
A
Constituição e os Direitos Ambientais
A
constituição Federal, além de ser a lei maior do País,
da qual dependem todas as outras normas jurídicas, pode
ter um papel jurídico-político fundamental nas lutas
para a consignação e criação de novos direitos.
A Lei Magna estabelece os princípios e
estruturas basilares do Estado brasileiro, os parâmetros
a partir dos quais se constróem as instituições e as práticas
jurídicas da sociedade.
Nossa Constituição, como apresenta normas
pragmáticas, cuja aplicação depende da edição de
outras leis e normas auto-aplicáveis, é um documento
ainda em construção, principalmente porque faltam inúmeras
leis para tornarem vivos grande parte dos direitos
constitucionais. Assim, ainda falta constitucionalizar o
Brasil. De certa forma, o poder constituinte, no que tange
a concretização de direitos, ainda está para ser
exercido.
Como foi visto, a Constituição é um
documento aberto e geral e, por isso, útil para
fundamentar propósitos, princípios e lutas pela
transformação da sociedade.
No âmbito dos direitos ambientais, a
Constituição ora vigente (que poderá ser devastada em
1993) traz um conjunto de princípios, direitos e
instrumentos de grande valia para a participação popular
no sentido do respeito aos direitos ambientais. A presente
Constituição tem a originalidade de ter um capítulo
específico dedicado ao meio ambiente. Mas não é só
isso: a lei maior, em seu corpo de normas, estabelece um
conjunto de princípios, instrumentos, faculdades e obrigações
de grande valia para as lutas por um ambiente mais
adequado.
8.1.
O Direito de Associação
A possibilidade de organização de defesa do
meio ambiente está prevista no art. 5º, XXI da Constituição
Federal e, dá às entidades associativas a legitimidade
para representar seus filiados judicial ou
extrajudicialmente, quando expressamente autorizadas.
A possibilidade do exercício da cidadania
ambiental juridicamente organizada está aberta pela
Constituição, sendo um direito maior na hierarquia das
leis brasileiras.
8.2.
O Mandado de Segurança Coletivo como Direito das Associações
Para a proteção de direito líquido e certo
não amparado por “habeas corpus” ou “habeas
data”, caberá o mandado de segurança, quando o responsável
pela ilegalidade ou o abuso de poder for autoridade pública
ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições
do Poder Público, como prescreve o art. LXIX, da
Constituição Federal.
O mandado de segurança coletivo é uma
prerrogativa das associações legalmente constituídas e
em funcionamento há pelo menos 1 (um) ano, em defesa dos
interesses dos seus membros ou associados, por determinação
do art. 5º, LXX, b, da Constituição Federal.
Assim, as entidades ambientalistas, com mais
de um ano de existência na data da impetração do
mandato de segurança coletivo, poderão exercer essa
medida em favor de seus associados, na defesa dos direitos
ambientais líquidos e certos.
8.3.
A Ação Popular
O art. 5º, LXXIII da Constituição Federal
concede a qualquer cidadão a legitimidade para propor ação
popular que vise, dentre outros, anular ato lesivo ao meio
ambiente e ao patrimônio histórico e cultural.
A ação popular, como instrumento processual
dos movimentos ambientalistas, será analisada mais
adiante.
8.4.
Os Bens da União
A União, por deter um conjunto de bens, tem
a responsabilidade de preservá-los e usá-los de modo
racional, sendo possível aos cidadãos exigir essa
conduta, já que são bens públicos, voltados
constitucionalmente, à realização do bem comum. A União
detém bens que são seus, de seu domínio, que recebem a
dominação de bens dominais, mas ela também é responsável
pelos bens de uso comum do povo, não podendo permitir sua
degradação ou destruição.
Assim, o
art. 20 da Constituição Federal prevê como bens da União
as terras devolutas indispensáveis à preservação
ambiental, definidas em lei (II); os lagos, os rios e
quaisquer correntes de águas em terrenos de seu domínio
como os terrenos marginais nas zonas limítrofes com
outros países, as praias marítimas, as ilhas oceânicas
e as costeiras (IV); os recursos naturais da plataforma
continental e da zona econômica exclusiva (V); o mar
territorial (VI); os terrenos de marinha, inclusive os do
subsolo (IX); as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios
(XI); além dos que hoje a ela pertencem ou vierem a ela
ser atribuída (I).
O rol apresentado mostra que os bens de domínio
da União são bens de todos os cidadãos brasileiros, são
patrimônio comum de todos, sob a tutela da União. Logo,
todos os cidadãos têm o dever democrático de preservá-los
e estarem atentos à destinação que lhes é dada. Como
ficou evidente, esses bens podem sofrer pesadas agressões
de toda natureza. Cabe aos movimentos ambientalistas
desenvolver ações preventivas ou reparadouras para
manter esse patrimônio nacional. É um imperativo da própria
Constituição e um mandamento básico da democracia.
8.5.
A Competência da União
A União tem um conjunto de atribuições
cujo cumprimento deve ser exigido pela participação dos
cidadãos. O desvio dessas orientações poderá, ainda
mais, degradar o meio ambiente e criar situações onde a
desigualdade social e os efeitos deletérios sobre as
populações serão aguçadores da justiça e pobreza de
nosso País.
