INTRODUÇÃO
Discriminação é tema sempre atual na
sociedade. A democracia racial brasileira, tão
propalada, é mera ficção. Antes, porém, de nos
deixarmos desencorajar, faz-se necessária a nossa
contribuição a fim de elucidar certas áreas de
estudo sobre as quais vêm se debruçando inúmeros
estudiosos.
No
sentido de enfrentarmos também esse tema e
contribuir para a difusão dos estudos sobre o
assunto, apresentamos o
seguinte trabalho, com o objetivo de tratar
do conceito, prova e evidência
da discriminação, dos instrumentos
internacionais que versam sobre o assunto, bem como
algumas considerações sobre a Constituição
brasileira e uma crítica geral acerca das leis
federais, estaduais e municipais sobre o tema.
Ressaltamos que, dada a vasta amplitude que comporta
a discriminação em seu sentido lato (geral) ,
nossa abordagem limita-se à discriminação racial,
embora, a título de elucidação de certas
passagens, possamos fazer referência à discriminação
amplamente considerada (em razão de sexo, idade,
opinião política, etc.)
No
item sobre instrumentos internacionais, vale
ressaltar o comentário sobre a inexistência de órgão
de conciliação civil ou comissão constituída com
esse fim a nível nacional (em Legislação Nacional
Modelo para a Orientação dos Governos na promulgação
de Legislação mais detalhada contra a Discriminação
Racial).
Finalizando,
traçaremos algumas observações sobre o racismo
institucional, numa análise da influência do
racismo em nossa sociedade.
1.
Conceito de discriminação racial
A
Convenção Internacional sobre a Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação Racial
aparece no contexto do processo de “multiplicação
de direitos”
à luz da International Bill of Rights (conjunto da
Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948
e dos dois Pactos de 1966 - Pacto Internacional dos
Direitos Civis e Políticos
e Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais). Adotada em 1965 pela Assembléia
Geral das Nações Unidas, foi , portanto, um dos
primeiros instrumentos de proteção dos direitos
humanos com força vinculante, integrando, ainda, o
sistema especial de proteção, em que se delineia
um sujeito de direito específico e concreto.
Como
conceito de discriminação racial, a referida
Convenção, em seu artigo 1º, estabelece o
seguinte:
Art.
1º - “Para os fins da presente Convenção, a
expressão "discriminação racial”
significará toda distinção, exclusão, restrição
ou preferência baseada em raça, cor, descendência
ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto
ou resultado anular ou restringir o reconhecimento,
gozo ou exercício em um mesmo plano (em igualdade
de condição) de direitos humanos e liberdades
fundamentais nos campos político, econômico,
social, cultural ou em qualquer outro campo da vida
pública".
Devemos,
após a citação do conceito, enumerarmos alguns
elementos caracterizadores da discriminação racial
. Esta consiste numa ação
de distinção, exclusão, restrição ou
preferência, com fundamentação
em raça, cor ou etnia, e que tem por objetivo
ou
resultado anular ou restringir o
reconhecimento, gozo ou exercício de direitos.
Portanto,
vê-se que fatores externos, como raça, cor ou
etnia servem como elementos de “classificação”
ou “desclassificação” de pessoas,
estabelecendo graus de superioridade ou
inferioridade entre elas, em razão das características
externas acima mencionadas.
Entretanto,
há que se ressaltar que "nem toda diferenciação
significa discriminação" .
A diferenciação ocorre quando fatores
objetivamente postos procuram justificar objetiva e
razoavelmente a diferenciação e os meios
empregados para tal devem ser proporcionais aos
objetivos legítimos visados. Essa diferenciação
baseia-se na diversidade de características físicas
e psicológicas entre as pessoas e na subseqüente
constatação de que um tratamento igual a grupos
distintos é uma forma de discriminação.
1.1.
Preconceito e discriminação
Torna-se
ainda necessário distinguir discriminação de
preconceito . A discriminação, como já visto,
exige concreticidade em termos de restrições ou
preferências não objetivamente justificadas. O
preconceito é um julgamento que se baseia em experiências
e decisões prévias, embora nem todo prejulgamento
seja um preconceito. Prejulgamentos tronam-se
preconceitos apenas quando não sujeitos a modificações
à luz de uma nova experiência. Uma das
principais características do preconceito é a
rigidez mental que o preconceituoso mantém e que o
leva a interpretar a nova informação de acordo com
seus conceitos estereotipados.
