
Nasce a Ouvidoria de Polícia do Estado de São Paulo
Bernardete
Toneto5
O Centro Santo Dias de
Direitos Humanos da Arquidiocese de São Paulo é o embrião da maior e
mais bem sucedida experiência brasileira de controle social da
atividade policial: a Ouvidoria de Polícia do Estado de São Paulo.
A
partir do trabalho de combate à violência policial desenvolvido pelo
Centro Santo Dias, o cientista social Benedito Domingos Mariano foi
indicado para assumir a Ouvidoria de Polícia do Estado de São Paulo,
em 1995, a primeira no Brasil. Esse trabalho resultou na instituição
do Fórum Nacional de Ouvidores de Polícia, vinculado à Secretaria de
Estado dos Direitos Humanos, do Ministério da Justiça.
A Ouvidoria da Polícia
do Estado de São Paulo era um sonho antigo de entidades de direitos
humanos paulistas. A idéia de sua criação aparece como uma das nove
recomendações feitas ao candidatos ao Executivo paulista pelo Conselho
Estadual de Defesa da Pessoa Humana (Condepe), nas eleições de 1994.
Em um
documento elaborado pela Comissão de Justiça, Segurança e Questão
Carcerária do Condepe, com sugestões para o aperfeiçoamento dos
aparatos da Polícia Civil e Polícia Militar de São Paulo, figurava a
sugestão de criação de um mecanismo de fiscalização da sociedade
civil da atividade policial.
5
Entrevista concedida por Benedito Domingos Mariano, em dezembro de 1999,
à jornalista Bernardete Toneto.
A proposta foi
elaborada fundamentalmente por três membros do Condepe: o padre
Francisco Reardon, da Pastoral Carcerária; Carlos Reis; e Benedito
Domingos Mariano, representante do Centro Santo Dias. O texto foi
endossado pelos outros membros do Condepe, Conselho formado por dez
pessoas, sendo seis representantes de entidades de direitos humanos,
dois representantes da seccional paulista da Ordem dos Advogados do
Brasil, um representante do Legislativo e um do Executivo.
O documento foi
encaminhado aos dois candidatos que disputaram o segundo turno das eleições
estaduais de São Paulo, Francisco Rossi (PL) e Mário Covas (PSDB). O
primeiro candidato respondeu ao Condepe, através de um telegrama,
afirmando já ter seu próprio projeto de segurança pública. Os
coordenadores da campanha de Mário Covas, entre eles o depois secretário
de Governo e Assuntos Estratégicos Antônio Angarita, aceitaram debater
as propostas encaminhadas pelo Conselho.
Eleito governador de São
Paulo, Mário Covas inaugurou sua administração assinando, no primeiro
dia de trabalho, 1º de janeiro de 1995, o decreto nº 39.900, de criação
da Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo. O decreto, de apenas
três pequenos artigos, define a Ouvidoria como “órgão para
fiscalizar atos irregulares cometidos por policiais”.
Entretanto, a
assinatura do decreto não significou a criação imediata da Ouvidoria
de Polícia de São Paulo. Temendo que a iniciativa não saísse do
papel, os membros do Condepe, em reunião com o então secretário de
Segurança Pública, José Affonso da Silva, questionaram a demora da
implementação do organismo. Em reunião de quase quatro horas, ouviram
do secretário uma justificativa incontestável: o governo do Estado não
encontrara, ainda, a pessoa ideal para assumir o novo projeto, ou seja,
uma pessoa vinculada aos grupos de direitos humanos que aceitasse um
trabalho em tempo integral, recebendo por isso um salário exíguo. Além
disso, a principal característica do futuro ouvidor deveria ser a
determinação em criar a primeira Ouvidoria de Polícia do país, em um
Estado cujas polícias marcavam sua ação pela repressão e com longa
folha corrida de torturas e abusos.
Nessa longa reunião, o
secretário José Affonso da Silva insinuou aos membros do Condepe que
indicassem o nome de um possível ouvidor da Polícia, uma pessoa que
estivesse vinculada às lutas dos direitos humanos.
A indicação do nome
de Benedito Domingos Mariano para o cargo foi feita pelo advogado
Antonio Carlos Malheiros, membro da Comissão Justiça e Paz de São
Paulo e atualmente juiz do Tribunal de Alçada de São Paulo. Foi o
advogado Malheiros quem formalizou um documento de adesão ao nome de
Benedito Domingos Mariano, assinado pelos membros da Comissão Justiça
e Paz. Foi também Malheiros quem apresentou o então secretário-executivo
do Centro Santo Dias ao secretário de Segurança Pública.
