Caracterização
dos conselhos em nível nacional, estadual
e municipal
Módulo
II – Conselhos dos Direitos no Brasil
Como já foi mencionado, os conselhos
são novos arranjos institucionais definidos
na legislação ordinária
para concretizar a participação
e controle social preconizados na Constituição
Federal de 88. São organismos que articulam
participação, deliberação
e controle do Estado. Suas características
e atribuições são definidas
na legislação ordinária.
“Os conselhos de direitos, também
denominados conselhos de políticas
públicas ou conselhos gestores de políticas
setoriais, são órgãos
colegiados, permanentes e deliberativos, incumbidos,
de modo geral, da formulação,
supervisão e da avaliação
das políticas públicas, em âmbito
federal, estadual e municipal”.1
O caráter deliberativo está
assegurado no princípio da participação
popular na gestão pública, consagrado
na Constituição de 1988, e são
instituições cujo sentido é
a partilha do poder decisório e a garantia
de controle social das ações
e políticas com fins da garantia de
direitos conquistados. Portanto, conselhos
são espaços deliberativos e
de controle social da coisa pública.
No entanto, nem todas as legislações
ordinárias consideraram este aspecto
ao definirem a criação e as
competências dos conselhos dos direitos.
“Conselhos são instâncias
permanentes, sistemáticas, institucionais,
formais e criadas por lei com competências
claras" (2000, p.24). Além disso,
devem ser órgãos colegiados,
paritários e deliberativos, com autonomia
decisória. Alguns exemplos de legislação
ordinária que dispõe sobre conselhos
de políticas, de segmentos e temáticos
como a Lei Federal no 8.069, de 13 de julho
de 1990, que dispõe sobre o Estatuto
da Criança e do Adolescente, em seu
artigo 88, inciso II, torna obrigatória
a existência de conselhos dos direitos
da criança e do adolescente em todos
os níveis da Federação,
destacando-se o caráter deliberativo
e controlador das ações, assegurada
a participação paritária.
Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990, dispõe
sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente
Art. 88. São
diretrizes da política de atendimento:
II - criação de conselhos municipais,
estaduais e nacional dos direitos da criança
e do adolescente, órgãos deliberativos
e controladores das ações em
todos os níveis, assegurada a participação
popular paritária por meio de organizações
representativas, segundo leis federal, estaduais
e municipais. (ECA, 1997)
A Lei Federal no 8.842 de 4 de janeiro de
1994, que dispõe sobre a política
nacional do idoso, cria o Conselho Nacional
do Idoso e define a criação,
a caracterização e as competências
dos conselhos nacional, estaduais, distrital
e municipais dos direitos do idoso, afirmando
seu caráter permanente, paritário
e deliberativo:
Lei no 8.842 de 4 de janeiro de 1994, dispõe
sobre a Política Nacional do Idoso.
Art. 6o Os
conselhos nacional, estaduais, do Distrito
Federal e municipais do idoso serão
órgãos permanentes, paritários
e deliberativos, compostos por igual número
de representantes dos órgãos
e entidades públicas e de organizações
representativas da sociedade civil ligadas
à área.
Art. 7o Compete
aos conselhos de que trata o artigo anterior
a formulação, coordenação,
supervisão e avaliação
da política nacional do idoso, no âmbito
das respectivas instâncias político-administrativas.
(Lei no 8.842 de 4 de janeiro de 1994).
Apesar da lei que estabelece a criação
dos Conselhos do Idoso ser de 1994, e determinar
o seu caráter deliberativo, apenas
8 anos depois, em 13 de maio de 2002, foi
criado por Decreto Presidencial o Conselho
Nacional dos Direitos do Idoso – CNDI.
E seu caráter foi reduzido a órgão
consultivo:
DECRETO No 4.227, DE 13 DE MAIO DE 2002.
Cria o Conselho Nacional dos Direitos do
Idoso - CNDI, e dá outras providências.
Art. 1o Este
Decreto dispõe sobre a criação,
competência e composição
do Conselho Nacional dos Direitos do Idoso
- CNDI.
Art. 2o Fica
criado, na estrutura básica do Ministério
da Justiça, o Conselho Nacional dos
Direitos do Idoso –(CNDI), órgão
de caráter consultivo.
É inegável o significativo
avanço na criação destas
instituições democráticas
que ampliam a democracia e asseguram a participação
e o controle social. No entanto, em se tratando
de novas institucionalidades democráticas,
ainda são muitos os desafios para a
compreensão e efetivação
destes espaços como instâncias
deliberativas. Ainda são muitos os
conselhos de gestão de políticas
e defesa dos direitos que mantém o
caráter apenas consultivo ou de assessoramento
do executivo, fragilizando desta forma o poder
decisório da participação
da sociedade na relação com
o Estado.
