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VII Caravana Nacional de Direitos Humanos
RELATÓRIO SOBRE A EXPLORAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO ESTADO DA PARAÍBA

 

COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS
CÂMARA DOS DEPUTADOS
Brasília, maio de 2002

O fenômeno da exploração sexual comercial infanto-juvenil no Brasil.

No Brasil, a temática da exploração sexual de crianças e adolescentes continua sendo cada vez mais discutida na medida em que o volume de denúncias cresce a todo instante no país. Pesquisas recentes, indicam que matérias veiculadas na mídia sobre este tema, têm crescido de modo significativo, indicando que este assunto sai aos poucos da sombra em que foi lançado e torna-se a principal pauta de esclarecedores encontros em todos setores sociais : as organizações governamentais em todas as esferas (federal, estadual e municipal), empresas privadas, organizações da sociedade civil: ONGs (Organizações Não-Governamentais) e OSCIPs (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público).

Ao se falar em dignidade humana, é impossível não se assustar com a complexidade deste tema. Ele traz à tona a realidade cruel de milhares de crianças e adolescentes em nosso país, que sobrevivem ao estado de miséria em que são lançadas, sem acesso a informações, reféns de um quadro social onde a violência e a exploração sexual é mais uma marca de uma política que, apesar de analisada e debatida de forma legítima, urge de uma articulação mais eficaz, voltada para o desmantelamento das redes de prostituição que se formam facilmente. Assim, coloca-se no centro da questão; esta que é a maior riqueza que uma nação pode oferecer aos seus cidadãos: o pleno direito de se desenvolver como ser humano em toda sua força, riqueza e plenitude.

O Estatuto da Criança e do Adolescente , instituído em 1990 foi uma adaptação da Convenção Internacional dos Direitos da Criança e também a regulamentação do art. 227 da Constituição Federal, dispondo sobre os direitos da criança e sua proteção integral. O CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da Criança), é uma entidade criada a fim de formular políticas públicas e o encaminhamento dos recursos para que este importante estatuto possa se fazer cumprir.

Em decorrência de sua participação na primeira edição do Congresso Mundial contra a Exploração Sexual Comercial de Crianças, em Estocolmo, o Brasil foi um dos poucos países que estabeleceram um Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual. Este Plano foi também aprovado por mais de 160 entidades governamentais e não-governamentais em Natal-RN em 2000. Seu objetivo é articular ações e produzir metas para que se proteja integralmente a criança e o adolescente em situação de risco de violência sexual, além de viabilizar a política de atendimento do Estatuto da Criança e do Adolescente. Para tanto, foi decidido que cada Estado e Município, realizassem seus planos de enfrentamento, tendo o Ministério da Justiça e o Fórum dos Direitos da Criança e do Adolescente firmado um convênio para o acompanhamento deste projeto.

A fim de que o problema da exploração sexual infanto-juvenil possa ser divulgado, mobilizando a sociedade brasileira para o seu importante combate, foi instituído o dia 18 de maio como o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes.

 

"A exploração sexual de crianças é um fenômeno transversal, atingindo todas as classes sociais e grupos na Sociedade, os quais podem contribuir para a exploração, através da indiferença, o desconhecimento das conseqüências nocivas sofridas pelas crianças e pelos valores que consideram crianças como mercadorias."

Declaração de Estocolmo

 

O Nordeste e a rota da prostituição infanto-juvenil.

Patos – PB

O novo epicentro da exploração sexual comercial de crianças e adolescentes

A Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, recebeu em meados de fevereiro, denúncia de que uma rede de prostituição infanto-juvenil estava atuando na cidade de Patos, no interior da Paraíba, a 350 km de sua capital João Pessoa.

A VII Caravana Nacional de Direitos Humanos, teve como proposta investigar denúncias de prostituição de nossas crianças e adolescentes. Patos foi o destino primeiro da Caravana, em decorrência das informações prestadas pelo Deputado Luiz Couto (PT), relator da CPI da Prostituição (realizada em 1997), dando-nos conta de que esta cidade tornara-se o mais recente epicentro da rede de prostituição de crianças e adolescentes na Paraíba.

Através daquela CPI, foi constatado que, anteriormente, a exploração da prostituição infanto-juvenil concentrava-se na cidade de Campina Grande, a 139 km de João Pessoa.

Ao chegarmos, foi possível observar que Patos é uma típica cidade do interior nordestino com 91 mil habitantes, muitos dos quais advindos da zona rural. Aparentemente é uma cidade como qualquer outra dentro do cenário nordestino. Para nós o referencial que estranhamente diferenciava este município de tantos outros, fora o casamento fraudulento de Fernandinho Beira-Mar em 1987 com uma menor de 14 anos residente na cidade, que ele engravidara, além de informações recentes indicando a participação de autoridades locais no favorecimento ao crime organizado.

Em 20 de abril de 2002, foi organizada uma audiência na Câmara Municipal de Patos, com a presença dos integrantes da VII Caravana Nacional dos Direitos Humanos; além do MM Juiz da 4ª Vara Criminal Dr. Francisco Antunes Batista e do Promotor Dr. João Manoel de Carvalho. Iniciando-se com um grupo de 15 meninas com idade variando entre 13 e 17 anos. Ao perguntarmos qual a melhor maneira de ouvi-las, responderam que preferiam ser ouvidas individualmente, em uma sala. Constam neste relatório, os depoimentos mais contundentes e esclarecedores da rede de prostituição formada na cidade de Patos.

Uma das primeiras adolescentes a ser ouvida foi R.P.F., 15 anos, cujo pai, Sr. Roberto, foi o responsável pela denúncia do aliciamento da filha e de outras vítimas, sofrendo represálias em função disso.

Esta denúncia resultou na abertura de processo criminal junto à 4ª Vara Criminal, onde os principais acusados : Willames Honório de Souza (31 anos, cabeleireiro) e Ângela Maria Correia (39 anos, funcionária pública municipal).,Ednilson Fernandes dos Santos (25 anos, cabeleireiro) e Rivânia Moreira de Araújo, 21 anos(do lar), conhecida por ‘tiazinha", que encontra-se foragida. Existe ainda em poder do Ministério Público, denúncia contra Agamenos Alves dos Santos (26 anos, proprietário do motel "Miami") e Damião Mendonça dos Santos ( 33 anos, proprietário do motel "Thaity").