Apesar da empatia
inicial com as propostas do secretário, Benedito Domingos Mariano
condicionou qualquer decisão a uma consulta prévia às entidades de
direitos humanos do Estado de São Paulo. Na época, aproveitou uma
viagem aos Estados Unidos para visitar instituições policiais e
sistemas penitenciários norte-americanos. Paralelamente a isso,
conversou com várias personalidades da área de direitos humanos e
cidadania, como o professor Paulo Sérgio Pinheiro (do Núcleo de
Estudos da Violência da USP), o jurista Hélio Bicudo (atual presidente
da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos
Estados Americanos), os professores Fábio Konder Comparato e Goffredo
da Silva Telles (da Universidade de São Paulo) e a socióloga Maria
Ignez Bierrenbach (da Comissão Teotônio Vilela).
Essa conversa inicial
com as personalidades de direitos humanos era acompanhada de um convite
para participar de um conselho consultivo da futura Ouvidoria. A intenção
era que o novo organismo fiscalizador da ação policial tivesse
completa autonomia e independência e que suas ações fossem definidas
não apenas pelo titular do cargo, mas por representantes da sociedade
civil.
Ao secretário de
Segurança Pública, essa intenção foi apresentada, como condição sine
qua non, para que Benedito Domingos Mariano aceitasse o cargo. As
outras condições, aceitas de imediato, foram a completa autonomia e
independência de trabalho e que, inicialmente, a Ouvidoria funcionasse
nas dependências do Gabinete do Secretário, para mostrar força política.
Entretanto, a decisão
final só foi tomada depois de uma consulta ao cardeal Paulo Evaristo
Arns, sócio-fundador do Centro Santo Dias de Direitos Humanos. Para
Benedito Domingos Mariano, na época diretor afastado do Centro, no qual
trabalhou durante 14 anos, o aval do “cardeal dos direitos humanos”
era fundamental, pois significava o reconhecimento do trabalho
desenvolvido até então, de defesa de familiares e vítimas da violência
policial.
Apoio
Na consulta, o cardeal
Paulo Evaristo Arns mostrou-se favorável à idéia, apesar da preocupação
com o futuro do Centro Santo Dias, criado em 1980, depois da morte do
operário católico Santo Dias da Silva. Dom Paulo viu na criação da
Ouvidoria da Polícia uma valorização do trabalho em defesa dos
direitos humanos que ele implementara na Arquidiocese de São Paulo e na
cidade nas décadas de 70 e 80.
Para demonstrar seu
apoio à criação da primeira Ouvidoria da Polícia do país e ao seu
primeiro responsável, o cardeal Paulo Evaristo Arns decidiu participar
da cerimônia de posse, realizada, a seu pedido, no Palácio dos
Bandeirantes, sede do governo estadual. Assim, aquela que seria uma
simples solenidade de posse de segundo escalão, prevista para as dependências
da Secretaria de Segurança Pública, tornou-se um ato político cujas
dimensões extrapolaram os muros do Palácio: estavam presentes o
governador Mário Covas, seus secretários, os comandantes das Polícias
Civil e Militar e os responsáveis por autarquias e empresas.
Junto com o governador
Mário Covas, dom Paulo Evaristo Arns foi a figura de destaque da
solenidade de posse do primeiro ouvidor da Polícia. Em seu discurso,
relatou a história da criação do Centro Santo Dias de Direitos
Humanos da Arquidiocese de São Paulo, sua trajetória desde 1980, a
importância da entidade na luta contra a violência policial na cidade
de São Paulo e o esforço despendido até então por ativistas de
direitos humanos, entre eles Benedito Domingos Mariano.
Também na solenidade
de posse, o ouvidor da Polícia do Estado de São Paulo recebeu, ainda
que indiretamente, outra manifestação de apoio irrestrito: em conversa
informal, o governador Mário Covas garantiu-lhe a permanência no cargo
enquanto durasse seu mandato. “De uma certa maneira, ele me deu um
mandato. Garantiu que se eu sofresse pressão, teria respaldo
institucional do governo”, lembra Mariano.
Primeiras
medidas
No dia da
posse, foi anunciada a primeira medida da Ouvidoria da Polícia do
Estado de São Paulo, que se tornaria sua marca registrada: os relatórios
trimestrais de prestação de contas do trabalho, o primeiro deles
divulgado em 29 de fevereiro de 1995, em uma coletiva de imprensa.
A decisão de tornar públicos
os dados do trabalho desenvolvido mostrou-se acertada, pois revelou a
transparência da Ouvidoria da Polícia, que assim presta contas de sua
ação à sociedade e ao governo, sem qualquer tipo de censura prévia a
esse tipo de fiscalização da ação policial, autônoma e independente
do Executivo estadual.