Como
o preconceito, por sua própria natureza, é cego
para as verdadeiras qualidades e méritos
individuais, é muitas vezes dirigido contra certo
grupo de pessoas que compartilham cultura e padrões
de comportamento comuns, o que claramente deixa
pouco espaço para flexibilidade na formação de
opinião sobre as pessoas tomadas individualmente. Há,
portanto, dois fatores essenciais para a inicial
formação e posterior manutenção e até reforço
do preconceito - a ignorância e a existência e
divulgação de estereótipos de certos grupos de
pessoas conforme conveniência dos principais
formadores de opinião pública, notadamente a mídia
e o sistema educacional.
O
papel da educação, por exemplo, firma-se no
sentido de aumentar o nível de conhecimento e
desenvolver a habilidade para formular pontos de
vista e atitudes, julgando situações com base no
conhecimento adquirido. A educação deve buscar
desfazer mal entendidos, sem, no entanto, envolver a
criança em um determinado jeito de pensar tido como
o único certo e adequado, evitando assim uma forma
educacional estereotipada.
1.2.
Medidas positivas - Ação Afirmativa
O tratamento diferenciado entre as pessoas
baseado em suas particularidades recebe a denominação
de ação afirmativa ou discriminação positiva,
consistindo na adoção de medidas especiais a
determinados grupos no sentido de promover sua
equiparação ao restante da sociedade em termos de
pleno exercício de direitos. Como se vê, essa é
uma questão referente `a igualdade de fato,
diferente da igualdade na lei, que veda qualquer
forma de discriminação, seja em razão de cor, raça,
idade, sexo, origem, religião, riqueza ou qualquer
outra espécie.
A
Convenção Internacional sobre Todas as Formas de
Discriminação Racial aponta para a possibilidade
de diferenciação racial, a saber :
Artigo
1º - 4. "Não serão consideradas discriminação
racial as medidas especiais tomadas com o único
objetivo de assegurar o progresso adequado de certos
grupos raciais ou étnicos ou de indivíduos que
necessitem da proteção que possa ser necessária
para proporcionar a tais grupos ou indivíduos igual
gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades
fundamentais, contanto que tais medidas não
conduzam, em conseqüência, à manutenção de
direitos separados para diferentes grupos raciais e
não prossigam após terem sido alcançados seus
objetivos".
Artigo
2º - 1 . e) "Cada Estado-parte compromete-se a
favorecer, quando for o caso, as organizações e
movimentos multirraciais, bem como outros meios próprios
para eliminar as barreiras entre as raças e a
desencorajar o que tenda a fortalecer a divisão
racial".
Abordagem
semelhante reaparece no artigo 2º, item 2.
"Os
Estados-partes tomarão, se as circunstâncias o
exigirem, nos campos social, econômico, cultural e
outros, medidas especiais e concretas para
assegurar, como convier, o desenvolvimento ou a
proteção de certos grupos raciais ou de indivíduos
pertencentes a esses grupos, com o objetivo de
garantir-lhes, em condições de igualdade, o pleno
exercício dos direitos humanos e das liberdades
fundamentais. Essas medidas não deverão, em caso
algum, ter a finalidade de manter direitos desiguais
ou distintos para os diversos grupos raciais, depois
de alcançados os objetivos, em razão dos quais
foram tomadas".
2.Prova
e evidência da discriminação
A problemática da verificação e demonstração
de ocorrência de discriminação é uma das que
mais têm exigido atenção dos estudiosos.
Analisando essa questão, os professores Bob Hepple
e Erika M. Szyszczak chegam às conclusões abaixo
sintetizadas e adaptadas (com base no texto “Proof
and Evidence of Discrimination”).
2.1.Prova
da discriminação
A
prova da discriminação tem três elementos:
primeiro, devemos saber o que caracteriza a
discriminação, no contexto legal. Para isso,
devemos confiar nas definições dos tratados sobre
o assunto,
suplementadas por interpretação judicial. Segundo,
devemos estabelecer o que deve ser provado para
estabelecer se a discriminação, assim como
definida, ocorreu ou não. Terceiro, há a
necessidade de se obter a evidência necessária de
sua ocorrência.
Devemos
considerar a prova separadamente para a discriminação
direta e a indireta.
2.1.1.Prova
da discriminação direta
Na
discriminação direta, duas coisas devem ser
provadas: que a vítima foi tratada "menos
favoravelmente" que outra pessoa e que tal
tratamento ocorreu por motivos raciais (cor, raça,
nacionalidade, origens nacionais ou étnicas).
Para
isso, tornam-se necessários parâmetros para
identificação dos grupos cujos membros permanecem
unidos por alguns dos laços acima referidos. Esses
parâmetros são:
1.
uma longa história compartilhada, pela qual o grupo
é consciente de sua distinção em relação a
outros grupos e a existência de memória em comum.
2.
