritório havia 3 cadeiras de metal e
plástico cinza, uma escrivaninha de madeira e 3 móveis com gavetas de
metal cinza. Havia um pequeno tapete marrom e na parede em frente da
porta havia uma janela pequena com uma persiana fechada. Um dos agentes
era muito baixo, tinha cabelos crespos e barba. O outro usava óculos,
tinha uma pequena cicatriz triangular sobre a sobrancelha direita e
fumava cigarros. Durante o interrogatório, o agente com barba
referiu-se ao agente com a cicatriz como "Sargento".
(Informe 2, continuação)
José foi mantido no escritório durante
duas horas. Durante esse período, o agente com a cicatriz pediu-lhe
repetidamente que revelara informações sobre uma quadrilha de
traficantes de drogas que operava em Pueblo. Quando ele disse que não
sabia nada sobre uma quadrilha de traficantes de drogas, o agente da
barba amarrou-lhe as mãos nas costas e bateu repetidamente em sua
cabeça com uma lista telefônica amarela que retirara da gaveta
superior de um armário.
Desceram novamente José para a mesma
cela de antes. Dezoito horas depois, dois agentes a paisana vieram
buscá-lo. Um deles era o agente da cicatriz do dia anterior. O outro
era louro e tinha cabelos curtos e uma voz grave. Levaram-no para o
mesmo escritório do terceiro andar. Desta vez, o agente louro disse a
ele que retirara a camiseta e amarrou suas mãos novamente enquanto
estava sentado em uma cadeira. O mesmo agente retirou uma caixa preta
retangular da gaveta esquerda da escrivaninha, com uns 5 cm x 7 cm de
tamanho e com dois pinos de metal que saíam de uma extremidade.
Apoiou-a contra o mamilo direito de José e apertou um botão. José
ouviu um zumbido curto e sentiu uma dor intensa na região do mamilo. O
mesmo foi feito três vezes. Durante o tempo em que esteve no
escritório, o agente com a cicatriz fez-lhe algumas perguntas sobre a
quadrilha de traficantes de drogas de Pueblo e pediu-lhe detalhes sobre
uma grande remessa de heroína esperada para a semana seguinte.
José foi solto sem ser acusado, em 25 de
janeiro.
Quando Maria, representante da ONG X,
entrevistou-o em sua casa, no dia 28 de janeiro, pôde constatar duas
pequenas marcas vermelhas, com aproximadamente 8 mm, próximas ao mamilo
direito de José, bem como marcas circulares roxas e amarelas ao redor
dos pulsos. Ele mostrou a Maria extensas contusões na parte inferior
das costas e um inchaço considerável na região dos rins, e
queixou-se, também, de dor ao urinar. Queixou-se, igualmente, de uma
dor de cabeça contínua e de um zumbido agudo nos ouvidos. Parecia
nervoso enquanto descrevia os fatos, estava com olheiras, mudava de
posição repetidamente e parecia estar com frio, embora a temperatura
fosse normal.
O Relatório 1 não é inexato nem
errôneo; apenas faltam pormenores. Esses pormenores, contudo, são as
chave que abrirão diversas possibilidades de ação para o
entrevistador. Observando o Relatório 1, vê-se que ele apresenta os
elementos básicos de uma denúncia de tortura (vítima, torturador
vinculado às autoridades, maus tratos), mas a descrição dos maus
tratos é mínima e são fornecidas poucas indicações sobre quem pode
ser o torturador, ou como é possível corroborar a denúncia. Isso
torna difícil a adoção de qualquer medida significativa relacionada
à denúncia.
O Relatório 2, por sua vez, é muito
detalhado e informativo, e fornece muitas oportunidades para a
corroboração. Além do mais, apresenta os elementos básicos para uma
denúncia de tortura:
Fornece muitos pormenores sobre os
autores, o que pode possibilitar sua identificação.
Descreve a localização e distribuição
do escritório onde ocorreram os maus tratos, o que permite achá-lo se
for realizada uma visita à delegacia.
Pode possibilitar a busca dos
instrumentos usados nos maus tratos caso seja realizada uma visita à
delegacia.
Esclarece o motivo da detenção e do
interrogatório.
Fornece pormenores sobre as condições
em que a vítima foi detida.
Descreve os maus tratos de uma maneia
precisa, tornando possível que um especialista médico dê sua opinião
a respeito das lesões da vítima.
Descreve as lesões da vítima, incluindo
uma indicação básica de seu estado emocional.
As perguntas que Maria poderia ter
formulado para obter um relatório mais completo seriam as seguintes:
Declaração de José:
Perguntas de Maria:
Fui preso em 23 de janeiro.
Onde aconteceu a detenção?
Em que momento ocorreu a detenção?
Levaram-me para a delegacia central de Pueblo.
Quando chegou à delegacia?
Para onde foi transferido quando chegou?
Compartilhava a cela com outra pessoa?
A cela tinha alguma janela?
A cela tinha um lavabo?
Como era a higiene da cela?
Enquanto estive preso recebi repetidos
golpes na cabeça.
Quando isso ocorreu?
Onde ocorreu?
Como chegou até lá?
Subiu ou desceu?
Quem o levou até lá?
Que aspecto tinham?
Observou algo pouco comum sobre eles?
Como era o escritório?
Estava mobiliado?
Observou algo especial nele?
O que ocorreu exatamente quando chegou
lá?
Tinha liberdade de movimentos?
Diz que o espancaram, quem o fez?
Usaram algum objeto?
Viu de onde o retiraram?
Disseram algo ou fizeram perguntas?
Lembra-se do que foi perguntado?
Quanto durou?
Para onde o transferiram depois?
Submeteram-me a choques a elétricos e me
interrogaram.
Quando aconteceu isso?
Onde aconteceu?
Quem o levou até lá?
O que aconteceu quando chegou lá?
Tinha liberdade de movimentos?
O que aconteceu em seguida?
Que aspecto tinha a caixa?
O que ele fez com ela?
Onde, exatamente, ele o tocou com a
caixa?
O que ele fez a seguir?
Ouviu ou sentiu algo?
Quantas vezes isso aconteceu?
Disseram algo ou fizeram perguntas?
O tratamento imposto deixou marcas?
Importa-se que dê uma olhada?
Sofre outras conseqüências em
decorrência do que aconteceu?
O Relatório 2 também pode ser melhorado
em certos aspectos, embora seja mais do que adequado para a maioria dos
objetivos. Não identifica possíveis testemunhas; por exemplo, não se
sabe se alguém viu como tiraram José de sua casa. A descrição das
condições da detenção é imprecisa e poderia ser mais elaborada.
Não indica se José teve permissão de contatar seu advogado ou sua
família, se fizeram um exame médico em algum momento durante sua
detenção ou se ele apresentou uma reclamação formal sobre os maus
tratos a alguém que tivesse autoridade. Tampouco traz informações
sobre o que pode ter ocorrido entre o segundo interrogatório de José e
o momento em que foi solto.
Existe um outro aspecto ainda mais
importante. Observando-se detidamente o relatório, vê-se que Maria se
esqueceu de uma coisa. José foi preso às 5 da manhã, mas só chegou
à delegacia às 7 da manhã. Como ela não morava na localidade, não
se lembrou de perguntar a distância entre a delegacia de polícia e a
casa de José. Na realidade, elas distam apenas três ruas. O que
aconteceu, portanto, entre as 5 e as 7 da manhã? Maria também deixou
passar outra pista: as contusões e o inchaço na parte inferior das
costas e na região dos rins e a dor ao urinar. Até para um advogado,
esses sintomas seriam difíceis de conciliar com a explicação de José
de que recebeu golpes na cabeça e choques elétricos no mamilo. Ele
insistiu que esses foram os únicos maus tratos que sofreu na delegacia.
É provável que antes de chegar à delegacia tenham levado José para
um lugar a fim de espancá-lo com golpes ou talvez chutes,
principalmente na região dos rins. Caso tivesse reparado a tempo nessa
incoerência, Maria teria descoberto outro incidente de maus tratos que
José esqueceu de mencionar ou pensou que não era importante se
comparado com o que ocorreu na delegacia. Maria pode ter sido concreta
demais em suas perguntas durante as primeiras fases da entrevista,
perguntando a José o que aconteceu na delegacia, em vez de o que
ocorreu depois que o tiraram de casa, ou apenas o que aconteceu a
seguir.
4.2. Contextos específicos
Os exemplos e as perguntas apresentados
na seção anterior sobre a informação modelo estão muito orientados
para os incidentes de maus tratos no contexto da detenção policial ou
outra forma de detenção oficial a curto prazo, porque trata-se do tipo
mais habitual de denúncia que se recebe. Embora a maioria dos elementos
e das normas gerais também seja válida para outros contextos, deve-se
ter em mente que nem todos serão pertinentes nem adequados. Quando o
entrevistador se prepara para uma visita a outro tipo de instituição
ou para uma entrevista em um contexto diferente do descrito
anteriormente, deve dedicar certo tempo para pensar sobre a necessidade
de utilizar novas abordagens no momento da entrevista.
Entre os exemplos de instituições de
detenção longa estão as prisões (com pessoas em prisão preventiva e
condenados), outros centros de reclusão onde os presos esperam
julgamento, às vezes durante longo período de tempo, e centros de
detenção juvenil. Nessas instituições, se o enfoque for o tratamento
dispensado dentro da instituição (ao invés dos fatos que ocorreram
antes da prisão) é pouco provável que o entrevistador deva se
preocupar com perguntas sobre a detenção ou o seqüestro. Em vez
disso, deve fazer mais perguntas sobre as condições de encarceramento,
o regime carcerário, as relações com os carcereiros e os incidentes
particulares de maus tratos. Com relação a este último ponto,
poderiam ser feitos os mesmos tipos de perguntas feitas por Maria quando
pedia informações sobre o que aconteceu com José quando o tiraram da
cela. Também é preciso pensar na possibilidade de maus tratos
coletivos, ou o emprego excessivo de força ou a brutalidade em resposta
a problemas disciplinares, tais como distúrbios.
Tampouco se deve esquecer que
instituições como as prisões são uma fonte importante de denúncias
relacionadas a fatos que ocorreram antes do encarceramento, sobretudo os
maus tratos da polícia. É o caso dos presos recém-chegados, porque
pode ser a primeira vez que se sintam seguros para falar sobre suas
experiências. Ver Parte I, Capítulo 3.4 e 3.5, para uma análise mais
extensa sobre este ponto.
Nos contextos de reclusão não-punitiva,
como abrigos para crianças e asilos de idosos, ou instituições
psiquiátricas, talvez seja necessário, igualmente, prestar atenção
ao entorno e às condições gerais, ao relacionamento com o pessoal de
supervisão e a todos os incidentes de maus tratos. Nesses contextos, os
maus tratos costumam adotar a forma do abuso físico ou sexual, mas
também podem incluir várias formas de abuso psicológico. É bom
lembrar que para as crianças é melhor que a entrevista seja realizada
por alguém que tenha certa experiência de trabalho com crianças. Uma
prática habitual em muitas instituições psiquiátricas que dá margem
a controvérsia é a utilização de amarras para restringir os
movimentos dos pacientes.
Nas instituições militares, os
problemas podem derivar do regime disciplinar, que costuma ser muito
rígido. Nesses casos, é provável que devam ser investigadas
denúncias de castigos que podem constituir maus tratos, como a
incomunicabilidade ou a retirada de certos privilégios. É preciso
lembrar que se deve pedir informações não só sobre a punição
propriamente dita, como ocorre, quanto tempo dura, sua freqüência,
etc., mas também sobre o processo mediante o qual as punições ou
medidas disciplinares são determinadas. Outra possível causa de
preocupação pode ser a tolerância oficial das intimidações dentro
das forças armadas, que em certos casos poderiam constituir maus
tratos. É muito importante anotar os detalhes sobre a forma exata das
intimidações, sua freqüência e intensidade, o número de pessoas
implicadas, a possibilidade de que seja generalizada, as conseqüências
físicas e psicológicas que a vítima pode estar sofrendo, e qualquer
indicação sobre a tolerância oficial dessa prática.
Nos centros de detenção para
estrangeiros, o problema pode dizer respeito aos maus tratos aos
estrangeiros por parte da polícia local ou de outras autoridades (que,
em geral deve ser examinado de uma maneira parecida às outras formas de
detenção a curto prazo), mas é mais provável que implique processos
de deportação de pessoas para países onde corram o risco de ser
torturadas. Em tais casos, deve-se repassar de forma exaustiva todas as
etapas do processo de deportação e obter cópias das decisões
importantes. Deve-se, também, entrevistar as pessoas sobre suas razões
para crer que sofrerão torturas, a fim de estabelecer um sólido motivo
para evitar que sejam deportadas. Deve-se obter informações sobre os
incidentes anteriores de tortura sofridos pelo entrevistado ou por
familiares próximos, bem como sobre todas as ameaças recebidas por
eles e suas razões para temer que a pessoa corre um risco. Deve-se ter
em mente que é preciso centrar a análise no risco atual e não no
anterior.
No caso de seqüestros, desaparecimentos
e execuções extrajudiciais, normalmente não será realizada uma
entrevista com a própria vítima, e sim com um familiar ou amigo
próximo. O entrevistador deverá se concentrar nas circunstâncias que
cercaram o desaparecimento da pessoa, no modus operandi dos
seqüestradores e, sobretudo, na tarefa de identificar as testemunhas
que possam fornecer informação não apenas sobre as circunstâncias da
prisão, mas também sobre o estado da vítima quando foi detida. Caso
tenha sido encontrado o corpo da vítima, isso será muito importante
para ajudar a demonstrar que todas as marcas de lesões no corpo
ocorreram durante a detenção.
Quando for necessário reunir denúncias
em campos de refugiados e de pessoas deslocadas, é possível que se
recebam denúncias de maus tratos ocorridos antes chegada ao campo e de
maus tratos ocorridos dentro do campo. É muito importante manter
registros muito precisos sobre os autores dos incidentes denunciados e
ser extremamente minucioso em sua identificação. Isso é igualmente
válido para as acusações apresentadas em relação, geralmente, às
zonas em conflito.
5. PROVAS
Fazer uma denúncia sólida não consiste
somente em apresentar a explicação de alguém sobre o que lhe
aconteceu. Consiste, igualmente, em que outros acreditem que os fatos
relatados são verdadeiros. Por muito crível e digna de confiança que
possa parecer uma pessoa durante uma entrevista, é importante reunir
todas as provas possíveis, por vários motivos:
Em primeiro lugar, a menos que a vítima
preste declaração perante um tribunal, é pouco provável que outras
pessoas tenham a oportunidade de observar seu comportamento da mesma
forma que o entrevistador. Isso significa que ele deve convencê-los de
que a vítima é sincera.
Em segundo lugar, todos os procedimentos,
nacionais e internacionais, estão sempre alertas com relação a
denúncias falsas, especialmente em contextos políticos delicados.
Quanto mais provas forem apresentadas, menos dúvidas terão quanto a
veracidade da acusação.
Por último, os procedimentos judiciais e
quase judiciais, em geral, não podem emitir um veredicto de
culpabilidade, quer do Estado, quer de um torturador específico, com
base apenas em uma denúncia. Isso significa que é pouco provável que
o julgamento seja bem-sucedido, a menos que existam provas que
corroborem a denúncia.
As provas podem adotar a forma de um
relatório médico, uma avaliação psicológica, uma declaração da
vítima, declarações de testemunhas, outras formas de prova de
terceiros, como o testemunho de um médico ou de outro especialista, ou
uma prova objetiva de incidentes generalizados de tortura nas
circunstâncias referidas. Ou seja, qualquer coisa que possa ajudar a
corroborar e demonstrar uma denúncia.
5.1. Prova médica
Os procedimentos técnicos para que o
pessoal médico realize um exame físico ou psicológico nas supostas
vítimas de tortura são descritos em muitos outros documentos e manuais
especializados (ver Apêndice 2), e não se tratará desse assunto neste
manual. É importante, porém, que todos os que desejem apresentar
denúncias de torturas e de outras formas de maus tratos compreendam a
função da prova médica, as dificuldades que gera e algumas medidas
bem básicas que podem ser tomadas para fazer constar esse tipo de prova
na falta de uma oportunidade para enviar uma suposta vítima a um
especialista médico para um exame.
A prova médica é, provavelmente, a mais
importante que se pode obter, e pode gerar um sólido respaldo às
declarações das testemunhas. A prova médica não costuma ser
incontroversa (provar com absoluta certeza que existiu tortura), porque:
Existem muitas formas de tortura que
deixam muito pouco rastro, e são poucas as que deixam sinais físicos
duradouros.
É possível que algumas lesões ou
marcas, apresentadas como sendo conseqüência de torturas, sejam
produto de outras causas.
O que realmente pode demonstrar a prova
médica é que os padrões de lesão ou de comportamento identificados
na suposta vítima são coerentes com a (poderiam ter sido causados
pela) tortura descrita. Se ocorrer uma combinação de provas físicas e
psicológicas coerentes com uma denúncia, isso reforçará o valor
geral da prova médica.
Os exames físico e psicológico deverão
estar a cargo de pessoal médico especializado, não só porque exigem
conhecimento técnico, mas também porque se os relatórios forem
utilizados em um tribunal, será necessário demonstrar que foram
elaborados e interpretados por profissionais qualificados. Entretanto,
isso não significa que se deva deixar de fazer constar todos os sinais
físicos ou o comportamento evidente observado durante a entrevista;
muito ao contrário, podem ser de muita utilidade, sobretudo quando não
se pode realizar um exame médico na ocasião. Um questionário
minucioso e os detalhes sobre o tratamento recebido pela vítima têm
pelo menos tanto valor quanto fazer constar os efeitos físicos e
psicológicos. E falar com uma testemunha, como a esposa, por exemplo,
pode ajudar muito a descobrir a aparência da vítima depois das
torturas e a observar todas as mudanças em seu comportamento.
Após a obtenção da prova médica, é
importante ter presente a diferença entre medicina terapêutica
(tratamento dos sintomas do paciente) e a medicina forense (legal) . O
objetivo da medicina forense é demonstrar as causas e as origens das
lesões; trata-se de uma disciplina especializada. Em muitos países, as
funções terapêuticas e forenses estão sob a responsabilidade dos
mesmos profissionais mas, sempre que possível, deve-se buscar o
auxílio de alguém que tenha conhecimentos forenses e conheça a
diferença entre as duas formas de medicina.
5.1.1. Prova física
Caso não seja possível contar com a
presença imediata de um médico, é melhor fazer constar provas
gráficas dos maus tratos, mas somente após o consentimento da pessoa.
O entrevistador deve deixar claro que não é médico e que talvez não
possa oferecer tratamento imediato. Em um contexto de detenção,
qualquer observação pode estar fundamentada apenas em uma breve
entrevista, mas quando a suposta vítima não estiver detida, poderá
retirar parcialmente a roupa para que seja possível uma observação
mais pormenorizada.
É mais provável que os sinais externos
sejam visíveis em um lapso de poucos dias após a lesão, mas deve-se
procurar esses sinais mesmo em casos mais antigos. É imprescindível
fazer constar toda a informação possível. É preciso lembrar que a
ausência de lesões visíveis não significa a inexistência de maus
tratos.
À guisa de orientação, seria
aconselhável fazer constar o seguinte:
Todas as lesões evidentes, como
inchaço, contusões, cortes, arranhões ou queimaduras.
Todas as dificuldades de movimento
corporal ao andar, subir escadas, sentar ou ficar de pé durante longos
períodos de tempo, inclinar-se ou levantar os braços.
Todas as deformidades de forma ou postura
nas costas ou nos membros.
Como fazer constar as observações:
Anotar REGIÃO, TAMANHO, FORMA, COR e
TIPO (corte, contusão, queimadura, etc.) de todas as lesões.
Utilizar, se possível, uma régua; caso
contrário, calcular o tamanho comparando-o com um objeto comum (mas
evitar objetos de tamanho variável, como uma laranja).
Caso existam muitas lesões, indique-as
em um diagrama (ver Apêndice 4).
As fotografias, embora não sejam
profissionais, podem ser úteis para o exame posterior dos
especialistas. O ideal é incluir uma foto da localização geral das
lesões e um primeiro plano de cada lesão. Deve-se incluir um indicador
de tamanho, de preferência uma régua, mas serve, também, um objeto
comum como uma caixa de fósforos. A indicação da data é de muito
valor. Se possível, deve-se chamar mais tarde um fotógrafo
profissional.
Descrever as aparências com toda
precisão e detalhe, por exemplo "Uma contusão inchada e roxa,
circular, de 4 cm de diâmetro, na parte exterior do braço direito, 10
cm acima do cotovelo".
Solicitar ao entrevistado que mostre a
postura ou o movimento anômalo.
Perguntar ao entrevistado sobre o
desenvolvimento dos sintomas desde o incidente. Uma resposta possível
é: "Na semana passada não podia levantar os braços em um ângulo
de 90 graus, mas agora posso levantá-los acima da cabeça. Ainda não
posso mexer completamente o pulso e minha mão ainda está
inchada". Essas declarações podem ser citadas literalmente.
Caso necessário, essas orientações
podem ser adaptadas para o exame em um cadáver. Nesses casos, deve-se
também elaborar um relatório sobre as condições em que foi
encontrado (por exemplo, onde estava situado, o tipo de superfície
sobre a qual estava, se fazia muito calor ou frio, se o lugar era
particularmente úmido), tendo em vista que isso pode ajudar um
especialista forense a determinar se ainda é possível encontrar sinais
de tortura no corpo.
5.1.2. Prova psicológica
Mesmo a tortura intensa, praticada com
perícia, pode não deixar marcas físicas, mas sim profundas
repercussões psicológicas. Esse será o caso se a vítima sofreu
torturas psicológicas, como isolamento prolongado, humilhação
religiosa ou sexual, ou ameaças de morte ou contra a família. Embora a
avaliação psicológica de uma pessoa só possa ser realizada por um
especialista, deve-se fazer constar as observações que uma pessoa
não-profissional faça sobre o comportamento do indivíduo, juntamente
com todos os comentários subjetivos que possam ter sido feitos pela
vítima sobre si mesma (descrição de um pesadelo, pensamentos
suicidas), para sua posterior interpretação por parte de um
especialista.
Os seguintes sinais podem ser evidentes
ou explicados pelo entrevistado. Embora sejam indicadores de tensão,
não são específicos da tortura, apesar de que o tema dos sonhos ou os
flashbacks podem indicar sua origem. Pensamentos sobre fatos
traumáticos voltam persistentemente, por exemplo, por meio de
angustiosos sonhos ou lembranças recorrentes dos fatos, reações ou
sensações repentinas como estivesse revivendo os fatos traumáticos (flashbacks).
Intensa angústia ao viver situações
que simbolizam ou se parecem com aspectos da tortura. Há uma constante
necessidade de evitar os estímulos associados ao trauma ou uma
paralisação emocional total.
Sintomas de crescente excitação, tal
como dificuldade para dormir, irritabilidade ou ataques de raiva e
dificuldade de concentração. O entrevistador pode notar impaciência,
agitação ou uma reação de medo exagerada.
Tendo em vista que a maioria dos sintomas
psicológicos é subjetiva, é muito útil obter indícios que os
corroborem com a família ou com amigos, por exemplo: "Ele acorda
gritando e suando de noite, tem pesadelos de que está sendo
torturado" ou "Zanga-se com facilidade. Antes de ser preso,
tinha um temperamento fácil e agradável" ou "Sempre evita
passar pelo lugar onde foi presa".
5.2. Declaração da pessoa que faz a
denúncia
Deve-se preparar uma declaração escrita
que descreva os fatos e seja assinada pela vítima ou por outra pessoa
que apresente a denúncia, sempre que possível quando a vítima não
estiver presa. Isso não será essencial em todas as circunstâncias,
mas ajudará em todos os processos a reforçar a credibilidade da
acusação. Além disso, a falta dessa declaração escrita afetará as
diversas possibilidades de ação e poderá impedir o início do
processo judicial.
A declaração deve descrever em detalhe
o incidente ou incidentes de tortura e os fatos anteriores e posteriores
às torturas. Não existe um formato determinado para essa declaração,
mas deve ser, antes de mais nada, informativa. Os tipos ideais de
detalhe que devem ser incluídos são descritos na a Parte II, Capítulo
4.
Essa declaração não precisa ser
escrita pela pessoa que faz a denúncia; também pode ser redigida —
de preferência, datilografada — pelo entrevistador. Posteriormente, a
pessoa deverá lê-la novamente ou, se for analfabeta, o entrevistador
deverá lê-la em voz alta. A pessoa dará sua aprovação e deverá
assinar a declaração, ou colocar nela sua impressão digital do
polegar. Caso exista a intenção de utilizar a declaração em
processos judiciais, deve ser assinada e datada não só pela pessoa que
faz a denúncia, mas também pela pessoa que tomou a declaração e, se
possível, por uma segunda testemunha.
As organizações costumam registrar
essas declarações, solicitando à pessoa que apresenta a denúncia que
preencha um questionário padrão, no qual presta a informação
solicitada.
5.3. Prova testemunhal
Uma vez que a tortura, geralmente, é
praticada em segredo, é difícil encontrar testemunhas do incidente em
si. Caso existam testemunhas, estas podem não querer falar sobre o que
presenciaram com medo de sofrer represálias ou porque a experiência
foi traumática demais. Entretanto, quando houver testemunhas dispostas
a fazer uma declaração sobre o que viram, isso pode contribuir muito
para a credibilidade da denúncia, bem como fornecer detalhes que a
própria vítima ou a pessoa que apresenta a acusação talvez não
possa dar. Pode ajudar a reconstruir os fatos e colocá-los em contexto.
O objetivo das declarações das testemunhas é ajudar a compreender
exatamente o que aconteceu e, portanto, devem ser bem pormenorizadas.
As testemunhas úteis não unicamente
aquelas que presenciaram o incidente de tortura.
As que estiveram presentes no momento em
que a vítima foi presa podem fornecer uma informação muito valiosa
sobre a identidade do torturador, o tratamento dado à vítima enquanto
a levavam, e o estado da pessoa no momento em que foi detida. Isso pode
ser muito importante se a vítima morreu, o corpo mostra sinais de
tortura e o Estado afirma que nunca prendeu essa pessoa ou que as
lesões não foram infligidas por agentes seus.
Se uma pessoa sabia que a vítima estava
recebendo mensagens ou ligações telefônicas ameaçadoras antes de ser
detida, é aconselhável fazer constar essa informação.
Outros presos podem confirmar que a
vítima foi levada para interrogatório e descrever seu estado antes e
depois de ter sido levada, ou que nunca voltou. Podem declarar que
ouviram sons, como gritos ou urros, ou que viram manchas de sangue ou
instrumentos de tortura. Podem dar testemunho de sua própria tortura ou
da de outras pessoas que pudessem ter presenciado, o que ajudaria a
demonstrar que no centro em questão se pratica a tortura, ou que um
guarda da prisão ou um determinado agente de polícia perpetrou
torturas. Isso pode ajudar a estabelecer padrões, por exemplo: os
policiais da delegacia X sempre leva a vítima ao escritório Y do andar
Zº ou os guardas da prisão sempre chegam depois da mudança de turno
do dia e levam a vítima para um determinado lugar da prisão onde é
sabido que se praticam maus tratos.
Um médico que reconheça um preso pouco
depois de um incidente também pode fornecer uma prova crucial.
A melhor maneira de identificar
possíveis testemunhas é seguir a cronologia do que ocorreu com a
vítima, averiguando em cada etapa se havia alguém presente: no momento
da detenção, no momento em que chegou à instituição ou no lugar
onde foi mantida, se compartilhou a cela ou se havia alguém nas celas
vizinhas, se alguém viu quando a levaram para ser torturada, se
assistiu a tortura, viu as lesões resultantes ou presenciou o desmaio,
se alguém sofreu experiências parecidas. Quando a vítima não é a
pessoa que apresenta a denúncia porque está morta, desaparecida ou
ainda está detida, os parentes mais próximos, os vizinhos ou membros
da comunidade local podem sugerir possíveis testemunhas, ou fornecer
informação útil eles próprios.
Não se deve esquecer que para as
testemunhas valem os mesmos princípios de consentimento informado que
para as vítimas (Ver Parte I, Capítulo 2.3). Esse fato é
particularmente válido quando se toma uma declaração escrita. No caso
de um comentário informal de uma possível testemunha que não se
pretende citar, talvez não seja necessário entrar em detalhes,
conforme as circunstâncias. Mas é preciso lembrar de jamais citar o
nome de uma pessoa sem seu consentimento.
Tal como com as declarações da pessoa
que denuncia torturas, as declarações escritas das testemunhas devem
ser assinadas e datadas pela testemunha e pela pessoa que toma a
declaração.
5.4. Outros tipos de provas
Não existe uma lista de outros tipos de
provas comprobatórias. O tipo de prova que se queira utilizar
dependerá muito da denúncia que se busca demonstrar, e deverá ser
identificado em um julgamento, caso a caso. Por um lado, deve-se tentar
identificar o que corrobora o caso em questão e, por outro, qual a
prova objetiva que ajudará a demonstrar como a denúncia se encaixa na
situação geral. Vale a pena ser criativo, e as possibilidades são
enormes. A seguir, são listados alguns outros tipos de prova:
Reportagens dos meios de comunicação:
Essa prova deve ser utilizada com certa cautela, e geralmente é
insuficiente para iniciar uma reclamação, mas pode ser muito útil
para fornecer uma prova independente de que ocorreu o incidente ou para
dar uma indicação sobre uma situação geral.
Relatórios de especialistas: Trata-se,
sobretudo, de relatórios forenses ou médicos, relatórios de
balística, ou qualquer outra forma de investigação ou testemunho
especialistas, realizada por encomenda.
Declarações e relatórios oficiais: Os
pareceres de relatórios elaborados durante investigações ou visitas
nacionais especiais de organismos internacionais - por exemplo, de um
relator especial da ONU ou uma delegação da CPT - podem ser utilizados
para fornecer uma fonte de informação mais oficial. Também podem ser
utilizadas as resoluções adotadas pelos organismos internacionais que
expressam sua preocupação sobre a situação de um país, como as
resoluções da Comissão da ONU sobre os Direitos Humanos, a
Assembléia Geral da OEA ou o Parlamento Europeu. Quanto aos casos de
deportação, o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados pode
proporcionar valiosa informação. O Departamento de Estado dos Estados
Unidos também elabora relatórios anuais sobre a situação dos
direitos humanos em todo o mundo.
Qualquer prova de uma prática de
torturas no país ou região em questão: Esse material aumenta a
credibilidade da denúncia, uma vez que demonstra a existência de
precedentes do tipo de comportamento denunciado. Isso é de suma
importância nos casos em que o objetivo é impedir a deportação de
uma pessoa para um país onde corre o risco de sofrer torturas; embora a
pessoa possa demonstrar que corre perigo, será mais fácil se for
possível demonstrar que a tortura é uma prática habitual no país em
questão.
Essa informação pode ser encontrada com
mais facilidade nos relatórios das ONGs. Entretanto, o valor desses
relatórios varia em função da reputação da organização. Os
relatórios que tendem a exagerar a situação de um país terão pouco
peso, e os relatórios de ONGs nacionais devem ser tratados com certa
prudência porque, apesar de apresentarem uma opinião muito próxima da
realidade, pode-se ficar com a sensação de que são menos objetivos.
Entretanto, caso sejam os únicos relatórios disponíveis, não há a
menor dúvida de que devem ser apresentados. Contudo, a melhor opção
é utilizar, sempre que possível, os relatórios das grandes ONGs
internacionais, que gozam de credibilidade mundial devido à sua
exatidão e veracidade. Pode-se, ainda, complementar a informação com
relatórios de ONGs menores e nacionais.
Investigação específica: Se o objetivo
é demonstrar um determinado tema, os padrões podem ser igualmente
identificados por meio de investigações particulares. Por exemplo,
pode-se tentar demonstrar a existência de uma tolerância oficial da
tortura reunindo um número significativo de casos nos quais não foi
iniciado um processo judicial, nem os autores de torturas foram
considerados culpados, apesar de existirem sólidas provas a respeito;
ou pode-se encontrar um especialista médico disposto a testemunhar que
observou na região muitos casos de lesões decorrentes de torturas.
Cópias de decisões nacionais: Se o
propósito é apresentar um caso perante uma das instâncias de
reclamação internacional (Ver Parte III, Capítulo 3), deve-se
demonstrar que a vítima não pôde obter uma solução jurídica no
âmbito nacional. Para tanto, deve-se fornecer cópias de todas as
decisões nacionais, quer sejam judiciais ou administrativas, adotadas
no caso. Isso inclui as decisões de não abrir um processo nem
instaurar um inquérito, e as cópias de todas as petições
apresentadas pela vítima ou pela família da vítima, bem como todos os
veredictos dados pelos tribunais.
RESUMO
PARTE II - DOCUMENTAÇÃO DAS DENÚNCIAS
Princípios básicos de documentação
Ao documentar denúncias, deve-se:
Tentar obter informação de boa
qualidade: Dentre os fatores que contribuem para a qualidade da
informação incluem-se a fonte da informação, o nível de detalhe, a
ausência ou presença de contradições, a ausência ou presença de
elementos que corroborem ou refutem a denúncia, até que ponto a
informação estabelece um padrão, e a época da informação.
Fazer o necessário para maximizar a
exatidão e a credibilidade da informação: Aumentar a exatidão e a
credibilidade tomando precauções gerais, buscando a corroboração de
casos específicos durante a entrevista e depois dela, e exercendo o bom
senso.
Entrevista da pessoa que denuncia
torturas
Entrevistar uma pessoa que faz uma
denúncia de torturas é uma tarefa difícil e delicada, mas pode ser
simplificada se preparada com antecedência. Deve-se revisar o texto
principal minuciosamente antes de realizar uma entrevista.
Durante toda a entrevista, deve-se
ponderar:
A necessidade de obter uma explicação
útil e a importância de respeitar as necessidades da pessoa que se
entrevista.
A necessidade de obter todos os detalhes
possíveis e a importância de não direcionar excessivamente a
explicação.
Antes de começar a entrevista, deve-se
pensar a respeito das seguintes considerações: consentimento
informado; como começar a entrevista; anotações; quem deve dirigir a
entrevista; o uso de intérpretes; fazer com que o entrevistado se sinta
mais a vontade; tratar com as pessoas que têm medo de falar; realizar
entrevistas em locais de detenção coletiva; como tratar um tema tão
sensível; maximizar a credibilidade da informação; composição de
homens/mulheres da equipe de entrevista; entrevista de crianças (ver
texto principal para maiores informações)
Informações que devem ser registradas
A informação deve assinalar:
QUEM fez O QUE em QUEM?
QUANDO, ONDE, POR QUE e COMO?
Deve:
Identificar a vítima ou vítimas
Identificar o torturador ou torturadores
Descrever como a vítima chegou às mãos
dos representantes oficiais
Explicar onde foi presa ou mantida a
vítima
Descrever as condições de detenção
Descrever a forma dos maus tratos
Descrever a resposta oficial sobre o
incidente
Para obter esses detalhes sem influir no
conteúdo da explicação, deve-se evitar formular perguntas que sugiram
as respostas; começar sempre com perguntas abertas ou gerais (pergunta
cuja resposta é ilimitada, por exemplo: "aconteceu alguma
coisa?" em vez de "sofreu torturas?") e tornar-se mais
específico em função da informação fornecida. (Ver estudo de caso)
Ter presente que os diferentes contextos
de entrevista podem exigir abordagens diferentes. (Ver texto principal
para maiores informações)
Provas
Ao apresentar uma denúncia, o objetivo
deve ser sempre o de proporcionar o maior número possível de provas
fundamentadas; isso ajuda a convencer outras pessoas da sinceridade
tanto do entrevistador quanto da vítima,e a dissipar todas as dúvidas
que o entrevistador ou outras pessoas possam ter sobre a veracidade da
denúncia. Além disso, trata-se de um requisito para certas ações,
sobretudo em procedimentos judiciais.
Formas habituais de provas:
Provas médicas: Físicas ou
psicológicas, ou ambas.
Uma declaração da pessoa que apresenta
a denúncia: Pode ser uma declaração escrita oficial ou um
questionário.
Prova testemunhal: Inclui testemunhas do
incidente real de tortura, da detenção da vítima, da condição
física da vítima, prévia ou posteriormente a qualquer período de
detenção, ou de comportamentos ameaçadores por parte das autoridades
antes da detenção da vítima. A melhor maneira de identificar
possíveis testemunhas é por meio de uma análise cronológica dos
fatos com a vítima, perguntando a ela quem, se é que havia alguém,
estava presente em cada etapa.
Outros tipos de provas podem incluir:
reportagens da mídia, relatórios de especialistas; declarações e
relatórios oficiais; qualquer prova de prática de tortura no país;
investigação específica; cópias de decisões nacionais,
administrativas e judiciais.
PARTE III - AÇÕES DIANTE DA
INFORMAÇÃO COLETADA
1. Introdução às Possíveis Linhas de
Ação
1.1. Ação no âmbito internacional
1.2. Ação no âmbito nacional
2. O Que se Deve Saber Sobre os
Mecanismos Internacionais de Denúncia e Como Utilizá-los
2.1. Que tipo de características gerais
deve ter seu comunicado?
2.2. Apresentação de informação a um
órgão de monitoramento: o que seu comunicado deveria incluir?