Os depoimentos:

R.P.F.S., 15 anos, relata que a cerca de um ano, começou a fazer programas, convidada por Ângela Correia, recebendo a quantia de R$50,00 (cinquenta reais) por programa e que esta primeira relação sexual aconteceu na própria casa da acusada, com o Sr. Fernando. Que num segundo momento, a sua entrada e permanência no motel "Miami" não foi obstáculo para os encontros, apesar de ter conhecimento de uma placa afixada no portão do estabelecimento proibindo a entrada de crianças e adolescentes, que nunca teve contato visual com nenhum funcionário dos motéis. A aliciadora conseguiu mais três programas com empresários da cidade ( Carlos Pinheiro que pagou R$50,00 ‘cinquenta reais’; Rosildo da ECOPLAN que pagou R$150,00 ‘cento e cinquenta reais’ e Nildo do Posto Almeidão que pagou R$100,00 ‘cem reais’).

Os encontros aconteciam da seguinte forma: Ângela telefonava para a adolescente que se dirigia à casa da aliciadora e lá esperava a chegada do "cliente" que a levava para o motel ,e que os pagamentos eram feitos após a realização do programa e sempre em dinheiro e que repassava uma parte da quantia à aliciadora . Que era comum encontrar outras adolescentes na casa de Ângela aguardando "clientes".

Em certa ocasião, Ângela foi ao colégio de R.P.F, onde ela assistia aula e; ludibriando a professora, conseguiu falar com R. , convidando-a para um programa àquela hora. A adolescente declara que se negou a sair do colégio para este fim. Contou-nos que em determinada ocasião presenciou o Vereador Rosemberg Leandro, empresários da cidade e o filho do Prefeito de Patos na casa de Ângela Correia.

Recebeu ameaças de morte por parte da aliciadora quando o caso veio à público, incluindo todos os denunciantes, depois que saísse da prisão.

Relata que por vezes, ao passar a noite fora de casa, em móteis, ligava para a mãe dizendo que havia dormido na casa de uma amiga.

Chegou ao conhecimento desta Comissão a informação de que em 25 de abril de 2002, R.P.F.S foi procurada pelo filho do Sr. Rosildo (ECOPLAN), chamado Rogério, que estava acompanhado por um outro rapaz em um carro modelo Gol, cor preta, coagindo-a e entrar no carro. Apesar da negativa da adolescente, ele insistiu e levou-a ao Motel "Thaity" onde, após argumentar que a mãe ameaçara seu pai de separação, também coagiu-a a assinar uma carta que declarava que a adolescente não mantivera relações sexuais com Rosildo, e sim com seu filho, Rogério. Esta carta foi encaminhada à Delegacia de Patos para provar a suposta inocência de Rosildo no caso.

A adolescente informa ainda que não manteve relações sexuais com Rogério quando do encontro no Motel Thaity.

O Sr. Roberto, pai de R.P.F.S foi à Delegacia da Mulher registrar um boletim de ocorrência sobre o acontecido.

Em 10 de maio de 2002, o Vereador Rosemberg Leandro em entrevista ao programa "Tony Show" da T.V Correio, que vai ao ar às 12h30, ele negou veementemente estar envolvido nas acusações de envolvimento com adolescentes da cidade. Declarou ainda que o pai de R.P.F.S (Sr. Roberto) ao invés de denunciar, deveria dar "tratamento à filha que é uma tarada", argumentando que ela já saíra com todos os homens da cidade. Além disso, acusou o Deputado Estadual Luiz Couto (PT) de praticar pedofilia e frequentar bares da cidade de Patos, "tomando cerveja".

Aliciamento:

"Comecei a frequentar a casa das filhas da Ângela. Ela (Ângela) começou a ajeitar programa para mim. Perguntava: "Quer sair com fulano?". Ela também arrumava para as filhas dela e para outras."

Érica*

, relata que dias após completar 14 anos, teve sua primeira relação sexual com um médico de 38 anos, morador da cidade, no motel "Miami" e que vez ou outra recebia dinheiro dele "apenas como uma ajuda", tendo sido presenteada também com um telefone celular. Que se encontrou com ele quatro vezes, sendo que em uma delas, S.A.S também estava presente no quarto do motel "Miami".

Ouvi de E.B.F que ela tinha conhecimento de que Ângela Correia agenciava programas para sua própria filha S.; e outras garotas da cidade como R.S.F.L e S.A.S e L.S.M. .

Saindo da delegacia,onde prestou depoimento acerca do caso, foi ameaçada também por Ângela.

Citou os lugares que servem de ponto de encontro para a prostituição: Bar do Cajueiro, Bar da Elba e Bar do Zezinho.

Ao ser indagada se tinha conhecimento de outros aliciadores, citou o cabeleireiro Willames, Rivânia (também conhecida como ‘tiazinha’), Tâmara e Edson (Edimilson), complementando que estes agenciavam programas para S.A.S , S.P.M e J.M.C.A. Disse ter conhecimento que F.B.A e M.S.A.R. também se prostituiam, assim como R.P.F.S, R.S.F.L, "Corrinha" e várias adolescentes.

Completou seu relato dizendo que tinha conhecimento que o cabeleireiro Willames também agenciava programas para meninos. Citou os nomes dos homens que costumam sair com as aliciadas: Bazinho, Michel, Dinarte, Luiz Flávio, dentre outros.

Esta adolescente pediu orientanções ao Promotor Dr. João Manoel de Carvalho, a fim de que pudesse solicitar uma ação reinvidicatória visando indenização por perdas e danos morais.

Vaidade:

"Gastava só com roupa. Comprava jeans da Gasoline, blusas, outras calças de marca."

Marta*

V.G.A ,16 anos, iniciou seu depoimento, declarando que faz programas a menos de um ano e que foi agenciada em cerca de 15 programas através do cabeleireiro Willames. Que além dela, várias outras adolescentes são agenciadas pelo acusado. O preço por cada programa era no mínimo de R$50,00 (cinquenta reais), chegando a R$70,00 (setenta reais) e R$80,00 (oitenta reais). Willames lucrava em torno de R$20,00 (vinte reais) por cada um. Quanto ao procedimento utilizado pelo acusado, V.G.A. declarou que se dirigia a casa dele , que telefonava para o "cliente" marcando um local para o encontro da adolescente com o cliente; que pagava R$20 (vinte reais) antecipadamente ao cabeleireiro.