Tradição cultural própria, incluindo costumes
familiares e sociais, muitas vezes, mas não
necessariamente, associados à observância
religiosa.
Outras
condições, embora aparentemente não essenciais,
devem ser consideradas relevantes:
3.
origem geográfica comum, ou descendência de
ancestrais comuns
4.
Uma língua comum, não necessariamente peculiar ao
grupo
5.
Uma literatura comum peculiar ao grupo
6.
Uma religião comum diferente da dos grupos vizinhos
ou da comunidade em geral ao redor
7.
Ser uma minoria ou um grupo oprimido dentro de uma
comunidade maior
A
intenção tem importância relevante para a
caracterização da discriminação direta. Trata-se
de estabelecer uma ligação causal entre a raça
(por exemplo) da vítima e o ato discriminatório.
O
ônus da prova recai normalmente sobre o requerente
(parte ofendida), como de costume nos procedimentos
cíveis, mas tem sido reconhecido que num caso de
discriminação, o ônus da prova recai sobre a
pessoa acusada.
Está
agora bem estabelecido que uma vez o reclamante
tenha apresentado evidência de ter recebido
tratamento menos favorável em função de raça, o
ônus recai sobre a pessoa acusada no sentido de
apresentar evidência em contrário: de que não
houve tratamento menos favorável ou de que tal
tratamento não se deu por causa racial.
A
posição atual tem sido no sentido de que se há a
caracterização de tratamento diferenciado em função
de raça, havendo ainda uma explicação inadequada
ou insatisfatória para o ato , usualmente a dedução
legítima será a de que ocorreu discriminação por
motivos raciais. Isso, entretanto, não é
suficiente. Significa que a pessoa acusada ainda será
capaz de evitar a caracterização de discriminação,
sem estar submetida a uma obrigação absoluta de
provar que a explicação dada foi a verdadeira.
2.1.2.Prova
da discriminação indireta
Na
discriminação indireta, o reclamante deve provar o
seguinte: que ele ou ela foi sujeito a uma exigência
ou condição; que a exigência ou condição foi
aplicada igualmente para pessoas de diferentes
grupos raciais; que a proporção de pessoas de um
mesmo grupo que podem cumprir a exigência ou condição
é consideravelmente menor que a proporção de
outro grupo racial e que o reclamante sofreu um
detrimento. Tendo o exposto acima sido provado, a
pessoa acusada pode evadir-se (escapar) da
responsabilidade, provando ser o requerimento ou
exigência justificável independentemente de
motivos raciais.
Quanto
à essência ou condição sendo aplicada
igualmente, é da essência da discriminação
indireta que o tratamento dado ou oferecido para a vítima
deva ser aparentemente não menos favorável que o
dado ou oferecido a membros de outros grupos
raciais. Mas a distinção entre discriminação
direta e indireta pode não ser tão evidente quanto
previamente suposto.
As
Cortes Européias têm aceito que provas estatísticas
não precisem ser
apresentadas em casos ordinários em que a
experiência comum torna evidente que uma proporção
considerável de membros de um particular grupo são
adversamente afetados por uma certa prática, embora
em alguns casos a prova possa ser exigida.
O
teste da justificativa foi por um longo período
interpretado em favor da pessoa acusada, que ficava
permitida a evadir-se da responsabilidade mostrando
que uma exigência ou condição era subjetivamente
razoável de acordo com a perspectiva da própria
pessoa acusada. No caso europeu, sob pressão da
Corte Européia de Justiça, a obrigação da pessoa
acusada de justificar exigências ou condições que
têm um impacto racialmente discriminatório tem se
tornado mais forte. Uma decisão da Corte Européia
de Justiça assegurou que tais exigências ou condições
poderiam apenas ser justificadas por medidas que
correspondessem a uma verdadeira necessidade em função
das particularidades de certo trabalho, fossem
apropriadas no sentido de atingir os objetivos
almejados e necessárias para esse fim.
2.2.Evidência
da discriminação
O
fato de que na maior parte das vezes a informação
necessária para provar a ocorrência de discriminação
está nas mãos do discriminador levou as Cortes
a criar meios de tornar a informação disponível.
Um deles é um questionário a ser submetido por
alguém que suspeite de discriminação ao possível
discriminador, na tentativa de recolher relevantes
informações, não havendo, entretanto, obrigação
jurídica no preenchimento do questionário acima
referido.
De
forma mais significativa, as Cortes têm apoiado a
necessidade de obtenção de documentos e informações
em posse da pessoa acusada todas as vezes que a
revelação for necessária para uma clara designação
de procedimentos, o que inclui documentos
confidenciais e até evidências estatísticas que
comprovem a discriminação (como favorecimento de
membros de um grupo em detrimento de outros).
