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Direitos Humanos
Direitos
Humanos
Direitos
Humanos em Moçambique
Josué
Bila
Parte
I – Artigos
Capítulo
I
Moçambique contemporâneo
e Direitos Humanos
Indústria
moçambicana de privilégios18
O
Mecanismo Africano de Revisão de
Pares (órgão da União
Africana) rebateu recentemente que, em
Moçambique, os índices de
exclusão social são expressivos,
confirmando, assim, o estado de miséria,
fome e pobreza a que muitos nacionais
se encontram mergulhados. A exclusão
social, miséria, fome e pobreza
traduzem o óbvio: ausência
de direitos humanos.
A
exclusão social, a pobreza, a fome
e a miséria são das mazelas
de que, ontem e hoje, os moçambicanos
padecem, em virtude dos processos produtores
de desigualdades económicas, sociais,
políticas e até culturais,
se tomarmos cultura em dimensão
de bens de literatura escrita, artes de
racionalidade urbana e não só.
Ontem,
padecíamos de mazelas, porque até
1975, vivíamos sob domínio
da administração colonial
portuguesa, não que o colonialismo
tivesse sido responsável único
de nossa penúria. Contudo, suas
acções contra a população
nativa moçambicana foram antónimas
à ética em direitos humanos.
Hoje, sob o governo da FRELIMO, continuamos
com mazelas porque a sorte político-ideológica
e social tem sido nossa madrasta e o pai
governamental é apenas biológico,
por se imiscuir dos seus deveres sociais.
Tanto um quanto outro produziram processos
de desigualdade no acesso ao Poder, quer
político, quer económico,
quer financeiro, quer social, quer cultural,
abrindo espaços para a instalação
daquilo que chamo de indústria
moçambicana de privilégios.
Em
Moçambique pós-independente,
a indústria moçambicana
de privilégios resultou na concentração
de poder, riqueza, recursos, renda, capital
social e cultural, que se arrasta por
dezenas de anos, em razão do arrogante
controle político e económico
exercido pelas elites nacionais. O filósofo
moçambicano Brazão Mazula
sublinha, em seus escritos, que as elites
nacionais, depois da Independência
Nacional em 1975, foram se constituindo
no aparelho de Estado e no partido governamental,
na base de privilégios políticos
e económicos em relação
ao conjunto da sociedade .
Nos
finais da década de ’90,
Moçambique adoptou o famoso Programa
de Reabilitação Económica,
dando início à economia
de mercado. Este é dos períodos
em que se verificou que o governo da FRELIMO
permitiu, em grande medida, que uma minoria
privilegiada tivesse riqueza ostensiva
e não criada na base de trabalho
e honestidade.
Em
1990, o antigo Primeiro-Ministro, Mário
Machungo , entrevistado pela revista Tempo,
assinalou a grande onda de desvios de
riqueza nacional para caprichos de nepotismo,
privilégio e ostentação
exagerada e grosseira da tal minoria,
revelando, ao que tudo indica, as elites
do partido governamental, FRELIMO, a que
ele pertence.
Machungo
frisou ainda que certos grupos ou indivíduos
do meio político e económico
ostentam, nas grandes cidades, uma riqueza
requintada de Primeiro Mundo, inexplicável
à situação económica
do país.
Por
a indústria moçambicana
de privilégios for, em grande parte,
a base de acesso ao Poder, recursos e
bens, a multinacional ética de
direitos humanos e políticas públicas
fica adiada, prejudicada e pisoteada pelos
detentores do Poder. Por isso que verificamos,
em todos os cantos, a miséria,
fome e exclusão social que neutralizam
os sonhos sociais e privam as pessoas
de “mastigarem” oportunidades
sociais, políticas, civis, económicas
a que têm direito. De igual modo,
processos há que não podem
ser deixados de fora na avaliação
dos produtores de desigualdades: os ventos
do neoliberalismo,21
globalismos predatórios22
e outros “ismos” similares
e muitos problemas internos existem sob
o descontrolo dos detentores de Poder
local-nacional.
As
mazelas sociais – pobreza, fome,
miséria e exclusão –
constituem por si a negação
de direitos. A negação de
direitos é incapaz de abrir e expandir
espaços de acesso aos bens sociais,
económicas, políticas e
culturais, privando que os moçambicanos
possam viver de modo digno.