Que Edimilson também providenciou encontros sexuais dela com Saturnino, que trabalha no centro da cidade, sendo que o acusado recebeu a quantia de R$20,00 (vinte reais). Estes programas eram feitos nos motéis ‘Miami" e "Thaity", onde tinha acesso livre e conhecimento das referidas placas de proibição de entrada de crianças e adolescentes. Também fez programas com Firmo, Everaldo (da J.J.Veículos) e Alexandre.

Além disso, a V.G.A. declarou que dentre outros homens com quem teve relações sexuais, está o irmão de um juiz da cidade de Catolé do Rocha (PB). Este homem, enviou seu motorista particular a Patos para buscá-la. Ela conta que por este programa, recebeu a quantia de R$100,00 (cem reais), retornando a sua cidade no dia seguinte. Em outro episódio, recebeu R$250,00 (duzentos e cinquenta reais) – o máximo já recebido, segundo a adolescente - por um encontro sexual com um juiz de uma cidade próxima a Patos. Diz não lembrar do nome do referido juiz e nem da cidade em que ele reside.

Um dado relevante foi a informação de que uma das adolescentes aliciadas Lidiane Silva dos Santos (18 anos), mora com um moto-taxista de nome Severino (em um outro momento dessa investigação , levantou-se a informação de que moto-taxistas também atuam na rede de prostituição, com a tarefa de levar as vítimas aos lugares combinados para o encontro, além de fazer contatos nos pontos já reconhecidos de prostituição com possíveis "clientes").

Informa, ainda, que já esteve numa mansão-prostíbulo das mais famosas de João Pessoa chamada "Granja do Gaúcho", chegando a fazer cinco programas por dia, ganhando até R$1.000,00 (mil reais) por semana.

F.B.A, 17 anos. Neste rápido depoimento, ela nega estar envolvida em casos de prostituição, porém é do seu conhecimento que R.P.F.S (da qual se diz amiga) e R.S.F.L. fazem programas. Que teve relacionamentos íntimos com Paulo, Maxwell, Edgleine, Fábio e Wescley , em diferentes oportunidades nos motéis "Miami" e "Thaity", onde entrou livremente, porém sem receber dinheiro.

Relata que, em certa ocasião foi ao motel "Thaity" com várias pessoas: M.S.A.R., E.B.F., Hermaninho, filho de Hermano Régis, "Emano" e João Neto, sendo que todos ficaram no mesmo quarto, apenas bebendo.

Conhece S. filha de Ângela Correia, e já ouviu falar que a acusada agenciava programas para R.P.F.S e R.S.F.L.

F.B.A. responderá processo por falso testemunho.

Medo:

" A Ângela disse que vai me matar quando sair da prisão."

Patrícia*

, inicia seu relato, relatando as atividades da acusada Ângela Correia. Ao perguntar como ela a conheceu, responde que através de R.P.F.S, e que a aliciadora convidou-a para fazer um programa com o Vereador Rosenberg Leandro. Ao relutar a proposta, Ângela insistiu dizendo que R. ganharia muito dinheiro e teria acesso a muitas vantagens. Perante os argumentos, a adolescente cedeu, tendo, inclusive, mais três encontros com ele, nos quais recebeu sempre a mesma quantia de R$100,00 (cem reais). Que um dia, após um contato telefônico de Ângela com o Vereador, este compareceu na casa da acusada. De lá, R. e ele foram para o Hotel Fazenda Vale das Espinharas, ficando instalados em um apartamento. Apesar da presença da adolescente, funcionários do estabelecimento não fizeram nenhuma objeção, quando da entrega das chaves do apartamento ao Vereador. Ainda sobre o Hotel Fazenda, conta que, durante uma festa de confraternização natalina realizada naquele local, relacionou-se sexualmente com Vasco (filho do dono do supermercado Foguete), perdendo a virgindade. Nesta mesma festa, várias outras adolescentes passaram a noite nos quartos do hotel em companhia de homens da cidade. Ao chegar em casa às cinco horas da manhã, encontrou a sua mãe esperando-a, já que não era costume dela chegar tal hora em casa.

Durante o ano em que se envolveu com prostituição, declara que foi reprovada na escola por um grande número de faltas. Que mentia para a mãe, dizendo que ia para a escola quando, na verdade, realizava programas agenciados por Ângela Correia. Esses programas variavam entre R$20,00 (vinte reais), R$30,00 (trinta reais) e R$50,00 (cinquenta reais).

Com o dinheiro recebido pelo primeiro programa, comprou lentes de contato verdes.

L.S.S., 18 anos, inicia contando que fez seu primeiro programa aos 16 anos, conhecendo o primeiro cliente na Praça da Alimentação (conhecido ponto de prostituição em Patos). Estes encontros continuaram durante um período em que se encontraram por mais sete vezes, recebendo sempre a quantia de R$50,00 (cinquenta reais) por cada programa . Posteriormente foi para João Pessoa com a amiga V.G.A., frequentando a "Granja do Gaúcho", dando continuidade aos programas que aconteciam todos os dias numa média de dois a três por noite, em valores que variavam entre R$50,00 (cinquenta reais) e R$100,00 (cem reais). Voltou a Patos depois deste período.

Informa que fazia programas agenciados por Willames e que este recebia R$20,00 (vinte reais por programa). Cita que a menor T.R.P. (17 anos), já a convidou para ir novamente a João Pessoa pois "tinha uns caras lá em João Pessoa" e que ela ganharia a sua parte no encontro. Que T.R.P procurou Patrícia Almeida Oliveira (maior de idade) para lhe fazer o mesmo convite.

T.A.S ,16 anos. Relata que a um ano atrás, viajou para João Pessoa sem o consentimento de seus pais junto com F. ficando hospedada na quitinete de T.R.P. Sabe que a acusada Rivânea Moreira de Araújo, gerenciava encontros para outras adolescentes (S.A.S, O. e G. além de outras que não lembra) ficando a acusada com uma parte do dinheiro ganho. Em João Pessoa, T.A.S contou-nos que fez vários programas e que nesta esta ocasião conversou com J.A.F. Esta adolescente estava hospedada na casa de T.R.P. Encontrou-se também com Ângela Correia e J.M.C.A, na mesma cidade.

Observações sobre a exploração sexual em Patos.

