A
Primeira Guerra Mundial e a
Criação
da Liga das Nações
Adriana
Carneiro Monteiro
1.1.Cenário
Mundial e início da Guerra - breves considerações
1.2.Conseqüências
da Guerra
2.Precedentes
históricos da moderna sistematização de proteção
internacional dos direitos humanos
2.1.Direito
Humanitário
2.2.Liga
das Nações
2.2.1.Sistema
de Mandatos
2.2.2.Padrão
Internacional do Trabalho
2.2.3.Sistema
de Minorias
3.OIT
CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA
CONSULTADA
Objetivo
do Trabalho
O
presente trabalho se propõe a analisar a criação da Liga das Nações
no contexto do pós - Primeira Guerra Mundial.
Nesse
sentido, traçaremos algumas observações sobre o início e
conseqüências da Primeira Grande Guerra, fazendo depois uma análise
dos precedentes da moderna sistematização de proteção
internacional dos Direitos Humanos, envolvendo considerações
sobre o Direito Humanitário, a Organização Internacional do
Trabalho e, em destaque, a Liga das Nações, com seu Sistema de
Mandatos, Padrão Internacional do Trabalho e Sistema de Minorias.
1.
A Primeira Guerra Mundial
1.1.Cenário
Mundial e início da Guerra – breves considerações
Em
meados do século XIX, a Europa vinha sendo dividida pelas
rivalidades imperialistas da Grã-Bretanha, França, Rússia e dos
Impérios Austro-Húngaro e Otomano. No início do século XX, o
nacionalismo tomava formas perigosas: o pan-eslavismo russo e o
plano de criação da Grande Sérvia visavam à união de todos os
povos eslavos. O revanchismo francês enraizava-se no desejo de
vingança da derrota sofrida contra a Prússia em 1870. Entrava em
cena a Alemanha como o país mais poderoso da Europa Continental,
após a Guerra franco-prussiana (1870 / 1871) e a arrancada
industrial propiciada pela unificação do país, em 1871. A nova
potência ameaça os interesses econômicos da Inglaterra e político-militares
da Rússia e da França.
Assim, o
choque dos interesses imperialistas das diversas nações européias,
aliado ao espírito nacionalista emergente, é o grande fator que
desencadeia o conflito.
O
atentado de Sarajevo, na Bósnia-Herzegóvina, em que o terrorista
sérvio Gavrilo Princip mata o herdeiro do trono austro-húngaro,
arquiduque Francisco Ferdinando, em 28/06/1914, serve de pretexto
para que o Império Austro-Húngaro ataque a Sérvia, foco mais
ativo da agitação eslava dos Bálcãs. O conflito assume proporções
amplas em conseqüência do sistema das alianças múltiplas: a Tríplice
Aliança (Alemanha, Império Austro-Húngaro e Itália, 1882) e a
Entente Cordiale ( Grã-Bretanha e França , 1904) , base da Tríplice
Entente ( Grã-Bretanha, França
e Rússia, 1907) – formadas como um meio de proteger-se contra a
expansão industrial, comercial e militar alemã.
1.2.Conseqüências
da Guerra
Com o
fim da Guerra, ocorre uma reorganização do mapa político
europeu. Os Impérios Alemão, Austro-Húngaro Otomano e Russo
deixam de existir; Polônia, Estônia, Letônia, Lituânia, Finlândia,
Hungria e Tcheco-Eslováquia tornam-se independentes; a Iugoslávia
surge da união da Sérvia com Motenegro.
As condições
extorsivas impostas pelo Tratado de Versalhes à Alemanha (perda
de todas as colônias e partes de seu território, pagamento de
indenizações gigantescas, proibição de formação do Exército
regular, etc. ) foram o germe do regime totalitário nazista e uma
das causas da Segunda Guerra Mundial.
Em relação
às perdas humanas, é preciso ressaltar que dos 65 milhões de
homens envolvidos na luta, mais de 8 milhões morreram, 20 milhões
ficaram feridos e 5 milhões desapareceram. Além disso, 9 milhões
de civis são mortos em conseqüência da fome, epidemias e
massacres.
É esse
o quadro degradante que encontramos ao fim da Primeira Guerra
Mundial e que servirá de palco para o desenvolvimento dos
precedentes históricos da moderna sistematização dos direitos
humanos.
2.
Precedentes históricos da moderna sistematização de proteção
internacional dos direitos humanos
Para a
internacionalização dos direitos humanos, era necessária uma
redefinição do âmbito e alcance do conceito tradicional de
soberania estatal, exigindo ainda uma redefinição do próprio
status do indivíduo no cenário mundial, para que fosse alçado
à categoria de sujeito de direito internacional.