Cabe à União explorar, diretamente ou
mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços
e instalações de energia elétrica e o aproveitamento
energético dos cursos d’água, em articulação com os
Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos
(Art. 21, XII, b, da Constituição Federal.
Vê-se que o impacto social e ambiental das
construções de usinas hidrelétricas deve ser estudado
cuidadosamente pela União e fiscalizado pela cidadania,
tanto no que se refere à construção, quanto ao que diz
respeito aos efeitos naturais, sociais e econômicos, após
a entrada em funcionamento. Esse é um dever e uma
prerrogativa constitucional da cidadania organizada.
A União, pelo art. 21, XII, c, da Constituição
Federal poderá também explorar, nas mesmas condições
descritas para o aproveitamento do potencial energético,
a navegação aérea, aeroespacial e a infra-estrutura
aeroportuária. Ora, como todos sabem, graves problemas de
poluição do ar, de poluição sonora e de degradação
do meio urbano marcam essas atividades, devendo a
cidadania exigir da União que aja segundo os princípios
constitucionais de respeito ao meio ambiente.
Os serviços de transporte ferroviário, aquático,
rodoviário interestadual e internacional e os postos marítimos
fluviais e lacunas também são explorados, da mesma
forma, pela União (art. 21, XII, d, e, f, da Constituição
Federal). Também aí aparecem as possibilidades de danos
ambientais, seja na abertura de rodovias e ferrovias, seja
pelo uso dessas vias de utilização equilibradas de
portos, vias hídricas, ferrovias e rodoviárias é uma
exigência constitucional que deve ser implementada pela
cidadania organizada.
Cabe à União instituir o sistema nacional
de gerenciamento de recursos hídricos, definindo critérios
de outorga de direitos de seu uso, assim como instituir
diretrizes para o desenvolvimento urbano, habitação,
saneamento básico e transportes urbanos, além de
estabelecer as diretrizes do sistema nacional de viação
(art. 21, XIX, XX, XXI da Constituição Federal). Essas
tarefas, de importância primordial para o País em termos
sociais, econômicos, políticos e ambientais, não podem
ser desenvolvidas sem a participação da sociedade
organizada na fixação dessas diretrizes, um direito
inerente à vida democrática.
À União compete explorar os serviços e
instalações nucleares de qualquer natureza, exercendo o
monopólio estatal sobre a pesquisa, lavra,
enriquecimento, reprocessamento, industrialização e comércio
de minérios nucleares e seus derivados (art. 21, XXIII da
Constituição Federal). Tal exploração se dá segundo
os seguintes princípios e condições: admissão de
atividades nucleares somente para fins pacíficos (art.
21, XXIII, a); a utilização de radioisópotos só será
autorizada para fins medicinais, agrícola, industriais e
atividades análogas (art. 21, XXIII, b); a
responsabilidade civil por danos nucleares independe de
culpa (art. 21, XXIII, c).
Os problemas de Angra I, de Goiânia, dos
efeitos da saúde oriundos de atividades ligadas à
energia nuclear no Brasil mostram a importância da vigilância
social afim de que a União mantenha sua conduta dentro
dos princípios institucionais. Ademais, cabe-se que a
tentação belicista aparece intermitentemente nesse
campo. Basta lembrar a questão de Serra do Cachimbo, onde
um buraco formalmente aberto para abrigar lixo atômico
era, na realidade, um local para explosões atômicas
subterrâneas. Em casos como este, abre-se a possibilidade
de luta política, por via de denúncias da luta jurídica,
para demonstrar a inconstitucionalidade da conduta,
desencadeando medidas coercitivas no sentido do abandono
dessa política e imposição das sanções cabíveis. Em
lutas como essa, é de muita importância a participação
da comunidade científica para subsidiar as propostas e
exigências fundamentais dos cidadãos.
Também é de competência da União
estabelecer as áreas e as condições para o exercício
da garimpagem, sob forma associativa (art. 21, XXV). Tanto
a garimpagem como a mineração industrializada são
devastadoras do meio ambiente. Como cabe à União a
propriedade dos bens minerais, sua exploração e a
regulamentação da garimpagem, as licenças, concessões
e autorizações devem estar sob constante vigilância dos
cidadãos, assim como a definição de áreas onde serão
desenvolvidas essas atividades. As organizações
ambientalistas devem estar atentas aos atos
administrativos vindos da União, assim como as normas jurídicas
que definam princípios, áreas, tipos e destinatários
dessas atividades.
8.6.
A Competência Legislativa da União
À União compete legislar privativamente,
dentre outros, sobre direito civil, comercial, penal,
processual, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial,
do trabalho (art. 22, I). também tem a faculdade de
legislar sobre desapropriação (art. 22, II), águas,
energia, informática, telecomunicações e radiodifusão
(art. 22, IV); regimes dos portos, navegação lacustre,
fluvial, marítima, aérea e aeroespacial (art. 22, X);
jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia
(art. 22, XII); populações indígenas (art. 22, XIV) e
atividades nucleares de qualquer natureza (art. 22, XXVI).
A luta jurídica da cidadania ambiental tem
como um de seus aspectos fundamentais a participação no
processo de discussão e aprovação de leis no Congresso
Nacional, além da fiscalização das normas jurídicas
oriundas do Poder Executivo.
Não basta lutar pela eleição de candidatos
comprometidos com as causas ambientalistas. É preciso que
as duas casa do Congresso sofram pressões e sejam
subsidiadas para elaborar leis conseqüentes e
fundamentadas no princípio de respeito ao meio ambiente.
