Luiz Gonzaga Cortez
Banco
de Dados Militante
Livros
CÂMARA
CASCUDO, O JORNALISTA INTEGRALISTA
LUIZ
GONZAGA CORTEZ
EDITORA GRD
SÃO PAULO - 2002
SEGUNDA EDIÇÀO
O
PROBLEMA SOCIAL NO BRASIL É POLÍTICO
CONTRA
PARTIDOS BURGUESES
O
COMUNISMO SEM VIOLÊNCIA É CÃO
SEM DENTES
O
INTEGRALISMO É O FASCISMO BRASILEIRO
OS
COMUNISTAS SOVIÉTICOS SÃO
IGUAIS AOS DE AREIA BRANCA
CASCUDO
NÃO DEVOLVEU COMENDA DE MUSSOLINI
O
PROBLEMA SOCIAL NO BRASIL É POLÍTICO
“De princípio, quem toma partido,
quem participa, mesmo erroneamente, está
mais próximo do que quem se omite,
seja por motivos pessoais ou princípios
filosóficos”. Ivan Maciel de
Andrade (In “Integralismo: pecado
sem perdão? “, “Tribuna
do Norte”, Natal/Rn, p.13, 29.07.1984)
O escritor Luiz da Câmara Cascudo
(1898-1986), monumento maior da cultura
potiguar, foi um dos maiores divulgadores
da ideologia da Ação Integralista
Brasileira, movimento político conservador
e nacionalista, liderado pelo escritor paulista
Plínio Salgado, entre os anos 1932/1937,
época em que as posições
políticas eram de direita ou de esquerda,
comunista ou anti-comunista, fascista ou
anti-fascista.
Intelectual consagrado na sua terra, Natal/RN,
Câmara Cascudo, ao se tornar o primeiro
chefe da Ação Integralista
Brasleira-AIB, na “Província
do Rio Grande do Norte”, em 1933,
já era um nome conhecido nos meios
culturais e políticos do Rio de Janeiro
e São Paulo, principalmente entre
os grupos conservadores. Dentre os grupos
conservadores de direita, a AIB tornou-se
o primeiro e maior movimento político
de massas no Brasil. A Plínio Salgado,
Miguel Reale, Menotti Del Picchia, Tasso
da Silveira e Gustavo Barroso, juntou-se
Câmara Cascudo, já então
consagrado como o intelectual maior do Rio
Grande do Norte. Por isso, é comum
dizer-se que a AIB reuniu a nata da intectualidade
brasileira dos anos trinta.
A partir daí, a militância
política na AIB/RN foi coadjuvada
com a militância jornalística
na imprensa integralista do Rio de Janeiro
e São Paulo, principalmente no semanário
“A Ofensiva” (mais tarde, em
1936, passou a circular diariamente), responsável
pela divulgação das notícias
do movimento “verde-amarelo”
de Plínio Salgado e do panorama político
internacional com farto noticiário
simpático ao movimento fascista mundial.
Apesar de não termos conseguido efetuar
um levantamento integral das atividades
jornalísticas de Cascudo nas hostes
da AIB, pois não tivemos acesso a
todos os exemplares de “A Ofensiva”,
porta-voz dos camisas verdes, podemos assegurar
que Câmara Cascudo publicou dezenas
de artigos e crônicas em jornais e
revistas integralistas.
Sào variados os temas que Cascudo
abordou quando era um atuante político
e jornalista integralista, pois tratam não
somente da doutrina pliniana, mas, ainda,
do marxismo-leninismo, do comunismo estalinista,
educação e moral comunista,
filosofia chinesa, cinema, música,
história do Brasil, fascismo e nazismo.
Além do jornal “A Ofensiva”,
Cascudo publicou artigos nas revistas de
divulgação do pensamento integralista,
como “Anauê” e “Panorama”,
esta criada pelo jovem escritor e pensador
Miguel Reale, um dos membros da “Câmara
dos Quarenta” e chefe de doutrina
da AIB. Estudioso dos problemas políticos
e econômicos que afligiam o povo brasileiro,
que permanece enfrentando os mesmos problemas
e acreditando num salvador da pátria,
Cascudo escreveu um artigo sobre “A
Dívida Externa do Rio Grande do Norte”,
mostrando como foi feito o primeiro grande
empréstimo pelo Governo do Estado
potiguar.