Nos seis primeiros
meses de funcionamento da Ouvidoria, foi elaborado um projeto, a ser
entregue ao governador, transformando o decreto de criação da
Ouvidoria em lei. O projeto foi estruturado pelo Conselho Consultivo, a
partir de elementos coletados no trabalho diário pelo ouvidor de Polícia.
O relator do projeto foi o jurista Goffredo da Silva Telles, conhecido
nacionalmente pela elaboração da Constituinte de 1988. O texto foi
apresentado ao secretário de Segurança Pública, que o guardou por 10
meses.
O projeto de lei de
institucionalização da Ouvidoria de Polícia só entrou em votação
na Assembléia Legislativa depois da divulgação do caso da Favela
Naval, em que policiais militares do ABC paulista foram filmados em atos
de violência contra civis. O episódio, que teve repercussão nacional
e internacional depois da transmissão de imagens pela Rede Globo de
Televisão, terminou com a morte de um civil.
Benedito Domingos
Mariano acredita que a repercussão nacional e internacional do Caso
Favela Naval obrigou o governo a dar uma resposta política imediata. O
episódio colocou a Ouvidoria da Polícia na berlinda, abrindo inclusive
espaço mais amplo em veículos de comunicação. Na época, a Ouvidoria
da Polícia fez questão de divulgar que o caso Favela Naval era seu
procedimento número 501, ou seja, outros quinhentos casos de violência
policial, tão ou mais graves quanto aquele, já tinham sido denunciados
aos órgãos competentes.
Dez dias depois da
divulgação das primeiras imagens de violência policial em Santo André,
foi convocada uma reunião de urgência no Palácio dos Bandeirantes.
Por decisão do governador do Estado, o projeto de lei complementar de
criação da Ouvidoria da Polícia seria encaminhado, o quanto antes,
para votação na Assembléia Legislativa.
Durante quatro horas, a
minuta de justificativa e os detalhes técnicos do projeto elaborado
pelo Conselho Consultivo da Ouvidoria de Polícia foram analisados pelas
secretarias do Planejamento, da Fazenda, de Governo e da Segurança Pública.
Pouco depois do almoço, o governador Mário Covas recebia o texto
definitivo, que determinava a criação de dezesseis cargos próprios.
No dia seguinte, o
projeto foi encaminhado à Assembléia Legislativa, em caráter de urgência
constitucional. Isso estabelecia que, se a Assembléia Legislativa não
aprovasse o projeto no prazo de trinta a quarenta e cinco dias, o
governador sancionaria a lei.
Na
Assembléia, o projeto inicial sofreu quarenta e quatro emendas, das
quais onze foram aproveitadas e aceitas pelo Executivo estadual. O
projeto de lei complementar foi aprovado em sessão extraordinária, sem
votos contrários e apenas três abstenções.
A
lei estipula que o ouvidor de polícia será escolhido, pelo governador
do Estado, a partir de uma lista tríplice apresentada pelo Condepe. O
ouvidor tem mandato de dois anos, com direito a uma recondução ao
cargo. A Ouvidoria de Polícia tem também um corpo próprio de funcionários,
nomeados em caráter de comissão.
Benedito
Domingos Mariano assumiu seu primeiro mandato amparado em lei em junho
de 1997. Em junho de 1999 foi reconduzido ao cargo, no qual fica até
junho de 2001.
Avaliação
Na
avaliação do ouvidor, em quatro anos de trabalho a Ouvidoria obteve
muitas conquistas.
Neste
período, a Ouvidoria se institucionalizou, atendeu mais de trinta mil
pessoas e abriu mais de quinze mil procedimentos internos de
acompanhamento de denúncias. A partir de procedimentos da Ouvidoria,
2.530 policiais civis e militares foram punidos por suas respectivas
corporações, cujos órgãos corregedores reconhecidamente atuam de
forma corporativista.
Mesmo
com todas as dificuldades, é significativo o número de pessoas que
procuraram a Ouvidoria da Polícia desde sua implantação e está
comprovado que a maioria das punições não teria ocorrido se a
Ouvidoria não existisse. Está provado que o denunciante raramente
faria a denúncia à Corregedoria da Polícia Militar ou à Corregedoria
da Polícia Civil, por temer represálias. Em contrapartida, vê a
Ouvidoria de Polícia como órgão independente, que não se mistura às
instâncias policiais, às quais não é subordinado hierarquicamente.