É preciso também atentar para a eficácia e
aplicabilidade da norma editada, evitando leis que não
sejam auto-aplicáveis, pois aquelas que são dependem de
regulamentação, sempre ficam à mercê de jogos de
interesse, que podem atrasar, por longo tempo, sua entrada
em vigor. Como exemplo, lembramos a própria Constituição
Federal, ora tratada, que apresenta uma centena de normas
que não entraram em vigor, sendo que, muitas delas, nunca
entrarão, dada a possível revisão constitucional de
1993.
Assim, os movimentos ambientalistas,
observando a competência legislativa da União, poderão
exercer uma ação mais profunda, pois não se pode falar
em eficácia de direitos ambientais, sem que os direitos
civis dos cidadãos estejam claramente definidos. Nem será
possível uma luta jurídica eficaz, se os instrumentos
processuais não resguardam de modo mais simples e rápido
os direitos reivindicados. Além disso, se as punições
forem pífias, os direitos ambientais continuarão a ser
desobedecidos, já que o lucro com a desobediência é
infinitamente maior que as penas aplicadas. Direitos
ambientais não serão promovidos se a estrutura fundiária
do País continuar a mesma. Sem a fixação do homem na
realidade rural, sen o reconhecimento da cidadania do
homem da terra não haverá possibilidade de tratarmos com
a devida amplitude as questões ambientais.
Quando é dada à União a competência de
legislar sobre trabalho, que é a forma do homem intervir
na natureza para dela tirar seu sustento, produzindo bens
e agredindo o meio ambiente, emerge o ponto nodal da questão.
Em verdade a agressão ao meio ambiente é iniciada pela
própria exploração de mão-de-obra, invade as condições
de trabalho, desemboca nos efeitos dos produtos na
sociedade e nos resíduos que a produção propicia. Para
terminar essa cadeia, há a desigual distribuição dos
produtos, que, como um círculo vicioso reinicia a mesma
trajetória. Ainda é preciso lembrar que, enquanto o
trabalho for um agente embrutecedor e alienador do ser
humano, ele é um fator impeditivo do aumento da consciência,
participação e de plenificação dos seres humanos.
A desapropriação, por interesse, do equilíbrio
ambiental é uma prerrogativa constitucional da União,
que deve ser exigida pela cidadania organizada.
Os outros aspectos relativos às águas,
navegação, jazidas minerais e atividades nucleares falam
por si mesmos, não necessitando de maior aprofundamento.
Resta aqui tratar das populações indígenas
que vêm sendo reduzidas desde o descobrimento
do Brasil. As populações sofrem três tipos de
agressões: o genocídio, trazido por sua eliminação física;
o etnocídio, representado pela morte de suas culturas e a
morte econômica proporcionada pela retirada das condições
básicas para desenvolverem seu modo de produção.
São essas ricas culturas indígenas, repositório
de conhecimento milenares relativos às relações do ser
humano com o meio ambiente. Saber que vão desaparecer na
história, graças a uma visão predatória e arrogante da
nossa cultura dominante, é um chamamento em sua defesa.
Logo, a busca de uma legislação adequada e,
principalmente, de práticas adequadas para os povos indígenas
se enquadra no leque de preocupações dos movimentos
ambientalistas.
8.7.
A Competência Comum da União, Estados, Distrito Federal
e Municípios
Cabe a esses quatro patamares de poder zelar
pela guarda da Constituição, das leis e das instituições
democráticas e conservar o patrimônio público, conforme
prescreve a art. 23, I, da Constituição Federal. Está aí
a base para as pressões legislativas, para as medidas
processuais perante o judiciário e para os movimentos políticos,
no sentido de respeito e zelo aos mandamentos
constitucionais, aos princípios democráticos e à
preservação do patrimônio público. A legislação e a
legitimidade para a ação está fundamentada nesta norma
ora citada. Este preceito também confere abrangência à
ação dos movimentos ambientais, pois eles podem agir
tanto no âmbito federal, como estatal, do Distrito
Federal e municipal.
Outra competência comum está prevista pelo
art. 23, II, da Constituição Federal: às citadas
esferas de poder, cabe cuidar da saúde e assistência pública,
da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência.
Logo, toda e qualquer conduta social ofensiva à saúde
deve ser denunciada e os órgãos próprios devem ser
acionados. Em caso de omissão do Executivo, cabe pedir em
juízo a concretização desse direito à saúde.
A proteção do meio ambiente e o combate à
poluição em qualquer de suas formas, também é de
competência comum, conforme determinação do art. 23,
VI, da Constituição Federal. Isso significa dizer que a
proteção do meio ambiente e o combate à poluição são
obrigações exigíveis
da União, Estados, Distrito Federal e municípios.
A preservação das florestas, da fauna e da
flora também é outra obrigação constitucional comum e
prescrita pelo art. 23, VII, da Constituição Federal. A
legalidade e a legitimidade democrática desses portadores
de poder estão condicionadas pelas obrigações aqui
descritas. Isso dá a significação jurídica e política
das lutas pelo respeito aos mandamentos da Constituição,
que será tanto mais viva, quanto mais a cidadania
sinsignar, pois as obrigações do Estado, correspondem a
direitos do povo.