2.3. Apresentação de informação no
contexto do procedimento de relatório estatal
2.4. Apresentação de informação a um
órgão de apuração de fatos
3. O Que se Deve Saber Sobre os
Procedimentos Internacionais de Reclamação e Como Utilizá-los
3.1. O que se pode procurar conseguir com
os procedimentos de reclamação particular?
3.2. Quais tipos de reclamação os
procedimentos de reclamação particular podem examinar?
3.3. Como funcionam os procedimentos de
reclamação particular?
3.4. O que uma deve conter uma
requisição em um procedimento de reclamação particular?
3.5. Dicas práticas para utilização
dos procedimentos de reclamação particular
4. Mecanismos e Procedimentos: Nações
Unidas
4.1. Introdução ao sistema das Nações
Unidas
4.2. Mecanismos de denúncia no âmbito
do sistema das Nações Unidas
4.3. Procedimentos de reclamação no
âmbito do sistema das Nações Unidas
5. Mecanismos e Procedimentos: Esfera
Regional
5.1. O sistema europeu
5.2. O sistema interamericano
5.3. O sistema africano
5.4. Outras regiões
6. Tabelas de Avaliação Comparativa dos
Procedimentos Internacionais
7. Onde se Pode Obter Mais Ajuda?
7.1. Por que seria desejável obter mais
ajuda?
7.2. Fontes específicas de ajuda
1. INTRODUÇÃO ÀS POSSÍVEIS LINHAS DE
AÇÃO
Uma vez concluída a coleta da
informação bruta, será necessário pensar em selecionar o lugar mais
adequado para onde enviá-la e como apresentá-la do modo mais propício
a que se obtenha o resultado desejado. Este capítulo identifica e
avalia as possíveis linhas de ação e apresenta orientações sobre
como otimizar seu uso.
De um modo geral, seu ponto de partida
será buscar uma solução no âmbito do sistema nacional,
principalmente quando a informação estiver relacionada a um caso
particular. Por razões práticas, este manual se concentra na
obtenção de soluções jurídicas no âmbito do sistema internacional,
mas isso não significa que os recursos nacionais não devam ser usados.
Ao contrário, há muitas razões pelas quais eles deveriam ser usados
sempre que possível:
É importante fortalecer e consolidar as
instituições nacionais para se alcançar progresso no longo prazo na
situação de direitos humanos em um país.
Nos casos em que os recursos nacionais
são eficazes, eles geralmente identificarm satisfação mais imediata e
direta aos reclamantes do que os procedimentos internacionais, que podem
levar um longo tempo para chegar a uma conclusão.
Nos termos do direito internacional,
considera-se que os Estados deveriam ter uma oportunidade de reparar
qualquer violação de direitos humanos pela qual sejam responsáveis
antes de qualquer intervenção por parte dos organismos internacionais;
por conseqüência, os procedimentos internacionais de reclamação
particular geralmente exigem que tenham sido esgotados os recursos
nacionais (Ver Parte III, Capítulo 3.3.2.2 para uma explicação deste
requisito) antes de aceitarem examinar a reclamação.
É mais adequado iniciar uma ação no
âmbito internacional nos casos em que:
Os recursos nacionais são ineficazes ou
não podem proporcionar uma solução satisfatória em um caso
particular.
Seu objetivo é alertar a comunidade
internacional sobre a situação de direitos humanos em um país, tanto
em geral como em relação a aspectos específicos.
1.1. Ação no âmbito internacional
No âmbito internacional, é muito amplo
o conjunto de mecanismos aos quais se pode solicitar assistência com
relação a uma denúncia de tortura e outras formas de maus tratos.
Este manual - e, em particular esta parte do manual - concentra-se
nesses procedimentos internacionais aos quais é possível enviar
informação e cuja função consiste em comentar se um Estado respeitou
ou não suas obrigações relativas à tortura nos termos do direito
internacional. Isso se deve ao fato de que eles são responsáveis por
supervisionar a implementação do sistema internacional para a
proteção dos direitos humanos; é por meio desses procedimentos que
podem ser invocadas as obrigações de um Estado nos termos do direito
internacional para se obter uma resposta formal ou oficial às
denúncias de tortura e obter algum tipo de solução jurídica da
violação. No entanto, é importante não esquecer que também existem
fontes adicionais de assistência às quais é possível recorrer em
busca de assessoramento, apoio ou outras formas de assistência,
particularmente se o recorrente se sentir à vontade utilizando um
procedimento formal. Essas fontes de ajuda são comentadas na Parte III,
Capítulo 7.
1.1.1. Conjunto de procedimentos
internacionais
Existem muitas possibilidades de ação
no âmbito internacional. Existem mecanismos criados pelas Nações
Unidas que podem examinar a situação de países em todo o mundo.
Também existem outros mecanismos criados no âmbito de uma
organização regional que somente podem atuar com relação aos Estados
da respectiva região. Existem mecanismos que foram criados para
examinar somente questões relativas à tortura (específicos de
tortura) e outros que estão capacitados para examinar questões mais
gerais de direitos humanos, que incluem a tortura. As formas pelas quais
os mecanismos desempenham suas funções podem variar muito de um
mecanismo para outro. A melhor maneira de distinguir um organismo de
outro é considerar sua origem (isto é, como foram criados) e suas
funções.
1.1.1.1. Origem do mecanismo
Nem todos os mecanismos podem ser
utilizados com cada país. A origem do mecanismo é importante porque
indica sobre quais países é possível receber acusações. A principal
diferença reside entre organismos de tratados e mecanismos que não
são de tratados.
Os organismos de tratados são aqueles
criados por um acordo juridicamente vinculante entre Estados, a exemplo
de um contrato. Esse tipo de acordo geralmente é denominado tratado,
mas também pode receber outros nomes, tais como convenção, pacto ou
carta. Os organismos de tratados são constituídos para supervisionar o
cumprimento de um acordo por parte dos Estados que dele são parte (isto
é, os que acordaram respeitá-lo). A Convenção das Nações Unidas
contra a Tortura, por exemplo, estabelece uma série de obrigações que
os Estados Parte devem respeitar, e também criou um organismo de
supervisão chamado Comitê contra a Tortura, cuja tarefa consiste em
comprovar que essas obrigações são respeitadas. O aspecto mais
importante que se deve ter presente é que se alguém deseja enviar uma
denúncia de tortura a um organismo de tratado, a primeira coisa que se
deve fazer é certificar-se de que o país sobre o qual se apresenta a
denúncia é parte do respectivo tratado. Uma vez que o organismo de
tratado foi criado mediante acordo, ele não pode examinar a situação
de Estados que não são parte desse acordo.
Os mecanismos que não são de tratados
são aqueles que não são constituídos com o objetivo específico de
supervisionar um determinado tratado. Podem ser um organismo político
constituído por representantes estatais, como a Comissão das Nações
Unidas sobre os Direitos Humanos, ou ainda mecanismos criados por uma
resolução (decisão oficial, normalmente adotada por voto) desses
órgãos políticos. Isso significa que o mecanismo tem automaticamente
o poder de examinar a situação dos Estados que integram o respectivo
organismo intergovernamental, sem a necessidade de esses Estados darem
seu acordo por escrito. A Comissão da ONU sobre Direitos Humanos, por
exemplo, criou a figura do Relator Especial sobre Tortura mediante uma
resolução. Isso significa que o Relator Especial pode examinar e
receber denúncias de qualquer Estado Membro das Nações Unidas. Como
se pode ver, os organismos que não são de tratados podem receber
denúncias de mais Estados porque não se limitam àqueles que firmaram
um acordo especial.
A origem do mecanismo também pode
limitar, de outra maneira, os Estados que podem ser supervisionados.
Quando um organismo é criado no contexto de uma organização
intergovernamental, normalmente ele se destina a aplicação somente aos
Estados que integram essa organização. Esse critério também vale
para os mecanismos de tratados e para os mecanismos que não são de
tratados. Isso significa que:
Quando uma organização
intergovernamental for regional, isso geralmente limitará o trabalho do
mecanismo para os Estados dessa região. Por exemplo, somente os Estados
Membros da OEA podem ser parte da Convenção Americana de Direitos
Humanos e aceitar a supervisão do Tribunal Interamericano de Direitos
Humanos. A única exceção seria se os Estados que instituíram o
mecanismo acordassem possibilitar que Estados de fora da organização
ou da região se tornassem partes, como poderá em breve acontecer no
âmbito da Convenção Européia para a Prevenção da Tortura.
Quando um mecanismo é criado no contexto
de uma organização mundial, como as Nações Unidas, ele está aberto
a qualquer Estado Membro da organização em todo o mundo. No caso da
ONU isso equivale a praticamente quase todos os países do mundo.
1.1.1.2. Funções do mecanismo
Muitos dos organismos descritos neste
manual desempenham mais de uma função. Não se deve pensar que recebem
somente denúncias particulares. Muitos dos mecanismos também foram
concebidos para tratar de uma situação mais ampla a fim de, em última
instância, gerar efeitos preventivos. É importante compreender as
diferenças entre as várias funções porque cada um responde a
diferentes formas de informação e proporciona diferentes tipos de
soluções. Assim sendo, é preciso certificar-se de que, por um lado,
sua informação esteja em uma forma à qual o mecanismo pode responder
e que, por outro lado, o mecanismo pode proporcionar-lhe o tipo de
solução desejada. As principais funções dos mecanismos podem ser
divididas, em linhas gerais, em dois tipos: funções de elaboração de
relatórios e procedimentos de reclamação.
As funções de elaboração de
relatórios compreendem:
Consideração dos relatórios estatais:
Certos organismos de tratados recebem e analisam relatórios elaborados
pelos Estados Parte sobre a situação em seu país e o modo como têm
procurado efetivar suas obrigações assumidas no tratado. O organismo
de tratado, em seguida, apresenta seus comentários sobre o relatório e
emite recomendações com vistas a melhorar a situação. Esses
comentários e recomendações geralmente são de natureza pública.
Monitoramento: Certos mecanismos de
tratados e mecanismos que não são de tratados podem se ocupar das
funções de monitoramento, muitas vezes de um ponto de vista
especifico. Pode ser tanto a situação mundial como regional no que se
refere a uma questão específica, por exemplo, a tortura ou violência
contra mulheres, ou a situação geral de direitos humanos em
determinado país. Normalmente, isso envolve o recebimento e a análise
de informação sobre denúncias particulares e gerais para se poder
elaborar um relatório sobre a situação.
Apuração dos fatos: Certos mecanismos
de tratados e mecanismos que não são de tratados também podem
desempenhar uma função de apuração de fatos e podem visitar países,
periodicamente ou atendendo a circunstâncias específicas de cada caso,
quando se considerar que constituem motivo de preocupação.
Os procedimentos de reclamação
compreendem:
Recebimento e processamento de
reclamações particulares: Essa é uma função desempenhada unicamente
pelos organismos de tratados. Ao contrário da função apresentação
de relatórios, em que também podem ser recebidas denúncias
particulares, embora seja usada essencialmente como meio para se
compreender uma situação mais geral, um procedimento de reclamação
é um processo judicial ou comparável a um litígio. O foco da
atenção incide na denúncia particular propriamente dita e seu
objetivo é demonstrar que um Estado violou os direitos humanos de uma
pessoa ou pessoas nos termos do tratado aplicável. É como levar um
caso perante um tribunal: trata-se de um processo formal que funciona
segundo um procedimento definido a ser seguido.
Recebimento e processamento de
reclamações interestatais: De acordo com este procedimento, os Estados
podem apresentar reclamações contra outros Estados, denunciando
violações de seus compromissos ou suas obrigações de direitos
humanos. Esta função pode ser desempenhada tanto por organismos de
tratados como por outros que não sejam de tratados. Este manual não
discute este tipo de procedimento de reclamação porque normalmente ele
não permite a participação de uma ONG.
Tabela 1: Resumo de Mecanismos
Internacionais – Por Origem e Função
Mecanismo
Origem
Funções
Tratado
Não-tratado
Regional
Mundial
Elaboração de Relatórios
Reclamações Particulares
Relatórios
Estatais
Monitora-mento
Apuração dos Fatos
Opcional
Obriga-
tório
Comitê Contra a Tortura
Ö
Nações Unidas
Ö
?*
Ö
Ö
Comitê de Direitos Humanos
Ö
Nações Unidas
Ö
Ö
Comitê dos Direitos da Criança
Ö
Nações Unidas
Ö
?*
Comitê para a Eliminação da
Discriminação contra a Mulher
Ö
Nações Unidas
Ö
?*
Comitê para a Eliminação da
Discriminação Racial
Ö
Nações Unidas
Ö
Ö
Relatores Especiais da Comissão da ONU
sobre Direitos Humanos
Ö
Nações Unidas
Ö
Ö
Procedimento 1503
Ö
Nações Unidas
Ö
Tribunal Europeu de Direitos Humanos
Ö
Conselho da Europa
Ö
Comitê Europeu para a Prevenção da
Tortura
Ö
Conselho da Europa (Ver nota 1)
Ö
Ö
Comissão Interamericana de Direitos
Humanos
Ö
Organização dos Estados Americanos
Ö
Ö
Ö
Tribunal Interamericano de Direitos
Humanos
Ö
Organização dos Estados Americanos
Ö
Comissão Africana de Direitos Humanos e
dos Povos
Ö
Organização da Unidade Africana
Ö
Ö
Ö
Ö
Nota 1: É possível que num futuro
próximo seja adotado um protocolo do Comitê Europeu para a Prevenção
da Tortura, o que possibilitará que Estados que não integram o
Conselho da Europa sejam parte da convenção.
Nota ?*: Essas funções estarão ou
poderão estar disponíveis para esses mecanismos em um futuro próximo.
Ver os comentários específicos sobre cada mecanismo para maiores
detalhes.
1.1.2. Como selecionar um procedimento
internacional
A fim de selecionar um procedimento
dentre os vários existentes no âmbito internacional, deve se
considerar:
DISPONIBILIDADE: quais mecanismos lhe
estão abertos?
ADEQUAÇÃO: quais mecanismos são os
mais adequados a seus objetivos?
1.1.2.1. Disponibilidade: quais
mecanismos lhe estão abertos?
Isso dependerá do país sobre o qual se
tem informação.
Conforme discutido acima, os mecanismos
da ONU que não são de tratados poderão se aplicar a todos os países
do mundo, sem que para isso seja necessário seu consentimento. No
entanto, os organismos regionais ou da ONU que foram criados por tratado
são, por lei, aplicáveis somente aos Estados que se obrigaram a esse
tratado. No caso dos organismos regionais, normalmente o mecanismo será
limitado aos Estados da região.
Além disso, alguns dos tratados que
estabelecem procedimentos de reclamação particular tornam esses
procedimentos facultativos para os Estados Parte. Nesses casos, para que
o procedimento de reclamação particular esteja disponível com
relação a um determinado Estado, não é suficiente que esse Estado
seja parte do tratado: ele deve, além disso, dar seu consentimento
expresso ao procedimento. Isso significa que um Estado pode ser parte de
um tratado que estabelece um procedimento de reclamação particular mas
não permitir essas reclamações contra si mesmo.
Ademais, quando de sua adesão como parte
de um tratado, os Estados geralmente têm a oportunidade de expressar
uma reserva ao tratado. Uma reserva significa que o Estado não aceita
os termos exatos do tratado, mas modifica uma ou mais de suas
disposições como condição para aceitar o tratado. Deve-se sempre
certificar não só que um Estado é parte do tratado, mas também se o
Estado em questão fez alguma reserva que possa ser relevante para o
caso.
Isso significa que, a fim de identificar
quais mecanismos aceitarão informação sobre um determinado país, é
necessário formular as seguintes perguntas:
O mecanismo foi criado por tratado
específico?
Em caso afirmativo:
O país é parte desse tratado? Se o for,
o mecanismo aceitará a informação. Se não for, o mecanismo
normalmente não poderá responder à informação.
Se existe um procedimento de reclamação
particular, o país aceitou esse procedimento? Caso tenha aceitado, o
mecanismo pode examinar reclamações particulares a seu respeito. Caso
não tenha aceitado, o mecanismo pode receber informação sobre o país
no exercício de suas demais funções, mas não pode ativar o
procedimento de reclamação particular.
O Estado expressou alguma reserva ao
tratado que possa modificar sua aplicação em seu caso?
Em caso negativo: Normalmente isso
significará que o mecanismo foi constituído por uma organização
intergovernamental.
O país é integrante dessa organização
intergovernamental? Se o for, o mecanismo aceitará a informação.
Lembre-se de que os mecanismos das Nações Unidas que não são de
tratados, em princípio, aceitarão informação sobre qualquer país do
mundo.
1.1.2.2. Adequação: quais mecanismos
são os mais adequados a seus objetivos?
Uma vez identificados os mecanismos que
lhe estão disponíveis, será preciso decidir o que se pretende
conseguir apresentando a informação, a fim de selecionar o mecanismo
ou mecanismos que têm mais probabilidade de alcançar seus objetivos.
Siga as considerações abaixo como orientação geral:
Tabela 2: Adequação dos Tipos de
Mecanismos a Objetivos Possíveis
Objetivo possível
Tipo de mecanismo com mais probabilidades de êxito
Objetivos gerais:
Chamar a atenção para uma situação/ demonstrar um padrão
Qualquer mecanismo de elaboração de relatórios ou procedimento de
reclamação
Buscar mudanças positivas em uma
situação general
Qualquer mecanismo de elaboração de relatório ou procedimento de
reclamação
Combater a impunidade
Qualquer mecanismo de elaboração de relatório ou procedimento de
reclamação
Objetivos particulares:
Constatação de uma violação
Qualquer procedimento de reclamação
Responsabilizar o torturador
Qualquer procedimento de reclamação; mecanismo de elaboração de
relatórios que se ocupe de denúncias particulares
Reparação
Procedimentos de reclamação que podem conceder reparações
Impedimento da deportação de uma pessoa
para um país onde se acredita que ela corre risco de sofrer torturas
Procedimentos de reclamação que podem ordenar ou recomendar medidas
provisórias; mecanismos de elaboração de relatórios que se ocupam de
denúncias particulares
1.2. Ação no âmbito nacional
Existem tantas variações dentre os
recursos nacionais, sua natureza exata, forma e procedimentos
aplicáveis quantos países no mundo. Este manual não poderia se propor
a descrever todos eles exaustivamente sem incluir muitos mais volumes.
Por essa razão, esta parte do manual apresentará apenas algumas das
linhas de ação que têm mais probabilidade de êxito no âmbito do
sistema nacional, a fim de fomentar a consciência sobre sua
existência. No entanto, aconselhamos enfaticamente o leitor a consultar
um advogado nacional ou uma ONG nacional com mais experiência para
obter maiores informações sobre os recursos atualmente disponíveis em
um determinado país, bem como a viabilidade prática de seu uso.
As possíveis ações no âmbito nacional
incluem:
1.2.1. Processos penais
Uma pessoa que denuncia ter sido
submetida a maus tratos por parte de um representante público
geralmente pode instaurar um processo penal apresentando uma denúncia
à polícia, ao Ministério Público da localidade ou a um tribunal
local. Em muitos sistemas jurídicos nacionais, a instauração de um
processo somente se dará se o Ministério Público decidir que assim é
apropriado, e uma vítima não pode ajuizar uma ação diretamente. O
leitor deverá consultar um advogado nacional para saber exatamente como
funciona o processo no sistema do país. O objetivo de um processo penal
é a punição do infrator, não a indenização da vítima, e as
possíveis soluções jurídicas incluem a condenação do perpetrador
de torturas a uma multa, liberdade condicional ou prisão.
O pessoal militar geralmente pode ser
processado da mesma forma que qualquer outro representante oficial, mas
também pode estar sujeito unicamente à disciplina militar interna,
como, por exemplo, a responsabilidade de um conselho de guerra
(julgamento de pessoal militar perante um tribunal militar que aplica a
legislação militar). Os processos de conselhos de guerra somente podem
ser instaurados no âmbito interno à corporação, mas alguém que
denuncia torturas ou maus tratos por parte de um integrante do exército
poderia apresentar uma requisição ao oficial superior, que, em um
mundo ideal, estaria em condições de iniciar uma investigação. Não
se pode ignorar o fato de que em um país onde o exército está no
poder, o mais provável é que não se realize qualquer investigação,
ou que a investigação se mostre ineficaz. No entanto, se o oficial
superior não iniciar a investigação de uma denúncia de torturas em
conformidade com a legislação militar, isso poderia caracterizar
omissão da responsabilidade de investigar uma denúncia, bem como
tolerância oficial da tortura, de modo que convém ter presente este
meio de investigação, inclusive se a vítima não puder iniciá-lo
diretamente. Tal situação constitui igualmente uma violação do
direito internacional de conflito armado (Ver Parte I, Capítulo 3.6),
uma vez que é responsabilidade dos comandos investigar os casos de
descumprimento das leis de guerra por parte de seus subordinados.
1.2.2. Processos civis
O processo civil deve fundamentar-se nas
disposições de um código nacional de obrigações, em algum tipo de
legislação ou no direito consuetudinário. Essas disposições tratam
de diversas questões, porém todas elas constituem uma forma de
violação do dever geral que toda pessoa deve exercer em suas
relações com as demais. De um modo geral, os processos civis são um
recurso utilizado por pessoas que querem obter uma compensação,
geralmente econômica, da pessoa responsável. Os processos são de
natureza judicial e tramitam nos tribunais ordinários.
1.2.3. Processos administrativos
Entre os exemplos de recursos
administrativos que podem ser importantes para uma vítima de tortura
inclui-se um requerimento dirigido a uma comissão de compensação
criada para proporcionar compensação a vítimas de crimes violentos,
ou uma requisição a uma autoridade de reclamação ou ouvidoria
policial. Os processos administrativos não se dão necessariamente
perante um juiz ordinário. Muitas vezes envolvem a tomada de decisão
por parte de tribunais especializados ou oficiais que têm conhecimentos
especiais ou a responsabilidade jurisdicional por uma determinada
matéria.
1.2.4. Processos disciplinares
Para od fins deste manual, os processos
disciplinares relevantes são os da polícia, do exército, de outras
divisões das forças de segurança e os da administração estatal.
Trata-se de processos não-judiciais nos quais um caso é examinado por
um superior ou superiores dos representantes públicos. Da mesma forma
que com os processos militares, uma pessoa que denuncia torturas pode
protocolar uma reclamação, porém a decisão de instaurar
sindicâncias só pode ser tomada internamente. Os tipos de sanções
que podem ser impostas em processos disciplinares normalmente estão
relacionadas ao trabalho e podem incluir a retenção de remuneração,
suspensão temporária do emprego, transferência para outro posto de
trabalho ou mesmo a demissão.
1.2.5. Pedidos de asilo
A natureza geral do processo de asilo
consiste em identificar as pessoas que têm um temor fundado de que
serão perseguidas se regressarem para um determinado país, que em
geral é o país de sua nacionalidade. Nos termos da legislação geral
sobre direitos humanos e de refugiados, os Estados têm a obrigação de
não enviar essas pessoas de volta a tal país. Em muitos casos, a base
para se demonstrar a possibilidade de perseguição consistirá em
demonstrar que essas pessoas correm risco de tortura. Além disso, os
Estados Parte da Convenção contra a Tortura obrigam-se, nos termos da
legislação de direitos humanos, a não expulsar uma pessoa para um
país onde se acredita que ela correrá risco de tortura.
Em tais casos, o objetivo não será
demonstrar que o Estado no qual se encontra uma pessoa é responsável
por um incidente de tortura, mas sim demonstrar que existe um risco se
ela for deportada, a fim de se ativar a obrigação do Estado de não
expulsar a pessoa. Os requisitos específicos podem variar de um país
para outro, mas, como regra geral, será necessário demonstrar que:
A pessoa corre risco pessoal de tortura
(isto é, não só que a tortura é praticada naquele país)
Que o risco persiste (isto é, não só
que existiu o risco, mas que o risco ainda existe)
Quando o risco de tortura se originar de
agentes não-governamentais, pode ser mais difícil comprová-lo, mas
existe uma corrente a favor de se colocar esse risco na mesma categoria
que o risco proveniente dos agentes estatais para fins do processo de
asilo (Ver Parte I, Capítulo 3.6).
Se a solicitação de asilo for
indeferida e se for fixada uma data para a deportação, deve-se ter
presente que existe uma série de mecanismos que podem adotar medidas
provisórias, tais como uma petição ao governo para adiar a
deportação até que o caso tenha sido considerado. O Relator Especial
contra a Tortura também interveio algumas vezes nesses casos, enviando
uma apelação urgente. Nenhuma dessas petições tem caráter
vinculante, mas elas dão a um Estado respeitável um bom tema para
reflexão e geralmente são atendidas, pelo menos temporariamente.
1.2.6. Recursos extraordinários
Em muitos países, existem recursos
extraordinários aos quais as pessoas privadas de liberdade têm direito
para questionar a legalidade de sua detenção perante uma autoridade
judicial que tenha poder de ordenar sua liberdade. Algumas dessas
figuras são o habeas corpus e o amparo. Essas soluções jurídicas
podem ser iniciadas mediante uma petição a um tribunal, por parte dos
próprios indivíduos interessados ou, se possível, por parte de outra
pessoa que atue em seu nome. Em alguns sistemas, pode ser necessária a
intervenção de um advogado. Essas petições geralmente podem ser
feitas em qualquer momento e devem ter prioridade sobre outras questões
do tribunal. Nos termos da legislação internacional de direitos
humanos, esses recursos devem poder ser utilizados a qualquer momento,
inclusive durante estados de emergência. São particularmente
importantes quando uma pessoa está detida em condições de
incomunicabilidade, situação considerada como de maior risco de
tortura.
Quando se entende que uma pessoa corre
risco de tortura durante um interrogatório, também é possível
recorrer a um tribunal para um mandado de segurança (uma ordem judicial
para que alguém se abstenha de um determinado tipo de conduta) perante
os representantes públicos cabíveis.
1.2.7. Outros procedimentos
Em alguns países podem existir órgãos
oficiais especializados cujo único objetivo é examinar ou investigar
possíveis violações dos direitos humanos. Alguns deles, como as
instituições de ouvidoria pública e comissões nacionais de direitos
humanos, ocupam-se das violações atuais, ao passo que outros, como as
comissões da verdade, têm por missão específica a investigação de
crimes de um determinado período do passado. Os procedimentos e poderes
específicos mudam de um órgão para outro, mas normalmente podem ser
encontrados na lei que dispôs sobre sua criação. Alguns podem decidir
sobre casos particulares (certas comissões nacionais de direitos
humanos), enquanto outros podem se ocupar mais de uma situação geral
(comissões da verdade). Nem todos esses órgãos são tão eficazes e
independentes como deveriam ser.
2. O QUE SE DEVE SABER SOBRE OS
MECANISMOS INTERNACIONAis de denúncia E COMO USÁ-LOS
O termo "mecanismo de
denúncia" é empregado no texto para designar:
Qualquer mecanismo internacional que
recebe ou busca informação, ou ambas as coisas, para informar ou
comentar se um Estado respeita suas obrigações assumidas nos termos da
legislação internacional de direitos humanos. A informação que o
mecanismo de denúncia recebe pode estar relacionada a acusações
gerais e particulares, mas o objetivo final é obter um retrato preciso
da situação geral e fazer recomendações.
O objetivo principal dos mecanismos de
denúncia é monitorar e avaliar o cumprimento, por parte dos Estados,
para com suas obrigações segundo a legislação internacional de
direitos humanos.
O que podem fazer?
Receber e coletar informações dos
Estados e de terceiras partes para informar sobre a situação em um
Estado (Monitoramento)
Examinar e comentar relatórios
elaborados pelos próprios Estados e fazer recomendações para melhorar
a situação (Consideração dos relatórios estatais)
Realizar visitas de investigação aos
Estados (Apuração dos fatos)
O que não podem fazer?:
Adotar decisões juridicamente
vinculantes
Conceder reparações às vítimas
A informação prática geral relacionada
a cada uma dessas funções é examinada a seguir. No entanto, existe
muita variação quanto aos métodos e poderes dos diferentes
mecanismos, e todas as peculiaridades serão observadas durante a
análise dos mecanismos correspondentes na Parte III, Capítulos 4 e 5.
2.1. Que tipo de características gerais
deve ter seu comunicado?
Os mecanismos de denúncia recebem
muitíssimas informações que carecem de um grande número de fontes,
boa parte das quais é de qualidade duvidosa ou não possui o grau de
detalhamento preciso para que sejam úteis. A melhor maneira de se
garantir que sua informação se sobressaia dentre as demais é
certificando-se de que seu comunicado é:
Acessível
Equilibrado
Crível
2.1.1. Acessível
É possível fazer com que a sua
denúncia seja acessível prestando atenção ao idioma utilizado e à
extensão da apresentação.
Idioma:
A maioria das organizações
internacionais distingue entre idiomas oficiais e idiomas de trabalho.
Como regra geral, ainda que os comunicados possam ser redigidos nos
idiomas oficiais, a maioria dos integrantes da organização poderá
trabalhar somente com os idiomas de trabalho. Ao mesmo tempo, muitas das
organizações dispõem de recursos limitados, o que significa que a
tradução nem sempre é uma prioridade, sobretudo se não se souber do
comunicado.
Para que seu comunicado receba a máxima
consideração, deve-se fazer todo o possível para apresentar seu
comunicado em um idioma de trabalho (especificados para cada
organização na Parte III, Capítulos 4 e 5); isso não significa que
devam ser traduzidos todos os documentos de apoio, mas que sua carta
introdutória deve ser redigida em um desses idiomas e que ela deve
indicar claramente o conteúdo de cada um dos documentos anexados. Se
não for possível fazê-lo, deve-se, pelo menos, apresentar um breve
resumo em um idioma de trabalho que indique os elementos essenciais da
informação ou reclamação. O que é essencial dependerá do
procedimento, mas, como regra geral, deve-se indicar:
1. A quem é dirigido o documento
p. ex. Relator Especial contra a Tortura
p. ex. Comitê contra a Tortura
2. Sua identificação
p. ex. ONG que trabalha com meninos e
meninas de rua
p. ex. ONG que trabalha com pessoas que
pedem asilo
3. Qual país está sendo denunciado
4. O objetivo ou conteúdo de sua
informação e se é necessário tomar medidas urgentes
p. ex. 10 acusações de tortura de
meninos/ meninas de rua, indicando o padrão de maus tratos cometidos
contra as vítimas por parte da polícia. Os maus tratos incluem
espancamentos, estupro e simiulação de execuções.
p. ex. Violação do Artigo 3 da CCT. A
Sra. Y será deportada para o país X, onde é provável que sofra
torturas. Sofreu várias torturas 8 meses antes de sair do país
(inclusive choques elétricos e espancamentos, o que lhe causou uma
fratura craniana; anexo o laudo médico) e seu irmão ainda está no
país e foi preso recentemente e interrogado a respeito da reclamante.
Deportação prevista para ……. (data) - URGENTE.
Não suponha que o pessoal que receber
sua denúncia possui conhecimentos especializados; é importante que
eles compreendam o que você está apresentando e os termos que para
você podem parecer simples, talvez não sejam compreendidos fora de seu
país. Certifique-se de que sempre seja usada uma linguagem simples e
explique os termos especializados. Evite, em particular, o uso de
abreviaturas e siglas, a menos que sejam explicadas.
Extensão das apresentações:
Em geral, as apresentações não
precisam ter uma extensão especificada, mas ao preparar seu comunicado,
tenha presente as limitações do quadro de pessoal e do tempo
disponíveis. Isso significa que ele não deve ser mais longo do que o
necessário e, se exceder 8 a 10 páginas, apresente um resumo dos
aspectos essenciais de modo que o pessoal possa facilmente ver se ele é
útil.
2.1.2. Equilibrado e crível
É possível fazer com que sua
apresentação seja equilibrada e crível apresentando-se e evitando
alegações sensacionalistas.
Apresente-se:
A resposta que sua apresentação obtiver
dependerá muito da impressão que se der de sua organização, sua
confiabilidade e seus motivos para enviar a informação. É muito
melhor falar dessas questões diretamente em vez de deixá-las para a
imaginação do funcionário do organismo que ler o comunicado. É
importante criar uma boa reputação você e para sua organização, de
modo que, com o tempo, vocês se tornem uma fonte em que o organismo
confia.
Se você não tiver se apresentado
anteriormente a uma organização, é possível começar explicando seu
mandato: faça-o no próprio comunicado ou, melhor ainda, inclua uma
cópia de seus estatutos ou de um relatório anual que contenha boas
indicações sobre suas atividades. Se for filiado a uma ONG
internacional, registre o fato: isso proporciona um meio simples de se
verificar suas credenciais. Lembre-se de explicar não só suas
atividades, mas também seu propósito e objetivos. Em se tratando de
uma organização de orientação política, faça a menção: isso
ajudará a contextualizar sua informação e também a demonstrar que
não há nada a esconder. Explique seus métodos de trabalho: como é
coletada sua informação? É informação de primeira mão ou foi
obtida de se ouvir falar ou de matérias publicadas na imprensa? O
objetivo é incluir toda informação que ajude o mecanismo a formar uma
impressão exata de sua organização e da qualidade de sua
informação.
Seja objetivo:
Certifique-se sempre de que sua
apresentação da informação seja equilibrada. Uma opinião objetiva e
equilibrada de uma situação fará com que seu comunicado seja muito
mais passível de credibilidade e demonstra que o interesse de quem
apresenta a informação é apresentar a situação real, em vez de
apenas um ponto de vista. Ainda que seja normal que a informação
pareça um tanto parcial quando se trata de demonstrar um padrão
sistemático de violação, é importante apresentá-la em um contexto
objetivo. Explique cuidadosamente as circunstâncias antecedentes, de
modo que não se possa pensar que a informação foi colocada fora de
contexto (Ver Parte III, Capítulo 2.2.1 para uma indicação do tipo de
detalhes que se pode incluir). Isso inspira confiança no material e
significa que a próxima vez que sua organização enviar uma
informação, será reconhecido que ela provém de uma organização que
no passado demonstrou sua credibilidade.
Evite reclamações sensacionalistas:
É provável que o uso de uma linguagem
sensacionalista ou descrições dramáticas seja prejudicial a sua
apresentação. Os mecanismos internacionais recebem muitos comunicados
repletos de alegações sensacionalistas que não contêm fatos nem
substância. Um comunicado equilibrado e informativo, respaldado por
exemplos, vai se sobressair dentre as muitas outras denúncias
infundadas e receberá muito mais atenção.
2.1.3. Detalhado
Para que sua apresentação seja
detalhada não é necessário que ela seja longa: é preciso que seja
informativa. Deve-se apresentar informações suficientes para que um
organismo internacional possa extrair suas próprias conclusões sobre a
prática da tortura ou de maus tratos, ao mesmo em que seja o mais
conciso e breve possível.
É preciso certificar-se de que os
detalhes incluídos são relevantes, isto é, que ajudam a corroborar
sua denúncia. Materiais extensos nos quais a denúncia está muito
"enterrada" e deve ser extraída dificultam o trabalho dos
organismos internacionais, da mesma forma que as grandes quantidades de
informação geral com poucos detalhes precisos. Concentre-se na
inclusão de todos os detalhes possíveis relacionados às denúncias
propriamente ditas, e seja breve com o material geral, embora
informativo: é preciso documentar esse material geral para se
estabelecer o contexto, mas ele não deve predominar ou ser o centro da
atenção do comunicado.
2.2. Apresentação de informação a um
órgão de monitoramento: o que seu comunicado deve conter?
O conteúdo de seu comunicado variará um
pouco em função daquilo que se procura provar. No entanto, é
possível seguir as orientações abaixo sobre o que se deve incluir.
2.2.1. Envio de informação geral a um
órgão de monitoramento
Ao enviar informação geral a um
mecanismo de denúncia, procure estabelecer o contexto e demonstrar
padrões.
Estabelecer o contexto: É muito difícil
para qualquer mecanismo ter uma idéia clara dos problemas de um país
ou fazer recomendações úteis se ele não tiver um bom entendimento do
contexto em que estão ocorrendo esses problemas. É de grande valia um
resumo objetivo da situação geral no país. Isso não significa fazer
afirmações generalizantes, acusando o Estado de violações
generalizadas dos direitos humanos; significa explicar brevemente as
condições presentes no país que podem afetar o respeito do Estado a
suas obrigações de prevenir a tortura. Os fatores relevantes são:
Os principais grupos políticos e sua
respectiva situação, inclusive qualquer controvérsia sobre a chegada
ao poder do atual governo e as principais rivalidades.
Quaisquer tensões entre grupos étnicos,
sociais ou religiosos.
A existência de um conflito armado e as
partes envolvidas.
A estrutura e os poderes das forças de
segurança e militares, principalmente se as forças armadas estiverem
no controle.
Costumes, práticas e crenças
tradicionais relevantes.
O quadro jurídico, em particular
quaisquer leis que conferem poderes especiais, por exemplo, leis
anti-terrorismo e outras leis relevantes.
O objetivo é incluir os fatos que
alguém de fora precisa saber para compreender o que está acontecendo
no país.
Demonstrar padrões: Em comparação com
as denúncias particulares, que dizem respeito aos resultados de um caso
específico, a informação geral deve esboçar um panorama geral da
prática da tortura em um país ou identificar um aspecto específico
dessa prática.