Através de um funcionário público que se fingiu de cliente, tentamos marcar um encontro a fim de comprovar o esquema de prostituição de crianças e adolescentes em Patos. Em um primeiro contato, o moto-taxista ofereceu o "serviço" ao funcionário público, marcando um encontro às 22h30 em um dos principais locais de prostituição da cidade: a Praça da Alimentação. Nesta ocasião, ele traria três meninas, segundo ele "bem novinhas" a fim de que o "cliente" pudesse escolher. No encontro, o referido moto-taxista veio só, informando que não seria possível realizar o "babado" (programa) pois as meninas souberam das investigações e estavam com medo de se expor.

A sensação de medo, foi claramente observada por nós durante toda a investigação que seguiu com o importante apoio da Polícia Federal em todos momentos. Nos depoimentos, as aliciadas, além de constrangidas, aparentavam um receio muito grande em expor os fatos. Muitas não tinham qualquer noção de que a denúncia era grave e se mostravam muito mais preocupadas com as ameaças de morte feitas por Ângela Correia (aliciadora) e usuários através de ligações telefônicas.

Além dos acusados citados neste relatório, mais vinte pessoas (possíveis aliciadores) estão sendo investigados. Outros continuam agindo na cidade, aliciando crianças e adolescentes, promovendo até mesmo leilões de garotas, gerando uma situação propícia para que a rota que agora se inicia em Patos, passa por Campina Grande, João Pessoa e se ramifica através dos Estados de Pernambuco (Recife) e Rio Grande do Norte (Natal) , se estabeleça, atraindo um número cada vez maior de crianças e adolescentes , aumentando os dados sobre o aliciamento infanto-juvenil na Paraíba e em outros Estados.

Outro fato que chamou-nos atenção, foi a presença maciça de público infanto-juvenil nos pontos já conhecidos de prostituição: a Praça da Alimentação, o "Espetinho", os Coretos I, II e III.

Quanto ao aliciadores referidos na audiência, o MM Juiz da 4º Vara Criminal , Sr. Dr. Francisco Antunes, foram presos e posteriormente postos em liberdade Willames Honório de Souza e Ednilson Fernandes dos Santos. Ângela Maria Correia citada na grande maioria dos casos envolvendo aliciamento infoanto-juvenil, está presa e Rivânia Moreira de Araújo continua foragida.

Apesar da gravidade das ocorrências, não há nenhuma ação por parte da prefeitura para se coibir essa situação e nem uma fiscalização policial; indicando um descaso das autoridades locais.

Mapa da rota de prostituição infanto-juvenil na Paraíba e Natal:

As vítimas.

"Eu moro só com a minha mãe, meu pai dá dinheiro para a gente."

Ana*

Várias questões surgem ao se analisar o caso: quem são essas meninas? Quais os motivos que levam adolescentes de 13 até 17 anos a venderem seus corpos?

Antes de qualquer análise focal sobre o fenômeno observado por nós, da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, é primordial entender o que representa a fase da adolescência. São muitos os autores que tentam defini-la, porém há um ponto de convergência : é um momento do ser humano onde infância e mundo adulto se mesclam. Os amadurecimentos psicológicos, mentais e físicos estão em pleno desenvolvimento . Nada é estanque. Questões relacionadas à criação da própria identidade e seu posicionamento na sociedade, estão ebulindo nesta fase tão complexa e marcada por conflitos existenciais.

Novas forças interagem com este indivíduo em formação, traçando suas características pessoais, dando prosseguimento ao seu processo de socialização, gerando seu caráter e sistema de valores. Para J. de Ajuriaguerra ;"A adolescência não pode ser totalmente entendida, se não considerarmos , ao mesmo tempo, os fatores biológicos, os fatores psicológicos e os fatores sociológicos." O adolescente antes de tudo é um ser em constante busca , moldando-se, transformando-se , através de seus referenciais . Não é uma criança, tão pouco um adulto, ele é um conflito de forças, um porvir.

Está em curso também o processo de avaliar, analisar, ponderar, enfim, de desenvolver uma das capacidades humanas fundamentais: a visão crítica, que definirá sua maneira de encarar o mundo.

As adolescentes de Patos, e outras na rota da exploração sexual, foram apenas e unicamente vítimas. Esta visão crítica que faz parte do desenvolvimento humano, foi, para elas, negado. A liberdade de escolha, a dúvida sobre qual caminho seguir, o direito a optar, advém da capacidade de julgar, discernir. E isto, elas não tiveram.

Estas meninas de Patos , pouco diferem das adolescentes de grandes centros urbanos. A maioria delas, nos relatou que "faziam babado" (programa) por vaidade, para comprar roupas e não por necessidade ou para ajudar no sustento da família. Todas aparentavam ter mais idade do que realmente tem, usando roupas coladas ao corpo e com cabelos artificialmente loiros, lembrando uma cópia mal feita de apresentadoras de programas infantis televisivos. A principal diferença entre estas e aquelas, está sendo o impacto destes acontecimentos na vida das adolescentes de Patos. Elas que foram manipuladas e engedradas numa teia de acontecimentos que resultaram em um distanciamento cada vez maior do sistema de valores e convívio de suas famílias, do cotidiano escolar , aproximando-se de um mundo que as via como mercadorias, de pessoas inescrupulosas, de drogas, da banalização total do sexo.

Aliciadores.

"Tem que chegar em alguém, falar direto com as meninas não funciona"

Cristina*

Os aliciadores da região de Patos, são moradores da cidade, vindo de diferentes classes sociais, níveis de renda e profissões – funcionários públicos, comerciantes, empregados domésticos, donas de casa e etc. Algumas vezes as próprias aliciadas, tornam-se aliciadoras na medida em que seus "contatos" aumentam. Em outra situação, rufiões de João Pessoa deslocam-se até Patos, com o objetivo de recrutar "mão-de-obra" infanto-juvenil para programas na Capital.

Existe também um outro tipo de aliciador, que facilita o cotidiano da prostituição: alguns moto-taxistas que agendam encontros e levam crianças e adolescentes aos locais combinados anteriormente.

Circulam em bares, postos de gasolina e pontos reconhecidos de prostituição, contactando usuários, promovendo festas, enfim, se infiltrando das mais variadas formas. Alguns fazem fotos de cunho erótico com as adolescentes nuas, organizando álbuns para atrair usuários.

