A
LDO E O “ORÇAMENTO SOCIAL”
A
Lei de Diretrizes Orçamentárias para o orçamento
2002 e a proposta de “Orçamento
Social”
Austregésilo
de Melo
O
projeto de lei que dispõe sobre as diretrizes para a elaboração da Lei Orçamentária
de 2202 foi enviado ao Congresso Nacional antes do dia 15 de abril do presente
ano, portanto dentro dos prazos legais estabelecidos. O texto tem por base a
proposta aprovada para o ano de 2001, com poucas alterações. O artigo 1º
trata da estrutura da lei que compreende os seguintes capítulos:
I
– as prioridades e metas da administração pública federal;
II
– a estrutura e organização dos orçamentos;
III
– as diretrizes para a elaboração e execução dos orçamentos da União e
suas alterações;
IV
– as disposições relativas à dívida pública federal;
V
– as disposições relativas às despesas da União com pessoal e encargos
sociais;
VI
– a política de aplicação dos recursos das agências financeiras oficiais
de fomento;
VII
– as disposições sobre alterações na legislação tributária da União
e
VIII
– as disposições gerais.
Quanto ao primeiro tema, as
metas e prioridades, cabem as seguintes observações: a) deveriam ser
anexadas as metas para o conjunto dos programas constantes do Plano Plurianual,
e não somente aquelas que o governo considera prioritárias, um total de 55.
Assim, o capítulo deveria chamar-se as prioridades e suas respectivas metas;
b) conforme ocorreu no ano passado, o governo insiste em declarar que “na
destinação dos recursos relativos a programas sociais será conferida
prioridade às áreas de menor Índice de Desenvolvimento Humano”. O fato é
que o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento-PNUD
considera na metodologia de cálculo do Índice de Desenvolvimento
Humano, como limite administrativo o “município” e não “as áreas”,
como está definido no texto proposto. Podemos exemplificar: a “área” de
execução tem indicadores altíssimos em determinadas cidades e no conjunto
do pais é um problema sério. Portanto, se fosse levada em conta a expressão
“área”, cidades que enfrentam ou não problemas na “área” da educação
poderiam ser contempladas da mesma forma.
Além disso, na redação
proposta não está definida qual a instituição responsável pela definição
do Índice, cálculo tradicionalmente feito pelo PNUD. Assim, para que não se
incorra no mesmo erro do ano passado, é necessário alterar a redação do
artigo 2º do capítulo I, bem como do anexo nele citado.
Há várias emendas
apresentadas que são de interesse da sociedade brasileira. Cabe aqui
ressaltar que um dos elementos mais importantes a serem discutidos é a
proposta de “Orçamento Social”, que tem por base a emenda apresentada
pela senadora Marina Silva (PT/AC), reproduzida abaixo:
Inclua-se no art. 8º, que
trata dos anexos dos orçamentos fiscais, de seguridade social e de
investimentos das estatais:
“VI – anexo do
orçamento social, composto pelas dotações orçamentárias referentes às
funções de assistência social, desportos e lazer, direitos da cidadania,
educação, gestão ambiental, habitação, organização agrária,
saneamento, saúde, trabalho e urbanismo.
§1º A programação de
despesas constante do orçamento social é de execução obrigatória, salvo
se aprovada pelo Congresso Nacional solicitação, de iniciativa do Presidente
da República, de cancelamento ou contingenciamento total ou parcial de dotação.
§2º A solicitação de que
trata o parágrafo anterior somente poderá ser formulada no prazo de cento e
vinte dias contado da data de publicação da lei orçamentária anual e será
acompanhada de justificativa pormenorizada das razões de natureza técnica,
econômico-financeira, operacional ou jurídica que impossibilitem a execução
daquelas despesas.
§3º A solicitação poderá,
ainda, ser formulada a qualquer tempo em situações de calamidade pública ou
de crises que afetem a arrecadação da receita, vetada a edição de medidas
provisórias”.