Para demonstrar um padrão, não basta:
Fornecer uma lista de alguns casos
particulares.
Fazer afirmações não-corroboradas
sobre a prática da tortura em um país.
Ao contrário, é necessário:
Utilizar todos os exemplos possíveis.
Analisar as denúncias particulares a fim
de identificar padrões.
Por exemplo, se for constatado que muitas
de suas denúncias estão relacionadas com a aplicação de choques
elétricos em todo um país ou à violação de mulheres detidas em uma
determinada delegacia de polícia, pode-se indicar que as acusações,
em seu conjunto, corroboram um padrão: a aplicação de choques
elétricos como método habitual de tortura, ou o estupro de mulheres em
uma determinada delegacia de polícia.
Outros padrões aparentes que poderiam
ser relevantes incluem uma alta coincidência de torturas e outras
formas de maus tratos entre suspeitos detidos a força com base em uma
determinada lei que permite a detenção em condições de
incomunicabilidade, uma alta incidência de tortura entre detentos de
uma determinado grupo étnico ou social, a não-instauração de
processos judiciais contra autoridades acusadas de atos de tortura, um
elevado índice de mortes não-explicadas durante a detenção, ou
relatos generalizados da tortura de mulheres ou crianças.
O objetivo é demonstrar que certas
formas de tortura, ou comportamento que favorece a tortura, não se
limitam a uns poucos incidentes isolados, mas ocorrem com freqüência.
Ao apresentar suas constatações sobre
os padrões identificados, será melhor:
Em primeiro lugar, resuma todos os
padrões identificados.
Em seguida, tome cada afirmação uma a
uma e explique-a em termos gerais.
Após cada afirmação, apresente todos
os exemplos possíveis para corroborar sua afirmação.
Tabela 3: Lista de Verificação para
Apresentação de Informação Geral a um Mecanismo de Denúncia
LISTA DE VERIFICAÇÃO: Apresentação de
informação geral a um mecanismo de denúncia
Sua apresentação compreende:
Uma breve introdução sobre os objetivos e métodos de trabalho de sua
organização?
Um resumo do contexto em que se dão as
acusações, particularmente o arcabouço jurídico?
Uma apresentação de todos os padrões
de violação identificáveis?
Tantos exemplos detalhados quantos
possíveis? (Ver Parte III, Capítulo 2.2.2 para orientações sobre a
informação a ser incluída em cada denúncia particular)
Toda a documentação de apoio
disponível?
Uma relação das pessoas ou
organizações locais que podem ser contatadas para se obter
informação sobre o país em questão?
2.2.2. Envio de uma denúncia particular
a um órgão de monitoramento
Se você deseja enviar informação sobre
uma denúncia particular a um mecanismo de denúncia, deve incluir, no
mínimo, o seguinte sempre que possível:
Nome da vítima: Deve incluir nome e
sobrenome, a menos que o costume local seja usar somente um nome. O
objetivo é a identificação: se o nome é muito comum, é necessário
dar outros detalhes, tais como o endereço ou o local de domicílio,
idade, sexo ou profissão. Esses detalhes sempre são valiosos e devem
ser fornecidos, se conhecidos. A maioria dos mecanismos não pode tomar
medidas em nome de uma pessoa não-identificada, que normalmente é uma
pessoa com nome e sobrenome. A única exceção na qual os nomes não
são necessários seria quando se tratar claramente de um grupo
identificável - por exemplo, um grupo de 50 estudantes presos após uma
manifestação em frente à prefeitura da cidade X no dia 19 de novembro
de 1999 - , porém, se disponíveis, os nomes sempre devem ser
incluídos.
Data do incidente: Deve ser muito precisa
e incluir tanto a data de detenção pelos representantes oficiais como
a de todos os incidentes de tortura, se forem diferentes. As datas são
importantes porque ajudam a entender a seqüência dos fatos. Quando se
sabe o momento do dia (hora exata ou se ocorreu pela manhã ou tarde)
essa informação pode ser de grande ajuda.
Local do incidente: Deve incluir o nome
da cidade, povoado ou distrito local e o nome do Estado ou região,
quando pertinente. Certifique-se de incluir o lugar de todos os
incidentes de tortura e outros maus tratos, que podem incluir mais de um
lugar se ocorreram vários incidentes, bem como o lugar da detenção,
se for diferente.
Suposto(s) torturador(es): Deve incluir o
nome e o posto ou a graduação do torturador, se conhecidos, mas pelo
menos a força de segurança ou a força armada envolvida ou a delegacia
de polícia em que trabalha. Muitas vezes é possível identificar o
grupo envolvido por sua farda. Lembre-se que o torturador precisa ter
uma relação com o Estado: em uma área em que se sabe serem
freqüentes as detenções por parte de militares ou policiais à
paisana, talvez não seja necessário citar o nome dos autores, uma vez
que será possível extrair uma sólida dedução a partir das
circunstâncias que cercam o caso. Ver Parte I, Capítulo 3.6 para uma
análise sobre o que fazer se a acusação estiver relacionada a agentes
governamentais.
Detalhes do tratamento sofrido: Evite
utilizar o termo "tortura" ou "torturado" sem
descrever o tratamento. Nem todos os incidentes de tratamento
desagradáveis são tão graves que constituem tortura em termos
jurídicos, ainda que você creia firmemente ser esse o caso. A melhor
abordagem é descrever o tratamento com todos os detalhes possíveis.
Dessa maneira, o organismo internacional poderá determinar por si mesmo
se ocorreu tortura no sentido jurídico. Quando a tortura foi física,
devem ser incluídas descrições do tratamento, de todos os
instrumentos utilizados, das partes do corpo nas quais foi innfligido o
tratamento e todas as lesões sofridas. Por exemplo, em lugar de dizer
que "o Sr. X foi espancado", que pode significar muitas
coisas, é muito mais informativo dizer "o Sr. X foi violentamente
espancado no rosto e na cabeça com uma barra de ferro, o que lhe
provocou uma fratura craniana e perfuração do tímpano". Quando a
tortura foi psicológica, deve-se descrever em que consistiu, como a
vítima se sentiu durante o incidente e posteriormente, e fornecer
detalhes de qualquer maneira em que o comportamento ou o estado mental
da vítima tenha sido visto alterado pelo tratamento, por exemplo se a
vítima sofre pesadelos ou paranóia.
Embora haja uma quantidade mínima de
detalhes que devem ser documentados, não existe uma quantidade máxima
de detalhes relevantes. O que significa relevante? Basicamente, tudo o
que ajude os organismos internacionais a entender o que aconteceu e
permita que decidam se um Estado respeitou suas obrigações. Uma vez
que os Estados têm a obrigação de investigar e reparar os incidentes
de tortura, essa obrigação inclui informação sobre o que ocorreu
após o incidente. Os detalhes que podem ser importantes e devem ser
incluídos, se conhecidos, compreendem:
Idade, sexo e profissão da vítima: é
particularmente útil mencionar se uma pessoa é homem ou mulher, uma
vez que para alguém que não conhece o idioma local, isso pode ser
difícil de se determinar.
Número da carteira de identidade.
Endereço ou local de domicílio.
Raça ou grupo étnico.
Quaisquer lesões ou conseqüências
duradouras sofridas.
A vítima teve acesso a um advogado e/ou
médico durante sua detenção?
A vítima apresentou uma denúncia do
incidente de tortura?
Se foi apresentada uma denúncia, qual
foi a resposta das autoridades estatais? Foi realizada uma
investigação ou instaurado um processo judicial? Se foi instaurado um
processo judicial, foi imposta alguma pena?
Tabela 4: Lista de Verificação para
Apresentação de uma Denúncia Particular a um Mmecanismo de Denúncia
LISTA DE VERIFICAÇÃO: Apresentação de
uma denúncia particular a um mecanismo de denúncia
Sua apresentação inclui:
Uma breve introdução sobre os objetivos e métodos de trabalho de sua
organização?
Todos os detalhes possíveis, mas pelo
menos:
o nome ou outra característica que
identifique a vítima?
a data e o local do incidente(s)?
suposto(s) torturador(es)?
detalhes do tratamento sofrido?
(Ver acima para uma explicação mais
detalhada)
Toda a documentação disponível que
corrobore os fatos?
Uma indicação clara de que o caso é
urgente se for solicitada uma ação urgente?
Uma indicação clara de todos os
detalhes que são confidenciais?
2.3. Apresentação de informação no
contexto do procedimento de relatório estatal
2.3.1. Como funciona o procedimento de
relatório estatal?
O objetivo do procedimento de relatório
estatal é ajudar os organismos de tratados (atualmente só se aplica
aos comitês de tratados das Nações Unidas) a obter um retrato
fidedigno de até que ponto os Estados Parte estão respeitando as
obrigações por eles assumidas nos tratados, solicitando aos Estados
que descrevam como estão implementando essas obrigações. Os Estados
têm a obrigação de apresentar relatórios periodicamente, embora
muitos retardem a apresentação desses relatórios durante meses ou
anos. Quando um organismo de tratado recebe um relatório estatal, deve
analisá-lo cuidadosamente para identificar as áreas de interesse. O
relatório é analisado em uma reunião oficial aberta ao público.
Durante essa reunião o Estado cujo relatório está sendo analisado tem
a oportunidade de apresentar seu relatório e normalmente a comissão
lhe solicitará que responda a perguntas originadas a partir do
relatório. Por fim, a comissão adotará suas conclusões e fará
recomendações ao Estado sobre como melhorar a implementação de suas
obrigações.
2.3.2. O que se pode conseguir
apresentando informação no contexto do procedimento de relatório
estatal?
Os relatórios recebidos pelos organismos
de tratados são elaborados pelos próprios Estados. Isso não significa
necessariamente que sejam inexatos, mas que representam a opinião
oficial de um Estado sobre uma situação. É importante assegurar-se de
que, quando os organismos de tratado chegam a suas conclusões e fazem
recomendações, eles o façam com base em informações que refletem
com precisão a situação de um país. A apresentação de informação
confiável pode ajudar os organismos de tratados a:
chegar a conclusões sobre a situação
de um país
formular as perguntas certas quando
analisarem o relatório do Estado
fazer recomendações úteis e adequadas
à situação
A análise de um relatório estatal por
um dos organismos de tratados é um fato significativo que recebe muita
divulgação. Sua apresentação pode ajudar a garantir que as
conclusões que receberem essa divulgação sejam confiáveis e atraiam
a atenção para as áreas de interesse real. Além disso, quando se
utiliza uma apresentação para fazer sugestões construtivas para
melhorar a situação, é muito possível que essas sugestões
influenciem as recomendações do comitê.
2.3.3. O que deve conter um relatório de
uma ONG no contexto do procedimento de relatório estatal ?
Siga as orientações gerais estipuladas
na Parte III, Capítulo 2.2.1, para a apresentação de informação
geral a um mecanismo de denúncia. Além disso, uma vez que o
procedimento de relatório estatal inclui uma avaliação, por um
organismo de tratado, de até que ponto as obrigações assumidas em
virtude de um tratado específico estão sendo respeitadas, deve-se
seguir as disposições desse mesmo tratado e as conclusões anteriores
com relação ao Estado, bem como o objetivo do procedimento.
Portanto, quando se prepara uma
apresentação, deve-se levar em conta que:
Uma vez que o ponto de referência usado
pelo comitê em sua análise será o próprio tratado, faz sentido
elaborar seu relatório em torno às disposições do tratado. Selecione
aquelas sobre as quais dispõe de informação e explique como estão
sendo implementadas no país. Isso garante que serão tratadas as
questões de maior interesse para o comitê e o ajuda a identificar os
aspectos nos quais se deve concentrar. Uma vez que o Estado certamente
apresentará informação sobre a situação jurídica oficial,
legislação existente etc., a grande pergunta que você deverá
responder será, em geral, como funciona essa legislação na prática.
Se o relatório não for o primeiro a ser
apresentado por esse Estado, também convém fazer referência às
conclusões anteriores do comitê sobre esse Estado, para ajudá-lo a
identificar as áreas de interesse do comitê. Deve-se comentar até que
ponto as recomendações do comitê têm sido implementadas desde a
análise do último relatório.
Se houver um intervalo de tempo entre a
publicação do relatório estatal e sua análise, pode ser útil
comentar o conteúdo do próprio relatório estatal, se está de acordo
ou não com ele (sempre apresente argumentos) ou se existe informação
adicional que deveria ser apresentada perante o comitê. Isso também
lhe ajuda a centrar a atenção nos aspectos de maior utilidade para o
comitê. Certifique-se de que seu relatório é objetivo e não se
concentra unicamente nos aspectos negativos: se o que o governo informou
é certo, isso deve ser reconhecido, e também devem ser reconhecidas as
medidas que o governo pode ter tomado e que tenham alcançado certos
resultados para melhorar a situação. Uma abordagem equilibrada
reforçará sua credibilidade e também permitirá que o comitê veja
quais são as medidas que realmente parecem funcionar na prática, o que
o ajudará a fazer recomendações em outros casos.
A menos que seja possível fazê-lo de
modo muito conciso, não se deve procurar falar de todos os aspectos
elaborados pelo governo ou contidos no tratado; concentre-se nas
questões mais importantes. Lembre-se que é melhor ser conciso sempre
que possível.
Procure apresentar o máximo possível de
exemplos e estatísticas precisas. A idéia é que se proporcione
informação geral de modo que o comitê possa chegar às suas próprias
conclusões. Isso significa que não se deve fazer afirmações
infundadas. Evite, por exemplo, afirmar que algo é ineficaz sem dar
exemplos específicos de porquê o é.
Ajude a contextualizar suas denúncias.
Ver Parte III, Capítulo 2.2.1 para sugestões sobre como descrever as
circunstâncias antecedentes gerais em um país.
Procure sugerir algumas perguntas que o
comitê possa querer perguntar ao analisar o relatório estatal. Isso
pode ajudar o comitê a identificar áreas de interesse importantes que
o relatório estatal pode não ter aprofundado.
Por fim, não se esqueça de apresentar
sugestões construtivas para melhorar a situação. Muitas vezes quem
apresenta a denúncia está em melhores condições que o comitê de
saber quais medidas podem ter uma repercussão positiva na situação
geral, e isso pode ser muito útil ao comitê. Além disso, ajuda a
mostrar que seus motivos não são meramente contestar o governo, mas
genuinamente procurar melhorar a situação geral no país.
2.3.4. Dicas práticas para
apresentação de informação no contexto do procedimento de
relatório estatal
Qualquer Estado Parte dos tratados de
direitos humanos que estabelecem um procedimento de relatório estatal
tem o dever de apresentar esses relatórios: certifique-se que seu
Estado é parte.
Para saber quando se prevê que seu país
apresentará um relatório, entre em contato com a Secretaria em Genebra
ou verifique sua página na Internet (Ver Apêndice 2) para saber quais
relatórios serão analisados na próxima sessão do comitê.
Normalmente a decisão é tomada ao final da sessão anterior.
Nos últimos anos, o número de Estados
que apresentam relatórios começou a diminuir. Se você tiver
conhecimento de problemas graves em um país, vale a pena alertar os
comitês sobre os fatos, mesmo que o país ainda não tenha apresentado
um relatório. Mas isso não deve substituir o envio da informação
próximo à data de análise de um relatório: os organismos de tratados
recebem tanta informação que podem esquecer a informação recebida
com muita antecedência.
Quando souber que o relatório de seu
Estado será analisado na próxima sessão, comece seu trabalho tão
logo possível, de modo a dispor de muito tempo hábil para preparar sua
apresentação.
O relatório estatal deve estar
disponível ao público seis semanas antes da reunião da comissão:
entre em contato com a Secretaria se desejar uma cópia ou verifique se
está publicada na página do organismo na Internet. Não espere até
que o relatório estatal esteja disponível para começar a preparar sua
apresentação, uma vez que será necessário muito tempo para pesquisa
e elaboração de um bom relatório.
Os comitês recebem um grande volume de
informação. A preparação das apresentações em conjunto com outras
ONGs é uma boa forma de se reduzir a duplicação de esforços e chegar
a uma apresentação mais completa. Os comitês geralmente preferem
receber uma única apresentação completa e bem elaborada do que uma
dezena de declarações que repetem os mesmo pontos e omitem outros.
Se tiver a oportunidade de ir a Genebra
para entregar sua apresentação pessoalmente, faça-o: isso também
ajuda a diferenciá-la das demais informações recebidas e, além
disso, permite que você possa chamar atenção para as partes mais
importantes de sua apresentação. Também pode ajudar a criar uma
impressão sobre sua pessoa e sua organização, e é de se esperar que
seja uma boa impressão.
2.4. Apresentação de informação a um
órgão de apuração de fatos
A informação a um órgão dedicado à
apuração de fatos pode ser proporcionada antecipadamente ou durante
uma visita de apuração dos fatos. Isso afetará o foco de atenção
que sua informação deve ter.
2.4.1. Apresentação de informação
antes de uma visita de apuração de fatos
Antes de uma visita de apuração de
fatos, deve-se proporcionar informação que ajude o órgão a programar
e preparar sua visita. A consideração preponderante deve ser que as
visitas para apuração de fatos costumam ser curtas demais para uma
análise de todos os aspectos da situação de um país. Isso exige que
os responsáveis pelo planejamento e preparação de uma visita sejam
seletivos. Sua informação deve ajudar o órgão de apuração dos
fatos a identificar os aspectos da situação que são mais importantes
e as atividades mais úteis que podem ser realizadas durante a visita.
Sua informação deve ajudar o órgão a
programar e preparar a visita das seguintes formas:
Identificando as áreas de interesse que
devem ser examinadas mais de perto.
Identificando as áreas, cidades e
instituições específicas que devem ser visitadas (aquelas sobre as
quais são recebidas muitas denúncias e que parecem ter os problemas
mais graves).
Incluindo todos os detalhes possíveis
relacionados à planta das instituições que devem ser visitadas e a
localização das salas ou áreas dentro da instituição onde os atos
de tortura são praticados com maior freqüência. Às vezes, é até
possível traçar uma planta ou diagrama ou descrever o acesso à sala
de interrogatório com base na informação fornecida pelas vítimas,
principalmente nos casos em que se tiver recebido a mesma descrição
por parte de mais de uma vítima, p. ex.: "Fui levado por uma porta
atrás do balcão da recepção principal da delegacia, que levou ao
andar de baixo; descemos dois andares pela escada e viramos à esquerda
em um longo corredor. A sala onde me interrogaram era a última porta à
direita no final do corredor".
Explicando o contexto social e jurídico
de um país, com particular atenção para quaisquer leis específicas
que parecem contribuir para o problema, por exemplo, legislação que
permite longas detenções em condições de incomunicabilidade
(detenção incomunicável) ou que restringe a liberdade de se instaurar
processo judicial contra representantes oficiais ou legislação ou
jurisprudência que permite o uso de confissões obtidas mediante
tortura como provas perante um tribunal.
Identificando qualquer agente estatal ou
parlamentar com quem seria muito importante falar: seja por estarem eles
mesmos estão envolvidos em incidentes de maus tratos (por exemplo,
quando se sabe que um médico do governo emitiu laudos ou relatórios
médicos falsos, ocultando a presença de lesões sofridas sob
detenção policial; quando se sabe que um promotor público não inicia
diligências relativas a denúncias de maus tratos contra representantes
públicos), seja por tentativas da parte do agente estatal ou
parlamentar no sentido de abordar problemas de maus tratos (por exemplo,
integrantes de uma comissão nacional independente de direitos humanos).
Fornecendo uma lista de contatos com os
quais o órgão pode querer organizar reuniões durante a visita, por
exemplo, representantes de ONGs nacionais de direitos humanos (tais como
as que atuam na defesa, denúncia e reabilitação), associações
profissionais, como as de médicos e de advogados, advogados que
conhecem bem o sistema jurídico nacional ou que exercem uma
representação ativa de vítimas, organizações de assistência a
vítimas.
Informando o órgão se você puder
providenciar uma reunião com as supostas vítimas de tortura durante a
visita.
2.4.2. Apresentação de informação
durante uma visita de apuração de fatos
Durante a visita, caso não tenha sido
proporcionada informação ao órgão de apuração de fatos
antecipadamente, siga as orientações sugeridas acima, bem como as
considerações a seguir. Você mesmo precisa ser muito seletivo nessa
etapa. O órgão de apuração de fatos terá uma agenda de trabalho
muito apertada e suas reuniões com as ONGs serão relativamente curtas.
O objetivo de uma visita para apuração
dos fatos é reunir FATOS. Nessa etapa, supondo-se que o órgão pôde
analisar a informação geral antes da visita, seu interesse maior
provavelmente estará centrado em três coisas:
Exemplos concretos do que realmente
acontece na prática.
Reunir-se com as supostas vítimas para
documentar testemunhos pessoais; provavelmente será melhor que a
reunião ocorra em separado de sua reunião informativa inicial (embora
isso dependa do programa da visita) e em um lugar que não intimide as
vítimas. Isso deve ser conversado com os representantes do órgão de
apuração de fatos, caso não tenha sido providenciado com
antecedência. Lembre-se de levar para a reunião fotocópias de
qualquer documentação que corrobore as denúncias da vítima, tais
como relatórios médicos ou sentenças judiciais.
A obtenção dos nomes e da localização
das pessoas que foram presas recentemente, principalmente se estiverem
sendo interrogados ou já o foram interrogados, e que possam ser
visitadas enquanto detidas (seja na delegacia de polícia, seja em um
centro de detenção preventiva para o qual tenham sido transferidos
após o interrogatório). Também seria útil identificar as pessoas que
acabam de ser soltas e afirmam ter sido torturados. No caso de uma
pessoa detida ter um representante legal, também seria útil fornecer
os dados de contato de seu representante legal.
Se você estiver apresentando
informação pessoalmente, você deve:
Lembrar-se de abordar primeiro os pontos
importantes, caso não haja mais tempo disponível.
Escutar atentamente todas as perguntas
que lhe forem feitas e respondê-las com precisão, ainda que isso
signifique que você não possa falar de tudo o que havia preparado; as
perguntas que lhe forem feitas são as que a delegação visitante mais
precisa saber.
Preparar também uma apresentação por
escrito e levá-la consigo para a reunião para servir de apoio a sua
apresentação: caso não disponha de muito tempo, esse apresentação
escrita deveria apresentar toda a informação necessária, o que
ajudará os representantes do órgão de apuração de fatos a se
lembrar de você.
Levar cópias de qualquer documentação
que explique quem você é e o que faz, por exemplo, um relatório de
atividades.
Evite usar a reunião para fazer
declarações políticas: se o fizer, você não disporá de tempo para
apresentar a informação de que o órgão de apuração de fatos
realmente precisa.
3. O QUE SE DEVE SABER SOBRE OS
PROCEDIMENTOS INTERNACIONAIS DE RECLAMAÇÃO E CoMO USá-LOS
O termo "procedimento de
reclamação" é usado em todo o texto para designar:
Um processo oficial de tipo jurídico no
qual uma pessoa ou grupo de pessoas apresenta uma reclamação ou queixa
a um organismo jurídico internacional, alegando que seus direitos
particulares foram violados em um caso específico. Uma reclamação no
âmbito de uma procedimento dessa natureza também pode ser denominada
requisição, petição ou comunicado.
Os mecanismos internacionais de
reclamação foram concebidos para casos particulares de violação, por
parte dos Estados, das obrigações assumidas nos termos da legislação
de direitos humanos, e não para examinar uma situação geral de
direitos humanos. Funcionam de modo semelhante aos processos jurídicos
nacionais e a eles estão associados mais requisitos oficiais do que aos
procedimentos de denúncia. Como regra, não forma pensados para servir
como primeiro recurso, mas somente aceitam reclamações nos caos em que
não tiver sido possível obter uma solução jurídica no âmbito
nacional (quando os recursos nacionais tiverem se "esgotado",
ver Parte III, Capítulo 3.3.2.2). As decisões adotadas no contexto dos
procedimentos internacionais de reclamação geralmente são vinculantes
para os Estados, mas é difícil assegurar seu cumprimento.
A informação a seguir vale para todos
os procedimentos particulares de reclamação como regra geral. Todas as
exceções encontram-se anotadas na análise no exame do respectivo
mecanismo na Parte III, Capítulos 4 e 5.
3.1. O que se pode procurar obter com os
procedimentos de reclamação particular?
Os procedimentos de reclamação podem:
Tratar casos individuais de violações
de direitos.
Dar ampla divulgação a casos
particulares.
Ordenar ou recomendar medidas
provisórias, tais como a não-expulsão de uma determinada pessoa para
um país onde ela corre o risco de sofrer tortura.
Encarregar-se de certas formas de
apuração de fatos e investigação.
Levar a decisões juridicamente
vinculantes.
Adotar constatações de violação em
casos particulares.
Conceder uma reparação às pessoas.
Os procedimentos de reclamação não
podem:
Tratar adequadamente um problema
generalizado.
3.2. Quais tipos de reclamação os
procedimentos de reclamação particular podem examinar?
Os procedimentos de reclamação
particular podem examinar reclamações:
Que estiverem relacionadas a uma suposta
violação de uma disposição do respectivo tratado.
Nos casos em que a violação
supostamente foi cometida por um Estado que tenha aceitado o
procedimento de reclamação particular (e a competência do organismo
executivo para examinar as reclamações particulares, caso seja
necessário, para tanto, o consentimento em separado, por exemplo, a
competência do Tribunal Interamericano de Direitos Humanos deve ser
expressamente aceita, embora o procedimento de reclamação particular
previsto na Convenção Americana de Direitos Humanos seja válido para
todas as partes).
Nos casos em que a violação
supostamente tiver sido cometida contra uma pessoa ou grupo de pessoas
sob a jurisdição do Estado e
Nos casos em que a reclamação for
apresentada pela vítima, sua família ou um representante autorizado
(que pode ser uma ONG).
Violação:
Um Estado pode incorrer em violação de
suas obrigações de direitos humanos não só por suas ações (a
prática deliberada de atos de tortura), mas também por suas omissões
(p. ex., não tomar medidas efetivas para prevenir a tortura/ não
processar os autores de atos de tortura/ não investigar denúncias).
Isso significa que uma suposta violação pode abarcar mais do que o
incidente de tortura propriamente dito, e também poderia ser comprovada
pelas circunstâncias que cercaram o incidente.
Cabe destacar que embora alguns dos
tratados analisados neste manual sejam específicos sobre a tortura,
outros são de natureza mais geral e englobam mais direitos humanos. As
reclamações submetidas a um tratado geral podem denunciar violações
de mais de um direito. Por exemplo, se uma pessoa foi detida
arbitrariamente e veio a falecer enquanto estava sob detenção em
decorrência das torturas, seria possível denunciar violações do
direito à liberdade e à segurança da pessoa e do direito à vida,
além do direito de não ser torturado.
Jurisdição:
Nos termos da legislação dos direitos
humanos, os Estados se comprometem a respeitar e proteger os direitos de
todas as pessoas sob sua jurisdição. Isso compreende, basicamente,
todas as pessoas sobre as quais o Estado pode exercer controle,
inclusive todas as que se encontrem dentro do território do Estado
(inclusive estrangeiros, e não somente os cidadãos do Estado em
questão), mas também pode incluir pessoas que são afetadas pelas
ações dos representantes oficiais do Estado no exterior, por exemplo,
pessoas afetadas pelas ações das forças armadas de um Estado em outro
território.
3.3. Como funcionam os procedimentos de
reclamação particular?
Cronologia básica
Todos os procedimentos de reclamação
particular baseiam-se nos mesmos passos cronológicos principais:
Recebimento de uma reclamação
Análise inicial para se ter certeza de
que:
1) a reclamação envolve um Estado Parte
da respectiva convenção que aceitou o procedimento de reclamação
particular
2) os fatos que são objeto da
reclamação estão relacionados ao tema da convenção e
3) existe uma possibilidade real de ter
ocorrido uma violação (isto é, a alegação não é absurda)
Avaliação da admissibilidade da
reclamação, por exemplo, a oportunidade para as duas partes
apresentarem suas observações (este passo às vezes se funde com o
seguinte; se for o caso, você será informado)
Análise do mérito da reclamação, por
exemplo, a oportunidade para as duas partes apresentarem seus argumentos
e (dependendo de seus poderes específicos) para que o organismo
internacional reúna informações sobre o caso que lhe ajudem a chegar
a uma decisão. Isso pode incluir defesas orais ou escritas, ou ambas,
investigação para apuração dos fatos e deliberação sobre provas de
especialistas ou relatos amicus curiae.
Uma decisão do organismo sobre se
ocorreu uma violação e (dependendo dos poderes do organismo) sobre
quais soluções jurídicas, se for o caso, devem ser concedidas.
Em qualquer etapa do processo, a maioria
dos organismos que recebem reclamações particulares pode:
Solicitar ou ordenar a adoção de
medidas provisórias.
Colocar-se à disposição das partes
para a busca de uma solução amistosa (acordo quanto a uma solução
satisfatória para ambas as partes e que torna desnecessária a
continuação do processo).
Convém explicar alguns desses passos.
Admissibilidade
3.3.2.1. O que é admissibilidade?
A etapa de admissibilidade funciona como
uma espécie de limiar: se um caso for declarado admissível, ele passa
a uma análise do mérito, mas se for declarado inadmissível,
encerra-se aí o caso.
Quando um órgão judicial examina a
admissibilidade de uma requisição, basicamente ele se pergunta se pode
considerar o caso. Não analisa se os fatos revelam uma violação da
legislação internacional dos direitos humanos (isso é o que ocorre na
etapa do mérito); em vez disso, o que o órgão judicial faz, na etapa
de admissibilidade, é perguntar se existe alguma razão que lhe impede
de examinar o caso.
3.3.2.2. Por que uma reclamação poderia
ser declarada inadmissível?
As razões (os "argumentos")
pelas quais um organismo internacional declara inadmissível um caso
são indicadas quando se considera esse mecanismo, mas muitas delas são
comuns à maioria dos procedimentos de reclamação particular. A
maioria das razões envolve argumentos procedimentais, o que significa
que não estão relacionados aos fatos do caso, mas sim à forma como
foi feita a requisição. As principais razões de inadmissibilidade
são:
A reclamação é anônima.
O reclamante não é a vítima e não
obteve a autorização da vítima ou da família da vítima para
apresentar uma reclamação.
A requisição é sobre fatos que
ocorreram antes de o tratado entrar em vigor para o Estado em questão.
Por exemplo, segundo o Artigo 27 da Convenção contra a Tortura, essa
convenção entra em vigor (passa a ser aplicável) 30 dias após o
Estado a ratificar. Isso significa que se o Estado X ratificar a
convenção (e aceitar o procedimento de reclamação particular) em 31
de março de 2000, a convenção entrará em vigor para esse Estado em
30 de abril de 2000. A Comissão contra a Tortura somente pode examinar
as reclamações sobre fatos que ocorreram em ou a partir do dia 30 de
abril de 2000.
O prazo limite para apresentação de uma
requisição venceu. Como regra geral, o prazo limite começa a contar a
partir do momento em que se toma uma decisão oficial definitiva. Pode
ser a data do incidente nos casos em que não se buscou uma solução
jurídica (ver abaixo comentário sobre o esgotamento de recursos
nacionais), mas, em geral, trata-se da data da decisão de não
processar, de uma sentença, da apresentação, pela vítima, de uma
petição à qual não se recebeu uma reposta, ou qualquer outra
decisão que represente o passo final no processo de busca de uma
solução jurídica no âmbito do sistema nacional.
O comunicado é incompatível com as
disposições da respectiva convenção.
A reclamação é considerada
manifestamente infundada ou um abuso do direito de apresentação. Esse
é o único argumento de inadmissibilidade sobre o qual os órgãos
judiciais podem se referir aos fatos de um caso. Esse argumento é
avaliado caso a caso e aplicado quando se considera que os fatos
poderiam não revelar a violação alegada, sendo, portanto, claramente
uma denúncia sem fundamento, para a qual o direito de apresentação
não deveria ter usado.
Os fatos do caso já foram analisados por
este ou outro procedimento internacional de solução.
Não se esgotaram os recursos nacionais.
O argumento mais comum para se declarar
inadmissível uma reclamação é o não-esgotamento dos recursos
nacionais, mas também é o mais difícil de se ter certeza e deve,
portanto, ser analisado mais detidamente.
O que significa "esgotamento dos
recursos nacionais"?
Basicamente, significa que se a vítima
de uma violação dos direitos humanos quer levar um caso particular
perante um organismo internacional, ela deve, primeiro, ter procurado
obter uma solução das autoridades nacionais. Deve ficar comprovado que
foi dada ao Estado uma oportunidade de solucionar o caso antes de se
recorrer a um organismo internacional. Isso reflete o fato de que não
se considera que os Estados tenham violado suas obrigações de direitos
humanos se eles proporcionarem soluções reais e efetivas para as
vítimas das ações de representantes estatais, em reconhecimento da
possibilidade de certos indivíduos terem um comportamento inaceitável
sem a aprovação de seus governos.
No entanto, os organismos internacionais
reconhecem que, em muitos países, os recursos podem não existir ou ser
ilusórios. Por isso, foram criadas regras sobre as características que
os recursos devem ter, a forma como devem ser esgotados os recursos e as
circunstâncias especiais em que não é necessário esgotá-los.
Que tipo de recursos um reclamante deve
ter esgotado?
Um reclamante deve ter esgotado qualquer
recurso (quer seja de natureza jurídica, quer administrativa):
Disponível: os recursos existem e a
vítima (ou outra pessoa em seu nome) pode utilizá-los sem
restrições;
Eficaz: é possível que o recurso seja
utilizado com êxito;
Adequado: o recurso pode proporcionar uma
reparação adequada à reclamação; por exemplo, se uma pessoa vai ser
deportada, um recurso que não pudesse suspender a deportação não
proporcionaria uma reparação adequada.
Se os recursos nacionais existentes não
cumprirem esses critérios, a vítima não deverá necessariamente
esgotá-los antes de reclamar a um organismo internacional. No entanto,
um reclamante deve poder demonstrar que esses recursos não atendem a
esses critérios na prática, não simplesmente na opinião da vítima
ou na de seus representantes legais. É possível, por exemplo, que seja
necessário demonstrar que nenhuma pessoa que denunciou torturas e usou
alguma vez um determinado recurso jamais obteve uma compensação. Se
existe alguma dúvida sobre a eficácia de um recurso, o reclamante deve
poder demonstrar pelo menos que tentou utilizá-lo. Além disso, se o
recurso tiver se tornado indisponível ou não mais passível de
utilização por uma falta do próprio reclamante (por exemplo, no caso
de o reclamante não ter respeitado os prazos de apresentação de uma
apelação, razão pela qual o procedimento de apelação não está
mais disponível e não pode ser utilizado), isso normalmente não seria
aceito como justificativa para o não-esgotamento do recurso.
Se um reclamante deseja argumentar que um
determinado recurso não deve ser esgotado porque não existe, é
ineficaz ou inadequado, o procedimento é:
1. O reclamante afirma que o recurso não
precisava ser esgotado porque é ineficaz (ou indisponível/
inutilizável ou inadequado); isso ainda não precisa ser comprovado.
2. O Estado deve, então, demonstrar que
o recurso é eficaz.
3. Se o Estado puder demonstrá-lo,
então o reclamante deve demonstrar que ele efetivamente esgotou o
recurso, ou que o recurso não poderia ter sido eficaz nesse caso
específico, ainda que pudesse sê-lo em geral.
Como o recurso deve ter sido esgotado?
O motivo da reclamação perante o
organismo internacional deve ser mencionado na reclamação tramitada
perante as autoridades nacionais. A razão é garantir que o Estado
tenha tido a oportunidade de proporcionar uma reparação à
reclamação específica que está sendo levada à atenção do
organismo internacional.
Por exemplo: um reclamante iniciou uma
ação judicial na esfera nacional a fim de obter uma compensação por
um ato de tortura e, durante o processo, não questionou a natureza da
investigação policial da reclamação em nenhum momento. Se o tribunal
não concedeu uma compensação porque a prova apresentada era
insuficiente para demonstrar que ocorreu um ato de tortura e o
reclamante afirma perante o Comitê contra a Tortura que ocorreu uma
violação da obrigação do Estado de garantir uma investigação
rápida e imparcial de todas as acusações de tortura, é bastante
possível que essa reclamação não seja aceita porque ela nunca foi
levantada perante as autoridades nacionais, ainda que seja possível uma
reclamação pela não-concessão de compensação.
Quando pode não ser necessários esgotar
os recursos nacionais?
Em circunstâncias especiais, o organismo
internacional pode considerar que os recursos nacionais não tinham
necessariamente de ser esgotados, ainda que pudessem ser utilizados e
fossem potencialmente eficazes e adequados. As circunstâncias especiais
podem ser:
Quando os recursos se prolongam
injustificadamente, por exemplo, quando o processo judicial ou a
investigação das denúncias é excessivamente longo, porém não por
culpa do reclamante.
Quando não existe um poder judiciário
independente.
Quando existe um clima geral de
intimidação é tal que não é possível obter uma representação
legal.
Cada caso será considerado com base em
seus fatos, e os argumentos que em um caso tiverem sido rejeitados, às
vezes são aceitos em outro, de modo que não se deve hesitar em ser
criativo nos argumentos apresentados. No entanto, cabe uma palavra de
advertência: o desconhecimento dos recursos disponíveis muito
provavelmente não será aceito como justificativa para o
não-esgotamento. Certifique-se de estar plenamente informado de todos
os recursos nacionais disponíveis em cada caso.