Conquistas
Em quatro anos, a
Ouvidoria da Polícia encaminhou, ao Executivo, quarenta e quatro
recomendações referentes a mudanças estruturais das polícias. Do
total, cinco foram acatadas:
1- Instituição do seguro de vida especial para
policial civil ou militar, morto ou ferido no estrito cumprimento do
dever legal. A proposta, elaborada pelo Condepe, era uma das nove
recomendações ao então candidato Mário Covas que foi colocada em prática.
2- Criação da disciplina permanente sobre
direitos humanos na Academia da Polícia Civil. Para isso, foi feito um
concurso público específico, interdisciplinar, para seleção de
professores para essa disciplina. Pela primeira vez na história da Polícia
Civil, candidataram-se pessoas com curso superior que não o de Direito
e que não eram delegados de polícia. Foram cinquenta inscritos para
dez vagas. Dos aprovados, cinco são civis, dos quais dois membros do
Centro Santo Dias: Benedito Domingos Mariano e Fermino Fecchio.
3- Elaboração do novo regulamento disciplinar
da Polícia Militar. O texto foi apresentado ao ex-secretário de
Segurança Pública José Affonso da Silva e tramita na Assembléia
Legislativa.
O atual regulamento
disciplinar da Polícia Militar, nunca alterado, é de 9 de novembro de
1943, tendo uma característica militar muito forte, dando destaque ao
comportamento do policial dentro do quartel e não no exercício de suas
funções na rua. A nova versão muda radicalmente a concepção
regulamentar, combinando disciplina, hierarquia, auto-estima e defesa
dos valores democráticos. Foram extintas trinta e cinco transgressões
consideradas leves e criadas outras, que desestimulam ações violentas.
A primeira versão do
novo regulamento disciplinar da PM foi apresentado ao governador do
Estado, que o encaminhou ao comando da Polícia Militar, para apreciação.
Tramita na Assembléia Legislativa, desde setembro de 1998, a segunda
versão, que já sofreu cento e onze emendas, das quais pelo menos
trinta que restituem o caráter do texto original.
4- Dar competência estadual à Corregedoria da
Polícia Civil, recomendação feita em maio de 1996, acatada pelo
governo em dezembro de 1999. Mas o decreto de ampliação de competência,
não havia sido publicado até setembro de 2000. Segundo avaliação
da Ouvidoria, o fato de a Corregedoria de Polícia Civil não atuar nas
cidades da Grande São Paulo e nas cidades do interior do Estado (ou
seja, 70% do Estado), e somente na capital, fazia com que o órgão
apurador não tivesse autonomia e independência, impossibilitando-o,
portanto, de apurar as denúncias com rigor, independente do posto ou
cargo que o agente policial tenha.
Em um mapa recente com
denúncias de participação de policiais em crimes de narcotráfico e
roubo de cargas, 70% das denúncias partiram
da Grande São Paulo e interior e 75% dos policiais civis envolvidos
eram dessa região, o que comprovava a maior participação de policiais
civis em delitos graves nos locais onde o órgão corregedor não podia
atuar.
5-
Mudança de silhueta na estante de tiro na academia, proposta
para as duas corporações mas aceita somente pela Polícia Civil.
Normalmente,
as estantes de tiros têm figuras da cintura pra cima, forçando o
policial a acertar as partes letais do corpo: coração e cabeça. A
Ouvidoria propôs uma silhueta de copo inteiro, a partir da qual ganha
mais pontos nas provas de tiro o policial que acerte braços, pernas e
ombros. Trata-se da única estante de tiro com silhueta de corpo inteiro
no Brasil e na América Latina, adotada a partir do conceito de tiro
preventivo desenvolvido pelo coronel da reserva da Polícia Militar José
Sivestre, ex-comandante da Guarda Metropolitana de São Paulo durante a
administração de Luiza Erundina.
Repercussão
Um
dos legados mais importantes da Ouvidoria de Polícia do Estado é o de
a experiência ter se espalhado pelo país. Depois de dezenas de visitas
aos Estados feitas por Benedito Domingos Mariano,foram criadas
Ouvidorias no Pará, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul,
Pernambuco, Cerá e Paraná. Está em processo de criação as
ouvidorias do Espírito Santo, Acre e Mato Grosso do Sul.
A
partir da Ouvidoria paulista, foi incluído no Programa Nacional de
Direitos Humanos o incentivo à criação de Ouvidorias, autônomas e
independentes, para fiscalizar a atividade policial. Em decorrência
disso, em junho de 1999 foi apresentado ao secretário nacional de
Direitos Humanos, José Gregori, a minuta de criação do Fórum
Nacional de Ouvidores de Polícia, vinculado a Secretaria Nacional de
Direitos Humanos, do Ministério da Justiça.