Os conselhos de direitos, independentemente
do nível de atuação –
nacional, estadual ou municipal – são
espaços nos quais o governo e a sociedade
devem discutir, formular e decidir, de forma
compartilhada e co-responsável, as
diretrizes para as políticas públicas
de promoção e defesa dos direitos.
Conselhos não são, portanto,
executores de políticas, são
formuladores, promotores de políticas,
defensores de direitos, controladores das
ações públicas governamentais
e não-governamentais, normatizadores
de parâmetros e definidores de diretrizes
das políticas na perspectiva da garantia
dos direitos humanos, sociais e políticos.
Em seu artigo sobre Democracia Participativa,
Reflexões sobre a natureza e a atuação
dos conselhos representativos da sociedade
civil, Borges2
explicita que os “Conselhos são
órgãos colegiados, que tem,
em nosso direito, regras próprias e
bem definidas de funcionamento e estrutura”.
E destaca que “o funcionamento de um
órgão colegiado obedece, em
nosso ordenamento jurídico, a coordenadas
próprias, muito especiais”. Por
exemplo:
- titularidade de seus membros, igual para
todos;
- decisões tomadas
pela deliberação conjunta de
um grupo de pessoas, mediante votação,
por unanimidade ou por maioria de votos. Tais
decisões passam a constituir, após
a discussão e votação,
a expressão da vontade do órgão,
como um todo ;
- oralidade das votações,
reduzidas a termo em ata ou resolução;
- caráter terminativo
da votação, após a proclamação
de sua apuração;
- responsabilidade do órgão
una, como um todo, após a deliberação
do grupo;
- representação
legal por um presidente, que não vota,
senão em casos de desempate, e que
vai expressar, em resolução,
a vontade do colegiado;
- estabelecimento prévio,
em regimento, de normas sobre quorum de votação:
para a realização da sessão;
para haver deliberação; para
a adoção de certas decisões
relevantes.
Observa a autora que “o voto do membro
do órgão colegiado tem o mesmo
valor que qualquer outro, porque nosso direito
não acolhe, em regra, votos privilegiados:
mas é apenas um voto”,
que deverá ser amplamente fundamentado,
alicerçado em razões objetivas.
Este quadro, segundo a autora, é válido
para qualquer conselho ou outro órgão
colegiado.
Os conselhos de direitos, nos três
níveis de ação, possuem
características comuns diferenciando-se
apenas por algumas particularidades. Mas é
fundamental que todos observem os princípios
da participação e descentralização,
estabelecidos na “Constituição
Cidadã” de 1988, cujos dispositivos
prevêem a participação
da sociedade na gestão e fiscalização
da “coisa pública”.
Características comuns dos
Conselhos dos Direitos e Gestores de Políticas
-
Devem ter poder deliberativo.
O fato de serem reconhecidos e de haver
legislação que lhes dá
poder não basta para que os conselhos
sejam realmente deliberativos. Para ser
reconhecido e valorizado, o conselho precisa
ter legitimidade tanto na definição
de sua composição como na
capacidade de interlocução
entre seus integrantes. Isso, porém,
pode ser um processo longo, que envolve
capacitação técnica
e política, pois os membros do conselho
devem ser capazes de apresentar propostas
e de estabelecer alianças, informando
e mobilizando os setores sociais que representam.
-
Devem levar em consideração
as reivindicações dos diversos
grupos sociais e atuar na implementação
e controle dessas políticas.
-
Devem ser criados por iniciativa
do executivo ou, em caso de omissão
deste, por uma ação civil
pública. A via judicial deve ser
uma alternativa para casos extremos. A negociação
política é sempre desejável
para que o conselho a ser criado nasça
baseado na cooperação e não
no dissenso.
-
Devem ser representativos
de legítimas instituições
atuantes nos segmentos ligados à
área de atuação do
conselho.
-
Devem ser compostos de
forma paritária por representantes
do governo e da sociedade. O estabelecimento
da paridade vai depender da área
temática, dos representantes e também
da história, democrática e
participativa ou não, que levou à
construção do conselho.
-
Devem dispor de fundos para
financiar políticas específicas.
Os recursos para o funcionamento dos conselhos
devem ser assegurados no orçamento
federal, do estado ou do município.
Características que variam
segundo particularidades dos conselhos
-
Número de participantes.
Quanto ao número de membros dos conselhos,
não há um limite estabelecido.
É recomendável que não
seja excessivamente grande para se evitar
a dispersão e problemas na operacionalização
e funcionamento do conselho.
-
Regimento interno. Cada
conselho institui o seu próprio regimento
interno, com as normas de conduta e procedimentos
estabelecidos para o desempenho de suas
funções. O regimento interno,
como todo ato administrativo, não
pode exceder os limites da lei, devendo
contemplar os mecanismos que garantem o
pleno funcionamento do conselho. Sua publicação
deve observar a regra adotada para a publicação
dos demais atos normativos do Executivo.