3.3.3. Relatos amicus curiae/
Intervenções de terceiras partes
Amicus curiae significa "amigo do
tribunal" e o objetivo desse relatório (apresentação) é ajudar
o órgão judicial fornecendo-lhe informação que o ajude a tomar uma
decisão. É uma prática que ainda não foi adotada no contexto dos
mecanismos da ONU, o que não significa necessariamente que não virá a
ser aceita no futuro, mas tem sido utilizada com relativa freqüência
pelos Tribunais Europeu e Interamericano de Direitos Humanos.
Um relato amicus é uma apresentação
feita por uma terceira parte interessada no processo, ou seja, por um
indivíduo, uma organização ou até mesmo outro Estado que não é nem
o reclamante, nem o Estado reclamado, nem, no caso de um parecer
consultivo, o órgão ou Estado solicitante, mas sim uma parte que se
considera pode contribuir significativamente para o processo. Em geral,
essas intervenções são solicitadas explicitamente pelo tribunal, ou a
terceira parte interessada procurará obter permissão para apresentar
um relato, que o tribunal pode aceitar ou indeferir.
O conteúdo do relato propriamente dito
variará de caso a caso, embora normalmente tratará de questões e
situações gerais, em vez de algo específico de uma reclamação
particular. No entanto, o requerimento de permissão
("licença") para se apresentar um relato amicus normalmente
deve conter os seguintes elementos:
Explique brevemente quem você é e o que
sua organização faz.
Explique por que você ou sua
organização está particularmente qualificado(a) para intervir, por
exemplo, qualquer experiência especial na área de relevância ou em um
determinado país; um determinado projeto realizado sobre uma matéria
relevante etc.
Explique o que sua apresentação
acrescentará ao processo, ou seja, resuma brevemente o que se pretende
dizer e explique como isso contribuirá e será útil ao tribunal.
3.3.4. Medidas provisórias
Quando um procedimento de reclamação
particular permite a adoção de medidas provisórias, isso possibilita
que, em qualquer etapa do processo, o órgão correspondente solicite ou
ordene ao Estado Parte que tome medidas para evitar possíveis danos
irreparáveis às pessoas relacionadas ao caso. A adoção de medidas
provisórias não tem conseqüências para o resultado final do caso:
não significa que o órgão tenha chegado a uma decisão sobre sua
admissibilidade ou mérito, mas é meramente uma precaução para
dar-lhe tempo para deliberar.
Essa função é utilizada de modo
generalizado nos casos que envolvem a expulsão iminente de uma pessoa
para um país em que se acredita que ela corre o risco de sofrer
torturas. Nesses casos, três critérios devem ser atendidos quando se
apresenta um pedido de medidas provisórias:
Foram apresentados argumentos sobre a
obrigação do Estado de não-expulsão perante os tribunais nacionais.
A reclamação deve demonstrar que o
indivíduo está pessoalmente sob risco de sofrer torturas. Não
bastará afirmar que as pessoas em geral são torturadas no país em
questão: deve ficar demonstrado que há argumentos para se acreditar
que essa pessoa em particular seria torturada naquele país.
Deve-se demonstrar que há um risco
contínuo que existe no presente. Normalmente não basta demonstrar que
uma pessoa foi torturada em algum momento do passado. Será necessário
demonstrar que o risco persiste, por exemplo, porque o nome dessa pessoa
aparece na lista de pessoas-alvo, ou porque familiares que ainda vivem
no país foram torturados recentemente, ou talvez porque a pessoa é um
líder da oposição muito conhecido no país.
3.4. O que deve conter uma requisição a
um procedimento de reclamação particular?
Deve-se pensar em dois componentes de um
comunicado. O primeiro é sua carta introdutória, que deve conter um
certo número de detalhes. Se não forem apresentados esses detalhes,
você será solicitado a complementar sua requisição para que ela
possa continuar a ser processada. O segundo componente é a
documentação de apoio.
Sua carta introdutória deve conter:
Nome, nacionalidade, profissão,
endereço postal e assinatura do reclamante, ou o nome e a assinatura
dos representantes legais ou de qualquer pessoa autorizada pela suposta
vítima para atuar em seu nome. Se for possível comprovar a identidade
do reclamante (por exemplo, carteira de identidade nacional), deve-se
anexar uma cópia do documento.
Cite o nome do Estado Parte contra o qual
é dirigido o comunicado.
Disposição ou disposições da
convenção que supostamente foram violadas.
Uma explicação do ato ou atos
denunciados (Ver Parte III, Capítulo 2.2.2 para os detalhes que devem
ser incluídos).
Uma indicação de que o Estado é
responsável ou por ação ou por omissão.
Informação sobre os esforços
realizados para esgotar os recursos nacionais e seus resultados,
inclusive a sentença, se houve apelação da sentença e a data da
sentença final, ou informação sobre a impossibilidade de esgotamento
dos recursos.
Indicação de até que ponto a mesma
matéria está sendo examinada em outro procedimento internacional de
investigação.
Uma indicação de qualquer parte do
comunicado (inclusive nome do reclamante) que deve ser mantida em
caráter confidencial.
Procure sempre anexar toda a
documentação de apoio possível (Ver Parte II, Capítulo 5) a seu
comunicado. Essa documentação pode incluir:
Uma carta de autorização: deve conter a
assinatura da vítima ou explicar por que a autorização foi dada pela
família da vítima (Sempre inclua essa informação se a pessoa que
envia o comunicado não é nem a vítima nem um familiar da vítima).
Quaisquer petições ou reclamações
feitas às autoridades.
Quaisquer decisões judiciais e
administrativas do caso, inclusive as decisões proferidas em todas as
instâncias do poder judiciário (primeira instância, apelação,
supremo tribunal), detalhes de quaisquer penas decretadas contra o
torturador ou torturadores, quaisquer decisões administrativas,
inclusive as da autoridade policial de queixas, decisões do promotor de
não processar ou de não dar continuidade a um processo, decisões
quanto à incompetência para examinar um caso.
Declarações da vítima.
Declarações das testemunhas.
Laudos ou relatórios médicos, inclusive
avaliações tanto físicas como psicológicas, se existentes.
Autópsias.
Fotografias.
Matérias divulgadas nos meios de
comunicação.
Informação geral, por exemplo,
relatórios de ONGs que indiquem a prática da tortura.
Sempre envie cópias dos documentos, não
os originais, uma vez que eles não lhe serão devolvidos.
Os documentos oficiais geralmente podem
ser apresentados em seu idioma original, mas é preciso indicar sua
importância; se possível, apresente um breve resumo, em um dos idiomas
de trabalho, do resultado do julgamento, por exemplo, ou das lesões
documentadas no laudo médico.
3.5. Dicas práticas para utilização
dos procedimentos de reclamação particular
Sempre faça todo o possível para
respeitar os prazos dados pelos organismos internacionais: se você sabe
que não poderá cumprir um prazo, sempre solicite uma prorrogação com
antecedência. A maioria dos organismos internacionais é compreensiva
quanto à necessidade de prorrogação de prazos, mas logo poderão
perder a paciência se você não os mantiver informados.
Sempre declare claramente quais partes do
comunicado são confidenciais, se houver.
Sempre declare CLARAMENTE na capa de seu
comunicado se devem ser tomadas medidas urgentes.
Todos os organismos internacionais
adotaram um "Regulamento" ou "Normas processuais"
que estabelecem pormenorizadamente como funcionam e quais medidas podem
adotar. Geralmente são textos bastante técnicos, mas são a melhor
fonte de consulta quando se quer a resposta para uma pergunta muito
específica sobre o procedimento.
Se você estiver atuando como
representante legal no contexto de um procedimento de reclamação
particular, é preciso assegurar-se de manter constante contato com o
reclamante a todo o momento: muitas vezes é necessário contatar os
reclamantes para obter informações solicitadas com pouco tempo de
antecedência pelo organismo internacional, e cabe lembrar que eles
também devem ser mantidos informados do andamento do processo.
4. MECANISMOS e PROCEDIMENTOS: NAÇÕES
UNIDAS
4.1. Introdução ao sistema das Nações
Unidas
Todos os mecanismos de direitos humanos
das Nações Unidas baseiam-se e emanam do Escritório do Alto
Comissariado para Direitos Humanos (EACDH) na sede da ONU em Genebra.
Há dois aspectos gerais que devem ser conhecidos por quem deseja
apresentar informação aos mecanismos da ONU. Um deles diz respeito aos
idiomas e o outro à distribuição.
Idiomas: A ONU tem seis idiomas oficiais
(inglês, francês, espanhol, russo, chinês e árabe), mas apenas três
idiomas de trabalho (inglês, francês e espanhol) e, na prática, o
idioma cujo conhecimento é mais generalizado no Escritório do Alto
Comissariado para Direitos Humanos é o inglês. Os recursos do EACDH,
da mesma forma que os de muitas organizações internacionais, são
muito limitados. Ver Parte III, Capítulo 2.2.1, para sugestões
relativas ao idioma de apresentação de seu comunicado nessas
circunstâncias.
Também convém saber que a ONU tem
normas complicadas para a tradução de documentos oficiais, o que
significa que, em geral, um relatório só se tornará público quando
tiver sido traduzido para todos os idiomas oficiais. Isso às vezes pode
criar longos atrasos e muitas vezes é a razão pela qual um documento
não chega antecipadamente às sessões da Comissão de Direitos
Humanos.
Distribuição: Se você deseja que seu
comunicado seja enviado a mais de um procedimento do EACDH, o método
mais confiável é você mesmo enviar uma cópia a cada um deles. Por
duas razões: 1) como qualquer organização de grande porte, às vezes
é possível ocorrer que a informação não seja passada de um
procedimento a outro dentro do EACDH e 2) geralmente será necessário
enfatizar diferentes aspectos para os diferentes procedimentos.
Se você não dispuser dos recursos
necessários para enviar mais de uma cópia, deve-se indicar muito
claramente quem você quer que receba a informação, a fim de garantir
que ela seja distribuída a todos os procedimentos que você escolheu.
Isso será particularmente importante quando se quiser que a
informação seja enviada a vários Relatores Especiais (Ver Parte III,
Capítulo 4.2.1.2.1). Algumas organizações que apresentam informação
periodicamente ao EACDH elaboraram um formulário padrão com uma
relação de todos os procedimentos disponíveis e marcam os que elas
desejam contatar em cada caso.
4.2. Mecanismos de denúncia no âmbito
do sistema das Nações Unidas
4.2.1. Procedimentos Não-regulados por
Tratados das Nações Unidas
Os dois principais organismos
responsáveis por questões relacionadas aos direitos humanos dentro do
sistema das Nações Unidas são: a Comissão de Direitos Humanos e a
Subcomissão para a Promoção e a Proteção dos Direitos Humanos. Uma
das maneiras pelas quais cumprem suas tarefas é mediante a criação e
supervisão de procedimentos auxiliares que lhes ajudam na realização
de estudos, redação de documentos e monitoramento. Esses procedimentos
auxiliares geralmente prestam contas de suas atividades à Comissão ou
à Subcomissão de Direitos Humanos. Os procedimentos apresentados a
seguir se inserem nessa categoria, foram criados pela Comissão de
Direitos Humanos e dependem dela e da Subcomissão para fins de
execução.
A Comissão e a Subcomissão são dois
organismos particularmente adequados ao exercício do lobby de
influência (Ver Parte III, Capítulo 7). Em ambos os casos, os
integrantes ou Estados Membros podem ter uma influência importante
sobre as questões consideradas durante suas sessões, e o exercício do
lobby pode alterar as questões que estarão dispostos a apoiar. Essa é
uma forma muito eficaz de chamar a atenção para as violações dos
direitos humanos em um país. Somente as ONGs que atuam em caráter
consultivo têm acesso direto à Comissão e à Subcomissão, mas
algumas delas estão dispostas a ajudar outras ONGs a comparecerem às
sessões. Ver Apêndice 2 para dados sobre as ONGs com sede em Genebra
que podem proporcionar assistência.
Tabela 5: Dados Básicos: Comissão de
Direitos Humanos da ONU
DADOS BÁSICOS: Comissão de Direitos
Humanos da ONU
Origem:
Como foi criada?
Mediante duas resoluções de 1946 do Conselho Econômico e Social da
ONU
Quando começou a funcionar?
1947
Composição:
Quantas pessoas a compõem?
Os representantes diplomáticos de 53 Estados
Essas pessoas são especialistas independentes ou representantes
estatais?
Representantes estatais
Objetivo:
Objetivo geral
Examinar questões relacionadas aos direitos humanos, tanto no que se
refere aos Estados Membros como de um ponto de vista geral, e adotar
medidas destinadas a melhorar a situação dos direitos humanos em todo
o mundo.
Tabela 6: Dados Básicos: Subcomissão da
ONU para Promoção e Proteção dos Direitos Humanos
DADOS BÁSICOS: Subcomissão da ONU para
Promoção e Proteção dos Direitos Humanos (anteriormente Subcomissão
para a Prevenção da Discriminação e Proteção das Minorias)
Origem:
Como foi criada?
Mediante uma resolução de 1947 da Comissão da ONU de Direitos Humanos
sob a autoridade do Conselho Econômicos e Social
Quando começou a funcionar?
1947
Composição:
Quantas pessoas a compõem?
26
Essas pessoas são especialistas independentes ou representantes
estatais?
Especialistas independentes eleitos com relação a Estados específicos
Objetivo:
Objetivo geral
Realizar estudos, fazer recomendações e elaborar normas relacionadas
aos direitos humanos, a fim de remetê-las à Comissão de Direitos
Humanos para considerações suplementares e possível adoção.
4.2.1.1. O Procedimento 1503
4.2.1.1.1. Como funciona o Procedimento
1503?
Nota: O procedimento 1503 atualmente
está sendo revisado e poderão ser introduzidas mudanças
significativas num futuro próximo.
O procedimento 1503 deriva seu nome do
número da resolução da Comissão de Direitos Humanos que o criou. Seu
objetivo é examinar as denúncias de violações graves de direitos
humanos em um país a fim de identificar padrões de violação. Não é
responsabilidade de um órgão especial, mas é implementado pela
Subcomissão para Promoção e Proteção dos Direitos Humanos e pela
Comissão de Direitos Humanos. A característica mais notável do
procedimento é que ele tem caráter confidencial e as pessoas que
apresentam informação não são informadas do resultado.
Tabela 7: Cronologia básica:
Procedimento 1503
CRONOLOGIA BÁSICA: Procedimento 1503
Recebe-se o comunicado.
ß
ß
SE O COMUNICADO SE QUALIFICA para exame (por exemplo, não está sendo
examinado por um procedimento público da Comissão de Direitos
Humanos), a reclamação é transmitida ao governo em questão, que é
solicitado a comentar.
SE O COMUNICADO NÃO SE QUALIFICA – o comunicado não prossegue.
ß
Julho: Exame das reclamações e
respostas por um Grupo de Trabalho da Subcomissão composto de cinco
membros (GT sobre Comunicados). Os comunicados que "parecem"
revelar um padrão sistemático de violações são transmitidos à
Subcomissão.
Þ
Se o comunicado não parece revelar um padrão sistemático de
violações, ele não prossegue ou fica pendente até o ano seguinte.
ß
Agosto: Análise pela Subcomissão dos
comunicados e das respostas recebidas do GT sobre Comunicados. Se parece
revelar uma "situação", é enviado à Comissão de Direitos
Humanos.
Þ
Se parece não revelar uma "situação", não prossegue ou
fica pendente até o ano seguinte.
ß
Fevereiro/março: Análise das
reclamações e respostas por um Grupo de Trabalho da Comissão de
Direitos Humanos (GT sobre Situações) antes da sessão da Comissão.
Sua tarefa é produzir recomendações à Comissão sobre uma linha de
ação a ser adotada.
ß
Março/abril: Durante sua sessão, a
Comissão de Direitos Humanos considera as situações a ela
encaminhadas em reuniões privativas, com a exceção de que os governos
são convidados a comparecer à sessão em que será considerada sua
"situação".
ß
Informam-se os nomes dos países
analisados, bem como os daqueles cujos comunicados não prosseguiram.
Isso significa que, por eliminação, são anunciados publicamente os
Estados que estão sendo examinados. Às vezes uma situação pode
tornar-se pública e passar a ser objeto de discussão aberta na
Comissão.
Tabela 8: Dados Básicos: Procedimento
1503
DADOS BÁSICOS: Procedimento 1503
Origem:
Como foi criado?
Mediante uma resolução do Conselho Econômico e Social da ONU em 1970.
Quando começou a funcionar?
1972
Composição:
O Procedimento 1503 é implementado pela Subcomissão para Promoção e
Proteção dos Direitos Humanos e pela Comissão de Direitos Humanos da
ONU.
Objetivo:
Objetivo geral
Exame confidencial de reclamações de violações graves dos direitos
humanos em um país a fim de identificar padrões de violações.
Funções
Monitoramento
4.2.1.1.2. O Que se Pode Conseguir
Apresentando Informação ao Procedimento 1503?
A eficácia do Procedimento 1503 é
claramente prejudicada por sua natureza confidencial. Entretanto, a
prática, que a Comissão de Direito Humanos vem desenvolvendo, de
anunciar os nomes dos Estados que estão sendo examinados e indicar
aqueles cuja análise não prosseguirá, até certo ponto funciona no
sentido de melhorar o procedimento. Isso significa pelo menos que o fato
de que um Estado está sendo examinado passa a ser de domínio público.
Apesar das restrições do procedimento
confidencial, é possível fazer com que um Estado preste contas e
responda às denúncias dirigidas contra ele. Uma conseqüência
"colateral" do procedimento é que a mera transmissão de uma
reclamação a um governo pode fazer com que este investigue e corrija a
situação denunciada, ou o leve a suspender ou pôr fim a uma prática,
com a finalidade de não chamar a atenção e fazer com que a
reclamação não seja remetida à Subcomissão. No caso das
reclamações e respostas que passam da instância da Subcomissão
adiante, a Comissão identifica questões de interesse durante sua
análise das "situações" e pode requisitar que os Estados em
questão implementem melhoras. A comissão pode requerer respostas a
perguntas específicas e tem o poder de iniciar um estudo ou criar um
órgão de investigação especial com o consentimento expresso do
governo envolvido, mas, ao longo dos anos, vem desenvolvendo seus
próprios meios de lidar com casos graves nomeando um especialista
independente que realiza missões de campo e apresenta um relatório
confidencial à Comissão em sua próxima sessão.
Em casos excepcionalmente graves, a
Comissão de Direitos Humanos pode optar por transferir a situação
para um procedimento público, o que pode envolver a nomeação de um
Relator Especial (Ver Parte III, Capítulo 4.2.1.2).
O Procedimento 1503 pode ser utilizado
para:
Despertar a consciência sobre uma
situação de violações graves dos direitos humanos, pelo menos no
âmbito da Comissão de Direitos Humanos.
Fazer sugestões para melhorar uma
situação dessa natureza.
O Procedimento 1503 não é adequado
quando se pretende:
Obter uma solução jurídica imediata
para uma pessoa em particular.
Receber resposta a denúncias
apresentadas. Você somente receberá uma confirmação de que sua
reclamação foi recebida e segue o trâmite do procedimento.
4.2.1.1.3. O que Deve Conter um
Comunicado ao Procedimento 1503?
Um comunicado ao Procedimento 1503 deve:
Ser dirigido à ONU ou a algum de seus
organismos ou funcionários de seu quadro de pessoal. Ou seja, não deve
ser dirigido especificamente ao Procedimento 1503, mas deve pelo menos
solicitar uma ação por parte da ONU.
Um comunicado ao Procedimento 1503 não
deve:
Ser anônimo. O nome será eliminado
antes de o comunicado ser transmitido ao Estado, a menos que o autor do
comunicado não tenha objeção à divulgação de seu nome.
Conter uma linguagem insultante.
Ser motivado por objetivos meramente
políticos nem fazer propaganda: o comunicado deve ser a expressão de
um motivo genuíno de queixa por uma injustiça sofrida.
O Procedimento 1503 foi concebido para
identificar e acompanhar as "situações que parecem revelar um
padrão sistemático de violações graves de direitos humanos,
fidedignamente atestadas como tais".
Isso significa que devem ser levadas em
conta as seguintes considerações quando se prepara um comunicado ao
Procedimento 1503:
O objetivo do comunicado é chamar a
atenção para uma situação, em vez de para um caso particular, e deve
ajudar a demonstrar um padrão de violações. Assim sendo, é muito
útil reunir casos particulares em um só documento, em vez de
apresentá-los separadamente, um a um; e, apesar de que um fato
particular somado a outros pode iniciar a análise de uma
"situação", raramente ele será suficiente por si só.
A prova deve se relacionar a violações
graves dos direitos humanos (inclusive tortura).
A prova deve ser consistente ao longo do
tempo e entre diferentes fontes de informação.
A prova de violação deve ser fidedigna.
Isso significa que se deve evitar contradições e apresentar provas
para corroborar suas denúncias, evitando declarações vagas.
Quando expuser sua explicação de cada
denúncia, siga as orientações contidas na Parte III, Capítulo 2.2.2,
quanto ao conteúdo de um comunicado padrão tanto quanto possível,
mas, além disso, deve-se:
Explicar por que você entende que houve
uma violação e por que você acredita que os fatos revelam um padrão
consistente de violações graves.
Fornecer todas as provas possíveis que
corroborem os fatos (Ver Parte III, Capítulo 5, e Parte III Capítulo
3.4 para exemplos de provas de apoio).
Explicar se foram utilizados quaisquer
recursos nacionais e quais foram os resultados, inclusive cópias de
sentenças judiciais, se for o caso; se não tiverem sido utilizados os
recursos nacionais, informar as razões.
Incluir quaisquer sugestões que se tenha
para uma ação adequada, por exemplo, a nomeação de um Relator
Especial ou uma investigação, ou simplesmente uma ação por parte da
ONU para pôr fim às violações.
4.2.1.1.4. Dicas Específicas
Quem será informado do comunicado/
identidade da fonte?
O nome do autor do comunicado será
apagado para ser transmitido ao Governo, a menos que o autor não tenha
objeção à divulgação de seu nome. Por se tratar de um procedimento
confidencial, nenhum dos casos analisados é publicado.
Você receberá alguma resposta sobre seu
comunicado?
Como o procedimento é confidencial,
você não receberá uma resposta sobre o conteúdo do comunicado
apresentado nem sobre qualquer medida adotada. No entanto, receberá uma
acusação de recebimento indicando que o comunicado segue o trâmite do
procedimento.
Se quiser que seu comunicado seja
analisado na próxima sessão do Grupo de Trabalho da Subcomissão no
mês de julho, você deve se certificar de que ele chegue ao EACDH até
meados de abril. Do contrário, ele só será analisado em julho do ano
seguinte.
O Procedimento 1503 aceita comunicados
enviados por correio eletrônico, ao contrário do Comitê contra a
Tortura e o Comitê de Direitos Humanos.
Convém observar que:
Não serão aceitas reclamações
referentes a um Estado:
Serão aceitas reclamações referentes a um Estado:
Que está sendo examinado por um
procedimento público da Comissão de Direitos Humanos.
Que aceitou o direito de petição
particular nos termos do PIDCP, do CCT ou do CEDR, e se a reclamação
for sobre uma violação particular de um direito protegido por um
desses instrumentos.
Que aceitou o direito de uma petição particular nos termos do PIDCP,
do CCT ou do CEDR, mas a reclamação se refere a informação geral
sobre o Estado, em vez de uma reclamação particular.
4.2.1.2. Procedimentos Especiais da
Comissão de Direitos Humanos da ONU
Os procedimentos especiais da Comissão
de Direitos Humanos da ONU foram criados para monitorar áreas
temáticas específicas em escala mundial ou determinados países com
relação a todos os direitos humanos. Esse procedimentos são mais
conhecidos como relatores especiais ou grupos de trabalho, mas também
há outros nomes, tais como especialistas independentes e representantes
especiais. São criados mediante resolução em resposta a situações
consideradas suficientemente preocupantes a ponto de exigirem um estudo
em profundidade. Os procedimentos prestam contas publicamente à
Comissão de Direitos Humanos a cada ano e alguns também à Assembléia
Geral da ONU.
Cada procedimento tem seus próprios
métodos de trabalho, que podem diferir um pouco entre si, mas sua
nomeação segue o mesmo critério, as considerações básicas são as
mesmas quanto à preparação de um comunicado e também se aplicam
todos os princípios gerais descritos acima no que se refere aos
comunicados dirigidos aos mecanismos da ONU. O procedimento que é mais
provável convenha ser utilizado no contexto de denúncias de tortura é
o Relator Especial contra a Tortura, que, por essa razão, utilizaremos
como exemplo básico. No entanto, cabe recordar que o Relator Especial
é apenas um dos vários procedimentos que podem receber denúncias de
atos de tortura.
4.2.1.2.1. Relatores Temáticos e Grupos
de Trabalho
Todos os procedimentos temáticos devem
ser abordados de modo semelhante ao descrito a seguir com referência ao
Relator Especial contra a Tortura. O aspecto mais importante que se deve
ter presente é que os diferentes mecanismos temáticos não são
mutuamente excludentes e podem fazer intervenções conjuntas ou
separadas com relação a uma mesma denúncia.
De um modo geral, quando uma denúncia
estiver relacionada a um tratamento que parece constituir tortura ou
maus tratos, será necessário enviá-la ao Relator Especial contra a
Tortura, mas quando os fatos também revelarem outras possíveis
violações dos direitos humanos, você deverá procurar enviá-la a
todos os procedimentos especiais cabíveis ou indicar em sua carta a
quais procedimentos quer que seu comunicado seja distribuído. A ação
por parte de mais de um relator ou grupo de trabalho costuma ter maior
peso e é provável que influencie um Estado mais do que quando somente
um procedimento expressa preocupação.
Um exemplo de denúncia que poderia ser
distribuída a mais de um procedimento seria a detenção e prisão
violenta de uma jornalista por representantes oficiais por suas
atividades jornalísticas, inclusive estupro e espancamento com
cassetetes quando da prisão. Dependendo dos detalhes disponíveis e das
circunstâncias específicas, seria possível motivar uma ação do
Relator Especial contra a Tortura, Violência contra as Mulheres e
Liberdade de Expressão, bem como do Grupo de Trabalho sobre Detenção
Arbitrária.
É igualmente possível que um caso sobre
o qual o Relator Especial decidir que não pode tomar medidas seja um
caso do qual se possa ocupar outro procedimento especial. É importante
não centrar a atenção exclusivamente em um procedimento quando outros
também podem ser competentes para examinar o caso. Por exemplo, quando
o tratamento sofrido por um detento não for considerado suficientemente
grave para a intervenção do Relator Especial contra a Tortura, os
fatos podem ainda assim revelar um caso de detenção arbitrária do
qual pode se ocupar o Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária.
Uma vez que o Relator Especial deve decidir cada caso com base em seus
próprios fatos, é difícil prever, com exatidão, se ele poderá agir
em um determinado caso. Portanto, é melhor ampliar a possibilidade de a
denúncia ser acompanhada assegurando que ela chegue a todos os
procedimentos que possam ter competência para tanto, em vez de limitar
o comunicado a um único mecanismo.
Uma vez que os mandatos dos procedimentos
temáticos dependem da Comissão de Direitos Humanos, pode ocorrer que
um Relator Especial ou um Grupo de Trabalho seja descontinuado ou que
seja criado outro de um ano para o outro. A tabela a seguir expõe os
procedimentos temáticos existentes quando da redação deste manual,
bem como os aspectos específicos de cada um.
Tabela 9: Procedimentos Temáticos
Relevantes da Comissão de Direitos Humanos da ONU
Procedimento Temático:
Comentários:
GT sobre detenção arbitrária
Você deve explicar por que se acredita que a detenção é arbitrária.
Para o GT isso significa que a detenção: 1) não tem fundamento legal;
2) é uma resposta ao exercício dos direitos fundamentais, como
liberdade (por exemplo, a prisão de um jornalista pelo exercício de
sua profissão); ou 3) é interpretada como arbitrária porque não
foram observadas as garantias processuais (por exemplo, se alguém não
é prontamente levado a comparecer em juízo). Não basta considerar que
a detenção é "injusta". O GT normalmente não analisa um
caso quando a pessoa tiver sido solta, a menos que envolva uma questão
de princípio.
GT sobre desaparecimentos forçados ou
involuntários
O GT atua somente em casos particulares claramente identificados. Se a
pessoa ou organização que apresenta a informação não é um
familiar, mas atua direta ou indiretamente a pedido da família, ela
precisa manter contato com a família a todo momento, uma vez que
quaisquer respostas recebidas destinam-se unicamente à informação da
familiares. Deve-se indicar se deseja que seu comunicado seja tratado em
caráter confidencial.
RE sobre execuções extrajudiciais,
sumárias ou arbitrárias
O RE pode agir em casos em que, das ações de representantes oficiais
do Estado ou de grupos que colaboram com o Governo ou são tolerados por
este, resultam as seguintes conseqüências: 1) pena de morte, quando o
julgamento foi injusto, quando não se observou o direito de apelação,
ou quando envolve um menor, um deficiente mental ou demente, uma mulher
gestante ou uma mãe que deu à luz há pouco tempo; 2) ameaças de
morte ou risco iminente de execução extrajudicial; 3) mortes sob
custódia decorrentes de atos de tortura, negligência, uso da força ou
condições de detenção que representam ameaça à vida; 4) mortes em
decorrência do uso desnecessário ou inadequado da força; 5) mortes em
violação do DICA; 6) expulsão para um país onde a pessoa corre risco
de vida; 7) genocídio; 8) violação da obrigação de investigar,
processar os autores de torturas perante os tribunais e proporcionar uma
compensação adequada. Deve-se indicar se a informação é
confidencial.
RE sobre a promoção e proteção do
direito à liberdade de opinião e de expressão
As áreas de interesse do RE compreendem: pessoas que exercem/ promovem
o exercício do direito, tais como profissionais do área da
informação; partidos políticos da oposição e ativistas sindicais:
os meios de comunicação (imprensa e veículos de radiodifusão),
inclusive Qualquer ameaça contra sua independência; editores e
executantes em outros meios de comunicação; defensores dos direitos
humanos; barreiras ao direitos das mulheres de serem ouvidas; barreiras
ao acesso à informação. Deve-se indicar se deseja que seu comunicado
seja tratado em caráter confidencial.
RE sobre a independência de juízes e
advogados
Pode receber informação sobre juízes, advogados e magistrados. O RE
ocupa-se essencialmente das garantias e do bom funcionamento do sistema
de justiça.
RE sobre a questão da tortura
Ver quadro abaixo.
RE sobre a violência contra mulheres
O RE analisa casos de violência contra as mulheres em razão de seu
sexo: seu comunicado deve indicar por que se acredita que a mulher em
questão foi alvo da violação por causa de seu sexo. Uma
característica especial deste mandato é que ele centra a atenção na
violência não só por parte de representantes oficiais do Estado, mas
também nos casos em que o Estado permite que ela continue ocorrendo na
comunidade e na família. Com relação à informação geral, deve-se
observar que o RE tem particular interesse pelos exemplos de boa
prática que possam ser utilizados como base para recomendações em
outros Estados. Os comunicados são confidenciais.
Outros procedimentos temáticos
relevantes:
RE sobre a venda de crianças,
prostituição infantil e pornografia infantil; RESG sobre crianças em
conflitos armados; RESG sobre pessoas deslocadas; RE sobre os direitos
humanos de migrantes; RE sobre formas contemporâneas de racismo,
discriminação racial, xenofobia e intolerância; RE sobre a questão
da intolerância religiosa.
Legenda: RE = Relator Especial; RESG =
Representante Especial do Secretário Geral da ONU; GT = Grupo de
Trabalho
4.2.1.2.2. Relator Especial sobre a
Tortura
Tabela 10: Dados Básicos: Relator
Especial da ONU sobre a Tortura
DADOS BÁSICOS: Relator Especial da ONU
sobre a Tortura
Origem:
Como foi criado?
Mediante resolução da Comissão das Nações Unidas de Direitos
Humanos
Quando começou a funcionar?
1985
Composição:
Quantas pessoas o compõem?
1
São especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialista independente
Objetivo:
Objetivo geral
Monitorar a prática da tortura no mundo e informar a Comissão de
Direitos Humanos a esse respeito
Funções
Monitoramento
Apuração dos fatos
4.2.1.2.2.1. Como Funciona o Relator
Especial sobre a Tortura?
O trabalho do Relator Especial consiste
em apresentar à Comissão de Direitos Humanos o retrato mais preciso
possível da prática da tortura em todo o mundo. Para tanto, ele
depende das informações que recebe de toda uma série de fontes, tais
como ONGs, pessoas e os próprios governos. Com base nessa informação
o Relator:
Estabelece um diálogo com os governos
sobre as denúncias razoáveis levadas a sua atenção.
Realiza visitas para apuração de fatos.
Diálogo:
O diálogo do Relator Especial com um
governo pode começar de duas formas. Se ele acredita que as denúncias
que recebeu são fidedignas, ele transmitirá um apelo urgente ou fará
a denúncia em um comunicado padrão.
O procedimento de apelo urgente é
concebido para responder com urgência à informação sobre o risco de
tortura de uma pessoa e é utilizado para evitar possíveis incidentes
de tortura. Será utilizado, portanto, somente quando a informação for
muito recente. Trata-se de um procedimento não-acusatório, no qual se
solicita ao governo que tome medidas para assegurar que a pessoa não
seja torturada, sem adotar qualquer posição sobre se o temor de
torturas é justificado ou não.
Os comunicados padrão são transmitidos
aos governos periodicamente e consistem de denúncias relativas a casos
específicos (denúncias particulares) e as relativas a tendências
gerais, padrões e fatores especiais que contribuem para a prática da
tortura em um país (denúncias gerais).
Esses comunicados são transmitidos ao
governo contra o qual são dirigidas as denúncias, para dar-lhe uma
oportunidade de examiná-las. Dependendo da resposta recebida do
governo, o Relator Especial pode prosseguir a investigação ou fazer
recomendações. Todos os comunicados enviados e recebidos ao longo do
ano são detalhados em um relatório anual, juntamente com outras
recomendações e comentários gerais, quando apropriado, inclusive
recomendações sobre medidas que deveriam ser tomadas para erradicar a
tortura.
Apuração de fatos:
O Relator Especial sobre a Tortura
também realiza visitas para esclarecer e apurar fatos e obter
informação em primeira mão. Não tem o poder de visitar qualquer
país de sua escolha, mas deve, primeiro, obter um convite do governo
para realizar uma visita. Durante a visita, o Relator Especial se reúne
com representantes do governo, representantes de ONGs e as supostas
vítimas, além de visitar centros de detenção, tais como presídios
ou delegacias. Seu objetivo é ter uma boa percepção de qual é a
situação real em campo. Ao concluir a visita, o Relator produz um
relatório no qual apresenta suas conclusões sobre o alcance do
problema, ou se não existe o problema, no país visitado e faz
recomendações sobre as medidas que poderiam ser tomadas para melhorar
a situação.
4.2.1.2.2.2. O Que se Pode Conseguir
Apresentando Informação ao Relator Especial sobre a Tortura?
O poder do Relator Especial reside na
Comissão de Direitos Humanos e na natureza pública do procedimento.
Suas conclusões não são juridicamente vinculantes e ele não tem
poderes de execução. No entanto, não existem muitos Estados imunes à
condenação pública e a publicidade de suas conclusões cria pressão
sobre os Estados para que cooperem, introduzindo reformas ou
implementando suas recomendações.
Se seu objetivo é que sejam adotadas
medidas com relação a uma situação general, pode-se recorrer ao
Relator Especial sobre a Tortura para:
Divulgar publicamente a prática da
tortura em um país, inclusive a tolerância oficial dessa prática.
Fazer recomendações aos governos sobre
melhoras a serem que deveriam ser feitas.
Solicitar uma visita de apuração de
fatos para chamar a atenção da opinião pública sobre uma situação
específica.
Se seu objetivo é que sejam adotadas
medidas com relação a um caso particular, pode-se recorrer ao Relator
Especial sobre a Tortura para:
Divulgar publicamente incidentes
particulares de tortura.
Fazer recomendações aos governos com
relação a incidentes particulares de tortura, inclusive recomendar a
instauração de processo judicial contra os autores dos atos de
tortura.
Procurar evitar a tortura de pessoas que
se acredita correm um risco, solicitando, por exemplo, que não se
mantenha uma pessoa sob detenção incomunicada ou que lhe seja dado
tratamento médico urgente.
Procurar evitar a deportação de uma
pessoa para um país em que se acredita que ela corre um risco fundado
de tortura.
O Relator não pode:
Visitar países sem o consentimento de
seus governos.
Adotar decisões juridicamente
vinculantes em casos particulares.
Fazer cumprir as recomendações que faz
aos governos.
Conceder uma reparação às pessoas.
4.2.1.2.2.3. O Que Deve Conter um
Comunicado ao Relator Especial sobre a Tortura?
Se você pretende que o Relator Especial
adote medidas com relação a um incidente de tortura particular
não-urgente, deve seguir as orientações expostas na Parte III,
Capítulo 2.2.2, sobre o conteúdo de um comunicado padrão.