Também é de competência comum combater as
causas da pobreza, os fatores de marginalização,
promovendo a integração social dos setores
desfavorecidos (art. 23, X); o registro, acompanhamento e
fiscalização das concessões de direitos de pesquisa e
exploração de recursos hídricos e minerais em seus
territórios (art. 23, XI). Como é sabido, não é possível
tratar do meio ambiente sem nele colocar o ser humano, que
dele faz parte, nele interfere e é interferido. A pobreza
e a marginalização são também agressões ao meio
ambiente.
8.8.
A Competência Legislativa Concorrente da União, Estados
e Distrito Federal
No âmbito da legislação concorrente, cabe
à União tão-somente estabelecer normas gerais (art. 24,
1º) o que não exclui a competência suplementar dos
Estados para atender suas peculiaridades (art. 24, 2º).
No caso de inexistência de normas gerais, os Estados
exercerão a competência plena, para atender as suas
peculiaridades (art. 24, 3º). Se houver uma lei federal
superveniente, sob forma de normas gerais, a eficácia da
lei estadual é suspensa no que colidir com a primeira
(art. 24, 4º).
É segundo esse mecanismo que se desenvolvem
as competências concorrentes, que possibilitam aos
Estados legislar em função de suas peculiaridades, de
modo suplementar, ou de forma plena, se não houver lei
federal abrangente sobre a matéria.
Nessa situação se enquadram as normas
legais sobre florestas, caça, pesca, fauna, conservação
da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção
do meio ambiente não se restringem no âmbito federal,
mas também é possível no estadual, o que abre mais uma
frente de luta para a cidadania ambiental.
8.9.
O Meio Ambiente e as Atribuições do Congresso Nacional
O art. 49 da Constituição Federal dá como
competência exclusiva do Congresso Nacional a aprovação
de iniciativas do Poder Executivo referentes a atividades
nucleares (XIV); a autorização de referendo e a convocação
de plebiscito (XV); a autorização, em terras indígenas,
de exploração e aproveitamento de recursos hídricos e
da pesquisa e lavra de riquezas minerais (XVI); e a aprovação
prévia da alienação ou concessão de terras públicas
com área superior a 2.500 ha. (dois mil e quinhentos
hectares).
O artigo citado estabelece competências
exclusivas do Congresso em áreas ligadas às questões de
meio ambiente, impedindo que o Poder Executivo tome
medidas unilaterais e sigilosas quanto à aplicação da
energia nuclear, evitando a reprodução do genocídio e
etnocídio nas terras indígenas e coibindo a alienação
de terras públicas de mais de 2.500 ha, sem que seu
impacto social, econômico e ambiental seja avaliado e a
lisura do negócio controlada.
Mas, a grande contribuição deste texto está
na concretização normativa da democracia direta, com a
introdução do referendo e do plebiscito. Eles são
instrumentos de participação que transcendem o exercício
representativo da democracia. Por eles, o povo se
manifesta diretamente sobre assuntos fundamentais a serem
decididos. A opção não será feita nos estritos limites
dos poderes constituídos, mas, para viger, deverá passar
pela aprovação popular.
Enquanto o referendo é um instrumento pelo
qual o povo sanciona, ou recusa as leis pelo voto, o
plebiscito é um procedimento pelo qual os poderes
constituídos convocam o povo para se manifestar, pelo
voto, a fim de subsidiar uma decisão.
Ora, os problemas do meio ambiente podem
levar à necessidade de decisões graves, que poderão ser
objeto de manifestação popular na busca de decisões
mais democráticas ou de leis com base na vontade da
cidadania. São procedimentos jurídicos, políticos,
educacionais e oportunidade para a organização maior dos
movimentos ambientalistas, constituindo-se no exercício
de uma cidadania ativa.
Os
movimentos de participação ambiental, quando
conveniente, poderão exigir do Congresso Nacional que
autorize o referendo ou convoque o plebiscito, a fim de
que a população decida sobre a melhor decisão a ser
implantada
8.10.
Defesa Nacional e Meio Ambiente
A Constituição de 1988, ao criar o Conselho
de Defesa Nacional, enquanto órgão de consulta do
Presidente da República, ampliou o conceito de defesa e
espancou do texto constitucional alguns resquícios da
antiga concepção de segurança nacional. O Conselho de
Defesa Nacional, previsto pelo art. 91, é um conselho de
defesa do estado democrático, e poderá vir a ser chamado
para opinar sobre assuntos relacionados com a preservação
e a exploração dos recursos naturais de qualquer tipo
(art. 91, 1º, III). Esse Órgão é formado pelo
vice-presidente da República, Presidente da Câmara dos
Deputados, Presidente do Senado Federal, Ministro da Justiça,
ministros militares, Ministro das Relações Exteriores e
Ministro do Planejamento (art. 91, I a VII). Também é
uma instância onde o trabalho político pode ser
desenvolvido pela cidadania, a fim de que teses e projetos
dos movimentos sociais sejam discutidos.
8.11.
A Legislação Ambiental como um todo
A legislação ambiental é esparsa, fragmentária
e advém de várias fontes, por isso, o acesso a seus
conteúdos específicos se torna difícil. Esforços
respeitáveis para reuni-la são representados pelo
trabalho Ecologia e Meio Ambiente, Brasília, IBAMA, 1992.