O
documento foi encaminhado ao presidente da República, que um mês
depois, por decreto, criou o Fórum Nacional de Ouvidores da Polícia,
cujo primeiro coordenador executivo é Benedito Domingos Mariano.
Os dois principais
objetivos da instância são:
1- Incentivar a criação de ouvidorias em
outros estados, com autonomia e independência;
2- Criar medidas que visem aperfeiçoar os
sistema policial no Brasil.
Depois de seis meses, o
Fórum Nacional de Ouvidores da Polícia realizou, em novembro de 1999,
em São Paulo, uma Conferência Brasil-Canadá sobre controle externo de
polícia, com a presença de policiais canadenses, atualmente modelo de
eficiência, e com pessoas vinculadas aos direitos humanos, ouvidores,
policiais brasileiros e responsáveis pelos órgãos corregedores da
policia.
A meta do Fórum
Nacional é de, até dezembro de 2000, constituir de 15 a 20 Ouvidorias
de Polícia organizadas no país. Mas não é só quantidade. O Fórum
aprovou, em sua primeira reunião, em agosto de 1999, uma carta de
recomendação ao governo, listando as condições essenciais para a
criação de ouvidorias: que o ouvidor tenha mandato, tenha um corpo próprio
de funcionários, não seja policial civil ou militar, da ativa ou da
reserva, e que não tenha subordinação hierárquica com a policia e
com o governo.
Constituição
O Fórum Nacional de
Ouvidores da Polícia é o organismo responsável por um projeto inédito:
o de emenda constitucional que propõe a criação de um novo modelo de
polícia no Brasil.
O projeto começou a
ser elaborado nos primeiros meses de 1999. Em agosto ficou pronto o
primeiro texto de emenda constitucional, que visa criar um novo modelo
de polícia no Brasil, com a extinção das duas atuais polícias e criação
de uma polícia, única, estadual, estabelecendo um corpo de investigação
e outro uniformizado, preventivo-ostensivo, com previsão de dois anos
para adequação. Assim, acabariam as atuais estruturas anacrônicas,
autoritárias e perversas da ação policial.
Depois do lançamento
oficial, em São Paulo, em 14 de dezembro de 1999, o texto foi entregue
em janeiro aos presidentes do Senado e da Câmara Federal.
O modelo que inspirou o
projeto é a polícia do Canadá, que nos últimos 15 anos democratizou
sua estrutura e que, segundo pesquisas de opinião pública, é a
instituição de maior credibilidade no país, à frente do
primeiro-ministro.
Alguns pontos merecem
destaque no projeto:
1- Fim da dualidade na função policial, com a
extinção das polícias Civil e Militar dos Estados e criação da Polícia
Única Estadual
2- Extinção dos Tribunais e Auditorias
Militares Estaduais, obrigando que todos os policiais, quando julgados,
sejam submetidos à Justiça comum dos Estados.
3- Extinção do inquérito policial.
4- Redução para cinco graus hierárquicos,
contra os atuais doze graus hierárquicos adotados pela Polícia
Militar, que segue o exemplo do Exército nacional.
5- Diferença de no máximo quatro vezes entre o
menor e o maior salário dos policiais. Há lugares no Brasil em que a
diferença é de quinze vezes. Em São Paulo, segundo dados do governo
publicados em 1997 pela então Secretaria da Administração, coronéis
da Polícia Militar ganhavam em média brutos R$ 11.400,00, enquanto os
soldados plenos (70% da corporação) recebiam, em média, R$ 800,00.
6- Controle externo- A emenda propõe que as
Ouvidorias de Polícia também exerçam o controle externo da atividade
policial, através da atribuição de fiscalizar auditar as policias.
7- Os médicos legistas, peritos criminais e
demais carreiras técnico-científicas não farão parte do corpo
policial, passando a integrar a carreira do Judiciário.
8- Estabelece o princípio constitucional de que
a polícia não será responsável por presos condenados ou provisórios.
9- Propõe o máximo de 35 anos para a carreira
policial.
10- O efetivos das polícias estaduais será composto pelos
integrantes da Polícia Civil e Polícia Militar. Será realizada avaliação
de idoneidade e antecedentes criminais.
O coordenador do Fórum
Nacional de Ouvidores de Polícia explica: “O objetivo do projeto é
que a ação policial deve estar baseada na legalidade democrática.
Queremos uma polícia que seja protagonista e garantia do Estado democrático
de direito.”
Os
idealizadores do projeto de emenda constitucional tentam, agora, o apoio
do presidente da República e das lideranças de todos os partidos políticos,
já que a emenda é suprapartidária.
|