Nesse
sentido, o Direito Humanitário, a Liga das Nações e a Organização
Internacional do Trabalho foram marcos do processo de
internacionalização dos Direitos Humanos. É isso que nos
propomos a analisar nas linhas seguintes, com destaque para a Liga
das Nações, de especial enfoque nesse estudo.
2.1.Direito
Humanitário
O
Direito Humanitário ou Direito Internacional da Guerra
desenvolveu-se com o objetivo de limitar a atuação do Estado e
assegurar a observância dos direitos fundamentais, colocando sob
sua tutela militares fora de combate ( por ferimentos, doença,
naufrágio ou prisão ) e populações civis.
Com
aplicação tanto em conflitos internacionais quanto civis, o
Direito Humanitário impõe regulamentação jurídica do emprego
da violência internacionalmente, referindo-se a questões de
extrema necessidade, em que se faz necessário o confronto com um
poder exterior.
Assim, o
Direito Humanitário figurou como a primeira expressão de limites
à liberdade e autonomia dos Estados.
2.2. Liga das
Nações
A criação
de um organismo internacional de manutenção da paz já vinha
sendo pensada por trabalhos jurídicos e filosóficos precedentes,
mas a primeira fonte da Liga das Nações foi mesmo a proposta na
Conferência de Paz em Paris, em 1919, no Pós-Primeira Guerra.
Criada
em 1920, a Liga das Nações "tinha como finalidade promover
a cooperação, paz e segurança internacional, condenando agressões
externas contra a integridade territorial e a independência política
de seus membros."
A Convenção da Liga das Nações ainda estabelecia sanções
econômicas e militares a serem impostas pela comunidade
internacional contra os Estados que violassem suas obrigações, o
que representou uma redefinição do conceito de soberania estatal
absoluta.
É bem
verdade, como afirma Thomas Buergenthal,
que a noção de proteção internacional dos direitos humanos não
tinha ainda ganho efetiva aceitação pela comunidade das nações,
nem seriamente sido tratada pela Convenção que instituiu a Liga
das Nações, mas podem ser destacadas certas previsões genéricas
a respeito do Direito Internacional dos Direitos Humanos, como o
sistema de mandatos, o padrão internacional do trabalho e o
sistema de minorias.
2.2.1.
Sistema de Mandatos
Uma das
previsões do artigo 22 da Convenção estabelecia o sistema de
mandatos a ser aplicado apenas às ex-colônias dos países
perdedores da Primeira Guerra Mundial. Sobre esse assunto,
manifesta-se Paulo Bonavides:
"Suscitou-se (...) após a Primeira Guerra Mundial a questão
do destino que se daria às colônias dos Estados vencidos no
conflito armado. Transferi-las pura e simplesmente, ainda sob a
forma clássica de Protetorado às potências vitoriosas,
equivaleria a confirmar as suspeitas de que os largos e generosos
princípios apregoados na guerra ficariam deslembrados na paz.
Concebeu-se, pois a destinação das colônias aos Estados
vencedores, mas sob o regime de "mandatos". A organização
política internacional, no caso a antiga Sociedade das Nações,
investiria determinados governos na tutela das populações
coloniais para regê-las no interesse de sua progressiva emancipação,
até que ali as condições materiais, morais e culturais
estivessem suficientemente amadurecidas, em ordem a capacitá-las
à plena fruição da liberdade e soberania."
Como se
observa, o sistema de mandatos muito se aproximava do Protetorado,
diferindo deste pelo fato de estar vinculado ao organismo jurídico
internacional da Liga das Nações e possuir, ao contrário do
Protetorado, caráter transitório em sua própria instituição.
A administração pelos Estados mandatários (dominantes) deveria
visar à subseqüente emancipação das populações coloniais dos
Estados sob mandato.
2.2.2. Padrão
Internacional do trabalho
Uma
outra provisão da Convenção da Liga das Nações, em seu artigo
23 era sobre questões
relacionadas às "condições justas e humanas de trabalho
para homens, mulheres e crianças." Também visava ao
estabelecimento de organizações internacionais com o mesmo
objetivo. Essa função foi posteriormente assumida pela Organização
Internacional do Trabalho, que teve sua fundação quase ao mesmo
tempo que a Liga das Nações .