Essa fragmentação traduz uma visão ainda
pontual do meio ambiente, não o integrando em totalidades
que alarguem aspectos políticos,
sociais, científicos, naturais e técnicos. Tem-se
a impressão de que os temas normados existem
independentemente. Parece que as legislações mais
recentes começam a manifestar uma concepção mais
totalizadora.
Como já foi vista, os princípios maiores,
que informam a legislação ambiental brasileira, estão
consignados no art. 225 da Constituição Federal.
O documento jurídico mais consistente em
definir objetivos para uma ação ambiental é a Lei nº
6.938, de 31 de agosto de 1981, que define a Política
Nacional do Meio Ambiente. Os objetivos citados estão
expressos em seu art. 4º a compatibilização do
desenvolvimento social com a preservação da qualidade do
meio ambiente e do equilíbrio ecológico; a definição
das áreas prioritárias de ação governamental relativa
à qualidade e ao equilíbrio ecológico, atendendo às
diversidades regionais; o estabelecimento de critérios e
padrões de qualidade ambiental e de normas relativas ao
uso e manejo de recursos ambientais; o desenvolvimento de
pesquisas e de tecnologias nacionais orientadas para o uso
racional de recursos ambientais; a difusão de tecnologias
de manejo do meio ambiente; a divulgação de dados e
informações ambientais; a formação de uma consciência
pública sobre a necessidade de preservação da qualidade
ambiental e do equilíbrio ecológico; a preservação e
restauração dos recursos ambientais com vistas à sua
utilização racional e disponibilidade permanente,
concorrendo para a manutenção do equilíbrio ecológico
propício à vida; e, a imposição, ao poluidor e ao
predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os
danos causados e, ao usuário, da contribuição pela
utilização de recursos ambientais com fins econômicos.
A Lei nº 6.938/81, com as modificações
introduzidas pela Lei nº 7.804, de 18 de julho de 1989,
apresenta um conjunto de instrumentos da Política
Nacional do Meio Ambiente, que devem ser utilizados,
relidos e ampliados pelos movimentos ambientalistas.
Tais instrumentos atingem o estabelecimento
de padrões de qualidade ambiental; o zoneamento
ambiental; a avaliação de impactos ambientais,; o
licenciamento e a revisão de atividades efetivas ou
potencialmente poluidoras; os incentivos à produção e
instalação de equipamentos e a criação ou absorção
de tecnologia, voltados para a melhoria da qualidade
ambiental; a criação de áreas de proteção ambiental
protegidas pelo Poder Público federal, estadual e
municipal, dado seu interesse ecológico; e a criação,
no mesmo sentido, de reservas extrativistas.
Essas determinações são encontradas no
art. 9º, incisos I a VI, da referida lei. Mas, o citado
documento legal vai mais longe, já que detalha modos de
tornar eficaz a ação ambiental.
O art. 9º prevê como instrumento da
Nacional do Meio Ambiente; o Sistema Nacional de Informações
Sobre o Meio Ambiente (VII); o Cadastro Técnico Federal
de Atividades de Instrumentos de Defesa Ambiental (VIII);
o estabelecimento de penalidades disciplinares ou
compensatórias ao não cumprimento das medidas necessárias
à preservação ou correção da degradação ambiental
(IX); o Cadastro Técnico de Atividades Potencialmente
Poluidoras e/ou Utilizadoras de Recursos Ambientais (XII);
além de instaurar, no âmbito da Política Ambiental, o
princípio da prestação de informações obrigatórias,
por parte do Poder Público (XI) e a obrigatoriedade da
divulgação, pelo IBAMA, do Relatório Anual sobre a
qualidade do meio ambiente (X).
Ao Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA),
representado por seus órgãos estaduais, e ao IBAMA,
supletivamente, foi delegada pelo art. 10 da referida lei
a competência de licenciamento de construções, instalações
e atividades potenciais ou efetivamente poluidoras.
Ao IBAMA foi dada a faculdade de propor ao
CONAMA as normas e padrões para a implantação,
fiscalização e licenciamento das obras e atividades
anteriormente citadas (art. 11).
Sob a égide desse poder fiscalizador estão tanto
as entidades particulares quanto as públicas, que
proponham a preservação ou recuperação de recursos
ambientais (art. 11, 2º).
Além da definição do campo de sua incidência
e do estabelecimento de um sistema de controle, a mesma
lei, atualizada pela de nº 7804/89, prevê incentivos a
atividades voltadas ao meio ambiente, como a pesquisa de
processos tecnológicos destinados a reduzir a degradação
da qualidade ambiental, a fabricação de equipamentos
antipoluidores, e iniciativas que propiciem a racionalização
do uso de recursos ambientais (art. 14, I); a perda ou
restrição de incentivos e benefícios fiscais concebidos
pelo Poder Público (art. 14, II); a perda ou suspensão
de participação em linhas de financiamento em
estabelecimentos oficiais de crédito (art. 14º III); e a
suspensão de atividade (art. 14, IV), sem prejuízo de
reparação de danos obrigatória (art. 14, 1º). O art.
15 da mesma lei, também, prevê o aumento das penas até
o dobro, quando houver dano irreversível à fauna, à
flora e ao meio ambiente (art. 15, 1º, I), a). e a lesão
corporal grave (art., 15, II), ou quando o crime é
praticado durante a noite, Domingo ou feriado (art. 15,
III). Finalmente, incorre nos mesmos nos mesmos crimes a
autoridade pública competente que deixar de promover as
medidas tendentes a impedir a prática de delitos contra o
meio ambiente. (art. 15, 2º).