Se você pretende que o Relator Especial
utilize um procedimento de apelo urgente, siga as orientações
recomendadas, mas, além disso, tenha presente que:
Nos casos em que a tortura ainda não
tiver ocorrido, a data, a hora e o lugar geralmente serão os da
detenção.
Deve-se demonstrar que existe risco de
que a tortura ocorra. Isso significa que se deve enfatizar os fatores
que demonstram que esse risco existe: por exemplo, a natureza de
incomunicabilidade ou o não-reconhecimento da detenção da pessoa; o
fato de que essa mesma pessoa já foi torturada quando detida em uma
ocasião anterior; o conhecimento de que as pessoas presas por essa
divisão específica da polícia geralmente são torturadas, ou que os
integrantes de um determinado grupo a que essa pessoa pertence muitas
vezes são torturados quando detidos.
Não existem orientações precisas para
a apresentação de informação ao Relator Especial para uso em suas
denúncias gerais. As denúncias gerais são aquelas que não se limitam
a um caso particular ou a um único incidente. No entanto, geralmente se
fundamentam em um conjunto de incidentes particulares e são usadas para
identificar padrões de violação com base em relatos consistentes e
para expressar preocupação acerca de fatores específicos que
facilitam a prática da tortura em um país. Entre os exemplos dos temas
que são objeto das denúncias gerais incluem-se:
Uso generalizado de um método
específico de tortura, por exemplo, choques elétricos .
Uma lei que permite o uso de grilhões
nos presos nas prisões.
Uma lei que permite a detenção
incomunicada durante um longo período de tempo.
Relatos consistentes indicando que as
pessoas processadas por tortura nunca são condenadas.
Relatos consistentes indicando que uma
determinada delegacia ou divisão das forças de segurança pratica a
tortura.
Relatos consistentes indicando que os
membros de um determinado grupo étnico têm mais probabilidade de
sofrer torturas do que outros.
Relatos consistentes indicando que é
negado atendimento médico a presos com enfermidades graves.
Como se pode ver, o fator mais importante
será demonstrar um padrão. Ver Parte III, Capítulo 2.2.1 para
indicações sobre como fazê-lo. Quantos mais casos se puder reunir que
corroborem suas denúncias gerais, tanto melhor, uma vez que eles
demonstram que as práticas identificadas não são meros incidentes
isolados, mas caracterizam uma situação grave e generalizada.
4.2.1.2.2.4. Dicas Específicas
Quem será informado do comunicado/
identidade da fonte?
Para que o Relator Especial tome medidas
em um caso particular, é necessário transmitir o nome da suposta
vítima ou vítimas ao governo em questão. O nome da suposta vítima
também se tornará conhecido do público quando for registrado no
relatório anual do Relator Especial. Se você especificar que não quer
que o nome ou nomes sejam divulgados ao governo, não será possível
investigar o caso, mas o incidente pode proporcionar uma base para
denúncias gerais em conjunto com outras informações. O nome da fonte
da denúncia nunca é revelado, nem no comunicado ao governo, nem no
relatório anual.
Você receberá alguma resposta a seu
comunicado?
Você não receberá uma acusação de
recebimento de sua informação. Se suas denúncias forem transmitidas
ao governo, qualquer resposta recebida do governo normalmente lhe será
enviada a fim de lhe oferecer a oportunidade de comentar sobre seu
conteúdo. Todos os casos que são transmitidos aos governos são
resumidos no relatório anual do Relator Especial à Comissão de
Direitos Humanos, de modo que isso também lhe dirá se foi adotada
alguma medida com base em suas denúncias.
Parte do trabalho do Relator Especial
sobre a Tortura consiste em identificar e monitorar os maus tratos a
determinados grupos de pessoas. Nos últimos anos, seu trabalho tem se
concentrado principalmente nos maus tratos a crianças, mulheres e
defensores dos direitos humanos. Caso você tenha informação relativa
a alguma dessas categorias, ou outros grupos identificáveis, seria
importante enviá-la à atenção do Relator Especial.
4.2.1.2.3. Relatores Nacionais
Além dos relatores temáticos e dos
grupos de trabalho, a Comissão de Direitos Humanos também nomeia
relatores para um país (ou especialistas independentes ou
representantes especiais) cuja tarefa é informar sobre todos os
direitos humanos, inclusive incidentes de tortura e tratamento desumano
no país específico do qual se ocupam. Em geral, esses relatores são
nomeados para países que têm situações de direitos humanos
particularmente graves, inclusive aquelas provocadas por guerra ou
conflito interno. No entanto, a escolha de um país para um escrutínio
desse tipo é, sem dúvida, uma questão politicamente delicada e deve
haver um consenso suficiente entre os Estados representados na Comissão
de Direitos Humanos para a criação e nomeação de um relator
específico para um país.
A exemplo dos relatores temáticos, o
objetivo dos relatores específicos de um país é pintar um quadro
preciso de uma situação, mas, em vez de ser um quadro mundial de um
determinado fenômeno, deve ser um relatório muito mais exaustivo sobre
a situação de direitos humanos em um único país. As acusações de
tortura e tratamento desumano são as de maior relevância para esse
relator, que precisa estar em condições de informar sobre o fenômeno
no contexto de seu relatório sobre país em questão. Portanto, quando
houver um relator especial nomeado para o país sobre o qual você
deseja apresentar uma denúncia de tortura, o relator deve ser incluído
na lista de procedimentos aos quais sua denúncia deve ser enviada.
Assim, se a prisão e a detenção da jornalista mencionada
anteriormente, por exemplo, ocorreu em um país para o qual existe um
relator especial nomeado, por exemplo, Birmânia, Guiné Equatorial ou
Irã, esse relator também deve receber a informação.
Quando da redação deste manual,
existiam mandatos específicos para os seguintes países:
Tabela 11: Relatores de país da
Comissão de Direitos Humanos da ONU (1999)
Afeganistão (RE)
Birmânia (RE)
Burundi (RE)
Camboja (RESG)
Congo, República Democrática (RE)
Chipre (SG)
Ex-Iugoslávia: Kosovo (SG)
Guiné Equatorial (RECDH)
Haiti (EI)
Iraque (RE)
Irã, República Islâmica (RECDH)
Ruanda (RECDH)
Somália (EI)
Sudão (RE)
Territórios Árabes Ocupados (SG, RE e
Comitê Especial)
Timor Leste (RE)
Legenda: RE = Relator Especial; RESG =
Representante Especial do Secretário Geral; RECDH = Representante
Especial da Comissão de Direitos Humanos; EI = Especialista
Independente
4.2.2. Organismos de Tratados das
Nações Unidas
Os organismos de tratados das Nações
Unidas foram criados para supervisionar a implementação pelos Estados
Parte de suas obrigações assumidas em virtude de uma série de
tratados de direitos humanos da ONU. Os principais comitês aos quais é
possível apresentar denúncias de tortura são:
Comitê contra a Tortura (CCT):
supervisiona a Convenção da ONU contra a Tortura
Comitê de Direitos Humanos (CDH):
supervisiona o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos
Comitê dos Direitos da Criança (CDC):
supervisiona a Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança
Comitê para a Eliminação da
Discriminação contra a Mulher (CEDM): supervisiona a Convenção da
ONU sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher
Comitê para a Eliminação da
Discriminação Racial (CEDR): supervisiona a Convenção da ONU sobre a
Eliminação da Discriminação Racial
Os mais importantes para os fins de
material relacionado à tortura são o CCT, que se concentra
exclusivamente no tema da tortura, e o CDH, um organismo consagrado que
se ocupa de toda uma ampla gama de direitos humanos, inclusive a
tortura. No entanto, os demais comitês são muito importantes nos casos
em que as denúncias de tortura estão relacionadas a certas categorias
identificáveis de pessoas, a saber, crianças, mulheres e grupos
raciais.
Os métodos de trabalho de cada um desses
organismos são muito semelhantes. Todos eles têm o poder de examinar e
comentar os relatórios estatais, e a maioria também pode receber
reclamações particulares ou estão em vias de criar um procedimento
dessa natureza.
Comitê Contra a Tortura
Tabela 12: Comitê Contra a Tortura
DADOS BÁSICOS: Comitê Contra a Tortura
Origem:
Como foi criado?
Pela Convenção da ONU Contra a Tortura de 1984
Quando começou a funcionar?
1988
Composição:
Quantas pessoas o compõem?
10
São especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes
Objetivo:
Objetivos gerais
Garantir que os Estados respeitem suas obrigações assumidas em virtude
desse tratado, a fim de prevenir e punir a prática da tortura.
Funções
Análise dos relatórios estatais (Artigo 19, CNUCT)
Apuração de fatos mediante um
procedimento de investigação confidencial (Artigo 20, CNUCT)
Reclamações interestatais (Artigo 21,
CNUCT)
Reclamações particulares (facultativo)
(Artigo 22, CNUCT) (Ver Parte III, Capítulo 4.3.1)
4.2.2.1.1. Como Funciona o Comitê Contra
a Tortura?
O Comitê é responsável por monitorar o
respeito, pelos Estados, de suas obrigações no sentido de implementar
a Convenção Contra a Tortura, isto é, prevenir, proibir e punir a
tortura. O Comitê realiza sua tarefa principalmente mediante:
A análise dos relatórios apresentados
periodicamente pelos Estados (Ver Parte III, Capítulo 2.3 para uma
descrição de como funciona o procedimento de relatório estatal).
Além disso, o Comitê pode:
Realizar uma investigação confidencial
de denúncias de uma prática sistemática de tortura em um Estado Parte
(ainda que alguns Estados Parte possam não o permitir; Ver Parte III,
Capítulo 4.2.2.1.4).
Com relação aos Estados que aceitaram o
procedimento de reclamação particular, o Comitê examina as denúncias
recebidas de particulares sobre incidentes específicos de tortura, tais
como casos que envolvem a expulsão iminente de pessoas para um país em
que se acredita que elas correm risco de tortura (essa função será
considerada na Parte III, Capítulo 4.3.1).
O procedimento de investigação é um
procedimento confidencial para investigar denúncias de uma prática
sistemática de torturas em um Estado Parte da convenção. Uma
investigação pode ser iniciada quando se recebe "informação
fidedigna" que "parece conter indicações fundadas de que a
tortura está sendo praticada sistematicamente". A grande parte
dessa informação procederá das ONGs, e é possível solicitar
expressamente uma investigação quando se acredita que se dispõe de
informação suficiente para demonstrar uma prática sistemática,
embora não se deva esperar ser informado se suas informações
originaram ações. Se um Estado Parte o aceitar, a investigação pode
envolver uma visita ao país para levantamento e apuração dos fatos.
Em tais casos, o Comitê fará contato com as ONGs locais, com base no
entendimento de que elas manterão o mais alto respeito pela natureza
confidencial da visita.
Por fim, o Comitê chegará a uma
conclusão sobre se existe ou não uma prática sistemática de tortura.
Essa conclusão, juntamente com quaisquer recomendações cabíveis,
será transmitida ao Estado Parte. O processo continuará sendo
confidencial, porém, quando concluído, a Comissão, após uma consulta
com o Estado Parte, pode optar por incluir uma explicação resumida de
seus resultados em seu relatório anual.
4.2.2.1.2. O Que se Pode Conseguir
Apresentando Informação ao Comitê Contra a Tortura?
Ver Parte III, Capítulo 2.3 para
sugestões sobre o que se pode conseguir no contexto do procedimento de
relatório estatal.
A força do procedimento de
investigação, apesar de sua natureza confidencial, é a repercussão
muito negativa de se iniciar uma investigação contra um país. Isso
somente ocorrerá nos casos em que as situações forem consideradas
extremamente graves; para um Estado, ser identificado como um país que
tolera a prática sistemática da tortura é uma penalidade pesada.
Apesar de o processo continuar sendo confidencial durante toda a
investigação, existe a possibilidade de divulgar ao público um resumo
das conclusões e isso inclui uma constatação afirmativa de que existe
uma prática sistemática da tortura. Essa sanção foi utilizada apenas
em dois casos até o momento. Mesmo nos casos em que o Comitê não
torna públicas suas conclusões, o procedimento pode ser útil: o
simples fato de o Comitê ter a possibilidade de tornar públicas suas
constatações pode criar pressão para que um Estado tome medidas para
alterar a legislação ou evitar certas práticas, no intuito de
desestimular o Comitê de ir adiante com suas ações.
4.2.2.1.3. O Que Deve Conter um
Comunicado ao Comitê Contra a Tortura?
Ver Parte III, Capítulo 2.3.3, para
orientações gerais sobre o que deve conter um comunicado no contexto
do procedimento de relatório estatal.
A Convenção Contra a Tortura cria
obrigações muito específicas, muitas das quais devem ser
implementadas pelos Estados Parte por meio de medidas legislativas ou de
outro tipo. Um Estado Parte geralmente exporá de modo muito amplo a
situação jurídica oficial com relação a cada uma dessas
obrigações. Em seu comunicado, seu principal objetivo deve ser
descrever o que geralmente acontece na prática, dando tantos exemplos
quantos possíveis. Nunca simplesmente afirme que algo é ineficaz sem
explicar por quê.
Por exemplo:
Quando o Estado tiver adotado medidas
legislativas, administrativas, jurídicas e outras medidas para evitar
atos de tortura e outras formas de maus tratos, na prática, elas
efetivamente evitam tais atos? Dê exemplos de casos em que essas
medidas funcionaram/ não funcionaram.
Se a tortura é um crime nos termos
previstos em lei, alguma autoridade foi efetivamente processada e
condenada com base nessa lei? Que tipo de pena recebeu? Dê exemplos de
quaisquer processos instaurados e de decisões de não instaurar
processo judicial, bem como quaisquer condenações e penas aplicadas.
O Estado investiga as denúncias de
tortura e maus tratos e, se o faz, qual é o resultado dessas
investigações? Por exemplo, os promotores públicos levam esses casos
a sério? As investigações alguma vez resultam na instauração de
processo penal contra os responsáveis pelos atos tortura? Que tipo de
métodos são utilizados para investigar?
As vítimas de torturas chegam a receber
uma compensação ou outro tipo de reparação? Se são concedidas
indenizações, dê exemplos das quantias pagas a título de
compensação.
Uma pessoa pode ser condenada por uma
declaração obtida mediante tortura? Ou seja, se um juiz sabe que uma
confissão ou outra declaração incriminatória foi feita sob tortura,
ele ainda assim pode condenar a pessoa?
Se você deseja solicitar uma
investigação confidencial, seu objetivo é duplo: demonstrar a
existência de uma prática sistemática de tortura no país e explicar
o contexto, principalmente o contexto jurídico.
Prática sistemática: O Comitê elaborou
alguns critérios gerais que são levados em consideração para
determinar se existe uma prática sistemática. O Comitê considera que
a tortura é praticada sistematicamente quando:
É evidente que os casos de tortura
denunciados não ocorreram de modo fortuito em um determinado lugar ou
em um determinado momento, mas são habituais, generalizados e
deliberados pelo menos em uma parte considerável do território em
questão.
Além disso, o Comitê considera que:
Isso não é necessariamente resultado de
uma intenção direta de um governo, mas pode ser conseqüência de
fatores que o governo tem dificuldade de controlar e sua existência
pode indicar uma discrepância entre a política definida pelo governo
central e sua implementação pela administração local.
Uma legislação inadequada que, na
prática, dá margem para o uso da tortura também pode contribuir para
a natureza sistemática dessa prática.
As ONGs devem fornecer informação sobre
um grande número de incidentes de tortura e estruturar bem sua
apresentação desses incidentes a fim de utilizá-los da melhor forma
para demonstrar a natureza sistemática da prática. Isso significa que
não basta denunciar uns poucos casos isolados: é preciso haver uma
concentração geográfica de incidentes ou múltiplas denúncias
relacionadas a uma determinada lei, por exemplo.
Contexto: Para que o Comitê esteja a par
da existência ou não de uma prática sistemática em um país, é
muito útil explicar-lhes o contexto, principalmente o contexto
jurídico. Esse aspecto é particularmente importante para ajudar o
Comitê a identificar as possíveis causas de uma prática sistemática,
principalmente quando em se tratando de legislação inadequada. As ONGs
devem apresentar informação sobre todas as leis anti-terrorismo
aplicáveis no país e chamar a atenção do Comitê para quaisquer leis
que parecem estar causando problemas; por exemplo, uma lei que permite o
prolongamento da detenção incomunicada ou protege as autoridades da
instauração de processos judiciais por atos de tortura.
4.2.2.1.4. Dicas Específicas
Os Estados têm o direito de fazer uma
declaração afirmando que não reconhecem a competência do Comitê
para realizar uma investigação confidencial conforme prevê o Artigo
20. Isso significa que se supõe que os Estados Parte consentem no
procedimento, a menos que especifiquem em contrário. Se você deseja
solicitar uma investigação, a primeira coisa que deverá fazer é
comprovar que o Estado em questão não fez tal declaração.
As ONGs podem solicitar o início desse
procedimento, porém, como se trata de um procedimento estritamente
confidencial, elas não receberão uma resposta. Não subestime a
importância da natureza confidencial do procedimento: se alguém se
dirigir a você para lhe pedir informação no contexto de uma
investigação desse tipo, inclusive no caso de uma visita para
apuração dos fatos, você deve respeitar a confidencialidade da
investigação se quiser que sua organização seja consultada
novamente.
Atualmente está sendo discutida a
elaboração de um protocolo à Convenção Contra a Tortura que
conferiria ao Comitê Contra a Tortura poderes semelhantes aos do
Comitê Europeu para a Prevenção da Tortura, criando, assim, um
sistema de visitas periódicas a centros de detenção.
4.2.2.2. Comitê de Direitos Humanos
Tabela 13: Dados Básicos: Comitê de
Direitos Humanos
DADOS BÁSICOS: Comitê de Direitos
Humanos
Origem:
Como foi criado?
Pelo Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de 1966
Quando começou a funcionar?
1976
Composição:
Quantas pessoas o compõem?
18
São especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes
Objetivo:
Objetivo geral
Supervisionar a implementação, pelos Estados, de suas obrigações nos
termos desse tratado
Funções
Análise dos relatórios estatais (Artigo 40, PIDCP)
Reclamações interestaduais (Artigo 41,
PIDCP) (nunca foi usado)
Reclamações particulares (opcional)
(Protocolo Opcional ao PICDP) (Ver Parte III, Capítulo 4.3.2)
4.2.2.2.1. Como Funciona o Comitê de
Direitos Humanos?
O Comitê é responsável por assegurar
que os Estados Parte cumpram suas obrigações de respeitar e garantir a
todas as pessoas os direitos contidos no PIDCP, inclusive o direito de
não ser submetido a tortura ou a tratamento ou punição cruel,
desumano ou degradante (Artigo 7) e o direito de todas as pessoas
privadas de sua liberdade de receber um tratamento humano e digno
(Artigo 10). O Comitê realiza seu trabalho de duas formas:
Analisa e comenta relatórios a ele
encaminhados periodicamente pelos Estados Parte.
Analisa as denúncias que recebe de
pessoas sobre incidentes específicos de violação (assunto a ser
considerado na Parte III, Capítulo 4.3.2).
Ver Parte III, Capítulo 2.3, para uma
descrição de como funciona o procedimento de relatório estatal,
sugestões sobre o que se pode conseguir no contexto do procedimento do
relatório estatal e o que deve conter um comunicado.
4.2.2.2.2. Dicas Específicas
O Comitê de Direitos Humanos pode
solicitar aos Estados Parte que apresentem um relatório especial se as
circunstâncias assim parecerem exigir. Potencialmente, essa
solicitação pode ser feita em resposta a informação de violações
graves. Entre os Estados aos quais se solicitou a elaboração desses
relatórios inclui a antiga Iugoslávia no período subseqüente à sua
independência.
Se possível, devem ser fornecidas 25
cópias dos relatórios das ONGs.
Outros Comitês
TABELA 14: DADOS BÁSICOS: COMITÊ DOS
DIREITOS DA CRIANÇA
DADOS BÁSICOS: Comitê dos Direitos da
Criança
Origem:
Como foi criado?
Pela Convenção da ONU sobre Direitos da Criança de 1989
Quando começou a funcionar?
1991
Composição:
Quantas pessoas o compõem?
10
São especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes
Objetivo:
Objetivo geral
Supervisionar a implementação, pelos Estados Parte, de suas
obrigações nos termos da CNUDC
Funções
Análise de relatórios estatais (Artigo 44, CNUDC)
Atualmente está sendo discutida a
possibilidade de se adotar um protocolo à CNUDC que permitiria
reclamações particulares.
Tabela 15: Dados básicos: Comitê para a
Eliminação da Discriminação contra a Mulher
DADOS BÁSICOS: Comitê para a
Eliminação da Discriminação Contra a Mulher
Origem:
Como foi criado?
Pela Convenção da ONU sobre a Eliminação da Discriminação Contra a
Mulher
Quando começou a funcionar?
1981
Composição:
Quantas pessoas o compõem?
23
São especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes
Objetivo:
Objetivo geral
Supervisionar a implementação, pelos Estados Parte, de suas
obrigações nos termos da CNUEDM
Funções
Análise de relatórios estatais (Artigo 18, CNUEDM)
No início de 1999, finalmente foi
alcançado um acordo para a criação de um procedimento de reclamação
particular, mas ele ainda não havia começado a funcionar até a data
de redação deste manual.
Tabela 16: Dados Básicos: Comitê para a
Eliminação da Discriminação Racial
DADOS BÁSICOS: Comitê para a
Eliminação da Discriminação Racial
Origem:
Como foi criado?
Pela Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial de 1965
Quando começou a funcionar?
1969
Composição:
Quantas pessoas o compõem?
18
São especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes
Objetivo:
Objetivo geral
Supervisionar a implementação, pelos Estados Parte, de suas
obrigações nos termos da CNUEDR
Funções
Análise de relatórios estatais (Artigo 9, CEDR)
Reclamações interestatais (Artigo 11,
CEDR) (nunca foi usado)
Reclamações particulares (opcional)
(Artigo 14, CNUEDR) (Ver Parte III, Capítulo 4.3.3)
Desses três comitês, todos atualmente
funcionam principalmente por meio do procedimento de relatório estatal.
O CEDR é o único que hoje dispõe de um procedimento de reclamação
particular em funcionamento (Ver Parte III, Capítulo 4.3.3), mas é
provavél que tanto o CDC como o CEDM também o tenham em breve.
Consulte a Parte III, Capítulo 2.3, para
uma descrição sobre como funciona o procedimento de relatório
estatal, sugestões sobre o que se pode conseguir por meio de um
procedimento desse tipo e orientações sobre como preparar um
comunicado a ser apresentado no contexto desse procedimento.
4.2.2.3.1. Dicas Específicas
O CDC realiza uma sessão prévia com um
grupo de trabalho antes de sua próxima reunião, na qual é elaborada
uma lista de temas a serem levantados junto aos governos que apresentam
seus relatórios. Essa lista é elaborada a partir de um exame do
relatório estatal, dos comunicados apresentados por ONGs e pelos
respectivos organismos da ONU e órgãos especializados, e solicita ao
governo que apresente respostas por escrito às perguntas, antes da
sessão em que será examinado o relatório. É importante ter presente
que os comunicados de ONGs relativos a um Estado devem ser apresentados,
portanto, antes da reunião prévia que precede a sessão de análise do
relatório do Estado em questão.
O CEDM está passando a solicitar aos
Estados que elaborem relatórios periódicos sobre temas mais
específicos, em vez de relatórios gerais sobre todas as obrigações
previstas na Convenção. Isso sugere que, via de regra, seria
preferível receber esse tipo de relatório também das ONGs.
4.3. Procedimentos de reclamação no
âmbito do sistema das Nações Unidas
4.3.1. Comitê Contra a Tortura
Tabela 17: Cronologia Básica do
Procedimento de Reclamação Particular: CCT
CRONOLOGIA BÁSICA DO: Procedimento de
Reclamação Particular – CCT
Recebimento de seu comunicado
ß
Um integrante do CCT é nomeado como
relator para decidir se o comunicado deve ser enviado ao governo
(informação suplementar pode ser solicitada)
ß
O comunicado é enviado ao governo para
que este faça seus comentários. O governo recebe:
ß
ß
OU 3 meses para apresentar observações
sobre a admissibilidade
Ou 6 meses para comentar a admissibilidade e o mérito
ß
ß
Os comentários do governo são enviados ao reclamante, ao qual se
concede:
ß
ß
OU 4 semanas para que responda aos
comentários sobre a admissibilidade
Ou 6 semanas para comentar a admissibilidade e o mérito
ß
ß
O CCT adota uma decisão sobre a
admissibilidade
ß
ß
O governo dispõe de 6 meses para
comentar o mérito
ß
ß
Os comentários do governo são enviados
ao reclamante, que dispõe de 6 semanas para comentá-los
ß
ß
O CCT considera toda a informação levada à sua atenção e adota um
parecer sobre o caso, bem como sobre se houve ou não uma violação
ß
Parecer e conclusão do CCT são enviados
ao reclamante e ao Estado Parte, que pode ser convidado a informar ao
CCT sobre as medidas tomadas para cumprir o parecer do CCT
ß
Um resumo do caso é publicado no
relatório anual do CCT
Ver Parte III, Capítulo 4.2.2.1, Dados
Básicos: Comitê Contra a Tortura.
4.3.1.1. Que tipo de reclamações pode
examinar?
Ver Parte III, Capítulo 3.2, sobre o
tipo de reclamações que podem ser analisadas pelos procedimentos de
reclamação particular.
A Convenção Contra a Tortura cria
obrigações para os Estados Parte não só com respeito à tortura, mas
também no sentido de adotarem medidas preventivas e reparadoras contra
a tortura. Isso significa que é possível apresentar uma reclamação
contra um Estado Parte não só pelo incidente de tortura propriamente
dito, mas também com relação a qualquer das obrigações do Estado
Parte previstas na Convenção. As principais obrigações compreendem
(Ver Artigos 2-16 da CNUCT para uma relação completa):
A obrigação de não expulsar, retornar
ou extraditar uma pessoa para outro Estado onde há razões
fundamentadas para se acreditar que a pessoa pode correr risco de ser
submetida a torturas (Artigo 3).
A obrigação de investigar com
diligência e imparcialidade uma denúncia de tortura e, portanto, a
obrigação de proteger um denunciante e testemunhas de qualquer
intimidação (Artigo 13).
A obrigação de garantir que o sistema
jurídico conceda uma reparação a vítimas de tortura, bem como uma
compensação justa e adequada ou, caso a vítima venha a falecer em
decorrência da tortura, a seus descendentes (Artigo 14).
A obrigação de garantir que qualquer
declaração comprovadamente feita mediante tortura não seja invocada
como prova em processos judiciais, salvo contra uma pessoa acusada de
tortura (Artigo 15).
4.3.1.2. Quais são os requisitos de
admissibilidade ?
Um comunicado será declarado
inadmissível se:
o comunicado for anônimo.
o comunicado for um abuso do direito de
apresentação de um comunicado particular.
o comunicado for incompatível com as
disposições da convenção.
a mesma matéria já tiver sido ou
estiver sendo examinada por outro procedimento internacional de
investigação.
não tiverem sido esgotados os recursos
nacionais, salvo quando os recursos forem injustificadamente prolongados
ou quando for improvável que tenham um efeito reparador para a vítima.
4.3.1.3. Dicas Específicas
Certifique-se de que o Estado é parte da
Convenção Contra a Tortura e que aceitou as reclamações particulares
em conformidade com o Artigo 22.
Lembre-se que é possível denunciar uma
violação de qualquer disposição da Convenção Contra a Tortura,
não só o incidente de tortura propriamente dito. A maioria dos casos
levados à atenção do Comitê, exceto os casos de deportação, têm
relação com as disposições sobre reparação. Se sua denúncia for
sobre essas disposições, deverão ser enfatizados os fatos
relacionados à não-concessão de reparação pelo Estado Parte.
O Comitê e sua Secretaria levam muito a
sério a confidencialidade do processo. Isso significa que não
oferecerão informação sobre um caso a nenhuma pessoa, exceto o autor
do comunicado e seu representante nomeado na carta de autorização.
Também significa que o autor do comunicado e seu representante não
devem revelar qualquer informação sobre o processo ao público. Em
caso de dúvida, certifique-se sempre junto à Secretaria sobre qual
informação pode ser divulgada e qual deve permanecer em caráter
confidencial.
Se você deseja fazer uma reclamação
sobre a deportação iminente de uma pessoa (conforme dispõe o Artigo 3
da CNUCT), procure não deixar sua requisição para a última hora. Nos
últimos anos, tem havido um certo abuso do procedimento de medidas
provisórias e o Comitê está começando a fechar a porta para essas
requisições. A abordagem mais sensata seria entrar em contato com a
Secretaria tão logo tenha sido fixada uma data para a deportação,
mesmo que você ainda esteja recorrendo da decisão. Explique a
situação e advirta que, caso seja negado o recurso interposto, é sua
intenção requisitar medidas provisórias do Comitê. Isso significa
que os membros do Comitê poderão se preparar para a possibilidade de
uma intervenção de última hora, em vez de serem tomados de surpresa.
Além disso, eles também poderão aconselhá-lo sobre a solidez de seu
caso.
Tabela 18: Aspectos Práticos do Uso do
Procedimento de Reclamação Particular: CCT
ASPECTOS PRÁTICOS DO PROCEDIMENTO DE
RECLAMAÇÃO PARTICULAR: Convenção da ONU Contra a Tortura
Quem pode apresentar um caso a este
procedimento?
Qualquer pessoa que afirme ser vítima de uma violação da Convenção,
seus familiares, um representante designado, ou outras pessoas nos casos
em que a vítima não puder fazer a apresentação ela mesma e o autor
do comunicado puder justificar sua atuação em nome da vítima.
Existe um prazo para se apresentar uma
requisição?
Não, mas a violação alegada deve ter ocorrido após a declaração do
Estado Parte aceitando que o procedimento entrou em vigor.
É possível apresentar um caso a este
procedimento se o caso já tiver sido apresentado a outro procedimento
com relação aos mesmos fatos?
Não
É necessária representação jurídica?
Não
É possível oferecer assistência
financeira?
Não
São aceitos relatos amicus?
Não está previsto, mas não se exclui a possibilidade.
Quem tomará conhecimento do comunicado?
O autor do comunicado e seu representante, o Comitê e sua Secretaria e
o Estado Parte. A identidade do autor somente é divulgada se o Comitê
constatar que ocorreu uma violação, mas pode ser mantida em caráter
confidencial a pedido do autor, mesmo em tais casos.
Quanto tempo dura este procedimento?
Normalmente um ano, mas pode se prolongar.
Quais medidas, se houver, o mecanismo
pode adotar para ajudar a alcançar uma decisão? Por exemplo,
audiências para apuração dos fatos; visitas in loco; postulações
escritas; audiências orais; outras.
Postulações escritas e audiências orais.
É possível utilizar medidas
provisórias ou urgentes?
Sim
Comitê de Direitos Humanos
Ver Parte III, Capítulo 4.2.2.2, Dados
Básicos: O Comitê de Direitos Humanos.
A cronologia básica do procedimento de
reclamação particular do Comitê de Direitos Humanos é a mesma que a
do CCT. Ver Parte III, Capítulo 4.3.1.
Ver Parte III, Capítulo 3.2, sobre o
tipo de reclamações que podem ser examinadas.
4.3.2.1. Quais são os requisitos de
admissibilidade?
Um comunicado será declarado
inadmissível se:
o comunicado for anônimo
o comunicado for um abuso do direito de
apresentação
o comunicado for incompatível com as
disposições do Pacto
a mesma matéria estiver sendo analisada
por outro procedimento internacional de investigação
não tiverem sido esgotados os recursos
nacionais, salvo quando os recursos forem injustificadamente prolongados
Tabela 18: Aspectos Práticos do Uso do
Procedimento de Reclamação Particular: Protocolo Opcional ao PIDCP
ASPECTOS PRÁTICOS DO USO DO PROCEDIMENTO
DE RECLAMAÇÃO PARTICULAR: Protocolo Opcional ao Pacto Internacional
sobre Direitos Civis e Políticos
Quem pode apresentar um caso a este
procedimento?
Pessoas que afirmem ser vítimas de uma violação do PIDCP. São
aceitos comunicados de familiares próximos ou de um representante
autorizado (deve haver uma carta de autorização da vítima ou de sua
família). Deve-se apresentar uma explicação nos casos em que as
vítimas não iniciarem a ação elas mesmas.
Existe um prazo para se apresentar uma
requisição?
Não, mas não havendo uma justificativa para uma longa demora, o
Comitê pode declarar o caso inadmissível.
É possível apresentar um caso a este
procedimento se o caso já tiver sido apresentado a outro procedimento
com relação aos mesmos fatos?
Sim, mas somente se o Estado Parte em questão não tiver feito uma
reserva a esse respeito.
É necessária representação jurídica?
Não
É possível oferecer assistência
financeira?
Não
São aceitos relatos amicus?
Não
Quem tomará conhecimento do comunicado?
O Estado Parte sempre será informado da identidade do reclamante, para
que responda às denúncias, mas o Comitê não tornará público o nome
do requisitante se assim lhe for solicitado. O reclamante e o Estado
Parte envolvido têm o direito de divulgar informação relacionada ao
procedimento, a menos que o reclamante ou o Estado Parte solicite
confidencialidade.
Quais medidas, se houver, o mecanismo
pode adotar para ajudar a alcançar a uma decisão?
Todo o procedimento baseia-se em postulações escritas das partes;
outras medidas não são possíveis.
Quanto tempo dura este procedimento?
Normalmente entre dois e cinco anos, embora possa ser reduzido para um
ano em casos urgentes.
É possível utilizar medidas
provisórias ou urgentes?
Sim, mas o Comitê raramente exerce esta opção.
4.3.2.2. Dicas Específicas
Certifique-se de que o Estado é parte do
PIDCP e que aceitou as reclamações particulares nos termos do
Protocolo Opcional.
Neste procedimento, um comunicado é
declarado inadmissível se estiver sendo examinado por outro
procedimento internacional de investigação; isso significa que um caso
que tiver sido considerado em outro procedimento já concluído continua
sendo admissível. Portanto, é possível tentar buscar uma solução
jurídica por meio de outro procedimento internacional primeiro e,
subseqüentemente, apresentar o caso perante o Comitê de Direitos
Humanos. No entanto, muitos Estados Parte têm feito reservas que
impedem que o Comitê examine casos já examinados por outros
organismos. Certifique-se, portanto, se essas reservas se aplicam a seu
caso.
Em vez de anexar um resumo dos pareceres
a seu relatório anual, o Comitê de Direitos Humanos publica seus
pareceres.
4.3.3. Outros Comitês
Ver Parte III, Capítulo 4.2.2.3, Dados
Básicos: Comitê dos Direitos da Criança, Dados Básicos: Comitê para
a Eliminação da Discriminação contra a Mulher e Dados Básicos:
Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial.
Somente o Comitê da CEDR atualmente
analisa reclamações particulares, mas essa função recentemente foi
aprovada para o Comitê da CEDM e também está em discussão para o
CDC.
A cronologia básica do procedimento de
reclamação particular do Comitê para a Eliminação da
Discriminação Racial é a mesma que a do CCT. Ver Parte III, Capítulo
4.3.1.
Ver Parte III, Capítulo 3.2, para o tipo
de reclamações que podem ser examinadas.
4.3.3.1. Quais são os requisitos de
admissibilidade?
Um comunicado será declarado
inadmissível se:
o comunicado for anônimo
o comunicado for um abuso do direito de
apresentação
o comunicado for incompatível com as
disposições do Pacto
não tiverem sido esgotados os recursos
nacionais, inclusive perante um órgão nacional designado, a menos que
os recursos sejam injustificadamente prolongados
for apresentado mais de seis meses depois
de esgotados todos os recursos nacionais, salvo no caso de
circunstâncias extraordinárias comprovadas
4.3.3.2. Dicas Específicas
Cerfifique-se de que o Estado é parte da
CEDR e que aceitou as reclamações particulares nos termos do Artigo
14.
Embora a CEDR seja uma convenção
amplamente ratificada, poucos Estados Parte aceitaram o procedimento de
reclamação particular.
A CEDR estipula que os Estados Parte que
aceitaram o procedimento de comunicação particular podem declarar ou
indicar que um órgão nacional é competente para examinar tais
reclamações no âmbito nacional. Somente se não for obtida qualquer
solução jurídica desse órgão é que, então, será possível
apresentar uma requisição ao Comitê da CEDR.
A CEDR pode declarar um comunicado
admissível mesmo se o caso estiver sendo examinado por outro
procedimento internacional.
O Comitê da CEDR não revela a
identidade do reclamante sem seu expresso consentimento.
Tabela 20: Aspectos Práticos do Uso do
Procedimento de Reclamação Particular: CEDR
ASPECTOS PRÁTICOS DO USO DO PROCEDIMENTO
DE RECLAMAÇÃO PARTICULAR: Convenção da ONU sobre a Eliminação da
Discriminação Racial
Quem pode apresentar um caso a este
procedimento?
Uma pessoa que alegue ser vítima de uma violação dos direitos
previstos na CEDR. O comunicado em geral deve ser apresentado pela
própria vítima ou por um familiar ou representante designado, mas
excepcionalmente pode ser aceito de uma terceira parte atuando em nome
da suposta vítima quando esta não puder atuar pessoalmente e a
terceira parte puder justificar sua atuação.