Um exemplo é o cabeleireiro Willames Honório Souza que agenciava encontros e "produzia" as meninas em seu próprio salão.

Algumas adolescentes nem sequer tinham o conhecimento de que o aliciador também recebia dinheiro quando da realização dos programas.

Em outro caso, uma aliciadora atraiu e induziu uma menor a realizar programas, primeiro contratando-a como babá de sua filha. Num segundo momento, foi averiguado que a casa da referida aliciadora era um ponto de encontro de caminhoneiros em busca de programas sexuais.

Usuários

"Aqui as meninas que fazem ‘babado’ (programa) têm que ser novinhas. Para ficar com ‘velha’, os homens ficam com as de casa mesmo."

Renata*

Caminhoneiros costumavam ser os usuários mais frequentes dos "serviços" oferecidos por crianças e adolescentes pobres nos postos de gasolina à margem da BR 230 (Patos- João Pessoa) nas primeiras denúncias em 1997. Nesta época um encontro sexual rendia de R$5,00 (cinco reais) a R$15,00 (quinze reais).

De lá para cá, este cenário mudou. A grande parte dos usuários destes "serviços" possui características em comum: a situação socioeconômica é estável. Vindos de vários setores da sociedade: médicos, políticos, empresários bem sucedidos, servidores públicos, juízes e familiares, eles alimentam a rede de prostituição, além de representarem um forte obstáculo nas investigações que visam o desmantelamento dessa rede de prostituição.

Um exemplo da dificuldade de desmonte dessa pérfida situação, foi o caso do relatório organizado pelo Deputado Estadual Luiz Couto (PT), relator da CPI da Prostituição, realizada em 1997. Para que o relatório final pudesse ser aprovado, Luiz Couto foi obrigado a retirar 33 das 99 páginas. Esta parte suprimida denunciava, justamente, o envolvimento de políticos, empresário e juízes em encontros sexuais com adolecentes e até mesmo crianças.

Estas informações resultaram em um inquérito policial que foi arquivado depois do depoimento das aliciadas, que identificavam por nomes os envolvidos. Luiz Couto responde a sete processos judiciais por calúnia e difamação pela divulgação do relatório integralmente na internet.

Este é um ponto importantíssimo a ser superado: a força da hipocrisia, a face maléfica dos que dão vasão aos seus impulsos mais perversosd, usando o poder, seja ele econômico ou; mais grave ainda: a força da representatividade que o Estado ou a sociedade civil delega a alguns destes juízes e políticos que as utilizam para corromper. Assim, transitam no sentido oposto aos seus deveres para com a nação, a sociedade e sua próprias famílias. Erguem barreiras de silêncio, construídas com a certeza da impunidade. Como consequência, é estimulada, continuamente a distorção de um sistema de valores precariamente estabelecido em função da realidade dura de pais trabalhadores, cidadãos comuns.

(*) Nomes fictícios

Considerações finais a respeito do fenômeno de exploração sexual comercial de crianças e adolescentes em Patos – PB

 

"Imitação ao nosso ver, é um fenômeno social explicado pelas contingências de recompensas observadas pela pessoa que imita, enquanto que identificação é um fenômeno muito mais complexo, muito mais duradouro e, até certo ponto, independente das contingências de recompensas (...)"

Aroldo Rodrigues

Estas crianças e adolescentes sucumbiram a algo muito maior do que elas, em sua fase tão carente de esclarecimentos: a força do ter em detrimento do ser, que nos é bombardeado a todo instante pela mídia que é só mais uma parte do sistema que nos envolve e tem regras claras: consuma, não interessa como.

São valores impostos, que um olhar desatento ou em processo de formação não consegue ver. Todos temos acesso a mídia: televisionada, ouvida, lida. Até onde chegaremos? O que define o homem contemporâneo, que está perdendo sua intimidade, sua individualidade? E ao falar em individualidade, voltamos ao ponto: se nós adultos, somos forçados a nos massificar, a nos igualar e lutamos dia-a-dia contra essa imensa força, o que dizer de meninas adolescendo, formando ainda seu sistema de valores, sua individualidade? Procurando no outro, o seu "Eu". Quem é o outro? Talvez a idealização de uma artista televisiva ou de uma " top model" modelada para se tornar um padrão a ser ambicionado em todo seu esplendor .

A vaidade na medida em que se traduz como resultado de uma auto-imagem positiva e identificada com o ser, só pode ser benéfica. Mas o que dizer quando ela é priorizada, de uma maneira tão fortemente distorcida a ponto de ultrapassar questões básicas como a própria saúde – física, psicológica e mental? Algo está profundamente desarticulado, sem referencial nenhum.

O que dizer aos cidadãos que um dia descobrem que suas filhas se prostituíram em função de um ideal de beleza? Que naquele dia em que disseram que iriam dormir na casa da amiguinha ,na verdade passaram a noite em um motel com um estranho, tendo a cumplicidade dos proprietários do estabelecimento . Alguém acredita que uma simples placa advertendo para a proibição de entrada de crianças e adolescentes em motéis é suficiente para coibir a entrada deles e de usuários desse sistema de exploração sexual?

Até onde o fenômeno da erotização de crianças interfere nestes casos? Pesquisas já alertam para o fato de que meninas tem começado seu ciclo menstrual cada vez mais cedo. Mas o fato é: nossas crianças estão sendo cada vez mais forçadas a um amadurecimento, seja físico, mental ou psicológico que está além, muito além da real possibilidade delas.

É preciso que, democraticamente, tentando desatar os nós do pré-julgamento tão fácil, do preconceito tão discutido, encontrar meios para que informações distorcidas sobre nossas realidades cotidianas, comuns, não atinjam frontalmente nossas crianças e adolescentes. É preciso buscar meios de controle de informações. É preciso que a sociedade civil e governo discutam, efetivamente o que mudar. Humildemente, passar a limpo o código de conduta adotado. Esta é uma proposta legítima, embasada no absurdo de constatar que este fenômeno não atinje somente Patos. Esta cidade também sofre das consequências negativas imediatas da cultura do ter, num momento histórico onde, nunca se discutiu tanto a ética e suas implicações.

João Pessoa – PB

Efetiva ação contra a pedofilia.

A VII Caravana Nacional dos Direitos Humanos, prosseguiu para João Pessoa em função de uma denúncia da Pastoral do Menor (ligada à Igreja Católica local) contra um pedófilo que estava atuando na cidade. A denunciante demonstrava preocupação , por saber (através de meses de investigações) que este homem parecia conhecer pessoas influentes na cidade.