O
reconhecimento de que a discriminação contra um
reclamante individual pode ser induzida de evidência
estatística e de que o reclamante deve ter o
direito de acesso a tal evidência representa grande
desenvolvimento, podendo formar as bases para
procedimentos que restrinjam tanto a discriminação
direta quanto a indireta. Mas é ainda importante
observar que a pessoa acusada de discriminação não
pode ser forçada a fornecer informações que de
fato não possui.
3.Instrumentos
Internacionais
Trataremos
agora, de forma sucinta
e por ordem cronológica, de alguns
instrumentos internacionais que fazem referência à
não-discriminação .
3.1.Carta
das Nações Unidas ( 1945 )
A
Carta das Nações Unidas foi adotada e aberta à
assinatura pela Conferência de São Francisco em
26.06.1945 e ratificada pelo Brasil em 21 de
setembro do mesmo ano.
Representou
o reflexo das organizações internacionais visando
à cooperação internacional no sentido de manutenção
da paz mundial e de proteção dos direitos humanos,
dadas as atrocidades vivenciadas em virtude da
tirania nazista durante a Segunda Grande Guerra.
Funciona, portanto, como instrumento de
internacionalização dos direitos humanos e
liberdades fundamentais e seu reconhecimento para
todos, independentemente de raça, língua, sexo ou
religião.
Tais
objetivos aparecem de forma clara no seguinte trecho
abaixo transcrito :
Artigo
1º -"Os propósitos das Nações Unidas são:
"Conseguir
uma cooperação internacional para resolver os
problemas internacionais de caráter econômico,
social, cultural ou humanitário, e para promover e
estimular o respeito aos direitos humanos e
liberdades fundamentais para todos, sem distinção
de raça, sexo, língua ou religião".
3.2.
Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948)
Adotada
e proclamada pela Resolução 217 A (III) da Assembléia
Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948
e assinada pelo Brasil na mesma data, a Declaração
Universal dos Direitos Humanos funciona como a
"interpretação autorizada da expressão
"direitos humanos", constante da Carta das
Nações Unidas", conforme Flávia Piovesan.
À
parte a discussão sobre sua força jurídica
vinculante, a Declaração tem papel decisivo no
reconhecimento universal dos direitos humanos e na
proteção desses direitos, exercendo influência
nas ordens jurídicas nacionais, por incorporação
nestas de vários de seus princípios, e na formulação
de demais tratados referentes aos direitos da pessoa
humana.
Seguem
passagens que comprovam a tutela dos direitos à
igualdade e à não-discriminação no instrumento
tratado:
Artigo
II – 1. “Toda pessoa tem capacidade para gozar
os direitos e as liberdades estabelecidos nesta
Declaração, sem distinção de qualquer espécie,
seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião
política ou de outra natureza, origem nacional ou
racial, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição
.
Artigo
VII – “Todos são iguais perante a lei e têm
direitos, sem qualquer distinção, a igual proteção
da lei. Todos têm direitos a igual proteção
contra qualquer discriminação que viole a presente
Declaração e contra qualquer incitamento a tal
discriminação”.
Artigo
XXIII – 2. “Toda pessoa, sem qualquer distinção,
tem direito a igual remuneração por igual
trabalho”
3.3.
Convenção Internacional sobre a Eliminação de
todas as formas de Discriminação Racial (1965)
Adotada
pela Resolução 2106-A (XX) da Assembléia Geral
das Nações Unidas em 21.12.1965 e ratificada pelo
Brasil em 27.03.1968, a Convenção Internacional
sobre a Eliminação de todas as Formas de
Discriminação Racial faz parte do chamado sistema
especial de proteção, que toma o sujeito de
direito de forma concreta, nas particularidades
inerentes a grupos de pessoas especialmente vulneráveis,
de modo a prevenir a discriminação.
A
definição de discriminação racial trazida pela
Convenção em seu artigo 1º é de fundamental
importância para a caracterização do ato
discriminatório .
A
Convenção ainda admite, em vários trechos, a
possibilidade de discriminação positiva (ação
afirmativa), com o incentivo a medidas diferenciais
para com os grupos menos favorecidos no sentido de
proporcionar uma igualdade na prática de direitos.
A
Dr.ª Flávia Piovesan elenca importantes direitos
consagrados pela Convenção, entre eles: “o
direito à igualdade perante a lei, sem qualquer
distinção de raça, cor, origem, nacionalidade ou
etnia; o direito a tratamento equânime perante os
Tribunais e perante todos os órgãos
administradores da justiça; o direito à segurança
e proteção contra a violência; o direito de
votar; o direito ao acesso a todo lugar ou serviço
de natureza pública, proibida qualquer discriminação,
além do exercício de outros direitos civis, políticos,
sociais, econômicos e culturais, que deve ser
garantido sem qualquer discriminação".