Como todo integralista, Cascudo foi um jornalista
cristão, anti-burguês, anti-capitalista,
nacionalista, anti-liberal, contra o banqueirismo
internacional que ainda hoje mantém
o Brasil numa situação de
dependência e escravização
financeira.
Em artigo publicado na página três
de “A Ofensiva” (Rio, 31.05.1934)
sobre o problema social do Brasil , Cascudo
diz que “para a burguesia liberal,
governar é arrecadar impostos. Que
importa o sofrimento dos homens? Que importa
o desenvolvimento constante de classes exploradas
ao lado de um pequeno grupo de exploradores?
Que importa o acorrentamento da nação
ao capitalismo estrangeiro? “.
Depois
de lembrar que a questão social sempre
existiu em todos os tempos, “na luta
da aristocracia e a democracia da Grécia
Antiga” , o jornalista Câmara
Cascudo asseverava que “a luta dos
povos é uma luta social permanente
em busca do novo equilíbrio perfeito.
Por isso, queremos a transformação
do Estado num organismo plástico
( uma antevisão da transparência
de Gorbachev, na ex-URSS? ), revolucionário,
capaz de atender as novas exigências
da vida em sociedade.
E
prossegue: “Não queremos negar
a evidência. O Brasil é, por
si mesmo, uma vasta questão social.
Se outras nações, como a Itália
e a Alemanha, reagem contra fatores certos
de decadência afim de conservarem
o esplendor de suas civilizações,
no Brasil a reação é
ainda mais necessária e premente.
É o progredir ou desaparecer de Euclides
da Cunha.
“É o dilema que se apresenta
a nova geração. Ou seremos
capazes de, num gesto viril de mocidade
ativa, romper os preconceitos que atravancam
o nosso caminho, formar um espírito
novo e criador, organizar o Brasil sobre
bases moral e materialmente sólidas,
ou sucumbiremos debaixo dos escombros de
uma pátria retaliada e miserável.
Não é fraseado ôco,
não é demagogia. É
a realidade que se nos apresenta a um exame
sincero. O problema social no Brasil é
político por excelência. Carecemos
de organização em todos os
setores das nossas atividades. A agricultura
agoniza escravizada ao banqueirismo e um
sistema de tributações que
constitui uma extorsão legalizada
ao trabalho da maior classe do país.
“ As populações rurais
reclamam higiene, ensino e salários
justos. Os operários urbanos pedem
trabalho e dignidade. O comércio
aspira a uma estabilidade propícia
ao desenvolvimento dos seus negócios.
No campo intelectual sofremos a invasão
de teorias que serviriam para apressar a
nossa escravização aos potentados
do capitalismo estrangeiro, seja de Londres,
Nova York ou Moscou.
A literatura é afeminada ou destruidora.
Os políticos não se preocupam
senão com posições
mais à mão. “Aprés
nous le deluge”.
Nesse ambiente nasce o Integralismo.
Concepção completa de nacionalismo
sadio e universalismo equilibrado. Uma filosofia
para o Brasil. Uma literatura a serviço
da nação. Libertação
mental da inteligência patrícia.
Um
direito como emanação natural
dos nossos costumes e das nossas necessidades.
Disciplina para conter o egoísmo
dos interesses individuais. Um mestre genial
para que não continue acéfalo
o lugar de chefe da Nação
Brasileira.
Atitude intransigente contra todas as doutrinas
e homens que pretendam confundir a trajetória
da nossa terra que há de ser grande
entre as maiores.
Numa época de ceticismo somos conduzidos
pela fé.
Contra a displicência e a dubiedade,
contra a ausência de atitudes másculas,
envergamos uma camisa verde, simbólica,
como um desafio aos inimigos da pátria.
Sorri-nos
a certeza da vitória. Hoje, amanhã
ou no decorrer dos anos próximos.
O
que importa é a vitória. Ela
virá matematicamente certa. Pacífica,
se for possível, violenta, com sacrifício
do nosso sangue, se a tanto formos levados”.