Relata a denunciante, que o pedófilo residia em um bairro de classe média e recrutava crianças de 10 e 11 anos residentes no município de Santa Rita, em Marco Moura, um dos bairros mais pobres de João Pessoa, situado a 30 km da Capital.

O conhecimento deste caso, deu-se através de uma das meninas de 10 anos, filha de uma funcionária da própria Pastoral. Assustada com o que presenciou na única vez em que esteve na casa do pedófilo, ela contou para a mãe, que três vizinhas, formando um grupo de crianças , variando entre 10 e 11 anos feequentavam o local.

O começo desta história, dá-se com o aliciamento de uma adolescente de 13 anos por "Lelo" acerca de um ano atrás. Ele a orientava para que convidasse outras amiguinhas, ludibriando-as através de um convite para vender revistas na praia. Antes de sair de Santa Rita, a menor ligava para o telefone celular de "Lelo", avisando da partida do grupo para João Pessoa. Prontamente, ele seguia para a praia para aguardá-las. Ao chegarem na praia, as menores davam conta de que não havia nenhuma revista e sim um carro a esperá-las. Assim, esta adolescente considerada a ‘líder’ do grupo orientava-as a entrar e daí seguiam para a casa do funcionário público.

Chegando, eram recebidas com um "banquete": pizza, hambúrgueres, refrigerantes, doces e toda sorte de guloseimas. Após a rica refeição, seguiam para o banheiro, a fim de tomar um banho – o grupo e o pedófilo. Segundo relato das próprias crianças, ele se definia para elas como um "irmãozinho", e que não lhes fariam nenhum mal. A partir daí, elas se deitavam na cama e eram ensinadas a praticar e a receber sexo oral. Uma delas, segundo relato, sempre filmava ou tirava fotos. Ao final, todas recebiam R$10,00 (dez reais) , cada uma.

A partir do contato estabelecido com o grupo, ele combinava de pegá-las de carro em um sinal de trânsito na Rua Duque de Caxias : "Assim que o sinal fechava a gente entrava rapidinho no banco de trás e ficava abaixada até chegar na casa dele.", relata a menor N.D. E assim, este esquema manteve-se por cerca de um ano.

Em função da suspeita de que este caso poderia estar ligado à rede de pedofilia , a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, solicitou de imediato ao Ministro da Justiça, Exmo. Sr. Dr. Miguel Reali Júnior que a Polícia Federal e o Ministério Público Federal entrassem no caso. Em resposta à solicitação, o Exmo. Sr. Ministro da Justiça designou o Delegado da Polícia Federal Dr. André Luís Epifânio e o Procurador Federal Dr. Antônio Edílio para investigar a denúncia no mesmo dia. Depois de três dias de espera, foi expedido um mandado de busca e apreensão.

Como resultado dessa providência, entramos na casa do acusado que foi preso em flagrante, além de apreendido vasto equipamento (filmadora, fitas de vídeo , CD-ROMs e computador), além de fotografias de crianças em posições eróticas. Quanto ao material apreendido, o pedófilo negou o uso destes para propaganda via internet, declarando que o mesmo era para uso próprio. A pena para o crime de "fotografar ou publicar cenas de sexo explícito ou pornográfico envolvendo criança ou adolescente" , está prevista no artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente , de reclusão de um a quatro anos.

A negativa do acusado talvez tenha como objetivo, livrá-lo da pena de atentado violento ao pudor, considerado pela atual legislação crime hediondo.

O acusado foi solto no dia seguinte.

Trechos dos depoimentos prestados pela denunciante da Pastoral do Menor da Paraíba e das menores vítimas de pedofilia à VII Caravana Nacional dos Direitos Humanos:

 

Denunciante da Pastoral do Menor:

"A gente vê que não há nenhuma vontade da parte do Sentinela** . O Conselho Tutelar quer ajudar, mais por outro lado, os outros não querem colaborar..."

**Programa governamental que visa proteger crianças e adolescentes aliciados pelos exploradores sexuais que objetivam o comércio sexual.

"Ele orientou as meninas; a pequenininha que deu todos os detalhes para a gente, para falar pra gente que ele não queria mais elas, elas não iam mais para lá, que não tinha mais dinheiro e acabou a história. Para poder a menina e a mãe da menina achar que acabou por aí. Enquanto isso, elas continuam indo, inclusive a menorzinha – a de dez anos..."

"Elas que fazem o contanto porque elas já têm o número do celular dele. E aí, ele é quem diz o horário."

"Geralmente vem de três, de quatro e até de duas (meninas)."

"Ele já diz para elas irem para um ponto estratégico, que é perto de um semáforo , onde tem muito movimento. Quando ele chega perto, imediatamente as meninas entram e aproveitam o sinal quando fecha. E aí, ele sai feito um louco, não respeitando nada."

"Ele passa até oito dias sem se encontrar com elas, porque ele tem outras meninas."

"Ele diz que é o pai mais velho. Diz: ‘Olhe vocês são minhas irmãzinhas, não precisa ficar com vergonha. Aqui é tudo família’. Então elas me disseram: ‘Tia, como é que pode se ele diz que é nosso pai, ou a gente somos as irmãs dele, fazer isso como a gente?"

Trechos das menores aliciadas:

T., 10 anos

" Começou que eu conheci uma menina chamada A., ela me levou a primeira vez (...) aí eu fui a primeira vez, fui a segunda com ela."

"Ela disse que quando a gente chegasse lá ele ia brincar de professor com nóis e aí a menina ficou com medo e teve muita vergonha de ficar na frente dele."

" A gente chega, tira a roupa, aí vai tomar banho com ele, depois a gente vai para o quarto dele e depois a gente vai para a cama. E então é pra chupar..."

"Faz uns três meses..."

(Ao ser perguntada há quanto tempo frequenta a casa do pedófilo.)

N., 11 anos

"Aí, eu contei para a minha mãe a aí ela ficou muito triste, doente."

"Aí quando chegou lá, a gente foi de carro, a gente comeu, e aí depois mandaram a gente tirar a roupa. Aí ele perguntou: Quem vai começar hoje? E aí disseram: ‘Um tapinha, um tapinha, um tapinha’."