O referido documento legal, como pode ser
visto, tem uma gama de instrumentos que podem e devem ser
utilizados na luta ambiental.
Articulando os mandamentos constitucionais
com os objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente,
temos uma pauta clara para a ação jurídico-política.
Embora existam várias normas mais antigas
regulando o tema ambiental, só mais recentemente é que
aumentaram as edições de documentos legais. Esse fenômeno
pode ser explicado pelo caráter eminentemente agrícola
do País, até os idos de 1940 e pelo de que, entre 1950 e
1970, além da pouca consciência ambiental, as leis
traduziam uma concepção ambígua que, de um lado,
tentava preservar o meio ambiente, e de outro, permitia e,
até, incentivava sua destruição. Para dar apenas um
exemplo, no ano de 1967, foi editada a Lei nº 5.357, de
17 de novembro, que procurava normalizar o lançamento de
detritos no mar. No início do mesmo ano veio a lume o
Decreto nº 221, de 28 de fevereiro, que criou estímulos
à pesca, o que veio gerar problemas para o meio ambiente,
já que essa atividade passou a ser desenvolvida em escala
industrial, por empresas pesqueiras internacionais. Neste
caso, a visão da produção capitalista e da precedência
do econômico sobre o ambiental ficam claras.
Hoje, parece que essa ambigüidade vem sendo
superada, embora, em termos de aplicação, as leis
ambientais deixem muito a desejar. Tal situação impõe
uma ativa, e até mesmo agressiva, participação no
sentido dos seus conteúdos serem aplicados.
Outro documento importante é a Lei nº
5.318, de 26 de julho de 1967, que institui a Política
Nacional de Saneamento e criou o Conselho Nacional de
Saneamento. Como hoje, a leitura da saúde pública é
abrangente, devendo ela ser estudada na teia de relações
que unem (e desunem) os seres humanos e a natureza, o teor
desse documento é de importância para informar as ações
pela saúde pública, um dos aspectos básicos da
constituição do meio ambiente. Vale lembrar, ainda que o
Decreto nº 49.974-A de 21 de janeiro de 1961 1 cria o Código
Nacional de Saúde, tangencia e se imbrica com os
problemas ambientais.
Outro avanço na legislação, hoje
consignado na Constituição e em outras leis é o de
considerar a natureza um bem público, um patrimônio de
todos os seres humanos. O Decreto nº 80.978, de 12 de
dezembro de 1977, promulgou a Convenção do Patrimônio
Mundial, Cultural e Natural, assumindo essa extensão do
próprio conceito de cidadania.
O uso racional do meio ambiente não pode ser
apenas um ideal para o futuro, nem ser expresso por experiências
isoladas. A condição para que isso aconteça passa pela
distribuição racional e justa desses bens, em princípio,
comuns. Por isso, a Lei nº 4.504, de 30 de novembro de
1964, o Estatuto da Terra, tem grande importância para a
distribuição fundiária. É um documento que, ainda, está
à frente dos atuais dispositivos constitucionais sobre a
Reforma Agrária.
Os princípios da proteção e uso racional
do meio ambiente vêm desdobrando-se em vários documentos
legais, dentre eles, a Lei nº 6.902, de 27 de abril de
1981, regulamentada pelo Decreto nº 99.274, de 6 de junho
de 1990, que dispõe sobre a criação de Estações Ecológicas
e Áreas de Proteção Ambiental; o Decreto nº 84.017, de
19 de setembro de 1979, que regulamenta os Parques
Nacionais; a Lei nº 7.661, de 16 de maio de 1988, que
institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro; a Lei
nº 7.735, de 22 de fevereiro de 1989, que criou o
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (IBAMA); o Decreto nº 97.626, de 10
de abril de 1989, que dispõe sobre a realização de
estudos sobre a produção, comercialização, métodos e
técnicas que comportem risco de vida, só para citar
poucos exemplos.
Para a concretização do uso racional do
meio ambiente e de sua preservação, a legislação lançou
mão de vários expedientes para impor regras quanto à
intervenção humana em determinadas áreas. Assim,
relembrando no âmbito público, encontramos os Parques
Ecológicos previstos pela Lei nº 4.771/65 e pelo Decreto
nº 84.017/79, as Estações Ecológicas normadas pela Lei
nº 6.902/81 e pelo Decreto nº 99.274/90, as Reservas
Biológicas previstas pelo art. 5º, a da Lei nº
5.197/65.
Na esfera privada destacamos as já citadas
APA’s delineadas pela Lei nº 6.902/81, pelo Decreto nº
99.274/90 e pela Resolução do CONAMA nº 10/88, e as
ARIE’S, também já citadas, cujas características e
limitações estão listadas no Decreto nº 89.336/84 e
pela Resolução do CONAMA nº 12/89. É preciso, ainda,
ressaltar a criação das Reservas particulares do patrimônio
natural, pelo Decreto nº 98.914/90, que podem ser criadas
por leis ou apenas por decretos.