A
Convenção Internacional sobre a Eliminação de
todas as Formas de Discriminação Racial
estabeleceu o Comitê sobre a Eliminação da
Discriminação Racial, com a função de examinar
as petições individuais, os relatórios
encaminhados pelos Estados-partes e as comunicações
interestatais.
As
petições individuais, vale salientar, só são
aceitas pelo Comitê mediante declaração
do Estado-parte envolvido, no sentido de
habilitar o Comitê a examiná-las, já que o
direito de petição é previsto de forma
facultativa. Além disso, o sistema de petições
individuais exige o esgotamento anterior dos
recursos internos, salvo por questões de ineficiência
e demora injustificada dos remédios aplicados.
Mesmo
destituída de força jurídica vinculante, a decisão
do Comitê é publicada no relatório anual deste,
enviado posteriormente à Assembléia Geral das Nações
Unidas, o que, de certa forma, constitui pressão
aos Estados-partes envolvidos.
3.4.
Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos
(1966)
O
Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos
foi adotado pela Resolução 2200-A (XXI) da Assembléia
Geral das Nações Unidas em 16.12.1966 e ratificado
pelo Brasil apenas em 24.01.1992.
Teve
o objetivo de tornar juridicamente vinculantes os
direitos civis e políticos elencados na Declaração
Universal dos Direitos Humanos, embora acrescente
novos direitos e garantias, como o direito à
autodeterminação dos povos (artigo 1º ), a proibição
de propaganda de guerra ou incitamento à intolerância
étnica ou racial (artigo 20), a proteção dos
direitos de minorias à identidade cultural,
religiosa e lingüística ( artigo 27), entre
outros.
Com
referência à não-discriminação, vale ressaltar
:
Artigo
3º - "Os Estados-partes no presente Pacto
comprometem-se a assegurar a homens e mulheres
igualdade no gozo de todos os direitos civis e políticos
enunciados no presente Pacto"; no sentido claro
de promover equiparação não apenas formal de
direitos entre ambos os sexos, mas, sobretudo,
equiparação material, em relação ao gozo efetivo
dos direitos elencados no Pacto.
Artigo
4º - 1. "Quando situações excepcionais
ameacem a existência da nação e sejam proclamadas
oficialmente, os Estados-partes no presente Pacto
podem adotar, na estrita medida em que a situação
o exigir, medidas que derroguem as obrigações
decorrentes do Pacto, desde que tais medidas (...) não
acarretem discriminação alguma apenas por motivo
de raça, cor, sexo, língua, religião ou origem
social." No artigo 4º, portanto, salienta-se a
preocupação com a não-discriminação, mesmo em
situações de ameaça à integridade do
Estado-parte.
Os artigos 20 (item 2) e 24 (item 1) tratam,
respectivamente, da proibição de incitamento à
discriminação (por apologia ao ódio nacional,
racial ou religioso) e dos direitos pertinentes às
crianças de acordo com sua condição peculiar na
sociedade, como verificamos a seguir:
Artigo
20- 2. "Será proibida por lei qualquer
apologia ao ódio nacional, racial ou religioso, que
constitua incitamento à discriminação, à hostilidade ou à violência"
Artigo
24 - 1. "Toda criança terá direito, sem
discriminação alguma por motivo de cor, sexo, língua,
religião, origem nacional ou social, situação
econômica ou nascimento, às medidas de proteção
que a sua condição de menor requer por parte de
sua família, da sociedade e do Estado".
Por fim, o artigo 26 reforça a idéia da
igualdade perante a lei e a proibição a qualquer
forma de discriminação, no que é completado pelo
artigo 27, que trata especificamente dos direitos
das minorias étnicas, religiosas e lingüísticas
às suas diferentes formas de expressão.
Artigo
26 - "Todas as pessoas são iguais perante a
lei e têm direito, sem discriminação alguma, a
igual proteção da lei. A este respeito, a lei
deverá proibir qualquer forma de discriminação e
garantir a todas as pessoas proteção igual e
eficaz contra qualquer discriminação por motivo de
raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política
ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou
social, situação econômica, nascimento ou
qualquer outra situação".
Artigo
27 - "Nos Estados em que haja minorias étnicas,
religiosas ou lingüísticas, as pessoas
pertencentes a essas minorias não poderão ser
privadas do direito de ter , conjuntamente com
outros membros de seu grupo, sua própria vida
cultural, de professar e praticar sua própria
religião e usar sua própria língua".
3.5.
Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais (1966)
Adotado
pela Resolução 2200-A (XXI) da Assembléia Geral
das Nações Unidas em 16.12. 1966 e ratificado pelo
Brasil em 24.01.1992, o Pacto Internacional dos
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais,
juntamente com a Declaração Universal de 1948 e o
Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos,
integra a International Bill of Rights (Carta
Internacional dos Direitos Humanos) e fez parte do
processo de “juridicização “ da Declaração
(no sentido de tornar juridicamente vinculantes seus
dispositivos), no que diz respeito aos direitos econômicos,
sociais e culturais .
Os
Estados-partes, ao ratificarem o Pacto, dada a
natureza programática dos direitos nele tutelados,
comprometem-se a adotar medidas “até o máximo de
seus recursos disponíveis” no sentido de
assegurar, de forma progressiva, o pleno gozo dos
direitos elencados. Entretanto, não se deve
confundir o caráter programático dos direitos
previstos no Pacto com sua não acionabilidade.
Sobre essa questão, Flávia Piovesan
afirma que “a idéia da não acionabilidade dos
direitos econômicos, sociais e culturais é
meramente ideológica e não científica”, devendo
haver o reforço da proteção judicial dos direitos
fundamentais da pessoa humana, independentemente de
sua natureza, de forma a garantir, efetivamente, sua
acionabilidade.
De
importância para o nosso estudo é o artigo 2º,
item 2, que afirma a garantia de direitos sem
discriminação:
Artigo
2º - 2. “Os Estados-partes no presente Pacto
comprometem-se a garantir que os direitos nele
enunciados se exercerão sem discriminação alguma
por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião,
opinião política ou de qualquer outra natureza,
origem nacional ou social, situação econômica,
nascimento ou qualquer outra situação”.
3.6.
Legislação Nacional Modelo para a Orientação dos
Governos na Promulgação de Legislação mais
detalhada contra a Discriminação Racial ( Model
National Legislation for the Guidance of Governments
in the Enactment of Further Legislation Against
Racial Discrimination )
Levando
a efeito o Programa de Ação para combater a
Discriminação Racial, o Secretário-Geral da ONU
submeteu à Assembléia
Geral, em sua trigésima nona sessão, um Plano de
Atividades para a Segunda Década, no sentido de
"preparar uma legislação modelo, que poderia
ser usada pelos Estados como uma base ou como
orientação para a promulgação ou desenvolvimento
mais aprofundado da legislação contra a discriminação
racial".
Pela
Resolução 39/16 de 23 de novembro de 1984, a
Assembléia Geral convidou o Secretário Geral a
iniciar imediatamente a implementação das
atividades previstas no Plano de Atividades. No ano
seguinte, com a Resolução 40 / 22 de 29 de
novembro de 1985, a Assembléia Geral pediu ao
Secretário Geral que preparasse e emitisse assim
que possível uma coletânea de legislação modelo
para a orientação dos governos na promulgação de
legislação mais detalhada contra a discriminação
racial. Esse documento foi revisado a partir da
resolução 47/77de 16 de dezembro de 1992, à luz
dos comentários feitos pelos membros do Comitê
sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial nas sessões quadragésima e
quadragésima primeira.
O
objetivo do documento referido é proibir e
restringir totalmente a discriminação racial
praticada por qualquer pessoa, grupo de pessoas,
autoridades públicas, instituições locais e
nacionais públicas e privadas e organizações nas
esferas civil, política econômica, social,
cultural, no que diz respeito a emprego, educação,
habitação e provisão de mercadorias, facilidades
e serviços. Constitui-se de três partes, tratando
respectivamente das definições (de discriminação
racial e discriminação positiva); princípios
gerais e medidas que a lei deve abranger e, por fim,
infrações e penalidades referentes à discriminação
racial.
Trataremos
especialmente da determinação, na Parte II, item
D, da Constituição de autoridade nacional
independente contra a discriminação racial, ou
seja, uma comissão ou órgão de conciliação
civil, que teria jurisdição sobre todo o país e
seria representado a nível nacional e local de
acordo com a organização administrativa do Estado
considerado. Esse órgão, que deveria contar com
conhecimento especializado e experiência nas mais
variadas áreas de atividade, ainda inexiste no
Brasil. Nosso país conta com Conselhos, a exemplo
do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos
(CEDDH), mas de esfera de atividade abrangente, o
que freqüentemente dificulta sua atuação. O que o
referido documento requer é um órgão de conciliação
ou comissão específica contra a discriminação
racial, de caráter nacional e independente,
contando com especialistas de moral incontestável e
conhecida imparcialidade, que seriam apontados de
forma a assegurar igualitária representação
racial e geográfica na composição da comissão.