-
Infra-estrutura de funcionamento.
Será de acordo com as possibilidades
e com o grau de importância dado pelas
instituições participantes
de cada conselho.
Os conselhos nacionais
Os conselhos nacionais devem estar
vinculados administrativamente aos Ministérios
respectivos ao seu interesse temático
e dos direitos. Deliberam sobre questões
no âmbito na política nacional
e suas decisões devem ser parâmetros
tanto para os órgãos nacionais,
quanto para estados e municípios.
No módulo III deste curso trataremos
especificamente das informações
básica dos seguintes conselhos:
Conselho Nacional dos Direitos do Idoso –(CNDI)
Conselho Nacional dos Direitos da Mulher –(CNDM)
Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora
de Deficiência (CONADE)
Conselho Nacional de Promoção
da Igualdade Racial –(CNPIR)
Conselho Nacional de Combate à Discriminação
(CNCD)
Conselho Nacional dos Direitos da Criança
e do Adolescente (CONANDA)
Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa
Humana (CDDPH)
Os conselhos estaduais
A maioria dos conselhos estaduais dos direitos
existentes no País foi criada nos anos
1990, tendo como característica principal
a participação expressiva da
sociedade civil e a independência perante
o Poder Executivo de seus respectivos Estados.
A criação desses conselhos inspirou-se
nos princípios da participação
e descentralização, estabelecidos
na “Constituição Cidadã”
de 1988, em cujos dispositivos estão
previstos a participação da
cidadania (representação da
sociedade) na gestão e fiscalização
da “coisa pública”.3
Criados por lei estadual, estão vinculados
administrativamente às Secretarias
de Estado das respectivas áreas temáticas
ou de direitos e não devem estar sujeitos
a nenhuma subordinação hierárquica.
Deliberam sobre questões no âmbito
na política estadual e suas decisões
devem ser parâmetros tanto para os órgãos
estaduais, quanto para os municípios.
Os conselhos municipais
A criação de um conselho municipal
dos direitos é uma medida voltada para
garantir uma esfera pública com representantes
da comunidade local e dos órgãos
governamentais, para monitorar o impacto das
políticas públicas na proteção
e efetivação dos direitos da
pessoa humana, e, também, para investigar
as violações de direitos no
território municipal.
O conselho deve ser criado por lei municipal
e, para o exercício de suas atribuições,
não pode ficar sujeito a qualquer subordinação
hierárquica. Deliberam sobre questões
no âmbito na política municipal
e suas decisões devem ser parâmetros
para os órgãos municipais e
para a execução das ações
públicas governamentais e não
governamentais.
A composição dos conselhos
Deve seguir o princípio da paridade
e a indicação de seus membros
deve refletir o dispositivo constitucional
da participação indireta da
população, por meio de segmentos
e de organizações representativas
ligadas à área de atuação
de cada conselho. Assim, cabe ao governo escolher
os representantes do Executivo e a sociedade
civil deve escolher seus representantes em
fóruns representativos do segmento
respectivo. A escolha dos representantes da
sociedade civil normalmente ocorre entre os
organismos ou entidades sociais, ou dos movimentos
comunitários, organizados como pessoas
jurídicas, com atuação
expressiva na defesa dos direitos e de políticas
específicas.
O período do mandato dos conselheiros
é normalmente de dois anos, podendo
coincidir, ou não, com a vigência
do mandato do governo. Estas e outras definições
de características e funcionamento
estão definidas nas respectivas Leis
de criação dos conselhos e em
seus Regimentos Internos.
Notas
1 Definição
extraída do artigo “Conselhos
de Direitos e Formulação de
Políticas Públicas”, de
Patrícia Helena Massa Arzabe, Doutoranda
na Faculdade de Direito da USP e Procuradora
do Estada de São Paulo. Disponível
no site: http://www.dhnet.org.br/direitos/textos/politicapublica/patriciamassa.htm
2 BORGES,
Alice Maria Gonzalez. Democracia participativa.
Reflexões sobre a natureza e a atuação
dos conselhos representativos da sociedade
civil. Jus Navigandi, Teresina, a. 10, n.
917, 6 jan. 2006. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7752
3
LYRA, Rubens Pinto Lyra, Formato e papel dos conselhos
e ouvidorias nas áreas de segurança
e de justiça, trabalho apresentado no 4o.
Encontro Nacional da ABCP – Associação
Brasileira de Ciência Política, área
Estado e Políticas Públicas, painel
Relações Estado e sociedade na produção
de políticas públicas, 21- 24 julho
2004 – PUC – Rio de Janeiro
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