"E aí eu disse: ‘ Não quero ir não e aí ficou insistindo que eu fosse, aí insistiu, insistiu, e ela disse ‘Não insistir ela não (sic), ela faz o que ela quiser.’, aí ele me disse mais desaforo e aí eu filmei, tirei foto."

"Aí ele mandava pegar no negócio dele, ele dizia que era um brinquedo..."

"Aí depois dele fazer o sexo oral com a gente, ele levava a gente pra praia e tirava muita foto."

F., 11 anos

"Ela não me chamou pra fazer estas coisas. Ela me chamou pra vender revista em João Pessoa, quando chegou lá ela me levou para a casa de um homem, dizendo que era amigo dela. Chegou lá, o homem disse que era pra eu tirar a roupa, aí eu disse que não ia tirar. Ela disse: ‘Agora que tu tá aqui, tu tem que tirar.’ Eu tirei e fiquei sentada e ela começou a chupar o negócio dele. Aí ela disse: ‘Agora vem tu.’ , eu disse ‘eu não vou não’ e ela pegou e disse : ‘É mais agora que tu tá aqui, não tem essa não’. Aí eu peguei e fui. E depois ele disse: ‘Se tu não fizer isso, tu não vai pra casa não.’

Denunciante da Pastoral do Menor:

"A gente vê que não há nenhuma vontade da parte do Sentinela** . O Conselho Tutelar quer ajudar, mais por outro lado, os outros não querem colaborar..."

**Programa governamental que visa proteger crianças e adolescentes aliciados pelos exploradores sexuais que objetivam o comércio sexual.

"Ele orientou as meninas; a pequenininha que deu todos os detalhes para a gente, para falar pra gente que ele não queria mais elas, elas não iam mais para lá, que não tinha mais dinheiro e acabou a história. Para poder a menina e a mãe da menina achar que acabou por aí. Enquanto isso, elas continuam indo, inclusive a menorzinha – a de dez anos..."

"Elas que fazem o contanto porque elas já têm o número do celular dele. E aí, ele é quem diz o horário."

"Geralmente vem de três, de quatro e até de duas (meninas)."

"Ele já diz para elas irem para um ponto estratégico, que é perto de um semáforo , onde tem muito movimento. Quando ele chega perto, imediatamente as meninas entram e aproveitam o sinal quando fecha. E aí, ele sai feito um louco, não respeitando nada."

"Ele passa até oito dias sem se encontrar com elas, porque ele tem outras meninas."

"Ele diz que é o pai mais velho. Diz: ‘Olhe vocês são minhas irmãzinhas, não precisa ficar com vergonha. Aqui é tudo família’. Então elas me disseram: ‘Tia, como é que pode se ele diz que é nosso pai, ou a gente somos as irmãs dele, fazer isso como a gente?"

Trechos das menores aliciadas:

T., 10 anos

" Começou que eu conheci uma menina chamada A., ela me levou a primeira vez (...) aí eu fui a primeira vez, fui a segunda com ela."

"Ela disse que quando a gente chegasse lá ele ia brincar de professor com nóis e aí a menina ficou com medo e teve muita vergonha de ficar na frente dele."

" A gente chega, tira a roupa, aí vai tomar banho com ele, depois a gente vai para o quarto dele e depois a gente vai para a cama. E então é pra chupar..."

"Faz uns três meses..."

(Ao ser perguntada há quanto tempo frequenta a casa do pedófilo.)

N., 11 anos

"Aí, eu contei para a minha mãe a aí ela ficou muito triste, doente."

"Aí quando chegou lá, a gente foi de carro, a gente comeu, e aí depois mandaram a gente tirar a roupa. Aí ele perguntou: Quem vai começar hoje? E aí disseram: ‘Um tapinha, um tapinha, um tapinha’."

"E aí eu disse: ‘ Não quero ir não e aí ficou insistindo que eu fosse, aí insistiu, insistiu, e ela disse ‘Não insistir ela não (sic), ela faz o que ela quiser.’, aí ele me disse mais desaforo e aí eu filmei, tirei foto."

"Aí ele mandava pegar no negócio dele, ele dizia que era um brinquedo..."

"Aí depois dele fazer o sexo oral com a gente, ele levava a gente pra praia e tirava muita foto."

F., 11 anos

"Ela não me chamou pra fazer estas coisas. Ela me chamou pra vender revista em João Pessoa, quando chegou lá ela me levou para a casa de um homem, dizendo que era amigo dela. Chegou lá, o homem disse que era pra eu tirar a roupa, aí eu disse que não ia tirar. Ela disse: ‘Agora que tu tá aqui, tu tem que tirar.’ Eu tirei e fiquei sentada e ela começou a chupar o negócio dele. Aí ela disse: ‘Agora vem tu.’ , eu disse ‘eu não vou não’ e ela pegou e disse : ‘É mais agora que tu tá aqui, não tem essa não’. Aí eu peguei e fui. E depois ele disse: ‘Se tu não fizer isso, tu não vai pra casa não.’

 

ASPECTOS GERAIS DA EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL EM JOÃO PESSOA

João Pessoa é uma cidade que assusta quando se trata do assunto exploração sexual. Por ser a Capital do Estado da Paraíba, há uma confluência de ramificações que exploram sexualmente crianças e adolescentes. A realidade difere de Patos em vários aspectos: a prostituição por ser um meio de lucro fácil, atrae vários menores com características diferenciadas. Crianças muito pobres, vindas de bairros e localidades carentes em torno da capital, podem facilmente ser encontradas nos inúmeros pontos de prostituição: desde o Terminal Rodoviário, passando pelo Mercado Central, várias praças, chegando a prostíbulos requintados como a Granja do Gaúcho onde meninas realizam até oito programas por dia.

As denúncias mais comuns referem-se à prostituição infanto-juvenil, cuja clientela é a de renda mais baixa, nos fornecendo um quadro da miséria em que essas crianças transitam, vivendo muitas das vezes na rua. Algumas chegam a ser pressionadas pela própria família a se prostituírem, para contribuir com o sustento da família.

Dados do começo da década de 90, já indicavam que cerca de mil crianças e adolescentes numa faixa etária compreendida entre os 14 e 16 anos, prostituiam-se em João Pessoa. Hoje, esse número cresceu muito e a idade dos aliciados diminuiu.