Entre as funções desse órgão, estariam:
fornecer opiniões para instituições privadas e públicas
ou assisti-las de qualquer outra forma na implementação
do Ato ou em relação a qualquer outra medida para
a eliminação da discriminação racial; preparar
ou ajudar na preparação de códigos de conduta em
relação à implementação do Ato em certas áreas
de atividade; propor ao corpo legislativo competente
quaisquer outras medidas que devem ser necessárias
para combater a discriminação racial; providenciar
informações e educação no sentido de promover e
encorajar boas relações entre diferentes grupos
raciais; relatar anualmente suas atividades; receber
reclamações de supostas vítimas e providenciar
ajuda legal e assistência para as vítimas que
tenham entrado na Justiça baseadas nas disposições
do Ato.
4.
Análise da legislação brasileira sobre o assunto
A
permanência e contínua reprodução das práticas
discriminatórias é marcante em nossa sociedade.
Essa constatação, apesar das freqüentes declarações
de igualdade, torna-se bem visível no Décimo Relatório
Periódico Relativo à Convenção Internacional
sobre a Eliminação de todas as Formas de
Discriminação Racial, que reconhece a incidência
da discriminação "nas relações
intersubjetivas, no mercado de trabalho, nas taxas
de emprego e desemprego, no sistema educacional, nas
taxas de analfabetismo, nos índices de mortalidade
infantil e expectativa de vida, no exercício dos
direitos culturais, na atuação dos aparelhos
policiais e nas decisões do Judiciário", como
salienta Hédio Silva Jr.
É
importante salientar que o princípio da igualdade
abrange três significados: proibição ao
legislador de editar regras que estabeleçam privilégios;
proibição ao juiz de interpretar a lei de forma a
criar privilégios e proibição de discriminação
no gozo de direitos .
À
luz da Constituição de 1988 foi instituída punição
mais severa à prática do racismo e da discriminação,
com o reconhecimento de uma série de preceitos
baseados na pluralidade racial brasileira e que
acabou por redesenhar as noções de nacionalidade e
processo civilizatório, "assegurando às
comunidades remanescentes de quilombos a propriedade
de suas terras e reiterando o direito à igualdade
racial no trabalho, no sistema escolar e no exercício
dos direitos culturais".
Exemplos
das determinações constitucionais sobre o assunto,
encontramos nos seguintes artigos e respectivos
incisos:
Artigo
3º - "Constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil:
IV.
promover o bem de todos, sem preconceito de origem,
raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação"
Artigo
5º - "Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos
termos seguintes:
XLI
- a lei punirá qualquer discriminação atentatória
dos direitos e liberdades fundamentais;
XLII
- a prática do racismo constitui crime inafiançável
e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos
termos da lei"
Artigo
7º - "São direitos dos trabalhadores urbanos
e rurais, além de outros que visem à melhoria de
sua condição social:
XXX
- proibição de diferença de salários, de exercício
de funções e de critério de admissão por motivo
de sexo, idade, cor ou estado civil;
XXI
- proibição de qualquer discriminação no tocante
a salário e critérios de admissão do trabalhador
portador de deficiência".
O
resultado concreto é que a Constituição atual
impulsionou uma tendência nacional para a edição
de normas programáticas e de conduta para o combate
ao racismo também nas esferas estadual e municipal
.
Assim,
fazendo uma observação do ordenamento jurídico
como um todo, sem nos determos nas normas
isoladamente, veremos que as regras de direito
municipal e estadual
assumem novos delineamentos em relação a
conteúdo e finalidade: caso da ênfase às sanções
positivas em detrimento das negativas, típicas do século
XIX .
Há
o aparecimento dos controles persuasivo (ênfase no
condicionamento da ação desejada) e premonitivo (ênfase
no processo de evitar que conflitos possam sequer
ocorrer), que passam a disputar lugar com o controle
meramente coativo (ênfase na repressão de
condutas) .
As
técnicas da persuasão suplantam cada vez mais as técnicas
da força, o que é grande avanço, já que passadas
quase cinco décadas da consideração da discriminação
como infração penal, permanecem a impunidade e a
ilusão de ataque apenas ao resultado (discriminação)
sem observância das raízes do problema
(preconceito, estereótipo, intolerância e
racismo).