Depois
dessa descrição, resta repetir
que em nosso meio o que causa a exclusão
social, miséria, fome e pobreza
são os processos produtores de
desigualdade social e não necessariamente
a falta de recursos, tal como apontado
no meu texto Como Moçambique pode
materializar direitos humanos? Moçambique
tem recursos, mas estão mal distribuídos,
por um lado. Por outro, recursos humanos
e materiais há que não estão
sendo produzidos, por a sua existência
e consequente distribuição
aos beneficiários de direitos humanos
e políticas públicas não
interessar a quem detém o Poder.
Uma
das medidas para a superação
das quatro mazelas relacionadas –
exclusão social, miséria,
fome e pobreza – é a via
Política, porque é onde
as relações de Poder se
realizam. Igualmente, na Política
é discutido os critérios
para a (não) distribuição
equitativa de bens e recursos, por isso
o apelo a maior consciência e prática
de cidadania, ainda que a níveis
primários, é tão
cadente quanto premente.
Por
assim dizer, Moçambique tem muitos
desafios pela frente. O primeiro é
a disposição política
de que as autoridades do Estado devem
ter para que se orientem na base de directrizes
constitucionais. Segundo, as autoridades
do Estado, ao se orientarem de directrizes
constitucionais, poderão reacender
a esperança de os moçambicanos
- pobres e socialmente excluídos
- terem acesso aos recursos de que a indústria
de privilégios permite exclusivamente
ter. Terceiro, as autoridades do Estado
precisam erguer políticas públicas
focalizadas em direitos humanos. Quarto,
é necessário que se resguardem
os valores de cidadania, abrindo cada
vez mais espaços de ética
democrática e de justiça
social, através da participação
dos cidadãos nas decisões
nacionais e na satisfação
processual e integral de seus direitos.
Quinto, traçar políticas
públicas erguidas sob a inspiração
ética de direitos humanos, a médio
e longo prazos.
Estas
propostas todas não serão
certamente realizadas em apenas um só
período como se políticas
públicas e direitos humanos fossem
única e exclusiva época
chuvosa. É necessário que
sejam implementados progressivamente.
Porém, é necessário
que as autoridades do Estado sejam flexíveis,
porque, neste momento, centenas de crianças
moçambicanas estão perdendo
vida por causa da fome e cuidados de saúde;
centenas de mulheres escalando a morte
por causa da falta de ambulância
e enfermeiro no lugar mais próximo
possível; milhares de moçambicanos
morrendo, por causa da malária;
milhares de famílias passando fome
crónica; milhares no desemprego;
milhares, não participando na vida
política, por causa de exclusão
político-ideológica e frustração
em virtude de as promessas eleitorais
não terem sido cumpridas; milhares,
não votando porque suas expectativas
sociais foram frustradas; milhares, fugindo
do País por falta de oportunidades
de emprego, liberdade intelectual/académica
e participar da cidadania efectiva; milhares
de crianças estão tendo
má qualidade de educação
e em péssimas qualidades pedagógicas
e infra-estruturais; milhares, em tudo
quanto chamo de mazelas sociais.23
É
preciso remover a indústria moçambicana
de privilégios, dando oportunidades
sociais, económicas, culturais
e políticas aos moçambicanos,
em nome de direitos humanos.
^
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Notas:
18
- São Paulo, 11 de Junho de 2009
19 - Mazula, Brazão.
Educação, Cultura e Ideologia
em Moçambique: 1975-1985. Edições
Afrontamento e Fundo Bibliográfico
de Língua Portuguesa. 1995. pág
236
20 - Machungo, Mário.
Revista Tempo, nr. 1009. Ano:1990. pág
7
21
- Este tema tem sido tratado em muitos
escritos. Neste momento, recomendo a leitura
do francês Passet, René.
A ilusão neoliberal. Trad. Clóvis
Marques – Rio de Janeiro. Record.
2002.
22
-
Falk, Richard.Globalização
Predatória: Uma crítica.
Trad. Rogério Alves. Lisboa. Instituto
Piaget. 1999.
23 - 5 de Fevereiro de
2008 e 1 e 2 de Setembro de 2010, os moçambicanos
saíram às ruas para protestar
contra as injustiças sociais que
são visíveis no alto custo
de vida.
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