A proposta da senadora foi
apresentada com a seguinte justificativa:
“Esta proposta de emenda à
LDO tem como principal objetivo a criação do orçamento social, entendido
este como o conjunto das cotações orçamentárias dos programas referentes
à educação, saúde, assistência social, habitação, urbanismo,
saneamento, trabalho, direitos da cidadania e reforma agrária.
Na forma prevista no Art. 165
da CF, §5º, não se constata uma divisão adequada das diversas modalidades
de despesa (fiscal e seguridade) em função de sua finalidade básica, tais
como a de provimento de serviços básicos à população, a da manutenção
da máquina administrativa, a de intervenção governamental na estrutura
produtiva e a de financiamento do sistema de seguro social, entre outras.
Um dos problemas que se
pretende resolver está relacionado ao fato de que os gastos sociais são
tratados em segundo plano, em face da prioridade dada ao pagamento dos juros e
encargos da dívida pública. Vários aperfeiçoamentos precisam ser feitos na
estrutura orçamentária brasileira para que o orçamento venha a
constituir-se em efetivo instrumento de planejamento e execução de políticas
públicas.
O Orçamento tem sido tratado
como se tivesse um caráter puramente autorizativo, permitindo que o resultado
da etapa executada no Congresso Nacional seja alterado unilateralmente pelo
Poder Executivo, passando a refletir prioridades voltadas claramente para a
geração de superávites primários crescentes nas contas governamentais, em
detrimento da área social e do desenvolvimento econômico.
Propomos tornar obrigatória
a execução das despesas sociais, com as ressalvas necessárias para os casos
de calamidade pública ou frustração de receita. É certo que os
parlamentares cumprem seu papel constitucional ao participar da elaboração,
implementação e avaliação das políticas públicas. Todavia, mais
importante que isso é fazê-lo de forma ética, cumprindo essa missão da
melhor forma possível. Daí a necessidade de se rever, incansavelmente, os
procedimentos adotados em todas as fases aqui mensionadas, acompanhando não
apenas as novas necessidades que se apresentam, como também as novas
possibilidades técnicas e institucionais disponíveis.
A VI Conferência Nacional de
Direitos Humanos, realizada em Brasília, de 30 de maio a 1º de junho,
definiu, entre suas resoluções, a necessidade de que o Congresso Nacional
aprove o “Orçamento Social” e recomendou a Comissão de Direitos Humanos
da Câmara dos Deputados que incorpore esta proposta.
No entanto, o relatório
apresentado para o projeto de LDO segue um outro caminho, que corresponde à
orientação do governo federal. Isso pode ser constatado pelas seguintes citações:
-
“A análise do PLDO/2002 teve como plano de fundo a delicada
situação econômica pela qual passa a economia brasileira – a par do que
ocorre com seus principais parceiros econômicos – e a crise energética que
demonstrou ser urgente a apropriação de investimentos nesse setor”;
-
“A proposta de LDO reafirmou o compromisso do governo com o
ajuste fiscal. Longamente adiado, o equilíbrio das contas públicas é
fundamental para a consolidação da estabilidade microeconômica. Fundamental
porque é elemento-chave para a credibilidade da política econômica, cuja
ausência determinou o fracasso de outros planos de estabilização no
passado”;
-
“O substitutivo que apresento mantém integralmente as metas
fiscais propostas pelo governo. Superávit primário de R$ 26,4 bilhões para
o governo central e de R$ 5,3 bilhões para as empresas estatais. Esses
valores somados ao que se projeta de superávit para estados e municípios darão
ao setor público consolidado superávit primário de 3% do PIB, valor
expressivo em qualquer economia”.
Na opinião do INESC, incluir
o conceito de Orçamento Social na LDO significa um grande avanço para a
sociedade brasileira, porque contribui para inverter a prioridade do orçamento
público, atualmente direcionado unicamente para o pagamento dos juros e
encargos das dívidas públicas interna e externa em cumprimento ao ajuste
fiscal acordado com o FMI.
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