Podemos dizer, sem sombra de dúvida, que
hoje, a legislação ambiental, embora esparsas, tem princípios
mais claros e uma política tendente à transparência. A
ativação e aperfeiçoamento desse sistema está nas mãos
da cidadania. Ainda é muito importante citar um
instrumento de realização da Política de Meio Ambiente
que é o zoneamento ecológico-econômico, cuja Comissão
Coordenadora foi criada pelo Decreto nº 99.540, de 21 de
setembro de 1990.
O Estatuto da Terra, Lei nº 4.504, de 30 de
novembro de 1964, é de utilidade para uma leitura
intertextual com as normais ambientais. Do mesmo modo, a
Lei nº 4.132, de 10 de setembro de 1962, que define e
dispõe sobre a aplicação da desapropriação por
interesse social pode ter essa leitura.
Os obstáculos são muitos, a começar pelas
elites atrasadas e predatórias, pela baixa consciência
ambiental e social, pela miséria e desigualdade social e,
ainda, pela organização incipiente dos movimentos
ambientalistas.
Quando, em capítulo anterior, acrescentamos
os documentos legais adequados à natureza do problema
tratado, queríamos apenas dar algumas indicações úteis
para o encaminhamento das questões. Aqui, nossa pretensão
foi mostrar que, embora as leis ambientais sejam esparsas,
há um evidente crescimento de certas direções em termos
de princípios e normas. Tais direções serão afirmadas
ou contraditadas pela aplicação das leis na sociedade.
Ora, as leis em si são um repertório que apenas opera se
acionado ou politicamente criticado. Logo, o aperfeiçoamento
ao ordenamento jurídico ambiental não está somente nas
mãos dos diversos órgãos do Estado, mas também na ação
fiscalizadora, vigilante e ética da sociedade destinatária
das normas. As leis são um processo, não são letras
mumificadas. É a cidadania que as faz eficazes, as
modifica ou as suprime.
8.12.
O Papel do Ministério Público
O Ministério Público, pela Constituição,
tem um papel fundamental nas lutas ambientais. Dentre suas
funções institucionais previstas pelo art. 129, estão a
de promover, privativamente, a ação penal pública (I);
zelar pelos direitos assegurados pela Constituição,
promovendo as medidas para sua garantia (II); promover o
inquérito civil e a ação civil pública para a proteção
do patrimônio público e social, do meio ambiente e de
outros interesses difusos e coletivos (III); promover a ação
de inconstitucionalidade ou representação para fins de
intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos
pela Constituição Federal (IV); defender judicialmente
os direitos e interesses das populações indígenas (V).
Pela Constituição vigente, o Ministério Público
alça-se como um órgão de importância p a garantia das
instituições democráticas, do respeito aos direitos
constitucionais e para a tutela dos interesses coletivos
da sociedade.
O direito a um meio ambiente sadio e
equilibrado é prerrogativa de todo cidadão, isto é, das
coletividades que compõem a população brasileira.
Diante disso, cabe aos movimentos ambientalistas levar ao
Ministério Público o conhecimento de fatos,
irregularidades e problemas que prejudiquem os direitos
dos cidadãos e das coletividades, exigindo dele uma ação
saneadora, no âmbito de sua competência. É preciso
lembrar que, hoje, se multiplicam no Ministério Público
brasileiro, curadorias do meio ambiente dedicadas a tratar
exclusivamente dessa natureza de questões.
O Ministério Público é um potenciador
institucional das lutas populares por um meio ambiente
melhor, o que não impede as associações ou entidades de
exercerem seus direitos pelas ações civis, cabíveis,
inclusive a ação pública, conforme prescrição do art.
129, 1º.
8.13.
A Ordem Econômica e o Meio Ambiente
A Constituição, quando define os princípios
gerais da atividade econômica, em seu art. 170, enumera,
dentre outros, os seguintes: a função social da
propriedade (III), a defesa do consumidor (V) e a defesa
do meio ambiente (VI). Esses princípios têm a finalidade
de assegurar a todos uma existência digna segundo os
ditames da justiça social.
Desse modo, nossa lei maior estabelece, para
a ordem econômica, as bases para seu exercício e os
valores que a impelem. Em um País com tantas
desigualdades econômicas, com tantas injustiças e com
tanta miséria, os ditames consignados, nesse artigo
passam a constituir uma bandeira de luta para o
estabelecimento de novos direitos. cabe à cidadania, por
exemplo, realmente social, a função da propriedade.
8.14.
O Meio Ambiente na Política Urbana
As organizações da cidadania ambiental
devem procurar a participação nos conselhos, comissões
e órgãos municipais que planejam e executam a política
de desenvolvimento urbano, a fim de garantir as funções
sociais da cidade e o bem-estar de seus habitantes. Esse
direito pode ser conquistado com base no art. 182 da
Constituição Federal.
A cidade, como já foi visto, é um dos
locais onde mais se aguçam os problemas ambientais. É
nela que os problemas sociais aparecem com mais nitidez,
onde a pobreza e as desigualdades mostram a sua face, onde
os dejetos e resíduos da produção atingem as águas, o
ar, o solo e a saúde dos habitantes urbanos.
Logo, a participação constitucional dos
movimentos ambientalistas na elaboração e execução da
política de desenvolvimento urbano é uma tarefa urgente
e necessária para o exercício democrático.
8.15.
Cultura e Meio Ambiente
A Constituição Federal assumiu um conceito
mais amplo de cultura, definindo os conjuntos urbanos e sítios
de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico,
paleontológico, ecológico e científico, como patrimônio
cultural brasileiro (art. 216, V).