Além disso, o turismo sexual também encontrou seu espaço na cidade, reforçado pelo advento de festas como o São João, o carnaval e alta estação.

Os usuários dos serviços têm características muito parecidas com os de Patos, sendo que, no caso de João Pessoa é possível observar estrangeiros e turistas em geral utilizando também desta rede.

Além dos aliciadores, que por vezes saem de João Pessoa indo até Campina Grande e Patos aliciar mais meninas, criou-se nesta capital uma verdadeira indústria do turismo sexual onde os intermediários deste comércio sexual são funcionários de agências de viagens, de empresas aéreas, de hotéis, restaurantes, garçons, motoristas de taxi, etc.

É importante ressaltar que o Estado da Paraíba ainda não formulou o seu Plano de Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil, a fim de que ações mais voltadas para a realidade do Estado possam ser efetivadas.

Exploração sexual em 2001 em João Pessoa:

Dados: Centro da Mulher 8 de Março.

Campina Grande

A cidade de Campina Grande é um dos pontos principais da rota de exploração sexual comercial de crianças e adolescentes da conexão Patos-João Pessoa. Situando-se entre a Capital e Patos. Também já foi o principal centro de exportação de menores para João Pessoa.

Em agosto de 2001, a Comissão dos Direitos Humanos da Câmara dos Deputados recebeu uma solicitação de apoio à adolescente V., na época com 16 anos que fez uma denúncia sobre o esquema de prostituição infantil à Curadoria da Infância e do Adolescente.

font size="2">Chegando em Campina Grande, nos encontramos com V. e sua amiga S. V. não difere das crianças e adolescentes vítmas do aliciamento no Nordeste: teve sua primeira experiência sexual aos 11 anos. Mais tarde, aos 14 anos já fazia programas.

Elas nos relataram a existência de uma rede de exploração sexual comercial, que de tão bem articulada, enviava crianças e adolescentes para João Pessoa, Recife e Fortaleza. Em Recife, elas chegavam a ser "importadas" para a Europa. Relatou-nos que devido a todas dificuldades em que se deparou desde que começou com os programas, resolveu dar um basta, compondo uma lista com 200 nomes de "clientes" estando disposta a revelá-los para a imprensa local.

Outros aliciadores foram citados. Inclusive um que enviava adolescentes aos hotéis, com características físicas e idade solicitadas pelo usuário.

Em função das informações prestadas por elas, a principal aliciadora envolvida, teve sua prisão preventiva decretada e, dias depois, ao ter sua prisão revogada, começaram as ameaças de morte à V. por telefone e represálias em alguns pontos da cidade, por exemplo um "shopping" local.

Em face da situação periculosa que a adolescente estava vivenciando, encontrei-me com o Promotor Público Dr. Erbert Targino, que contactou com a Promotora responsável pela inclusão de testemunhas que sofrem fortes ameaças no Programa de Proteção à Testemunha. Dando prosseguimento ao ato, foi solicitada a inclusão neste Programa.

Porém ao chegar em Brasília, no dia seguinte, soube que V. havia sofrido um atentado, escapando ilesa. Além disso, intimidaram, por telefone, a mãe do Promotor naquela mesma manhã.

Solicitamos urgência na inclusão de V. , através da gerência do Programa de Proteção à Testemunhas e, na semana seguinte, foi-nos informado que ela já não se encontrava mais em Campina Grande, devidamente protegida.

A amiga de V., S. e sua mãe, recusaram-se a serem incluídas no mesmo programa.

Encaminhamento

Em razão das denúncias compiladas neste relatório, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, encaminhará solicitação de providências aos seguintes órgãos públicos:

- ao Ministério da Justiça;

  • Ministério Público Federal,
  • Polícia Federal

- à Secretaria de Ação Social / Ministério da Previdência Social;

- ao Ministério Público Estadual da Paraíba;

  • aos secretários de estado da Paraíba responsáveis pela pasta da cidadania, no sentido de efetivar procedimentos jurídicos e assistenciais a fim de coibir o crime de exploração sexual comercial de crianças e adolescentes em nosso País.

Face às graves denúncias de tráfico e exploração sexual infanto-juvenil, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, também encaminhará o presente relatório à Organização dos Estados Americanos (OEA), através da sua Comissão de Direitos Humanos. Esta iniciativa dá-se em função da morosidade nos atos que se referem à necessidade urgente de se apurar os fatos envolvidos nestes casos e punir os responsáveis.

Breve histórico sobre o desenvolvimento da legislação internacional acerca dos direitos infanto-juvenis.

Em vinte de novembro de 1989, a Assembléia Geral das Nações Unidas celebrou o 30º aniversário da Declaração dos Direitos da Criança. E como parte dessa celebração, constituiu a Convenção dos Direitos da Criança, que se tornou o primeiro instrumento jurídico internacional voltado para a efetiva aplicação dos direitos da criança. Este tratado foi o mais amplamente reconhecido e ratificado na história dos Direitos Humano; onde afirma que a humanidade deve prestar o melhor de seus esforços à criança. Dentre outros países, o Brasil ratificou este instrumento, que serve de base a tantos outros voltados para a proteção da criança e do adolescente em suas diversas frentes de atuação.

Esta Convenção, fruto de um grupo de trabalho instituído pela Comissão de Direitos Humanos da ONU, tem-se desenvolvido de acordo com os acontecimentos que carecem de maior atenção, que se destacam pelo seu poder de malefício nesta faixa etária tão necessitada de proteção por parte da sociedade.

A Convenção dos Direitos da Criança, foi base da Declaração de Estocol mo (agosto/96), definida durante o Congresso Mundial sobre a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, que ampliou a discussão acerca dos vários fatores que contribuem para este fenômeno. Não só a pobreza tem um papel importante na exploração sexual comercial. Os contrastes econômicos, o êxodo rural, a desintegração da base familiar e o consumismo são exemplos de outros fatores que se somam ao quadro de miséria tão bem conhecido nos países em desenvolvimento. É possível observar também que a ausência ou existência de leis inadequadas, ou mesmo o descumprimento da legislação, favorece ainda mais esta rede criminal que se infiltra através da criança, de sua família, de sua comunidade. Assim, ampliam seus efeitos nocivos na sociedade, distorcendo pouco a pouco seu sistema de valores e consequentemente suas referências culturais. Através dessas discussões pôde-se traçar um quadro da intrincada malha de fatos, marcada por características tão sórdidas

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