Na
análise de Hédio Silva Jr., "as normas
estaduais e municipais (...) sinalizam novas e mais
promissoras possibilidades de um enfrentamento
eficaz do problema, senão vejamos: 1. Porque não
se limitam a fixar princípios de não-discriminação
ou estabelecer sanções negativas; 2. Porque
estabelecem medidas positivas para a promoção da
igualdade, o que implica papel ativo, uma obrigação
positiva para o Estado e não apenas uma abstenção
(não-discriminar) ; 3. Porque introduzem princípios
e regras que ao menos teoricamente autorizam a adoção
de medidas destinadas a compensar as desigualdades;
4. Porque lançam mão de métodos persuasivos
preocupados em evitar que a discriminação aconteça,
e preocupados também com a educação para a tolerância;
5. Porque ao adotar métodos persuasivos, sinalizam
preocupação com causas e não apenas com
resultados; 6. Porque, ao estabelecer normas programáticas,
asseguram ao discriminado o direito de demandar
judicialmente o Estado no sentido de fazer valer o
direito tutelado".
Assim,
o que se percebe é uma preocupação cada vez maior
com a educação para melhoria de comportamento, no
sentido de incentivar a igualdade e evitar a
discriminação, não mais apenas pelo medo da
penalidade, mas por uma verdadeira tomada de consciência
em relação à necessidade da não-discriminação.
Entretanto,
permanece grande o abismo entre a teoria e a prática,
a exemplo do racismo institucional, assunto de que
trataremos no próximo tópico.
5.Considerações
sobre o racismo institucional
A
referência ao poder do racismo leva-nos diretamente
a uma dimensão da sua influência em nossa
sociedade, o que tem sido geralmente denominado de
"racismo institucional".
O
racismo institucional tem sido visto como o meio
pelo qual uma variedade de sistemas, práticas e
procedimentos estabelecidos no sistema educacional
ou na sociedade como um todo, que foram
originalmente concebidos para congregar as
necessidades e aspirações de uma sociedade
relativamente homogênea, podem agora ser vistos a
ignorar ou até efetivamente ir contra os interesses
das comunidades étnicas minoritárias na sociedade
pluralista atual. O tipo de práticas às quais nos
referimos incluem muitas, que, embora originalmente
bem intencionadas e de modo algum racistas em intenção,
podem agora ser vistas como racistas em efeito,
impossibilitando o acesso de grupos minoritários às
mesmas oportunidades possíveis ao grupo majoritário.
O
Racismo Institucional pode ainda ser visto na dimensão
em que a sociedade tem continuado a se auto definir
no sentido de critérios pré-estabelecidos para
congregar as necessidades de um todo homogêneo e
que inevitavelmente não reconhece a complexa rede
de objetivos e aspirações presentes na sociedade
atual.
Uma
complexa inter-relação existe entre atitudes
individuais e a influência de práticas e
procedimentos institucionalizados. É inegável que
práticas e procedimentos pré-estabelecidos e o
sistema convencional de processos e estruturas
institucionais podem suprimir atitudes individuais,
que se restringem a seguir estritamente o sistema pré-concebido.
Da mesma forma, deve ser salientado que as formas
institucionais são, por sua vez, e, em grande
medida, sustentadas pelas atitudes individuais.
É
assim que concluímos que a mudança de padrões
institucionalizados e de atitudes individuais são
de igual importância e têm papéis complementares
para o alcance de uma alteração abrangente de ênfase
e ponto de vista, alteração essa essencial nas
relações da sociedade multirracial da atualidade.
CONCLUSÃO
Ao
fim do nosso estudo, torna-se necessário traçarmos
algumas considerações.
Como
visto, o conceito de discriminação racial , em
concepção adotada pela Convenção sobre a Eliminação
de Todas as Formas de Discriminação Racial , exige
forma concreta de expressão, no sentido de
"distinção, exclusão, restrição ou preferência"
com o objetivo de anular ou restringir o gozo de
direitos humanos e liberdades fundamentais, em função
de raça, cor, descendência ou origem nacional ou
étnica”. Desse modo, caracteriza-se
diferentemente do preconceito, que é um
prejulgamento, sem necessária demonstração
exterior no sentido de anulação ou restrição dos
direitos de outrem.
Importante
é também observarmos o impacto dos instrumentos
internacionais na Constituição Brasileira atual e
os reflexos desta na criação das leis federais,
estaduais e municipais subseqüentes contra o
racismo e a discriminação. Devemos a esse
encadeamento de reflexos o reconhecimento de vários
preceitos baseados na pluralidade racial do nosso país
e o redelineamento das noções de nacionalidade e
processo civilizatório.
Entretanto,
devemos considerar que, dadas as grandes diferenças
entre a teoria e a prática , um avanço na forma de
constituição do Direito, embora nos traga esperanças,
não exclui a necessidade do aprimoramento da
efetivação das punições às práticas
discriminatórias.
Assim,
na expectativa de promover o alargamento da visão
sobre o assunto, esperamos deixar nossa contribuição
para a melhoria das relações entre os diferentes
grupos na sociedade multirracial de nossos dias.