Existe um prazo para se apresentar uma
requisição?
Até seis meses após o esgotamento dos recursos nacionais, salvo se
houver circunstâncias excepcionais comprováveis.
É possível apresentar um caso a este
procedimento se o caso já tiver sido apresentado a outro procedimento
com relação aos mesmos fatos?
Sim
É necessária representação jurídica?
Não
É possível oferecer assistência
financeira?
Não
São aceitos relatos amicus?
Não está disposto, mas não se exclui a possibilidade.
Quem tomará conhecimento do comunicado?
A identidade da pessoa não é revelada sem seu expresso consentimento.
Quanto tempo dura este procedimento?
Normalmente de 1 a 3 anos.
Quais medidas, se houver, o mecanismo
pode adotar para ajudar a alcançar uma decisão? Por exemplo,
audiências para apuração dos fatos; visitas in loco; postulações
escritas; audiências orais; outras.
Postulações escritas; audiências orais; solicitação de
documentação pertinente de organismos da ONU e órgãos
especializados.
É possível utilizar medidas
provisórias ou urgentes?
Sim
5. MECANISMOS E PROCEDIMENTOS: ESFERA
REGIONAL
5.1. O Sistema Europeu
Existem muitas organizações
internacionais no âmbito da União Européia: a Organização para
Segurança e Cooperação na Europa, o Conselho da Europa e a União
Européia. Quando da redação deste manual, somente o Conselho da
Europa havia estabelecido procedimentos oficiais para lidar com
denúncias de tortura e outras formas de maus tratos, embora a OSCE
também trabalhe na área dos direitos humanos, como se observará na
Parte III, Capítulo 7.
Dentro do Conselho da Europa, existem
dois órgãos de relevância para este manual: o Comitê Europeu para a
Prevenção da Tortura e o Tribunal Europeu de Direitos Humanos. O
Comitê Europeu para a Prevenção da Tortura será discutido
pormenorizadamente porque desempenha uma função singular que nenhum
outro órgão atualmente está capacitado para exercer.
Idiomas: Os idiomas oficiais e de
trabalho do Conselho da Europa são o inglês e o francês. Procure
apresentar pelo menos um breve resumo de suas denúncias em um desses
idiomas. Ver Parte III, Capítulo 2.1.1, para sugestões sobre o idioma
de apresentação de seu comunicado.
5.1.1. Mecanismo de Denúncia: Comitê
Europeu para Prevenção da Tortura
Tabela 21: Dados básicos: Comitê
Europeu para a Prevenção da Tortura
DADOS BÁSICOS: Comitê Europeu para a
Prevenção da Tortura
Origem:
Como foi criado?
Pela Convenção Européia para a Prevenção da Tortura de 1987
Quando começou a funcionar?
1989
Composição:
Quantas pessoas o compõem?
Tantos membros quantos Estados Parte da Convenção (atualmente 40)
São especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes
Objetivo:
Objetivo geral
Melhorar a proteção às pessoas privadas de liberdade, trabalhando
para prevenir a tortura e tratamento ou punição desumana ou
degradante.
Funções
Monitoramento
Apuração de fatos
5.1.1.1. Como funciona o Comitê Europeu
para a Prevenção da Tortura?
As funções do Comitê são estritamente
preventivas, mas também são as mais intervencionistas de todos os
organismos analisados neste manual. Realiza visitas aos centros de
detenção nos Estados Membros para examinar o tratamento dado às
pessoas privadas de liberdade e elabora um relatório de suas
constatações e recomendações, que é transmitido ao Estado em
questão. Esse relatório é confidencial, mas pode ser dado a conhecer
ao público com o consentimento do Estado. Em circunstâncias
excepcionais, quando um Estado Parte não colabora com o Comitê ou
recusa a implementação de suas recomendações, o Comitê pode decidir
emitir uma declaração pública sobre o país. O objetivo de todo o
processo não é tanto condenar os Estados mas, sim, identificar as
áreas de interesse e fazer sugestões para melhorar a proteção às
pessoas privadas de liberdade de atos de tortura e punição ou
tratamento desumano ou degradante.
Características das visitas do Comitê:
O que é particularmente importante nas
visitas do Comitê em comparação com as realizadas por outros
mecanismos é que:
Podem ser realizadas a qualquer momento.
Podem ser realizadas em qualquer lugar
dentro da jurisdição do Estado Parte em questão onde as pessoas são
privadas da liberdade por agentes estatais ou da ordem pública. Isso
inclui lugares não só comumente reconhecidos como centros de
detenção, tais como delegacias de polícia e gendarmerie, prisões,
locais de detenção anterior ao julgamento e instalações
administrativas, mas também instituições tais como instalações
militares, hospitais psiquiátricos, centros de detenção para
estrangeiros, zonas de trânsito aeroportuário, centros de
desintoxicação, abrigos para crianças e asilos de idosos.
O Comitê pode viajar por todo o país e
visitar as instituições sem qualquer restrição.
O Comitê pode realizar entrevistas em
particular com pessoas privadas da liberdade.
O Comitê pode se comunicar livremente
com qualquer pessoa que ele acredita possa fornecer-lhe informação
relevante.
Ou seja, uma vez que um Estado aceitou as
obrigações previstas na Convenção, as atividades do Comitê não
dependem do consentimento do Estado Parte.
Modalidades das visitas do Comitê:
As visitas do Comitê são principalmente
de dois tipos: visitas periódicas e visitas ad hoc. As visitas
periódicas ocorrem regularmente a todos os Estados Parte. As visitas ad
hoc ocorrem em resposta a alegações graves e consistentes de um
problema urgente em um determinado Estado Parte e podem ser realizadas a
qualquer momento. Além disso, o Comitê realiza visitas de
acompanhamento de situações investigadas anteriormente, quando as
circunstâncias assim parecem exigir.
Na prática, embora não seja
especificamente necessária uma notificação das visitas, o Comitê
criou um procedimento de notificação de visitas periódicas que
inclui: 1) anunciar, no início do ano, os países que o Comitê
pretende visitar, 2) notificar o Estado em questão das datas propostas
para visita cerca de duas semanas antes da visita e, por último, 3)
fornecer ao Estado uma lista dos lugares que a delegação deseja
visitar alguns dias antes do início da visita. Durante a visita, a
delegação também pode decidir fazer visitas não-anunciadas a lugares
que não tenham sido indicados previamente. Essa prática de
notificação não se aplica às visitas ad hoc, que podem ser
realizadas dentro de um curtíssimo prazo de notificação prévia.
Os Estados têm a possibilidade de
recorrer a uma lista limitada de razões excepcionais (defesa nacional,
segurança pública, distúrbios graves nos lugares em que as pessoas se
encontram privadas de liberdade; ou que se está sendo realizado um
interrogatório urgente relacionado a um crime grave) para adiar uma
visita. No entanto, essas razões só podem ser invocadas para adiar a
visita, não para evitar indefinidamente uma visita.
5.1.1.2. O que se pode conseguir
apresentando informação ao Comitê para a Prevenção da Tortura?
Em geral:
A natureza confidencial do trabalho do
Comitê significa que, embora a informação enviada à Secretaria
sempre seja objeto de uma acusação de recebimento (você receberá uma
carta que lhe dirá que seu comunicado foi recebido), o Comitê não
pode expressar qualquer opinião sobre a qualidade ou a importância do
material, nem indicar se será utilizado ou como será utilizado. Para a
ONG que envie a informação, o processo pode parecer mais ou menos como
lançar uma pedra em um poço muito profundo e ouvir um breve
"plinc" que lhe indica que a pedra chegou ao fundo, mas não
se pode ver onde. É muito importante não se deixar desanimar por isso.
Do ponto de vista do Comitê, sua informação é imprescindível para
maximizar a eficácia das funções que o Comitê desempenha e é
importante que você considere suas chances de sucesso de um ponto de
vista mais a longo prazo.
Sua informação pode ajudar o Comitê a:
Centrar a atenção nos problemas mais
graves em um país no que diz respeito ao tratamento de pessoas privadas
de liberdade e aos riscos de tortura ou maus tratos, bem como a
identificar as possíveis origens desses problemas.
Determinar a possível necessidade de uma
visita ad hoc.
Programar suas visitas, identificando as
instituições que devem ser visitadas e as áreas de interesse que
precisam ser examinadas com mais atenção.
Compreender o contexto social e jurídico
de um país.
Avaliar até que ponto suas
recomendações estão sendo implementadas, principalmente no que se
refere às garantias, no âmbito do contínuo diálogo entre o Comitê e
os governos, como parte do processo de cooperação.
Monitorar os contínuos desdobramentos em
um Estado Parte, tanto positivos como negativos.
Do ponto de vista de quem apresenta a
informação, isso significa que, ao fazê-lo, você está contribuindo
para a identificação de problemas graves relacionados com o tratamento
de pessoas privadas de liberdade e, ainda mais importante, para a
identificação das causas desses problemas e a implementação de
medidas para evitá-los.
Em particular:
Ao contrário dos outros mecanismos, o
Comitê para a Prevenção da Tortura não se ocupa de casos
particulares per se. Na região européia, isso é competência do
Tribunal Europeu de Direitos Humanos, que se ocupa quase exclusivamente
das denúncias particulares, como será analisado adiante. O Comitê
para a Prevenção da Tortura está em melhores condições e dispõe de
meios mais adequados para contribuir para uma melhora de longo prazo da
proteção geral das pessoas sob detenção oficial, e para prevenir,
mais do que remediar, incidentes de tortura. No entanto, só porque o
Comitê não oferece recursos específicos às pessoas como parte de
suas funções não significa que as pessoas não possam se beneficiar
direta ou indiretamente de suas atividades.
Em primeiro lugar, é importante recordar
que é mediante denúncias particulares que é possível identificar
padrões, e que essas pessoas se beneficiam da eliminação de uma
prática negativa. Se, por exemplo, o Comitê recebe um número
expressivo de denúncias sobre maus tratos que vêm ocorrendo em um
abrigo para crianças e o Comitê investiga e faz recomendações para
eliminar as causas, isso trará um benefício imediato para as pessoas
da instituição.
Além disso, as intervenções em nome de
pessoas particulares não se entendem por si sós, mas ocorrem no
contexto das atividades gerais do Comitê. São utilizadas como uma
espécie de estudo de caso para investigar uma prática específica ou
uma acusação geral. O Comitê atuou, por exemplo, em casos de pessoas
detidas com base em uma legislação anti-terrorismo com o propósito de
verificar denúncias relacionadas a maus tratos dessas pessoas. Também
podem ocorrer intervenções quando uma situação urgente é levada à
atenção de uma delegação durante uma visita a um país, e cabe
destacar que, em um caso concreto, o Comitê chegou a realizar uma
visita ad hoc em resposta à detenção de uma figura pública que
estaria correndo um risco particularmente alto. O aspecto importante que
se deve ter presente é que, embora a intervenção do Comitê nesses
casos não tenha por objetivo proporcionar uma solução particular, na
prática, pode ter efeitos equivalentes.
5.1.1.3. O que deve conter um comunicado
ao Comitê para a Prevenção da Tortura?
Consulte as orientações gerais na Parte
III, Capítulo 2, sobre como preparar uma apresentação a um mecanismo
de denúncia. Além disso, tenha presente também o seguinte:
Características da informação:
O conteúdo de sua informação será,
até certo ponto, determinado pelo objetivo específico que você tiver
em mente; por exemplo, se você acredita que é desejável uma visita ad
hoc, convém enfatizar a urgência e a natureza extrema de uma
situação. Mas, acima de tudo, a informação deve ser equilibrada (ver
Parte III, Capítulo 2.1.2, para sugestões sobre como fazê-lo) e ser
passível de comprovação pelo Comitê. Isso significa que:
As denúncias apresentadas devem ser tão
recentes quanto possível.
Os detalhes devem ser tão precisos
quanto possível.
Ambos aspectos são imprescindíveis para
que o Comitê esteja em condições de comprovar a informação, e a
natureza recente das denúncias também é importante para que o Comitê
possa identificar os problemas atuais. Não se esqueça que as provas
que corroboram os fatos sustentam e confirmam os detalhes de suas
denúncias, principalmente provas médicas consistentes com as
acusações.
Além disso, à exceção da informação
comunicada sobre, por exemplo, a implementação das recomendações do
Comitê por um determinado Estado, há outra característica importante
que deve estar presente:
O foco da informação deve consistir em
estabelecer provas de um padrão ou de uma "situação".
Isso é importante porque o trabalho do
Comitê se destina a investigar e melhorar a situação geral de todos
os Estados Membros. Se você apresentar um único caso particular, esse
caso pode ser útil como parte de um conjunto maior de informações
recebidas de outras fontes (e com certeza deve ser enviado), mas
normalmente não basta demonstrar que existe um problema generalizado.
Se você puder apresentar uma série de casos, você conseguirá
avançar muito mais no sentido de estabelecer um padrão, ou seja,
demonstrar uma situação, e é mais provável que estimule o Comitê a
realizar novas investigações da situação.
Tema:
Não se limite às instituições
prisionais mais óbvias, como presídios ou delegacias. Sem dúvida,
elas são uma importante foco de interesse para o Comitê, mas há
outras instituições em que as pessoas estão privadas de liberdade por
agentes estatais, que também se inserem no âmbito do mandato do
Comitê. Entre os exemplos dessas instituições incluem-se
estabelecimentos militares, centros de detenção para estrangeiros,
centros de desintoxicação, abrigos para crianças, asilos para idosos
e instituições psiquiátricas, embora esta não deva ser considerada
uma lista exclusiva. As instituições relevantes devem ter duas
características: abrigar pessoas que não têm liberdade de deixar o
estabelecimento por vontade própria, e a privação de liberdade deve
ser conseqüência de uma ação de uma autoridade pública.
Também deve-se levar em consideração
que o Comitê está interessado em todos os aspectos do tratamento das
pessoas privadas de liberdade. Isso inclui não só os incidentes de
tortura em uma instituição, mas também todos os fatores que
contribuem para a criação de um ambiente desumano ou degradante na
instituição, tais como o tamanho das celas e sua ocupação,
condições de higiene e saneamento, oportunidades de exercício
físico, atendimento à saúde, reclusão em cela solitária e
restrições de contatos com o mundo exterior. O Comitê pode fazer
recomendações não só sobre as condições materiais e sociais da
detenção, mas também de um ponto de vista mais a longo prazo,
abordando questões tais como garantias legislativas ou a capacitação
de pessoal.
5.1.1.4. Dicas Específicas
Quem tomará conhecimento do comunicado
apresentado/ fonte da informação?
O Comitê para a Prevenção da Tortura
nunca citará o nome de pessoas em seus relatórios, salvo se os
respectivos casos já forem de domínio público. Também não citará o
nome das ONGs com as quais se reúne durante as entrevistas e das quais
recebe informação, se esse for o desejo das ONGs participantes.
Você receberá uma resposta a seu
comunicado?
Uma vez que o procedimento baseia-se no
princípio da confidencialidade, a pessoa que apresenta a informação
não receberá qualquer resposta direta sobre sua apresentação.
Certifique-se de que o Estado sobre o
qual você está enviando informação é parte da Convenção Européia
para a Prevenção da Tortura.
No que se refere à informação
apresentada com relação a uma visita periódica, ela pode ser muito
útil quando apresentada durante a visita, mas é ainda mais útil se
for recebida com antecedência, de modo que haja tempo de examinar seu
conteúdo. Certifique-se de quais são os países que o Comitê
visitará ao longo do ano (o Comitê emite um comunicado à imprensa com
essa informação ao final de cada ano, normalmente em dezembro), de
modo que você possa se preparar para enviar a informação
antecipadamente. É importante observar que a visita periódica pode
ocorrer a qualquer momento do ano e você só saberá quando ela
ocorrer.
Não espere até que seja programada uma
visita periódica para enviar informação sobre um país. O diálogo
entre o Comitê e os Estados Parte prossegue entre visitas e o Comitê
precisa manter-se a par das evoluções. Sua informação pode,
inclusive, proporcionar a base para a identificação da necessidade de
uma visita ad hoc.
O Comitê costuma reunir-se com ONGs
nacionais no primeiro dia de sua visita a um país: isso lhes dá a
oportunidade de apresentar informações recentes e possivelmente
influenciar a escolha dos locais que o Comitê decidir visitar.
5.1.2. Procedimento de Reclamação:
Convenção Européia de Direitos Humanos
Tabela 22: Dados Básicos: Tribunal
Europeu de Direitos Humanos
DADOS BÁSICOS: Tribunal Europeu de
Direitos Humanos
Origem:
Como foi criado?
Pela Convenção Européia sobre Direitos Humanos de 1950, revisada pelo
11º Protocolo da convenção, 1994
Quando começou a funcionar?
Em 1998, conforme o sistema revisado
Composição:
Quantas pessoas o compõem?
Tantos juízes quantos Estados Parte da Convenção
São especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes
Objetivo:
Objetivo geral
Analisar denúncias de violação da CEDH
Funções
Reclamações interestatais (obrigatório) (Artigo 33, CEDH)
Reclamações particulares (obrigatório)
(Artigo 34, CEDH)
Apuração dos fatos (somente no contexto
de reclamações particulares e constitui um passo opcional deste
procedimento)
5.1.2.1. Quais são os requisitos de
admissibilidade ?
Um comunicado será declarado
inadmissível se:
o comunicado for anônimo
o comunicado não tiver sido apresentado
dentro de seis meses após a data da decisão final no caso pelas
autoridades nacionais
o comunicado for manifestamente infundado
ou constituir um abuso do direito de petição.
o comunicado for incompatível com as
disposições da Convenção
a requisição for fundamentalmente a
mesma que o Tribunal ou outro procedimento internacional de
investigação já tiver examinado e não contiver informação nova
relevante
não tiverem sido esgotados os recursos
nacionais, a menos que os recursos sejam ineficazes ou
injustificadamente longos
5.1.2.2. O que deve conter sua
requisição?
Sua carta introdutória deve conter:
um breve resumo de suas queixas
uma indicação de quais direitos da
Convenção você acredita terem sido violados
uma indicação dos recursos que você
usou
uma lista das decisões oficiais adotadas
em seu caso, bem como a data de cada decisão, quem a tomou, uma
indicação de seu conteúdo; anexe uma cópia de cada decisão.
Se você em seguida receber um
formulário, siga as instruções contidas no formulário e na carta que
o acompanha.
Tabela 23: Cronologia Básica do
Procedimento de Reclamação Particular: CEDH
CRONOLOGIA BÁSICA: Procedimento de
reclamação particular - CEDH
Sua carta introdutória, contendo informações mínimas, é enviada ao
Tribunal
ß
É possível que lhe solicitem
informações suplementares; se parecer tratar-se de uma requisição
legítima, você receberá um formulário.
ß
Após o recebimento, sua requisição é
registrada e levada à atenção do Tribunal.
ß
As denúncias são comunicadas ao
Governo, que é solicitado a apresentar suas observações sobre a
admissibilidade da requisição.
ß
O requisitante responde às observações
do Governo.
ß
Às vezes, o Tribunal pode decidir
realizar uma audiência de admissibilidade. O Tribunal decide se a
requisição é admissível.
ß
Possibilidade de uma solução amistosa.
ß
As partes são solicitadas a apresentarem
novas observações sobre o mérito/ provas adicionais .
ß
O Tribunal examina o mérito e adota uma
sentença, provavelmente após uma audiência oral.
ß
O Tribunal geralmente decide a questão
da justa satisfação ao mesmo tempo, mas pode optar por fazê-lo em
data posterior.
ß
O Estado Parte deve executar a sentença
sob a supervisão do Comitê de Ministros do Conselho da Europa.
Tabela 24: Aspectos Práticos do Uso do
Procedimento de Reclamação Particular: CEDH
ASPECTOS PRÁTICOS DO USO DO PROCEDIMENTO
DE RECLAMAÇÃO PARTICULAR: Convenção Européia de Direitos Humanos
Quem pode apresentar um caso a este
procedimento?
Pessoas particulares, ONGs e grupos de pessoas que afirmam ser vítima
de uma violação dos direitos humanos. Um caso pode ser apresentado por
um familiar da vítima quando a vítima não puder fazê-lo
pessoalmente, isto é, porque está desaparecida ou morta.
Existe um prazo para se apresentar uma
requisição?
Até seis meses contados a partir da data da decisão final adotada no
caso pelas autoridades estatais.
É possível apresentar um caso a este
procedimento se o caso já tiver sido apresentado a um outro
procedimento com relação aos mesmos fatos?
Não
É necessária representação jurídica?
Não é necessária no momento da requisição, mas sim para os atos
processuais após um caso ter sido declarado admissível, salvo se o
Presidente do Tribunal conceder uma permissão excepcional para que o
reclamante apresente seu próprio caso.
É fornecida assistência financeira?
Sim, mas somente se a requisição for comunicada ao Governo, não no
momento da requisição. Será necessário preencher uma declaração
assinada por sua junta nacional de assistência jurídica, uma vez que a
assistência jurídica só é concedida em caso de necessidade
financeira.
São aceitos relatos amicus?
Sim, mediante permissão (Norma 61, Normas Processuais)
Quem tomará conhecimento do comunicado?
Em princípio, os atos processuais são públicos, a menos que o
Presidente da Câmara decida em contrário. Em casos excepcionais,
quando um reclamante não desejar que sua identidade seja divulgada e
apresentar uma declaração explicando suas razões, o Presidente pode
autorizar o anonimato.
Quanto tempo dura este procedimento?
Vários anos.
Quais medidas, se houver, o mecanismo
pode adotar para ajudar a alcançar uma decisão? Por exemplo,
audiências para apuração dos fatos; visitas in loco; postulações
escritas; audiências orais; outras.
Audiências para apuração dos fatos; provas de especialistas;
postulações escritas; audiências orais.
É possível utilizar medidas
provisórias ou urgentes?
Sim, mas se trata de uma prática que o Tribunal desenvolveu e não se
baseia na Convenção. Aplica-se somente em determinados casos,
principalmente em casos de imigração/ deportação, quando existe um
"risco real" se uma pessoa for enviada de volta (Norma 39,
Normas Processuais)
5.1.2.3. Dicas Específicas
De acordo com o procedimento original,
que foi substituído em 1998, as etapas iniciais do processo se
desenrolavam perante a Convenção Européia de Direitos Humanos. Se
você estiver investigando um determinado tema com base na
jurisprudência da Convenção, lembre-se de pesquisar relatórios
emitidos pela Comissão, bem como sentenças proferidas pelo Tribunal.
Se o período de seis meses para
apresentação de uma requisição estiver prestes a vencer e não
houver tempo para se preparar uma requisição completa, envie uma
requisição "de pausa" com um breve resumo de sua
reclamação, que logo deverá ser suplementada com a requisição
completa tão logo seja possível.
A fim de respeitar os prazos concedidos
pelo Tribunal, a data válida é a da postagem, e não a do recebimento;
no entanto, é aconselhável pelo menos notificar o Tribunal, no dia do
prazo final, de que a apresentação foi despachada pelo correio, o que
se pode fazer enviando ao Tribunal uma cópia por fax da carta
introdutória, ou por correio eletrônico ou telefone.
O Tribunal pode, por iniciativa própria
ou a pedido de uma das partes, obter as provas que considerar úteis ao
processo, inclusive mediante a realização de audiências de apuração
dos fatos. Quando uma das partes solicitar essas medidas, normalmente
caberá a esta parte arcar com os custos decorrentes, embora a Câmara
possa decidir de outro modo. Se você não deseja arcar com esses
custos, é aconselhável redigir sua carta cuidadosamente: sugira ao
Tribunal que talvez seja o caso de o Tribunal exercer sua discrição no
sentido de adotar medidas destinadas à obtenção de provas.
O Tribunal realiza a maior parte de seu
trabalho habitual em Câmaras de 7 juízes. Quando se considera que um
caso suscita uma questão grave ou pode envolver uma mudança dos
pareceres do Tribunal com relação a uma determinada matéria, o caso
pode ser transferido para uma Grande Câmara composta por 17 juízes.
Quando um caso tiver sido considerado por uma Câmara e tiver sido
proferida uma sentença, é possível, em circunstâncias excepcionais,
solicitar, dentro de três meses da sentença, que o caso seja
transferido para a Grande Câmara para sua consideração. (Norma 73,
Normas Processuais)
É possível solicitar a interpretação
de uma sentença dentro de um ano após ela ser proferida. (Norma 79,
Normas Processuais). Também é possível solicitar, dentro de seis
meses após a descoberta, a revisão de uma sentença caso sejam
descobertos novos fatos importantes que teriam influenciado as
conclusões do Tribunal (Norma 80, Normas processuais).
5.2. O Sistema Interamericano
A organização regional nas Américas
— Américas do Norte, Central e do Sul, bem como a região do Caribe
— é a Organização dos Estados Americanos (OEA). Muitos instrumentos
de direitos humanos foram adotados no âmbito da OEA, inclusive a
Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, a Convenção
Americana de Direitos Humanos, a Convenção Interamericana para a
Prevenção e Punição da Tortura, a Convenção Interamericana sobre o
Desaparecimento Forçado de Pessoas e a Convenção Interamericana para
a Prevenção, Punição e Erradicação da Violência contra a Mulher.
Existem dois mecanismos responsáveis pela implementação de todos
esses instrumentos, a saber, a Comissão e o Tribunal Interamericano de
Direitos Humanos.
Idiomas: Os idiomas oficiais do Comitê e
do Tribunal são o espanhol, o francês, o inglês e o português. O
Tribunal e a Comissão selecionam seu idioma ou idiomas de trabalho
segundo os idiomas falados por seus membros. No contexto do procedimento
de reclamação particular, o Tribunal pode optar por trabalhar no
idioma de uma das partes em um determinado caso, contanto que esse
idioma também seja um idioma oficial.
Tabela 25: Dados Básicos: Tribunal
Interamericano de Direitos Humanos
DADOS BÁSICOS: Tribunal Interamericano
de Direitos Humanos
Origem:
Como foi criado?
Pela Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969
Quando começou a funcionar?
1979
Composição:
Quantas pessoas o compõem?
7
São especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes
Objetivo:
Objetivo geral
Supervisionar a implementação da Convenção Americana de Direitos
Humanos
Funções
Reclamações particulares (opcional) (Artigos 61-62, CADH)
Tabela 26: Dados Básicos: Comissão
Interamericana de Direitos Humanos
DADOS BÁSICOS: Comissão Interamericana
de Direitos Humanos
Origem:
Como e quando foi criada?
Mediante uma resolução dos Ministros de Relações Exteriores da OEA
em 1959, com vistas à promoção do respeito à Declaração Americana
dos Direitos e Deveres do Homem.
Revisada pela Convenção Americana de
Direitos Humanos em 1969.
Composição:
Quantas pessoas a compõem?
7
São especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes
Objetivo:
Objetivo geral
Promover o respeito e a defesa dos direitos humanos
Funções
Monitoramento (Artigo 41, CADH)
Apuração de fatos (Artigo 41, CADH)
Reclamações interestatais (opcional)
(Artigo 45, CADH)
Reclamações particulares (obrigatória)
(Artigo 44, CADH)
Mecanismo de Denúncia: Comissão
Interamericana de Direitos Humanos
5.2.1.1. Como funciona a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos?
A Comissão Interamericana é
responsável pela supervisão do respeito, pelos Estados, de suas
obrigações assumidas em uma série de instrumentos de direitos humanos
da OEA. Possui funções de denúncia, bem como recebimento de
reclamações particulares (Ver Parte III, Capítulo 5.2.2).
Com relação a todos os Estados Membros
da OEA (quer sejam ou não parte da Convenção Americana de Direitos
Humanos), a Comissão Interamericana tem o poder de promover a
conscientização sobre os direitos humanos, fazer recomendações aos
governos, realizar estudos e elaborar relatórios, instar os governos a
apresentarem informação relativa aos direitos humanos e atuar como
órgão consultivo na área de direitos humanos. Sua importância para
os fins deste manual reside no fato de que ela pode:
Elaborar relatórios sobre a situação
dos direitos humanos em determinados países, com base em uma
combinação de visitas para apuração dos fatos (nos casos em que o
Estado Membro em questão der seu consentimento), provas de
especialistas e informações recebidas em diversos formulários,
inclusive petições particulares.
Elaborar um relatório anual, no qual
tem-se adotado a prática de incluir menções a Estados Membros
específicos.
Com relação aos Estados Parte da
Convenção Americana para a Prevenção e Punição da Tortura, a
Comissão também tem o poder de:
Receber informações dos Estados Parte
relativas a quaisquer medidas adotadas a título de aplicação da
Convenção e analisar, em seu relatório anual, a situação nos
Estados Membros da OEA com relação à prevenção e à eliminação da
tortura (Artigo 17).
O que se pode conseguir apresentado
informação à Comissão Interamericana de Direitos Humanos?
Apesar de poder adotar seu próprio
método de apuração dos fatos, as informações que a Comissão recebe
de várias fontes, inclusive ONGs, ajuda a Comissão Interamericana a
identificar as situações que mais necessitam de sua atenção. A
apresentação de informação lhe dá a oportunidade de:
Chamar a atenção para uma situação
Buscar mudanças positivas em uma
situação geral
Combater a impunidade
Além disso, a informação fornecida no
contexto dos preparativos de visitas in loco proporciona a oportunidade
de se chamar a atenção da Comissão Interamericana para os problemas
mais urgentes de um modo bastante específico.
O poder da Comissão Interamericana,
conforme a Convenção para a Prevenção e Punição da Tortura, de
relatar sobre a prática da tortura nos Estados Membros tem um grande
potencial de ajudar a centrar a atenção no problema da tortura nessa
região. No entanto, é um poder que a Comissão Interamericana ainda
não exercitou. Nesse sentido, as ONGs podem fomentar e facilitar esse
exercício contribuindo com informações específica sobre incidentes
de tortura.
5.2.1.3. O que deve conter um comunicado
à Comissão Interamericana de Direitos Humanos?
Ver Parte III, Capítulo 2, para
sugestões sobre como apresentar informação particular e geral a um
órgão de denúncia.
Procedimento de Reclamação: Comissão
Interamericana e Tribunal Interamericano de Direitos Humanos
Ver Parte III, Capítulo 5.2, para Dados
Básicos: Comissão Interamericana de Direitos Humanos e Dados Básicos:
Tribunal Interamericano de Direitos Humanos.
Uma reclamação no âmbito do sistema
interamericano pode basear-se ou na Convenção Americana de Direitos
Humanos (caso em que um Estado é parte dessa Convenção) ou nas normas
dos direitos humanos fundamentais estabelecidas pelo direito
internacional, com especial referência à Declaração Americana dos
Direitos e Deveres do Homem (caso em um Estado é membro da OEA mas não
é parte da Convenção Americana de Direitos Humanos).
Na prática, o procedimento de
requisição funciona da mesma forma em ambos os casos, contanto que a
reclamação continue sendo examinada pela Comissão. No entanto, as
reclamações só podem ser transferidas para o Tribunal se forem
relacionadas a:
um Estado Parte da Convenção Americana
de Direitos Humanos
que tiver aceitado a jurisdição do
Tribunal
Tabela 27: Cronologia Básica do
Procedimento de Reclamação Particular: Sistema Interamericano
CRONOLOGIA BÁSICA: Procedimento de
Reclamação Particular - Sistema Interamericano
A Comissão recebe um comunicado
ß
Abre-se um processo. O requerente poder
ser solicitado a apresentar informação suplementar.
ß
Não existe uma fase oficial de
admissibilidade: a Comissão pode declarar um caso admissível ou
inadmissível nessa fase ou simplesmente confirmar a admissibilidade do
caso em seu relatório sobre o mérito.
ß
Solicita-se ao Governo que apresente
informação relevante dentro de 90 dias (ou até 180 dias, se for
solicitada uma prorrogação). Em casos urgentes, a informação será
solicitada prontamente. O requerente também pode se solicitado a
fornecer informação suplementar.
ß
Ambas partes têm a oportunidade de
comentar as informações apresentadas pela outra parte.
ß
A Comissão também pode coletar
informações ela mesma, mediante visitas in loco, uma audiência ou
qualquer outro meio necessário.
ß
A Comissão oferece seus serviços a fim
de ajudar as partes a alcançarem uma solução amistosa.
ß
Caso não se alcance uma solução
amistosa, a Comissão produz um relatório confidencial com suas
conclusões e recomendações, e o transmite ao Estado.
ß
Se o Estado Membro não cumprir as
recomendações e:
ß
ß
Não for parte da CADH ou for parte
porém não tiver acatado a jurisdição do Tribunal, a Comissão pode
elaborar um segundo relatório, que geralmente é divulgado ao público.
Encerra-se aqui o caso.
For parte da CADH e tiver acatado a jurisdição do Tribunal, o caso
pode ser encaminhado ao Tribunal pela Comissão ou pelo Estado Parte,
mas não pelo requerente. É possível que o requerente seja solicitado
a assistir à Comissão.
ß
O Tribunal coleta informação sobre o
caso mediante audiências escritas e orais e qualquer outro meio
necessário.
ß
O Tribunal adota uma sentença na qual
declara se ocorreu uma violação.
ß
O Tribunal também se ocupa da questão
da reparação, seja na sentença original, seja em outra.
5.2.2.1 O que se pode conseguir usando
este procedimento?
A Comissão Interamericana de Direitos
Humanos pode:
Adotar conclusões em um caso particular
na forma de um relatório.
Tornar público seu relatório quando um
Estado não adotar as medidas adequadas para cumprir as conclusões.
Solicitar que o Governo adote medidas
preventivas nos casos em que houver probabilidade de um dano
irreparável às pessoas.
Solicitar em caráter confidencial que o
governo apresente informação sobre o paradeiro das pessoas
supostamente desaparecidas.
O Tribunal Interamericano de Direitos
Humanos pode:
Adotar uma sentença juridicamente
vinculante, inclusive uma constatação de violação.
Ordenar a instauração de processo
judicial contra um torturador.
Conceder uma reparação.
Ordenar medidas provisórias de
proteção em casos urgentes, nos quais haja probabilidade de dano
irreparável às pessoas.
Que tipo de reclamações podem ser
examinadas?
Pela Comissão Interamericana de Direitos
Humanos:
Quando envolver um Estado Parte da
Convenção Americana de Direitos Humanos, uma reclamação pode ser
examinada se:
denunciar uma violação da Convenção
Americana de Direitos Humanos pela qual o Estado pode ser considerado
responsável (Ver Parte I, Capítulo 3.6 para uma análise das ações
de agentes não-governamentais).
Quando envolver um Estado Membro da OEA
que não é parte da Convenção Americana de Direitos Humanos, uma
reclamação pode ser examinada se:
estiver relacionada com uma suposta
violação das normas fundamentais de direitos humanos, nos termos do
direito internacional, com especial referência à Declaração
Americana sobre os Direitos e Deveres do Homem.
Pelo Tribunal Interamericano de Direitos
Humanos:
Uma reclamação pode ser examinada se:
denunciar uma violação da Convenção
Americana de Direitos Humanos pela qual o Estado pode ser considerado
responsável (Ver Parte I, Capítulo 3.6 para um exame das ações de
agentes não-governamentais)
estiver relacionada a um Estado Parte da
Convenção Americana de Direitos Humanos que tiver acatado a
jurisdição do Tribunal
tiver sido examinada primeiramente pela
Comissão
tiver sido encaminhada ao Tribunal por um
Estado Parte ou pela Comissão
5.2.2.3. Quais são os requisitos de
admissibilidade ?
Um comunicado será inadmissível se:
Não tiverem sido esgotados os recursos
nacionais adequados e eficazes.
O caso não tiver sido apresentado dentro
de 6 meses após a notificação da decisão final sobre o caso, ou
dentro de um "tempo razoável" nos casos em que não for
possível o esgotamento dos recursos nacionais.
A Comissão ou outro tribunal
internacional já tiver examinado ou estiver examinando um caso que
trata dos mesmos fatos, exceto se este caso tiver sido apresentado por
uma terceira parte sem a autorização da vítima ou da família da
vítima, e o caso atual for apresentado pela vítima, por um familiar da
vítima ou por um representante autorizado.
O comunicado for anônimo ou carecer de
certos dados sobre o requerente.
O comunicado não contiver fatos que
revelem uma violação de direitos.
O comunicado for manifestamente
improcedente (infundado).
5.2.2.4. Dicas Específicas
Certifique-se de que o Estado é parte da
CADH e que aceitou a competência do Tribunal para examinar
reclamações particulares. Em caso negativo, as reclamações
particulares referentes aos Estados Membros da OEA ainda assim poderão
ser apresentadas à Comissão com base na Declaração Americana.
As reclamações devem se basear na CADH
(ou na Declaração Americana), mas pode ser importante fazer
referência à Convenção Interamericana para a Prevenção e Punição
da Tortura, à Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento
Forçado de Pessoas, à Convenção Interamericana sobre a Prevenção,
Punição e Erradicação da Violência contra a Mulher a fim de ajudar
a esclarecer um determinado aspecto.
Na fase em que o Tribunal considerar a
questão das reparações, os representantes da vítima ou a família da
vítima têm o direito de apresentar seus próprios argumentos sobre a
matéria.