O capítulo que trata da cultura também deu
direitos à comunidade de colaborar com o Poder Público
para proteger o patrimônio cultural brasileiro, por meio
de inventários, registros, vigilância, tombamento,
desapropriação e de outras formas de acautelamento e
preservação (art. 216, 1º) e o art. 68 do ADCT da
Constituição Federal dá aos remanescentes das
comunidades dos quilombos, que estejam ocupando suas
terras, o direito à propriedade definitiva.
Assim, o direito ao meio ambiente sadio não
é mais uma questão econômica e política, mas uma
prerrogativa constitucional da cidadania, podendo o povo
participar do controle do patrimônio cultural,
colaborando com o Poder Público.
8.16.
O Meio Ambiente como Direito Constitucional
A Constituição de 1988 dedica um capítulo
específico ao meio ambiente, aí consignado como um
conjunto de direitos, prerrogativas e obrigações, que
será exercido na medida da participação dos cidadãos
organizados, que poderão torná-lo vivo, ampliá-lo e
dar-lhe eficácia.
8.16.1
Sistematizando, podemos perceber os seguintes direitos:
8.16.1.1.
Todas as pessoas têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado.
8.16.1.2.
O meio ambiente ecologicamente equilibrado é bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida.
8.16.1.3.
É imposto constitucionalmente ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo para as presentes e
futuras gerações.
Por
esses imperativos constitucionais expressos pelo art. 225
da Constituição Federal, o meio ambiente é um direito
de todos, um patrimônio do povo, essencial à sadia
qualidade de vida e que isso, exige-se do Poder Público e
do povo o dever de defendê-lo no presente e para o
futuro. Com isso está criada a obrigação de defesa,
pelo povo, do meio ambiente essencial à qualidade de
vida. Poder Público e coletividade têm a mesma
legitimidade para promover medidas no sentido de defendê-lo.
A base para a organização das comunidades
em torno das lutas ambientais tem sua raiz nesse preceito
constitucional.
8.16.2.
Preocupado em assegurar a efetividade desse direito, o
legislador constitucional incumbiu o Poder Público de
tomar um conjunto de medidas, que podem ser assim
descritas:
8.16.2.1.
Preservar e restaurar os processos ecológicos das espécies
e ecossistemas (art. 225, 1º, I);
8.16.2.2.
Preservar a diversidade e a integridade do patrimônio
genético do País (art. 225, 1º, II);
8.16.2.3.
Fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e
manipulação de material genético (art. 225, 1º, II);
8.16.2.4.
Definir os espaços territoriais e seus componentes e
serem essencialmente protegidos (art. 225, 1º, III);
8.16.2.5.
Promover a alteração ou supressão dos espaços
anteriormente citados tão-somente através de lei, vedada
qualquer utilização que comprometa a integridade dos
atributos que justifiquem sua proteção (art. 225, 1º,
III);
8.16.2.6.
Exigir, legalmente, estudo prévio de impacto
ambiental para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do
meio ambiente (art. 225, 1º, IV);
8.16.2.7.
Dar publicidade ao estudo prévio de impacto ambiental
(art. 225, 1º, IV);
8.16.2.8.
Controlar a produção, a comercialização e o
emprego de técnicas, métodos e substâncias que
comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio
ambiente (art. 225, 1º, V);
8.16.2.9.
Promover a educação ambiental em todos os níveis de
ensino e a conscientização para a preservação do meio
ambiente (art. 225, 1º, VI);
8.16.2.10.
Proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei,
as práticas que coloquem em risco sua função ecológica,
provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais
à crueldade (art. 225, 1º, VII);
8.16.3.
A Constituição também impôs a todo aquele que
explorar recursos minerais a obrigação de recuperar o
meio ambiente degradado, de acordo com laudo técnico de
órgão público competente, na forma da lei (art. 225, 2º).
As
condutas e atividades lesivas ao meio ambiente sujeitarão
as pessoas físicas e jurídicas a sanções penais e
administrativas, independentemente da obrigação de
reparar os danos causados (art. 225, 3º).
A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica,
a Serra do Mar, o Pantanal mato-grossense, e a Zona
Costeira são patrimônios nacionais e sua utilização,
na forma da lei será feita dentro de condições que
assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive,
quanto ao uso dos recursos naturais (art. 225, 4º).
As terras devolutas ou arrendadas pelos
Estados, por ações discriminatórias, necessárias à
proteção dos ecossistemas naturais são indisponíveis
(art. 225, 5º).
A localização das usinas que operem com
reator nuclear só poderá ser definida em lei federal
(art. 225, 6º).
A
partir desta análise que fizemos dos dispositivos
constitucionais, direta ou indiretamente, ligados aos
problemas de meio ambiente, emerge a riqueza do
instrumental jurídico posto a serviço dos movimentos
ambientalistas. Cabe à cidadania tornar esses direitos
ativos, seja exercendo-os, seja forçando sua regulamentação,
quando for necessário. Se as disposições
constitucionais ficarem no papel, certamente elas irão
sendo dissolvidas pelo desuso, perdendo sua significação
original e morrendo para a ordem social. A Constituição
é, talvez, o instrumento mais consistente para
fundamentar a participação popular. Ela se torna mais
forte,
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