A OIT
sobreviveu à Liga das Nações e é agora uma das Agências
especializadas das Nações Unidas. As atividades legislativas e a
supervisão estabelecida pela OIT para promover e monitorar a
obediência aos padrões internacionais de trabalho têm, ao longo
dos anos, contribuído enormemente para a melhoria das condições
de trabalho e para o desenvolvimento do Direito Internacional dos
Direitos Humanos.
2.2.3.
Sistema de Minorias
A Liga
das Nações também teve papel de grande importância no
desenvolvimento de uma sistemática internacional para a proteção
das minorias.
Como
sabemos, uma das conseqüências da Primeira Guerra Mundial foi o
remapeamento político europeu, com a formação de novos Estados
constituídos por uma grande variedade de grupos étnicos, lingüísticos
e religiosos. A partir daí, firmava-se a necessidade da conclusão
de tratados especiais destinados à proteção das minorias.
Nesses
tratados, os Estados se comprometiam a não discriminar membros de
grupos minoritários e a garantir-lhes direitos especiais necessários
à preservação de sua integridade étnica, religiosa ou lingüística.
A Liga
das Nações passou a ser a guardiã dos compromissos assumidos
pelos Estados nos tratados, exercendo essa função a partir de um
sistema de petições a ser utilizado por membros dos grupos
minoritários quando da violação de seus direitos.
Como
lembra Thomas Buergenthal, é importante reconhecer que algumas
das instituições modernas de Direitos Humanos guardam considerável
semelhança com as instituições primeiramente desenvolvidas pela
Liga das Nações para a administração do sistema de minorias.
3.
OIT (Organização Internacional do Trabalho / International
Labour Office, hoje denominada International Labour Organization)
A
Organização Internacional do Trabalho foi criada após a
Primeira Guerra Mundial com o objetivo de promover padrões
internacionais de condições de trabalho e bem-estar.
A
OIT teve importante papel, influenciando a adoção de uma série
de novos documentos internacionais no ramo da proteção ao
trabalho. Nos sessenta anos posteriores à sua criação, foi
promulgada uma centena de Convenções, pelas quais os Estados
–partes comprometem-se a assegurar dignas condições de
trabalho.
CONCLUSÃO
A Liga
das Nações (juntamente com o Direito Humanitário e a OIT) marca
a projeção do Direito Internacional ao alcance de obrigações
coletivas por parte dos Estados, visando à defesa dos direitos
humanos e, portanto, ultrapassando o âmbito simplesmente
governamental.
Assim,
de um Direito Internacional que tinha no Estado o único sujeito
de Direito Internacional, alcança-se o reconhecimento da
titularidade e proteção de direitos individuais não mais
restritos à esfera nacional.
As
intervenções possíveis nos territórios desses Estados a partir
desses institutos é prova da redefinição do conceito de
soberania absoluta e do delineamento de um novo Direito
Internacional, marcado também pela consolidação da capacidade
processual internacional dos indivíduos.
BIBLIOGRAFIA
CONSULTADA
BUERGENTHAL , Thomas. International
Human Rights in a nutshell. United States of America: West
Publishing Co. 1988
PIOVESAN , Flávia. Direitos
Humanos e o Direito Constitucional Internacional .3ed. atual. São
Paulo: Max Limonad. 1997
STEINER
, Henry J. & ALSTON , Philip. International Human Rights in
Context - Law, Politics , Morals. United States of America:
Clarendon Press. 1996
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado.
A proteção internacional dos direitos humanos: fundamentos jurídicos
e instrumentos básicos. São Paulo : Saraiva. 1991
ALMANAQUE ABRL 96. São Paulo :
Editora Abril .1996.
Como salienta Thomas Buergenthal ( International Human Rights
, pág. 3 ) : “ a doutrina da intervenção humanitária foi
a primeira a dar expressão à afirmativa de que há limites
à liberdade com que o Estado trata seus próprios nacionais
sob o Direito Internacional .”
Flávia Piovesan ,
"Direitos Humanos e o Direito Constitucional
Internacional" , pág. 134.
Thomas Buergenthal , "International Human Rights", págs.
5-6.
Como observa Flávia
Piovesan : "A Convenção da Liga das Nações , de 1920
, continha previsões genéricas relativas aos direitos
humanos , destacando-se aos voltados ao mandate system of the
League , ao sistema das minorias e ao padrão internacional do
direito ao trabalho." ( Flávia Piovesan , "Direitos
Humanos e o Direito Constitucional Internacional", pág.
134 )
Paulo Bonavides , "Ciência
Política", pág. 198.
Thomas Buergenthal , “ International Human Rights” , págs.
7-8.
Thomas Buergenthal , “ International Human Rights” , pág.
11.
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