Tabela 28:Aspectos Práticos do Uso do
Procedimento de Reclamação Particular: Sistema Interamericano
ASPECTOS PRÁTICOS DO USO DO PROCEDIMENTO
DE RECLAMAÇÃO PARTICULAR: Sistema Interamericano
Quem pode apresentar um caso a este
procedimento?
Qualquer grupo ou pessoa, ou entidade de ONG reconhecida juridicamente
em um ou mais Estados Membros, seja em representação própria, seja em
nome de uma terceira pessoa. Não é necessário ter contato com a
vítima, mas geralmente com a família da vítima ou um representante
autorizado.
Existe um prazo para se apresentar uma
requisição?
Até seis meses após a decisão final adotada no caso, quando esgotados
os recursos nacionais, ou dentro de um prazo razoável após os fatos
denunciados, quando não for possível esgotar os recursos nacionais.
É possível apresentar um caso a este
procedimento se o caso já tiver sido apresentado a outro procedimento
com relação aos mesmos fatos?
Não, a menos que o caso tenha sido apresentado por uma terceira parte
sem autorização da vítima ou de sua família.
É preciso ter uma representação
jurídica?
Não necessariamente, mas é aconselhável.
É possível oferecer assistência
financeira?
Não
São aceitos relatos amicus?
Sim
Quem tomará conhecimento do comunicado?
Os requerentes podem realizar uma reunião com a imprensa após a
apresentação do requerimento.
Quanto tempo dura este procedimento?
Pode durar anos.
Quais medidas, se houver, o mecanismo
pode adotar para ajudar a alcançar uma decisão? Por exemplo,
audiências para apuração dos fatos; visitas in loco; postulações
escritas; audiências orais; outras.
Audiências para apuração dos fatos; visitas in loco; provas de
especialistas; postulações escritas; audiências orais.
É possível utilizar medidas
provisórias urgentes?
Sim
5.3. O Sistema Africano
O sistema africano para a proteção dos
direitos humanos baseia-se na Carta Africana de Direitos Humanos e dos
Povos, adotada sob os auspícios da Organização da Unidade Africana
(OUA). A supervisão do respeito à Carta tem sido, até o presente,
domínio exclusivo da Comissão Africana de Direitos Humanos e dos
Povos. No contexto de seu trabalho, a Comissão Africana nomeou uma
série relatores especiais, a saber, Relator Especial sobre Execuções
Extrajudiciais, Relator Especial sobre Mulheres e, de particular
interesse para os propósitos deste manual, o Relator Especial sobre
Prisões e Condições de Detenção na África. Em 1998, foi adotado um
Protocolo para a criação de um Tribunal Africano, que funcionará
junto à Comissão, porém esse Tribunal só começará a funcionar
quando 15 Estados tiverem assinado o Protocolo. Com base nas atuais
informações dadas pelos Estados africanos, é possível que isso leve
entre cinco a dez anos.
Idiomas: Os idiomas oficiais da Comissão
são o árabe, o inglês, o francês e o português, mas, na prática, a
Secretaria utiliza o inglês e o francês. Se uma parte deseja fazer uma
apresentação em outro idioma, deve providenciar a tradução.
Tabela 29: Dados Básicos: Comissão
Africana de Direitos Humanos e dos Povos
DADOS BÁSICOS: Comissão Africana de
Direitos Humanos e dos Povos
Origem:
Como foi criada?
Pela Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos de 1981.
Quando começou a funcionar?
1987
Composição:
Quantas pessoas a compõem?
11
São especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes.
Objetivo:
Objetivo geral
Promover e proteger os direitos humanos e dos povos na África.
Funções
Análise de relatórios estatais (Artigo 62, CADHP).
Monitoramento (Artigo 45, CADHP)
Apuração de fatos (Artigos 45 e 58,
CADHP)
Recebimento de comunicados, inclusive de
Estados (Artigo 47, CADHP) e de pessoas particulares (automático)
(Artigo 55, CADHP)
Mecanismos de Denúncia
Comissão Africana de Direitos Humanos e
dos Povos
Funções
A Comissão Africana pode:
analisar relatórios estatais periódicos
(Artigo 62, CADHP).
empreender pesquisas e estudos, inclusive
mediante visitas de apuração de fatos (Artigo 45(1)(a), CADHP)
realizar um estudo em profundidade e uma
investigação ativa quando receber comunicados que indiquem a
existência de uma série de violações graves e em grande escala dos
direitos humanos (Artigo 58, CADHP)
Ver Parte III, Capítulo 2.3, para
informação sobre como funcionam os procedimentos de relatório
estatal.
5.3.1.1.2. Dicas Específicas
Qualquer ONG séria, seja ela africana ou
não-africana, pode solicitar a condição de observador perante a
Comissão Africana. Não é necessário ter a condição de observador
para enviar comunicados, mas o fato de tê-la dá à organização
certos direitos: estar informada, comparecer e participar de reuniões
públicas, receber documentos e publicações da Comissão Africana e
solicitar que um determinado assunto seja incluído na pauta de trabalho
da Comissão. Qualquer solicitação de introdução de um item na pauta
deve ser feita pelo menos 10 semanas antes da abertura da sessão.
Qualquer solicitação da condição de
observador deve ser apresentada por escrito e deve incluir: o ato
constitutivo da organização e informação sobre sua estrutura,
liderança, número de membros e atividades. Também seria útil incluir
cópias de publicações e relatórios de atividades. Um relator é
designado para tratar a solicitação e fazer recomendações à
Comissão Africana sobre a possibilidade de se conceder a condição de
observador.
5.3.1.2. Relator Especial sobre Prisões
e Condições de Detenção na África
Tabela 30: Dados Básicos: Relator
Especial sobre Prisões e Condições de Detenção na África
DADOS BÁSICOS: Relator Especial sobre
Prisões e Condições de Detenção na África
Origem:
Como foi criado?
Mediante uma resolução da Comissão Africana de Direitos Humanos e dos
Povos de 1996
Quando começou a funcionar?
1996
Composição:
Quantas pessoas o compõem?
1
São especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes
Objetivo:
Objetivo geral
Examinar a situação de pessoas privadas de liberdade nos territórios
dos Estados Parte da CADHP.
Funções
Monitoramento
Apuração de fatos
O Relator Especial sobre Prisões pode
exercer suas funções com relação a todos os Estados Parte da CADHP.
O REP pode:
Ocupar-se do monitoramento com vistas à
identificação de áreas problemáticas e fazer recomendações para
melhorá-lhas.
Fazer recomendações em casos
particulares.
Recomendar uma ação urgente em casos
particulares.
Buscar e receber informação sobre casos
e situações que se inserem no âmbito de seu mandato.
Realizar visitas para apuração de fatos
com o consentimento dos Estados Parte. Os relatórios dessas visitas
são apresentados oralmente perante a CoADHP em uma sessão pública e,
embora a própria Carta indique que os relatórios só podem ser
divulgados ao público por decisão da Assembléia de Chefes de Estado e
de Governo, na prática, a Comissão os torna públicos sem consultar a
OUA.
As principais áreas de interesse para o
REP compreendem:
Condições das prisões.
Questões de saúde em contextos de
detenção.
Detenção ou prisão arbitrária ou
extrajudicial.
Tratamento de pessoas privadas de
liberdade.
Condições de detenção de grupos
especialmente vulneráveis, tais como refugiados, pessoas portadoras de
deficiência física ou mental ou crianças.
Procedimento de Reclamação: Comissão
Africana de Direitos Humanos e dos Povos
Tabela 31: Cronologia Básica do
Procedimento de Reclamação Particular: CoADHP
CRONOLOGIA BÁSICA: Procedimento de
Reclamação Particular – CoADHP
Recebimento de um comunicado de uma pessoa ou ONG.
A Secretaria pode solicitar informações
adicionais.
ß
ß
Se há informação suficiente, o
comunicado é transmitido ao Governo; o nome do autor não é revelado
se tiver sido solicitado anonimato.
Se a informação é insuficiente para indicar que ocorreu uma
violação, o comunicado não pode ser transmitido ao Governo.
ß
ß
Ambas as partes são convidadas a
apresentar seus comentários sobre a admissibilidade.
ß
ß
ß
A Comissão considera a admissibilidade
do caso. Em se declarando admissível o caso, a Comissão procede à
consideração do mérito.
ß
A Comissão coloca-se à disposição das
partes para ajudá-las a chegar a uma solução amistosa.
ß
A fim de examinar o mérito, ambas as
partes devem apresentar suas observações sobre a matéria. Muitas
vezes é realizada uma audiência oral perante a Comissão.
ß
A Comissão chega a uma decisão sobre se
houve ou não uma violação da Carta; sua consideração sobre o
mérito ocorre em caráter privativo.
ß
A Comissão continua trabalhando com as
partes para ajudar na implementação, mas não existe um mecanismo de
execução formal e ela depende essencialmente da OUA para fins de
execução.
5.3.2.1. Quais são os requisitos de
admissibilidade?
Um comunicado será considerado
inadmissível se:
Não indicar os nomes dos autores (embora
estes possam solicitar à Comissão que seja protegido seu anonimato).
Não tiverem sido esgotados os recursos
nacionais, exceto no caso de os recursos se prolongarem
injustificadamente (Ver, no entanto, Dicas Específicas abaixo).
O comunicado não tiver sido apresentado
dentro de um prazo razoável após o esgotamento dos recursos nacionais.
O comunicado for incompatível com as
disposições da Carta da OUA ou com a Carta Africana.
O comunicado estiver redigido em uma
linguagem insultante para com o Estado em questão.
As denúncias se basearem exclusivamente
em notícias veiculadas pelos meios de comunicação.
A denúncia tratar de assuntos já
solucionados pelos Estados envolvidos em conformidade com os princípios
da Carta da ONU e da OUA ou da Carta Africana.
Tabela 32: Aspectos Práticos do Uso do
Procedimento de Reclamação: CADHP
ASPECTOS PRÁTICOS DO PROCEDIMENTO DE
RECLAMAÇÃO PARTICULAR INTERNACIONAL: Carta Africana de Direitos
Humanos e dos Povos
Quem pode apresentar um caso a este
procedimento?
Qualquer pessoa ou ONG que possa fornecer detalhes suficientemente
precisos sobre um incidente para se iniciar uma investigação. Não é
necessário que seja a vítima ou um familiar da vítima, levando-se em
consideração as dificuldades práticas no contexto africano.
Existe um prazo para se apresentar uma
requisição?
A denúncia deve ser apresentada dentro de um tempo razoável, mas a
interpretação da Comissão é muito generosa nesse particular.
É possível apresentar um caso a este
procedimento se o caso já tiver sido apresentado a um outro
procedimento com relação aos mesmos fatos?
Não
É necessária representação jurídica?
Não, mas é permitida
É possível oferecer assistência
financeira?
Não
São aceitos relatos amicus?
Aceita-se qualquer informação que possa ajudar a Comissão, mas todos
devem respeitar a confidencialidade do procedimento.
Quem tomará conhecimento do comunicado?
A pedido do autor, sua identidade poderá ser mantida em caráter
confidencial.
Quanto tempo dura este procedimento?
Nos primeiros casos houve longas demoras, mas hoje o procedimento dura
de 18 meses a 2 anos.
Quais medidas, se houver, o mecanismo
pode adotar para ajudar a alcançar uma decisão? Por exemplo,
audiências para apuração de fatos; visitas in loco; postulações
escritas; audiências orais; outras.
Postulações escritas; audiências orais; visitas in loco nos casos que
envolvam grupos de reclamantes.
É possível utilizar medidas
provisórias ou urgentes?
Sim
5.3.2.2. Dicas Específicas
A Comissão procederá ao exame do
comunicado mesmo se o Estado Parte não responder às denúncias.
Além dos detalhes básicos, deve-se
indicar se o comunicado diz respeito a violações graves ou em grande
escala dos direitos humanos.
Nos casos de violações graves ou em
grande escala, e quando as denúncias envolvem um grande número de
pessoas ou violações que ocorrem há muito tempo, a Comissão, na
prática, não tem exigido o esgotamento dos recursos nacionais, com
base no entendimento de que essa seria uma medida pouco prática e
indesejável.
Por outro lado, quando as denúncias
envolvem violações graves e de grande escala, é possível fundamentar
o comunicado no Artigo 58 a fim de se evitar a necessidade de
esgotamento dos recursos nacionais.
A Comissão exige que os autores do
comunicado forneçam seus nomes e endereços, mas quando as
circunstâncias o inviabilizarem (por exemplo, devido a um grande
número de vítimas), não é necessário citar os nomes de todas as
vítimas. A informação, no entanto, deve ser suficientemente precisa
para permitir a realização de uma investigação.
Boa parte do procedimento aplicável a
reclamações particulares tem se desenvolvido a partir das normas
processuais e da prática da Comissão: não se surpreenda se você não
encontrar muita informação sobre o procedimento na Carta propriamente
dita.
5.4. Outras regiões
Atualmente não há outras regiões que
tenham estabelecido procedimentos formais para considerar denúncias de
violações dos direitos humanos, apesar de muitas já começarem a
mostrar um crescente interesse pelos direitos humanos em geral. Nos
próximos anos, é muito possível que se veja um aumento no número de
organismos internacionais capazes de considerar denúncias, e também é
provável que novos organismos regionais fundamentar-se-ão nos
procedimentos bem estabelecidos, testados e comprovados, descritos acima
para a Europa, as Américas e a África.
Nesse ínterim, é importante não se
deixar desanimar diante da ausência de recursos internacionais
próximos de onde você vive. Os organismos da ONU não estão sujeitos
a limites geográficos e podem examinar situações em qualquer parte do
mundo. Informe-se dos tratados dos quais seu Estado faz parte e
lembre-se que os procedimentos que não são de tratados podem examinar
a situação dos direitos humanos em qualquer Estado Membro da ONU.
6. TABELAS DE AVALIAÇÃO COMPARATIVA DOS
PROCEDIMENTOS INTERNACIONAIS
Tabela 33: Avaliação Comparativa I -
CCT, CDH e CEDR (Geral)
CCT
CDH
CEDR
pre
pi
prp
pre
prp
pre
prp
Até que ponto o mecanismo é adequado
para:
Þ Chamar a atenção para uma
situação?
O procedimento é público?
S
N
N
S
N
S
N
As constatações são públicas?
S
É possível
S
S
S
S
S
O mecanismo pode realizar visitas de
apuração dos fatos?
N
S
N
N
N
N
N
As constatações dessas visitas são
conhecidas pelo público?
-
É possível
-
-
-
-
-
Þ Buscar mudanças em uma situação
geral?
O mecanismo pode fazer recomendações de
natureza geral ou sistêmica?
S
S
S
S
N
S
N
O Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas recomendações?
N
N
N
N
-
N
-
Os Estados costumam cumpri-las?
Varia
S
Jurispru-dência insuficiente
Varia
-
Varia
-
O mecanismo dispõe de um procedimento de
acompanhamento?
Próximo relatório
Não, mas poderia caso a caso
Não, mas não se exclui
em desen-volvi-mento
-
Próximo relatório
-
Existe alguma sanção especial que o
mecanismo pode impor aos Estados que não cooperam?
N
Pode publicar um resumo dos resultados
N
N
-
N
-
Þ Buscar soluções jurídicas particulares?
De um mecanismo de denúncia:
Ampla divulgação de um caso particular
no contexto de uma situação geral
Impedir a deportação
O mecanismo pode fazer recomendações em
casos particulares?
N
Sim, embora não o faça com freqüência
N
N
O Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas recomendações?
_
N
_
_
Os Estados costumam cumpri-las?
_
S
_
_
O mecanismo dispõe de um procedimento de
acompanhamento para casos particulares?
-
N
N
N
Podem ser utilizadas medidas urgentes?
-
S
N
N
Um Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas medidas?
-
N
Os Estados costumam cumpri-las?
-
S
Legenda: CCT = Comitê Contra a Tortura;
CDH = Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas; CEDR = Comitê
para a Eliminação da Discriminação Racial; PRE = Procedimento de
Relatório Estatal; PI = Procedimento de Investigação; PRP =
Procedimento de Reclamação Particular; S = Sim; N = Não
Tabela 34: Avaliação Comparativa II -
CDC, CEDM, RE-CDH e 1503 (Geral)
CDC
CEDM
RE-CDH
1503
pre
pre
com
af
com
Até que ponto o mecanismo é adequado
para:
Þ Chamar a atenção para uma
situação??
O procedimento é público?
S
S
N
N
N
As constatações são públicas?
S
S
S
S
Não, mas o fato de um Estado estar sendo considerado é público
O mecanismo pode realizar visitas de
apuração dos fatos?
N
N
N
S
Sim, mas geralmente não utiliza essa opção
As constatações dessas visitas são
conhecidas pelo público?
-
-
-
S
N
Þ Buscar mudanças em uma situação
geral?
O mecanismo pode fazer recomendações de
natureza geral ou sistêmica?
S
S
S
S
Sim, mas em caráter confidencial
O Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas recomendações?
N
N
N
N
N
Os Estados costumam cumpri-las?
varia
varia
varia
Com freqüência
Varia
O mecanismo dispõe de um procedimento de
acompanhamento?
Próximo relatório
Próximo relatório
Pode continuar o diálogo
Diálogo de acompanha-mento
Pode manter Estado sob consideração até o ano seguinte
Existe alguma sanção especial que o
mecanismo pode impor aos Estados que não cooperam?
N
N
N
Pode fazer uma declaração ao apresentar o relatório à CDH da ONU
Pode transferir caso para um procedimento público, o que pode implicar
nomear um Relator Especial
Þ Buscar soluções jurídicas particulares?
De um mecanismo de denúncia:
Ampla divulgação de um caso particular
no contexto de uma situação geral
Impedir a deportação
O mecanismo pode fazer recomendações em
casos particulares?
N
N
S
S
O Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas recomendações?
_
_
N
N
Os Estados costumam cumpri-las
_
_
Varia
Regularmente
O mecanismo dispõe de um procedimento de
acompanhamento para casos particulares?
N
N
Oportunidade para a fonte comentar a resposta do Estado
Pode continuar diálogo
Podem ser utilizadas medidas urgentes?
N
N
S
S
Um Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas medidas?
-
-
N
N
Os Estados costumam cumpri-las?
-
-
Regular-mente
Regular-mente
Legenda: CDC = Comitê dos Direitos da
Criança ; CEDM = Comitê para a Eliminação da Discriminação contra
a Mulher; 1503 = Procedimento 1503; RE-CDH = Relatores Especiais/ Grupos
de Trabalho/ Especialistas Independentes/ Representantes Especiais da
Comissão de Direitos Humanos da ONU; PRE = Procedimento de Relatório
Estatal; AF = Apuração dos Fatos; COM = Procedimento de Comunicado; S
= Sim; N = Não
Tabela 35: Avaliação Comparativa III -
CPT, CIADH e TIADH (Geral)
CEPT
CIADH
TIADH
af
af
prp
prp
Até que ponto o mecanismo é adequado
para::
Þ Chamar a atenção para uma
situação?
O procedimento é público?
N
N
N
N
As constatações são públicas?
Ver apuração de fatos
Ver apuração de fatos
Não automatica-mente
S
O mecanismo pode realizar visitas de
apuração de fatos?
S
S
S
S
As constatações dessa visitas são
conhecidas pelo público?
Só se o Estado concordar com sua publicação: na prática, a maioria
dos Estados concorda
Geralmente
Não automatica-mente
Mencionadas na sentença
Þ Buscar mudanças em uma situação
geral?
O mecanismo pode fazer recomendações de
natureza geral ou sistêmica?
S
S
S
S
O Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas recomendações?
N
N
N
S
Os Estados costumam cumpri-las?
S
Varia
Varia
S
O mecanismo dispõe de um procedimento de
acompanhamento?
Visitas de acompanhamento e diálogo contínuo
Visitas de acompanhamento
Pode solicitar ser informado das medidas tomadas
Pode solicitar ser informado das medidas tomadas
Existe alguma sanção especial que o
mecanismo pode impor aos Estados que não cooperam?
Declaração pública
N
Relatório público/ Encaminhar ao Tribunal
N
Þ Buscar soluções jurídicas particulares?
De um mecanismo de denúncia:
Ampla divulgação de um caso particular
no contexto de uma situação geral
Impedir a deportação
O mecanismo pode fazer recomendações em
casos particulares?
S
S
O Estado está obrigado juridicamente a
cumprir essas recomendações?
N
N
Os Estados costumam cumpri-las
S
Varia
O mecanismo dispõe de um procedimento de
acompanhamento para casos particulares?
Pode acontecer
Pode pedir informações sobre o caso
Podem ser utilizadas medidas urgentes?
Pode acontecer
S
Um Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas medidas?
N
N
Os Estados costumam cumpri-las?
S
Varia
Legenda: CEPT = Comitê Europeu para a
Prevenção da Tortura; CIADH = Comissão Interamericana de Direitos
Humanos; TIADH = Tribunal Interamericano de Direitos Humanos; AF =
Apuração de Fatos; PRP = Procedimento de Reclamação Particular; S =
Sim; N = Não
Tabela 36: Avaliação comparativa IV -
CNADH e REP (Geral)
CoADHP
REP
pre
af/ep
prp
af
com
Até que ponto o mecanismo é adequado
para::
Þ Chamar a atenção para uma
situação?
O procedimento é público?
S
N
N
N
N
As constatações são públicas?
S
Geralmente
Anexadas ao relatório anual da CADHP
S
S
O mecanismo pode realizar visitas de
apuração dos fatos?
-
S
Para grupos de reclamações
S
S
Os resultados dessas visitas são
conhecidos pelo público?
-
Geralmente, mas pode haver longas demoras
Podem ser
Sim, mas pode haver demora na publicação
Sim, mas pode haver demora na publicação
Þ Buscar mudanças em uma situação
geral?
O mecanismo pode fazer recomendações de
natureza geral ou sistêmica?
S
S
Sim, se referente a uma "situação"
S
Sim, se referente a uma "situação"
O Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas recomendações?
N
N
N
N
N
Os Estados costumam cumpri-las?
Às vezes
Às vezes
Às vezes
Às vezes
Às vezes
O mecanismo dispõe de um procedimento de
acompanhamento?
Próximo relatório estatal
Pode manter o assunto na agenda
Possivel-mente por meio da OUA
Missões de acompanha-mento
Não se exclui
Existe alguma sanção especial que o
mecanismo pode impor aos Estados que não cooperam?
N
N
N
N
N
Þ Buscar soluções jurídicas particulares?
De um mecanismo de denúncia:
Ampla divulgação de um caso particular
no contexto de uma situação geral
Impedir a deportação
O mecanismo pode fazer recomendações em
casos particulares?
N
S
S
S
O Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas recomendações?
-
N
N
N
Os Estados costumam cumpri-las
-
Às vezes
Às vezes
Às vezes
O mecanismo dispõe de um procedimento de
acompanhamento para casos particulares?
-
N
N
Não se exclui
Podem ser utilizadas medidas urgentes?
-
S
S
S
Um Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas medidas?
-
N
N
N
Os Estados costumam cumpri-las?
-
Às vezes
Às vezes
Às vezes
Legenda: CoADHP = Comissão Africana de
Direitos Humanos e dos Povos; REP = Relator Especial sobre Prisões e
Condições de Detenção na África; PRE= Procedimento de Relatório
Estatal; AF = Apuração de Fatos; EP = Estudo em Profundidade; PRP=
Procedimento de Reclamação Particular; COM = Procedimento de
Comunicado; S = Sim; N = Não
Tabela 37: Avaliação Comparativa IV -
CCT, CDH e CEDR (Procedimento de Reclamação Particular)
CCT
CDH
CEDH
Até que ponto o mecanismo é adequado
para:
Þ Buscar soluções jurídicas
particulares?
De um procedimento de reclamação:
Constatação jurídica de violação
S
S
S
Impedir a deportação
S
S
Potencialmente
Que tipo de reparação, se houver, é
possível conceder?
Indicação de ação necessária para restabelecer o cumprimento
Indicação de ação necessária para restabelecer o cumprimento
Indicação de ação necessária para restabelecer o cumprimento
Os Estados estão juridicamente obrigados
a cumprir a decisão final?
N
N
N
Os Estados costumam cumpri-la?
Geralmente
Varia
Varia
Existe alguma maneira de fazer valer a
decisão?
Não, mas possível solicitar ser informado de quaisquer medidas
adotadas
N
N
É possível utilizar medidas
provisórias ou urgentes?
S
S
S
O Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas medidas?
N
N
N
Os Estados costumam cumpri-las?
Geralmente
S
S
Legenda: CCT = Comitê Contra a Tortura;
CDH: Comitê de Direitos Humanos; CEDR = Comitê para a Eliminação da
Discriminação Racial.
Tabela 38: Avaliação Comparativa V -
TEDH, CIADH, TIADH e CoADHP (Procedimento de Reclamação Particular)
TEDH
CIADH
TIADH
CoADHP
Até que ponto o mecanismo é adequado
para:
Þ Buscar soluções jurídicas
particulares?
De um procedimento de reclamação:
Constatação jurídica de violação
S
S
S
S
Impedir a deportação
S
S
S
S
Que tipo de reparação, se houver, é
possível conceder?
Pode incluir compensação financeira
-
Pode incluir compensação financeira e outras soluções jurídicas
menos tradicionais
-
Os Estados estão juridicamente obrigados
a cumprir a decisão final?
S
N
S
N
Os Estados costumam cumpri-la?
S
Varia
S
Às vezes
Existe alguma maneira de fazer valer a
decisão?
Pode ser considerado pelo Comitê de Ministros
Não, embora a possibilidade de encaminhamento ao Tribunal ou de
publicação da decisão pode motivar seu cumprimento
Pode ser objeto de ação nos tribunais nacionais
N
É possível utilizar medidas
provisórias ou urgentes?
S
S
S
S
O Estado está juridicamente obrigado a
cumprir essas medidas?
N
N
S
N
Os Estados costumam aceitá-las?
S
Varia
S
Às vezes
Legenda: TEDH = Tribunal Europeu de
Direitos Humanos; CIADH = Comissão Interamericana de Direitos Humanos;
TIADH = Tribunal Interamericano de Direitos Humanos; CoADHP = Comissão
Africana de Direitos Humanos e dos Povos
7. ONDE SE PODE BUSCAR MAIS AJUDA?
7.1. Por que seria desejável buscar mais
ajuda?
Os procedimentos oficiais perante
mecanismos internacionais constituídos com o propósito exclusivo de
avaliar se os Estados estão respeitando suas obrigações estabelecidas
no direito internacional não são, de modo algum, o único meio de
ajuda ao qual se pode recorrer em resposta a denúncias de tortura.
Existem várias razões para se querer buscar ajuda de outra fonte —
como medida adicional ou alternativa —, recorrendo a um procedimento
formal.
Em certas circunstâncias, pode ser que
você esteja relutante em recorrer aos mecanismos internacionais. Talvez
esteja preocupado quanto à sua própria segurança ou se sinta
intimidado pelo processo. Nos casos em que você dispuser de
informação que pode ajudar uma pessoa a obter uma solução jurídica
ou mesmo salvar a vida de uma pessoa, ou informação que pode ser
importante para os organismos internacionais, deve-se pelo menos
considerar uma ação que não necessariamente o envolva pessoalmente,
mas que garanta que a informação não seja desperdiçada. Uma
possível solução seria remeter a informação a outro grupo ou
organização que esteja em melhores condições de dar continuidade ao
processo. Também é possível recorrer a certas organizações para
obter apoio e orientação; elas poderão lhe aconselhar sobre a melhor
linha de ação a seguir.
É importante lembrar que,
independentemente de se utilizar ou não um procedimento oficial para
buscar uma solução jurídica, certamente a melhor assistência que se
pode proporcionar a uma vítima da tortura consiste em oferecer-lhe
apoio e reabilitação. Uma vez mais, existem organizações
especializadas nessa área com as quais talvez seja o caso de você
entrar em contato.
Um complemento extremamente eficaz e
geralmente mais rápido do que os procedimentos formais é o lobby,
particularmente junto à Comissão de Direitos Humanos e à Subcomissão
para Proteção e Promoção dos Direitos Humanos das Nações Unidas,
mas também junto a uma série de órgãos políticos.
Tabela 39: Possíveis Fontes de Ajuda
Tipo de Ajuda
possível fonte (Ver Apêndice II para mais detalhes)
Organizações que podem adotar ações
com base em sua informação
Comitê Internacional da Cruz Vermelha
Alto Comissariado das Nações Unidas
para Refugiados
ONGs nacionais e internacionais mais
experientes
Missões de campo, tais como as da OSCE,
do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, ou de
grandes ONGs internacionais
Organizações específicas para
vítimas, tais como as conferências da OIT ou a UIP.
Organizações que podem oferecer
assessoramento e apoio
ONGs internacionais ou nacionais mais experientes
Organizações e redes profissionais
Organizações que podem ajudar as
vítimas mediante apoio e reabilitação
Fundo Voluntário das Nações Unidas para Vítimas da Tortura
ONGs nacionais e internacionais de
reabilitação
Organizações ou órgãos onde o
exercício ativo do lobby pode ser eficaz
Comissão das Nações Unidas de Direitos Humanos
Subcomissão das Nações Unidas para
Promoção e Proteção dos Direitos Humanos
7.2. Algumas fontes específicas de ajuda
Comitê Internacional da Cruz Vermelha
O Comitê Internacional da Cruz Vermelha
(CICV) é uma organização neutra e independente que intervém
principalmente no contexto de um conflito armado, mas também em
situações de violência e agitação política. O Comitê tem sua sede
em Genebra, Suíça, mas tem delegações de campo em muitos países
onde sua intervenção se faz necessária, geralmente mediante acordo
com as autoridades do país. Nesses contextos, uma de suas funções é
atuar como intermediário neutro entre as pessoas detidas e as
autoridades que efetuam a detenção. Seus representantes realizam
visitas a locais de detenção onde as pessoas são mantidas por razões
relacionadas ao envolvimento no conflito ou na agitação, e examinam as
condições de detenção e tratamento e entrevistam os detentos sobre
sua experiência em detenção. Devem ter acesso a todos os locais de
detenção onde são mantidos detentos que se inserem no campo de
atividade do Comitê, bem como a oportunidade de entrevistar os
próprios detentos em particular e sem a presença de testemunhas. Em
troca disso, mantêm absoluta confidencialidade sobre o que observam
durante as visitas. Devido a seu mandato especial e a seus métodos de
trabalho, o CICV geralmente tem acesso a locais de detenção que outros
grupos não podem visitar.
O CICV dispõe de sua própria rede e seu
próprio quadro de pessoal, exercendo suas funções independentemente
de outras organizações. No entanto, o Comitê está aberto a receber
informação sobre padrões de violação ou pedidos de informação
sobre detentos específicos ou pessoas desaparecidas que o Comitê
poderia estar em condições de acompanhar. O CICV prefere receber tal
informação diretamente dos familiares, mas aceita informações de
ONGs com base no entendimento de que a confidencialidade que protege seu
trabalho significa que a ONG não deve esperar um retorno sobre qualquer
ação adotada. No caso de pessoas desaparecidas, o Comitê pode enviar
uma resposta à família. Em geral, o Comitê procura fazer contato
direto com a família antes de decidir adotar alguma ação. O
princípio que norteia sua conduta é que qualquer ação que venha a
adotar se faça em prol e em nome dos próprios detentos, não de outras
organizações.
A informação transmitida ao CICV deve
ser conter o máximo de detalhes possível sobre a prisão e a
detenção. Como regra geral, o CICV tenderá a agir mais rapidamente em
casos que indiquem um padrão do que em casos particulares.
Alto Comissariado das Nações Unidas
para Refugiados
O Alto Comissariado das Nações Unidas
para Refugiados (ACNUR) atua no sentido de proteger e proporcionar
assistência a pessoas que tenham tido de fugir de seu país devido a um
temor fundado de perseguição e não podem ou não querem regressar
(refugiados), bem como a outros grupos em situações semelhantes, tais
como pessoas deslocadas em seu próprio país (PDs) e vítimas da guerra
civil.
Uma das maneiras pelas quais o ACNUR
desempenha essas funções é por meio de uma rede de pessoal em todo o
mundo, com base em várias localidades onde há pessoas que se inserem
no objeto de seu mandato, inclusive capitais, campos remotos de
refugiados ou de PDs, bem como ao longo de áreas fronteiriças. Seu
propósito é proteger e minimizar o risco de ataques a grupos e campos
de refugiados e de PDs, identificar e tratar as causas de deslocamento
em situações específicas. Nesse contexto, é muito importante
fornecer-lhe informação sobre: 1) quaisquer maus tratos a refugiados e
PDs em seu lugar de origem ou durante o trânsito, e 2) quaisquer maus
tratos a refugiados e PDs dentro dos campos.
Visitas e missões de campo
Tanto organizações intergovernamentais,
tais como a OSCE e a ONU, quanto organizações não-governamentais
internacionais podem criar missões de campo ou realizar visitas de
campo. Essas visitas podem ser permanentes (contínua) ou ad hoc (em
resposta a um acontecimento ou situação específica). A maioria dessas
missões e visitas é concebida para coletar e monitorar informações
sobre a situação e dependem intensamente das informações fornecidas
por várias fontes.
ONGs internacionais e nacionais ou locais
e outras organizações de apoio
Existe uma vasta gama de ONGs nacionais e
internacionais. Um ponto inicial de contato poderia ser uma grande ONG
nacional experiente. Em geral, essa é a melhor maneira de se reunir
informação básica sobre recursos nacionais ou sobre os tratados dos
quais o Estado é parte. As ONGs podem prestar uma assistência de
grande valia, seja assumindo responsabilidade pelo encaminhamento de
denúncias, seja aconselhando-o sobre como proceder. Um tipo de ONG
internacional particularmente útil é a chamada "organização
guarda-chuva". Trata-se de ONGs que atuam como ponto central de
contanto para uma rede de ONGs nacionais menores. Em geral, para poder
participar de uma rede, as ONGs nacionais devem explicar seus objetivos,
métodos de trabalho etc., e devem poder demonstrar que tanto elas
quanto suas informações são fidedignas (Ver Apêndice II para
exemplos dessas organizações).
Também é possível obter assistência e
respaldo de organizações profissionais e redes de apoio (Ver Apêndice
II para exemplos dessas organizações).
Fundo Voluntário das Nações Unidas
para as Vítimas da Tortura
O Fundo Voluntário das Nações Unidas
para Vítimas da Tortura foi criado com a finalidade de distribuir
financiamento a ONGs que prestam assistência médica, psicológica,
jurídica, social, financeira, humanitária e qualquer outro tipo de
assistência às vítimas da tortura e a seus familiares. Qualquer ONG
disposta a realizar um projeto desse tipo pode solicitar uma subvenção
do Fundo. Deve-se preencher um formulário com informações detalhadas
sobre o projeto proposto e a organização beneficiada deverá
apresentar um relatório sobre o emprego da subvenção concedida. Os
formulários devem ser entregues até 31 de dezembro de cada ano e os
recursos financeiros são distribuídos cerca de seis meses depois (Ver
Apêndice II para detalhes).
Lobby
Nada pode substituir a opinião pública
quando se trata de buscar mudanças efetivas. Não há dúvida de que o
lobby perseverante pode ajudar a trazer à tona e lançar luz sobre os
abusos cometidos contra os direitos humanos. O lobby mais importante é
o que ocorre em Genebra durante as sessões da Comissão de Direitos
Humanos e a Subcomissão para Proteção e Promoção dos Direitos
Humanos das Nações Unidas. O exercício do lobby junto aos membros e
representantes estatais pode fazer a diferença entre excluir um tema da
agenda ou adotar uma resolução em condenação a um Estado. Se você
deseja participar, recomenda-se que você entre em contato com uma ONG
sediada em Genebra, que poderá ajudá-lo e fornecer-lhe informação
sobre como solicitar permissão para comparecer às sessões e como
fazer uma apresentação escrita ou oral (Ver Apêndice II para
contatos).
Outros foros onde se realiza um lobby
ativo em matéria de direitos humanos são os órgãos políticos de
organizações internacionais, a exemplo do Parlamento Europeu, e
representantes governamentais (não necessariamente de seu país),
principalmente os de Estados influentes.
RESUMO
PARTE III - AÇÃO DIANTE DA INFORMAÇÃO
COLETADA
Introdução às possíveis linhas de
ação
É possível agir
No âmbito internacional
No âmbito nacional
Se houver recursos eficazes no âmbito
nacional, deve-se procurar utilizá-los antes de recorrer aos mecanismos
internacionais. No âmbito nacional, existem recursos tais como
processos penais; processos civis; processos administrativos; processos
disciplinares ou pedidos de asilo.
Para escolher uma linha de ação no
âmbito internacional, deve-se considerar:
A disponibilidade do mecanismo: ele pode
ser utilizado?
A adequação do mecanismo: ele é
adequado a seus objetivos?
O que se deve saber sobre os mecanismos
internacionais de denúncia e como usá-los
Um mecanismo internacional de denúncia
é um mecanismo que recebe ou busca informação com a finalidade de
denunciar ou comentar se os Estados estão respeitando suas obrigações
nos termos da legislação internacional dos direitos humanos. A
informação que esse mecanismo recebe pode estar relacionada a
acusações gerais e particulares, mas seu objetivo, em última
análise, é obter um retrato preciso da situação geral e fazer
recomendações.
Os métodos mais comumente utilizados
pelos mecanismos internacionais de denúncia no desempenho de suas
funções são:
Monitoramento
Análise de relatórios estatais
Visitas de apuração dos fatos
O conteúdo e a forma de sua
apresentação variará segundo as funções do mecanismo (Ver texto
principal para indicações), mas todos os comunicados devem ser:
Acessíveis
Equilibrados e críveis
Detalhados
O que se deve saber sobre os
procedimentos internacionais de reclamação e como usá-los
Um procedimento internacional de
reclamação é um processo formal de natureza jurídica no qual uma
pessoa ou grupo de pessoas apresenta uma denúncia a um organismo
jurídico internacional, alegando que seus direitos individuais foram
violados em um caso específico. Uma reclamação nos termos deste
procedimento também pode ser denominada: requisição, petição ou
comunicado.
Ao considerar uma reclamação particular, o organismo faz duas
perguntas principais:
O organismo tem poder para examinar a
reclamação? Trata-se da questão de admissibilidade. Se o órgão
conclui que o caso é inadmissível (que ele não tem poder para
examinar a reclamação), o caso se encerra e os fatos não são
examinados (Ver texto principal para as razões pelas quais uma
reclamação pode ser declarada inadmissível).
Os fatos indicam ter ocorrido uma violação das obrigações do Estado?
É o que se chama consideração do mérito do caso, e só acontece se o
caso for considerado admissível.
Um comunicado a um procedimento internacional de reclamação sempre
deve conter:
Uma carta introdutória que exponha um
mínimo de detalhes (Ver texto principal para sugestões).
Tanta documentação de apoio Quanto for possível (Ver texto principal
para sugestões).
Mecanismos e procedimentos: Nações
Unidas
Os mecanismos e procedimentos de
denúncia mais importantes no âmbito do sistema das Nações Unidas
são:
O Procedimento 1503
Os Procedimentos Especiais da Comissão de Direitos Humanos da ONU:
Relatores Temáticos e de Países
O Comitê Contra a Tortura
O Comitê de Direitos Humanos
O Comitê dos Direitos da Criança
O Comitê para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher
O Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial
Os procedimentos de reclamação mais
importantes no âmbito do sistema das Nações Unidas fundamentam-se nos
seguintes instrumentos:
Convenção Contra a Tortura
(implementada pelo Comitê contra a Tortura)
Protocolo Opcional do PIDCP (implementado pelo Comitê de Direitos
Humanos)
Convenção para a Eliminação da Discriminação Racial (implementada
pelo Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial)
Mecanismos e procedimentos: esfera
regional
EUROPA:
O mecanismo de denúncia mais importante no sistema europeu é:
O Comitê Europeu para a Prevenção da
Tortura
O procedimento de reclamação mais importante no sistema europeu
fundamenta-se no seguinte instrumento:
Convenção Européia de Direitos Humanos
(implementada pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos)
AMÉRICAS:
O mecanismo de denúncia mais importante
no sistema interamericano é:
A Comissão Interamericana de Direitos
Humanos
O procedimento de reclamação mais importante no sistema interamericano
fundamenta-se nos seguintes instrumentos:
Convenção Americana de Direitos Humanos
ou Declaração Americana sobre os Direitos e Deveres do Homem
(implementadas pela Comissão e pelo Tribunal Interamericano de Direitos
Humanos)
ÁFRICA:
Os mecanismos de denúncia mais
importantes no sistema africano são:
A Comissão Africana de Direitos Humanos
e dos Povos
O Relator Especial sobre Prisões e Condições de Detenção na África
O procedimento de reclamação mais
importante no sistema africano fundamenta-se no seguinte instrumento:
Carta Africana de Direitos Humanos e dos
Povos (implementada pela Comissão Africana de Direitos Humanos e dos
Povos)
Onde se pode buscar mais ajuda?
Pode ser que você esteja relutante em
recorrer aos mecanismos internacionais por iniciativa própria, ou pode
ser que você precisa de apoio ou orientação, tanto para você mesmo
quanto para uma vítima. Nos casos em que você tomar uma ação você
mesmo, talvez convenha reforçar ou agilizar o processo mediante o
exercício do lobby.
Em tais casos, entre as organizações ou órgãos aos quais você pode
recorrer incluem-se aqueles que podem adotar suas próprias ações com
base em sua informação ou que podem lhe proporcionar assessoramento e
apoio; aqueles que podem ajudar as vítimas com apoio ou reabilitação;
e aqueles junto aos quais o lobby ativo pode se mostrar eficaz.
APÊNDICES
1. Apêndice I - Lista de Instrumentos
Relevantes
2. Apêndice II – Dados para Contato e
Obtenção de Maiores Informações
3. Apêndice III - Formulários de
Requisição Padrão
4. Apêndice IV – Diagramas do Corpo
1. APÊNDICE I - LISTA DE INSTRUMENTOS
RELEVANTES
Todos os instrumentos relacionados a
seguir podem ser relevantes para qualquer pessoa que queira denunciar
maus tratos a órgãos internacionais ou mesmo no âmbito do sistema
nacional. Os instrumentos foram organizados por tema para facilitar a
escolha de todos os instrumentos relevantes para um determinado assunto.
Dentro das divisões temáticas, os instrumentos foram subdivididos
segundo sua origem, isto é, a organização internacional que os criou.
Por razões de espaço, não foi possível reproduzir aqui todos os
instrumentos, mas o Apêndice II contém referências de possíveis
fontes para obtenção de cópias dos instrumentos.
Instrumentos Gerais de Direitos Humanos:
Nações Unidas:
Declaração Universal dos Direitos
Humanos
Pacto Internacional sobre Direitos Civis
e Políticos
Protocolo Opcional do Pacto Internacional
sobre Direitos Civis e Políticos
Conselho da Europa:
Convenção Européia de Direitos Humanos
Organização dos Estados Americanos:
Declaração Americana dos Direitos e
Deveres do Homem
Convenção Americana de Direitos Humanos
Organização da Unidade Africana:
Carta Africana de Direitos Humanos e dos
Povos
Instrumentos de Direitos Humanos
Específicos à Tortura:
Nações Unidas:
Declaração para a Proteção de Todas
as Pessoas Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Punições Cruéis,
Desumanos ou Degradantes
Convenção Contra a Tortura e Outros
Tratamentos ou Punições Cruéis, Desumanos ou Degradantes
Conselho da Europa:
Convenção Européia para a Prevenção
da Tortura
Organização dos Estados Americanos:
Convenção Interamericana para a
Prevenção e Punição da Tortura
Normas Gerais para o Tratamento de
Pessoas sob Custódia Oficial:
Nações Unidas:
Normas Mínimas para o Tratamento de
Prisioneiros
Princípios Básicos para o Tratamento de
Prisioneiros
Conjunto de Princípios para a Proteção
de Todas as Pessoas sob Qualquer Forma de Detenção ou Prisão
Regras das Nações Unidas para a
Proteção de Menores Privados de Liberdade
Normas Mínimas das Nações Unidas para
a Administração de Justiça Juvenil ("Regras de Pequim")
Conselho da Europa:
Regulamento Prisional Europeu
Normas Profissionais:
Nações Unidas:
Princípios Éticos Médicos pertinentes
à Função do Pessoal de Saúde, principalmente Médicos, na Proteção
de Presos e Detentos contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Punições
Cruéis, Desumanos ou Degradantes
Regras Modelos de Autópsias
Código de Conduta das Autoridades de
Execução da Lei
Princípios Básicos sobre o Uso de
Força e Armas de Fogo por Autoridades de Execução da Lei
Princípios Básicos sobre a Função dos
Advogados
Orientações sobre a Função dos
Promotores
Princípios Básicos sobre a
Independência do Poder Judiciário
Conselho da Europa:
Declaração sobre a Polícia
Instrumentos Relativos à Mulher:
Nações Unidas:
Declaração sobre a Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher
Convenção sobre a Eliminação de Todas
as Formas de Discriminação contra a Mulher
Declaração sobre a Eliminação da
Violência contra a Mulher
Organização dos Estados Americanos:
Convenção Interamericana para a
Prevenção, Punição e Erradicação da Violência contra a Mulher
Instrumentos Relativos a Crianças:
Nações Unidas:
Declaração sobre os Direitos da
Criança
Convenção sobre os Direitos da Criança
Regras das Nações Unidas para a
Proteção de Menores Privados de Liberdade
Normas Mínimas das Nações Unidas para
a Administração de Justiça Juvenil ("Regras de Pequim")
Organização da Unidade Africana
Carta Africana sobre os Direitos e o
Bem-estar da Criança
Instrumentos Relativos a Pessoas Detidas
por Razões de Saúde Mental:
Nações Unidas:
Princípios para a Proteção de Pessoas
com Doenças Mentais e a Melhoria do Atendimento em Saúde Mental
Instrumentos Relativos a Discriminação
Racial, Apartheid e Genocídio:
Nações Unidas:
Declaração das Nações Unidas para a
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial
Convenção Internacional para a
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial
Convenção para a Prevenção e
Punição do Crime de Genocídio
Convenção Internacional para a
Supressão e Punição do Crime de Apartheid
Instrumentos Relativos a Desaparecimentos
e Execuções Extrajudiciais:
Nações Unidas:
Declaração para a Proteção de Todas
as Pessoas contra Desaparecimentos Forçados
Princípios sobre a Prevenção e
Investigação Efetivas de Execuções Extrajudiciais, Arbitrárias e
Sumárias
Organização dos Estados Americanos:
Convenção Interamericana sobre o
Desaparecimento Forçado de Pessoas
Instrumentos Jurídicos Humanitários:
Convenção I de Genebra para a Melhoria
das Condições dos Feridos e Enfermos das Forças Armadas no Campo
Convenção II de Genebra para a Melhoria
das Condições dos Feridos, Enfermos e Náufragos Membros das Forças
Armadas no Mar
Convenção III relativa ao Tratamento de
Prisioneiros de Guerra
Convenção IV de Genebra relativa à
Proteção de Civis em Tempo de Guerra
Protocolo Adicional às Convenções de
Genebra de 12 de agosto de 1949, relativo à Proteção de Vítimas de
Conflitos Armados Internacionais (Protocolo I)
Protocolo Adicional às Convenções de
Genebra de 12 de agosto de 1949, relativo à Proteção de Vítimas de
Conflitos Armados Não-Internacionais (Protocolo II)
Outros Instrumentos Importantes:
Nações Unidas:
Declaração sobre o Direito e a
Responsabilidade de Indivíduos, Grupos e Órgãos da Sociedade pela
Promoção e Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades
Fundamentais Reconhecidos Universalmente ("Declaração sobre os
Defensores dos Direitos Humanos")
Garantias de Proteção dos Direitos dos
Condenados à Pena de Morte
Declaração de Princípios Básicos de
Justiça para Vítimas de Crimes e Abuso de Poder
Estatuto do Tribunal Penal Internacional
2. APÊNDICE II –DADOS PARA CONTATO E
OBTENÇÃO DE MAIORES INFORMAÇÕES
DADOS PARA CONTATO:
Mecanismos Internacionais:
COMISSÃO AFRICANA DOS DIREITOS HUMANOS E
DOS POVOS:
Kairaba Avenue, P.O. Box 673
Banjul, Gâmbia
Telefone: +220-392962
Fax: +220-390764
Correio eletrônico: achpr@achpr.gm
COMITÊ CONTRA A TORTURA:
OHCHR-UNOG
CH 1211 Genebra 10, Suíça
Telefone: +41-22-917 9000
Fax: +41-22-917 9011
Correio eletrônico:
webadmin.hchr@unog.ch
http://www.unhchr.ch/
COMITÊ PARA A ELIMINAÇÃO DA
DISCRIMINAÇÃO RACIAL:
OHCHR-UNOG
CH 1211 Genebra 10, Suíça
Telefone: +41-22-917 9000
Fax: +41-22-917 9011
Correio eletrônico:
webadmin.hchr@unog.ch
http://www.unhchr.ch/
COMITÊ PARA A ELIMINAÇÃO DA
DISCRIMINAÇÃO CONTRA A MULHER:
OHCHR-UNOG
CH 1211 Genebra 10, Suíça
Telefone: +41-22-917 9000
Fax: +41-22-917 9011
Correio eletrônico:
webadmin.hchr@unog.ch
http://www.unhchr.ch/
COMITÊ SOBRE OS DIREITOS DA CRIANÇA:
OHCHR-UNOG
CH 1211 Genebra 10, Suíça
Telefone: +41-22-917 9000
Fax: +41-22-917 9011
Correio eletrônico:
webadmin.hchr@unog.ch
http://www.unhchr.ch/
COMITÊ EUROPEU PARA A PREVENÇÃO DA
TORTURA:
Conselho da Europa
F-67075 Estrasburgo Cedex
França
Correio eletrônico:
HumanRights.Info@coe.int
Telefone: +33-3-88 41 20 24
Fax: +33-3-88 41 27 04
http://www.cpt.coe.int/
TRIBUNAL EUROPEU DE DIREITOS HUMANOS:
Tribunal Europeu de Direitos Humanos
Conselho da Europa
F - 67075 Estrasburgo-Cedex
França
Telefone: +33-3-88 41 20 18
Fax: +33-3-88 41 27 30
http://www.echr.coe.int/
COMITÊ DE DIREITOS HUMANOS:
OHCHR-UNOG
CH 1211 Genebra 10, Suíça
Telefone: +41-22-917 9000
Fax: +41-22-917 9011
Correio eletrônico:
webadmin.hchr@unog.ch
http://www.unhchr.ch/
COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS
HUMANOS:
Comissão Interamericana de Direitos
Humanos
1889 F St., NW, Washington, D.C., EE.UU.
20006.
Telefone: +1-202-458 6002
Fax: +1-202-458 3992.
Correio eletrônico: cidhoea@oas.org
http://www.cidh.oas.org/
TRIBUNAL INTERAMERICANO DE DIREITOS
HUMANOS:
Tribunal Interamericano de Direitos
Humanos
Apdo 6906-1000
San José, Costa Rica
Telefone: + 506-234 0581 or +506-225 3333
Fax: +506-234 0584
Correio eletrônico:
corteidh@sol.racsa.co.cr
http://www1.umn.edu/humanrts/iachr/iachr.html
ESCRITÓRIO DO ALTO COMISSARIADO DAS
NAÇÕES UNIDAS PARA DIREITOS HUMANOS:
OHCHR-UNOG
CH 1211 Genebra 10, Suíça
Telefone: +41-22-917 9000
Fax: +41-22-917 0099
Correio eletrônico:
webadmin.hchr@unog.ch
http://www.unhchr.ch/ (inclui dados sobre
todas as presenças no campo do EACDH e textos de muitos instrumentos
internacionais de direitos humanos)
RELATOR ESPECIAL SOBRE PRISÕES E
CONDIÇÕES DE DETENÇÃO NA ÁFRICA
Kairaba Avenue, P.O. Box 673
Banjul, Gâmbia
Telefone: +220-392962
Fax: +220-390764
Correio eletrônico: achpr@achpr.gm
RELATOR ESPECIAL DAS NAÇÕES UNIDAS
SOBRE A TORTURA:
OHCHR-UNOG
CH 1211 Genebra 10, Suíça
Telefone: +41-22-917 9000
Fax: +41-22-917 9006
Correio eletrônico:
webadmin.hchr@unog.ch
http://www.unhchr.ch/
PROCEDIMENTO 1503
OHCHR-UNOG
CH 1211 Genebra 10, Suíça
Telefone: +41-22-917 9000
Fax: +41-22-917 9011
Correio eletrônico:
webadmin.hchr@unog.ch
http://www.unhchr.ch/
Outras Fontes de Ajuda:
Organismos Intergovernamentais
Especializados:
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO:
Departamento Internacional de Normas
Trabalhistas e Direitos Humanos (NORMES)
4 route de Morillons
CH-1211 Genebra 22
Suíça
Telefone: +41-22-799 7126
Fax: +41-22-799 6926
Correio eletrônico: infleg@ilo.org
http://www.ilo.org/
ESCRITÓRIO PARA INSTITUIÇÕES
DEMOCRÁTICAS E DIREITOS HUMANOS:
Organização para Segurança e
Cooperação na Europa
Escritório para Instituições
Democráticas e Direitos Humanos
Aleje Ujazdowskie 19
00-557 Varsóvia
Polônia
Telefone: +48-22-520 06 00
Fax: +48-22-520 06 05
Correio eletrônico:
office@odihr.osce.waw.pl
http://www.osce.org/odihr/ (inclui dados
atuais de operações de campo)
PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O
DESENVOLVIMENTO (PNUD)
1 UN Plaza
Nova York, NY 10017
Estados Unidos
http://www.undp.org (esta página dá
acesso a muitos escritórios do PNUD em todo o mundo)
ALTO COMISSARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS
PARA REFUGIADOS:
C.P. 2500,
1211 Genebra 2,
Suíça
http://www.unhcr.ch/ (inclui link para
endereços de correio eletrônico e dados sobre todas as atividades de
campo do ACNUR)
UNICEF:
UNICEF House
3 United Nations Plaza
Nova York, NY 10017
Estados Unidos
Telefone: +1-212-326 7000
Fax: +1-212-887 7465
http://www.unicef.org/
Organização Humanitária Internacional:
COMITÊ INTERNACIONAL DA CRUZ VERMELHA:
19 Avenue de la Paix
CH 1202 Genebra
Suíça
Telefone: +41-22-734 60 01
Fax: +41-22-733 20 57 (Central de
Informação ao Público)
Correio eletrônico:
webmaster.gva@icrc.org
http://www.icrc.org/
ONGs Internacionais:
"Organizações guarda-chuva":
ASSOCIAÇÃO PARA A PREVENÇÃO DA
TORTURA (APT)
Route de Ferney 10
Case postale 2267
CH-1211 Genebra 2
Suíça
Telefone: +41-22-734 2088
Fax: +41-22-734 5649
Correio eletrônico: apt@apt.ch
http://www.apt.ch/ (inclui cópias de
muitos relatórios e estudos)
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL CONTRA A TORTURA
(OMCT)
Secretaria Internacional
PO Box 35 - 37 Rue de Varembé
CH1211 Genebra CIC 20
Suíça
Telefone: + 41-22-733 3140
Fax: + 41-22-733 1051
Correio eletrônico: omct@omct.org
http://www.omct.org/
FEDERAÇÃO INTERNACIONAL DAS LIGAS DOS
DIREITOS HUMANOS (FIDH)
17 Passage de la Main d'Or
75011 Paris, França
Telefone : +33-1-43 55 25 18
Fax : +33-1-43 55 18 80
Correio eletrônico : fidh@csi.com
http://www.fidh.imaginet.fr/
Outras ONGs Internacionais:
ANISTIA INTERNACIONAL (AI)
Secretaria Internacional
1 Easton St
Londres
WC1X 8DJ
Reino Unido
Telefone: +44-171-413 5500
Fax: +44-171-956 1157
Correio eletrônico:amnestyis@amnesty.org
http://www.amnesty.org/ (o ponto de
partida para acesso a todos os relatórios e comunicados à imprensa da
AI, bem como dados para contato com escritórios nacionais)
AÇÃO CRISTÃ PARA A ABOLIÇÃO DA
TORTURA E DAS EXECUÇÕES CAPITAIS (ACAT)
7 rue Georges Lardennois
75019 Paris, França
Telefone: +33 -1-40 40 42 43
Fax : +33 -1-40 40 42 44
Correio eletrônico: acat-fr@worldnet.fr
http://home.worldnet.fr/acatfr/
FIACAT:
Federação Internacional da ACAT
27 rue de Maubeuge
75009 PARIS
França
Telefone : +33-1-42 80 01 60
Fax : +33-1-42 80 20 89
Correio eletrônico: Fi.Acat@wanadoo.fr
DIREITOS HUMANOS NA INTERNET (HRI):
8 York StrRET, Suite 302
Ottawa, Ontário
K1N 5S6 Canadá
Telefone: +1-613-789 7407
Fax: +1-613-789 7414
Correio eletrônico: hri@hri.ca
http://www.hri.ca/
HUMAN RIGHTS WATCH (HRW):
350 Fifth Avenue, 34th Floor
Nova York, NY
10118-3299 EUA
Telefone: +1-212-290 4700
Fax: +1-212-736 1300
Correio eletrônico: hrwnyc@hrw.org
http://www.hrw.org/
FEDERAÇÃO INTERNACIONAL DE HELSINKI
PARA OS DIREITOS HUMANOS:
Rummelhardtg. 2/18
A-1090 Viena
Áustria
Telefone: +43-1-408 88 22
Fax: +43-1-408 88 22-50
Correio eletrônico: office@ihf-hr.org
http://www.ihf-hr.org/
INSTITUTO INTERAMERICANO DE DIREITOS
HUMANOS:
A.P. 10.081-1000
San José, Costa Rica
Tel.: +506-234 0404
Fax: +506-234 0955
Correio eletrônico: instituto@iidh.ed.cr
http://www.iidh.ed.cr/
SERVIÇO INTERNACIONAL PARA OS DIREITOS
HUMANOS:
(fornece informações e presta
assistência às ONGs que desejam utilizar o sistema da ONU)
1 Rue de Varembé
P.O. Box 16
Ch-1211 Genebra CIC
Suíça
Telefone: +41-22-733 5123
Fax: +41-22-733 0826
REFORMA PENAL INTERNACIONAL
Unit 114, The Chandlery
50 Westminster Bridge Rd
Londres SE1 7QY
Reino Unido
Telefone: +44-171-721 7678
Fax: +44-171-721 8785
Correio eletrônico: Headofsecretariat
@pri.org.uk
http://www.penalreform.org (inclui dados
dos escritórios regionais)
MÉDICOS PELOS DIREITOS HUMANOS (PHR)
100 Boylston St.
Suite 702
Boston, MA 02116
Estados Unidos
Telefone: +1-617-695 0041
Fax: +1-617-695 0307
Correio eletrônico: phrusa@igc.apc.org
http://www.phrusa.org/
Apoio a Vítimas:
CONSELHO INTERNACIONAL DE REABILITAÇÃO
PARA VÍTIMAS DA TORTURA (IRCT)
P.O. Box 2107
DK-1014 Copenhague K
Dinamarca
Telefone: +45-33-76 06 00
Fax: +45-33-76 05 00
Correio eletrônico: irct@irct.org
http://www.irct.org (inclui dados para
contato com centros de apoio a vítimas de tortura em muitos países)
FUNDO VOLUNTÁRIO DAS NAÇÕES UNIDAS
PARA VÍTIMAS DA TORTURA
(Ajuda a financiar projetos voltados para
a reabilitação de vítimas da tortura)
OHCHR -UNOG (Trust Funds Unit)
CH-1211 Genebra 10, Suíça
Telefone: +41-22-917 9000
Fax: +41-22-917 9011
Correio eletrônico:
dpremont.hchr@unog.ch
http://www.unhchr.ch/
Organizações Profissionais:
UNIÃO INTERPARLAMENTAR (UI)
C.P. 438
1211 GENEBRA 19
Suíça
Telefone: +41-22-919 41 50
Fax: +41-22-733 31 41, +41-22-919 41 60
Correio eletrônico: postbox@mail.ipu.org
http://www.ipu.org/
COMITÊ DE ADVOGADOS PARA OS DIREITOS
HUMANOS (LCHR)
333 Seventh Avenue, 13th Floor
Nova York, NY 10001
Estados Unidos
Telefone: +1-212-845 5200
Fax: +1-212-845 5299
Correio eletrônico: lchrbin@lchr.org
http://www.lchr.org/
ASSOCIAÇÃO MÉDICA MUNDIAL (WMA)
PO Box 63
01212 Ferney-Voltaire Cedex
França
Telefone: +33-4-50 40 75 75
Fax: +33-4-50 40 59 37
Correio eletrônico: info@wma.net
http://www.wma.net/
COMO OBTER MAIS INFORMAÇÕES
Onde é possível encontrar cópias dos
instrumentos mencionados neste manual?
O modo mais fácil de encontrar a maioria
desses instrumentos é pela Internet. Normalmente, é possível ter
acesso aos instrumentos citados pelo site da organização que os criou
(ver Dados para Contato acima para os endereços na Internet). O ponto
de partida para encontrar muitos dos textos de tratados internacionais
seria a página do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas
para Direitos Humanos, http://www.unhchr.ch/html/intlist.htm. Outro site
sobre direitos humanos muito útil é o da Universidade de Minnesota,
http://www1.umn.edu/humanrts/ e a página do Human Rights Internet
(Direitos Humanos na Internet) citada na seção anterior. Ambos dão
acesso aos textos de muitos instrumentos internacionais.
Se você não tem acesso à Internet, é
possível obter cópias dos textos enviando uma solicitação por
escrito às próprias organizações. No entanto, talvez seja mais
simples entrar em contato com ONGs maiores que já disponham desses
textos. Alternativamente, muitos desses textos podem ser encontrados em
uma biblioteca pública ou universitária. Também é possível obter
compilações de textos sobre direitos humanos.
De qualquer modo, não deixe de verificar
se o Estado em questão ratificou o tratado e se fez alguma reserva ao
tratado.
Onde encontrar cópias de relatórios dos
mecanismos internacionais descritos neste manual?
Uma vez mais, a maioria dos mecanismos
coloca seus relatórios à disposição na Internet. Os mecanismos
baseados no EACDH têm uma página muito completa na Internet, com um
banco de dados que contém a maioria dos documentos publicados, senão
todos. A CoADHP ainda não dispõe de página própria na Internet, mas
muitos de seus relatórios estão disponíveis na página da
Universidade de Minnesota. Também é possível escrever à
organização, entrar em contato com outras ONGs ou procurar
encontrá-los em uma biblioteca.
Onde encontrar mais informação sobre
como documentar a tortura?
O Protocolo de Istambul e o Manual de
Investigação e Documentação Efetiva da Tortura e Outros Tratamentos
e Punições Cruéis, Desumanos ou Degradantes contêm disposições
muito pormenorizadas sobre a investigação jurídica da tortura e, em
particular, sobre o exame médico de vítimas da tortura. Recomenda-se
que os profissionais médicos que quiserem saber mais sobre esse assunto
consultem o Protocolo. A publicação do Protocolo será realizada com a
ajuda do EACDH no ano 2000. Por enquanto, o documento está disponível
em Physicians for Human Rights (Médicos pelos Direitos Humanos) e está
publicado em sua página na Internet (Ver referência na seção
anterior).
O Protocolo de Minnesota e o Manual de
Prevenção e Investigação Efetiva de Execuções Extrajudiciais,
Arbitrárias e Sumárias também contêm disposições muito
pormenorizadas sobre autópsias e exames de cadáveres, inclusive de
pessoas falecidas em decorrência de torturas. Esses documentos estão
disponíveis por meio do EACDH: (1991) UN Pub. Sales No. E.91.IV.1 (doc.
ST/CSDHA/12).
Para informações mais detalhadas sobre
o direito internacional e a prática relacionados à tortura, ver
Rodley, Nigel S., "The Treatment of Prisoners Under International
Law", 2nd edition, Oxford Press (1999).
Para maiores informações sobre como
usar os mecanismos internacionais dos direitos humanos, ver Hannum,
Hurst, "Guide to International Human Rights Practice", 3rd
edition, Transnational Publishers, Ardsley, New York (1999).
3. APÊNDICE III – FORMULÁRIOS DE
SOLICITAÇÃO PADRÃO
Modelo de questionário para
apresentação de denúncia de tortura
ao Relator Especial sobre Tortura
A informação sobre a tortura de uma
pessoa deve ser encaminhada por escrito ao Relator Especial e enviada
aos cuidados do Escritório do Alto Comissariado para Direitos Humanos
(Office of the High Commissioner for Human Rights, United Nations Office
at Geneva, CH-1211 Genebra 10, Suíça). O Relator Especial somente pode
se ocupar daqueles casos particulares que contenham, no mínimo, as
seguintes informações:
a. Nome completo da vítima
b. Data do(s) incidente(s) de maus tratos
(pelo menos o mês e o ano)
c. Lugar onde a pessoa foi detida
(cidade, província etc.) e local onde se deram os maus tratos (se
conhecido)
d. Indicação das forças ou outros agentes públicos que praticaram os
maus tratos
e. Descrição da forma de maus tratos
usada e de qualquer lesão sofrida como conseqüência
f. Identidade da pessoa ou organização
que apresenta o relato (nome e endereço; esses dados serão mantidos em
caráter confidencial)
Se necessário, podem ser acrescentadas
folhas adicionais. Devem ser apresentadas cópias da documentação de
apoio, tais como laudos médicos ou relatórios policiais, sempre que
pertinentes. Somente devem ser enviadas cópias, e não os originais,
desse tipo de documentação.
I. Identidade da(s) pessoa(s)
submetida(s) a maus tratos
A. Sobrenome:
B. Nome(s):
C. Sexo (masculino ou feminino):
D. Idade ou data de nascimento:
E. Nacionalidade:
F. Profissão:
G. Número do documento de identidade (se
for o caso):
F. Atividades (sindical, política,
religiosa, humanitária, solidária, imprensa etc.):
G. Endereço residencial e/ou de trabalho
II. Circunstâncias em que ocorreram os
maus tratos:
A. Data e lugar da prisão e subseqüente
tortura
B. Identidade da(s) força(s) que
efetuaram a detenção inicial e/ou a tortura (polícia, serviços de
inteligência, forças armadas, paramilitares, agentes carcerários,
outros)
C. Alguma pessoa (advogado, familiares ou
amigos, por exemplo) foi autorizada a ver a vítima durante a
detenção? Se foi, quanto tempo após a prisão?
D. Descreva os métodos de maus tratos
usados
E. Quais lesões foram sofridas em
decorrência dos maus tratos?
F. Qual supostamente seria a razão dos
maus tratos?
G. A vítima foi examinada por um médico
em algum momento durante ou após o incidente? Se foi, quando? Esse
exame médico foi realizado por um médico de uma prisão ou do governo?
H. A vítima recebeu tratamento adequado
das lesões causadas pelos maus tratos?
I. O exame médico foi realizado de modo
que o médico pudesse detectar provas de lesões sofridas em
decorrência dos maus tratos? Foi emitido algum laudo ou atestado
médico? Se foi, o que revelaram os laudos?
J. Se a vítima morreu sob custódia, foi
realizada autópsia ou um exame forense? Quais foram os resultados?
III. Ação reparadora
A vítima, seus familiares ou
representantes buscaram algum recurso nacional (reclamações contra as
forças responsáveis, o poder judiciário, órgãos políticos, etc.)?
Em caso afirmativo, quais foram os resultados?
IV. Informação sobre o autor da
denúncia apresentada:
A. Sobrenome
B. Nome(s)
C. Relação com a vítima
D. Organização que representa, se for o
caso
E. Endereço atual completo
Modelo de comunicado com base no
Protocolo Opcional ao PIDCP
Comunicado ao: Comitê de Direitos
Humanos, a/c OHCHR-UNOG, 1211 Genebra 10, Suíça,
apresentado para consideração com base
no Protocolo Opcional ao Pacto Internacional sobre Direitos Civis e
Políticos.
I. Informações sobre o autor do
comunicado
Sobrenome .... Nome(s)
Nacionalidade .... Profissão
Data e local de nascimento ....
Endereço atual
Endereço para troca de correspondência
confidencial (se diferente do endereço atual)
Apresenta o comunicado como:
(a) Vítima da violação ou violações
especificada(s) abaixo
(b) Representante nomeado/ advogado da suposta vítima(s)
(c) Outro
Se for assinalado o item (c), o autor
deve especificar:
Em que qualidade ele está agindo em nome
da(s) vítima(s) (por exemplo, parentesco ou outros vínculos pessoais
com a suposta vítima(s):
(ii) Porque a(s) vítima(s) não pode(m)
apresentar o comunicado ela(s) mesma(s)?:
Não se permite que um terceiro sem
qualquer vínculo com a vítima(s) apresente um comunicado em seu nome.
II. Informação sobre a suposta
vítima(s)
(em caso de não ser o autor)
Sobrenome ... Nome(s)
Nacionalidade ... Profissão
Data e local de nascimento ...
Endereço ou paradeiro atual
III. Estado envolvido/artigos
violados/recursos nacionais
Nome do Estado Parte (país) do Pacto
Internacional e do Protocolo Opcional contra o qual o comunicado é
dirigido:
Artigos do Pacto Internacional de
Direitos Civis e Políticos supostamente violados:
Medidas tomadas pela vítima, ou em seu
nome, para esgotar os recursos nacionais junto aos tribunais ou a outras
autoridades públicas; quando e com quais resultados (se possível,
incluir cópias das respectivas decisões judiciais ou administrativas):
Se não foram esgotados os recursos
nacionais, explicar por que:
IV. Outros procedimentos internacionais
A mesma matéria foi apresentada para
consideração a outro procedimento internacional de investigação ou
solução (por exemplo, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos,
a Convenção Européia de Direitos Humanos)? Em caso afirmativo, quando
e quais foram os resultados?
.....
V. Fatos da alegação
Descrição pormenorizada dos fatos da
suposta violação ou violações (inclusive respectivas datas).
Acrescentar tantas páginas quantas forem necessárias para esta
descrição.
Assinatura do autor: Data:
4. APÊNDICE IV – DIAGRAMAS DO CORPO
MULHER - FRENTE E COSTAS
HOMEM - FRENTE E COSTAS
Human Rights Centre, Universidade de
Essex
SBN 1 874635 28 5
Publicado em fevereiro de 2000
Human Rights Centre
University of Essex
Wivenhoe Park
Colchester CO4 3SQ
Reino Unido
Tel: 00 44 1206 872558
Fax: 00 44 1206 873428
Email: hrc@essex.ac.uk
URL: http://www2.essex.ac.uk/human_rights_centre/
© The Human Rights Centre
Todos os direitos reservados. Esta obra
somente pode ser reproduzida para fins não-comerciais e com referência
expressa ao Human Rights Centre, Universidade de Essex.
PRINCIPAIS COLABORADORES
Autora e Pesquisadora:
Sra. Camille Giffard Diretora de
Pesquisa, Universidade de Essex
Diretores do Projeto:
Professor Sir Nigel Rodley, KBE Relator
Especial da ONU sobre tortura e professor de Direito, Universidade de
Essex
Professor Geoff Gilbert Professor de
Direito, Universidade de Essex
Junta Editorial:
Dra. Silvia Casale Membro do Comitê
Europeu para a Prevenção da Tortura
Professor Malcolm Evans Professor de
Direito da Universidade de Bristol
Professora Françoise Hampson Membro da
Subcomissão da ONU para a Promoção e Proteção dos Direitos Humanos
e Professora de Direito, Universidade de Essex
Professor Geoff Gilbert
Professor Sir Nigel Rodley
Apoio Administrativo e Secretaria:
Sra. Anne Slowgrove
Sra. Heidi Wiggam
Sra. Anna Massara (reunião de trabalho)
AGRADECIMENTOS
A autora e os diretores do projeto
gostariam, antes de mais nada, de agradecer à Dra. Silvia Casale, ao
Prof. Malcolm Evans e à Profa. Françoise Hampson por seu sensato
assessoramento e por sua incansável dedicação, boa vontade e
profissionalismo ao longo de todo este empreendimento. Também estendem
seus agradecimentos às muitas instituições, organizações e
indivíduos que contribuíram nas diversas etapas do processo. Sua
resposta sempre foi sempre entusiástica e serviu de grande apoio, além
de contribuir para o bom andamento do projeto. Agradecimentos especiais
também ao Ministério das Relações Exteriores e à Commonwealth do
Reino Unido, sem cuja colaboração e interesse inicial este projeto
nunca teria se concretizado. Agradecimentos também a todos aqueles que
participaram da reunião de trabalho realizada de 1 a 3 de setembro de
1999, na Universidade de Essex, que ajudaram a transformar uma versão
preliminar em um manual que, esperamos, poderá cumprir melhor sua
finalidade.
Entre aqueles que prestaram valorosas
contribuições incluem-se: Barbara Bernath, Dr. Joe Beynon, Mylène
Bidault, Said Boumedouha, Craig Brett, Aissio Bruni, Christina Cerna,
Daniela De Vito, Carla Edelenbos, Caroline Ford, Dr. Duncan Forrest,
Yuval Ginbar, Sara Guillet, Rogier Huizenda, Maria Francisca Ize-Charrin,
Cecilia Jiménez, Mark Kelly, Johanna MacVeigh, Nathalie Man, Dr. Andrew
Mawson, Fiona McKay, Cecilia Moller, Rod Morgan, Ahmed Motala, Patrick
Müller, Dr. Michael Peel, Borislav Petranov, Carmen Rosa Rueda
Castañón, Eleanor Solo, Eric Sottas, Trevor Stevens, Morris Tidball,
Rick Towle, Agnes Van Steijn, Olga Villarrubia e Jim Welsh.
Instituições e organizações
consultadas:
Anistia Internacional, Associação para
a Prevenção da Tortura, Secretaria do Comitê Europeu para a
Prevenção da Tortura, Registro do Tribunal Europeu dos Direitos
Humanos, Federação Internacional dos Direitos Humanos, Secretaria
Executiva da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, Instituto
Interamericano de Direitos Humanos, Comitê Internacional da Cruz
Vermelha, Fundação Médica para as Vítimas da Tortura, Organização
Mundial contra a Tortura, REDRESS, Save the Children, Escritório do
Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos e
Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados.
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