^
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CONTRA
PARTIDOS BURGUESES
Luiz da Câmara Cascudo, Francisco
Veras Bezerra e Miguel Seabra Fagundes integraram
o triunvirato que dirigiu o movimento integralista
no Rio Grande do Norte, de julho de 1933
a meados de 1934, quando, efetivamente,
passou a chefiar a AIB/RN. Cascudo foi o
primeiro potiguar a comandar a AIB potiguar
de forma efetiva e titular, haja vista que
o professor e historiador Manoel Rodrigues
de Melo assumiu a interinidade da chefia
integralista local quando Cascudo viajou
ao Rio de Janeiro para entendimentos com
Plínio Salgado, Gustavo Barroso,
Olbiano de Melo, os dirigentes nacionais
do movimento.
Em maio de 1934, Cascudo integrou uma comitiva
oficial do Interventor Mário Câmara
que percorreu o interior do Estado. O resultado
dessa viagem foi o livro de reportagens
“Viajando o Sertão”,
publicado pela Imprensa Oficial do Estado,
em 1934. ( A segunda edição
, patrocinada pela Fundação
José Augusto, em 1975, tem prefácio
de Manoel Rodrigues de Melo que, em certo
trecho, transcreve parte do artigo de Cascudo,
publicado no jornal “A República”,
de Natal/Rn, em 04.09.34, em resposta às
acusações do político
“decaído” José
Augusto Bezerra de Medeiros, o “Zé
Promessa”, que questionava o fato
de um chefe integralista viajar com o interventor.
Vale
a pena transcrever o trecho supracitado
para se ter uma idéia de como Cascudo,
na época, considerava os políticos
conservadores e burgueses: “Chefe
Provincial Integralista, miliciano convicto,
considero os partidos políticos meras
fórmulas desacreditadas e incapazes
de renovação social. Não
pertenço a nenhuma agremiação
partidária e mantenho relações
íntimas com vários próceres
que não ignoram a retidão
da minha atitude, assumida publicamente
a 14 de julho de 1934.
Aos camisas verdes de minha Província
não dou explicações,
porque eles me conhecem de perto. Aos políticos
é desnecessária qualquer justificação
em contrário às suas afirmativas,
porque “política é isso
mesmo”.
***
^
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“O
COMUNISMO SEM VIOLÊNCIA É CÃO
SEM DENTES”
Pecar pelo silêncio quando
se devia protestar, transforma homens
em covardes. A . Lincoln.
A obra cascudiana, apesar de vasta, talvez
seja a menos estudada pelos intelectuais
do Rio Grande do Norte e do resto do país.
Nada foi pesquisado sobre Cascudo, o político.
O profundo e extenso trabalho de pesquisas
desenvolvido pela falecida poetisa Zila
Mamede ( 1) não abriu nenhuma vereda
nesse campo, pois, à exceção
de poucas referências a artigos políticos-ideológicos
da lavra de Câmara Cascudo, publicados
no jornal natalense “A República”,
não faz menção a sua
atuação como jornalista, militante,
dirigente e intelectual da Ação
Integralista Brasileira, nos anos trinta.
Câmara Cascudo foi um combativo jornalista
anti-comunista do jornal “A Ofensiva”,
do Rio de Janeiro, sob a orientação
de Plínio Salgado e dirigido por
Madeira de Freitas. O anti-comunismo exarcebado,
o nacionalismo xenófobo, o anti-capitalismo
internacionalista e o misticismo cristão
eram as características da ideologia
da AIB, que possuía uma estrutura
paramilitar, hierarquizada e disciplinada.
Como intelectual integralista, Cascudo tinha
que escrever pró-integralismo e contra
o comunismo, cujas ações e
atividades clandestinas desenvolvidas contra
o governo de Getúlio Vargas eram
acobertadas pela Aliança Nacional
Libertadora-ANL, criada pelo Partido Comunista
do Brasil-PCB e integrada, ainda, por grupos
de socialistas, democratas liberais e oposicionistas
diversos. Portanto, os artigos e crônicas
de Cascuda, na sua maioria, versavam sobre
os assuntos da atualidade política
nacional e internacional, com forte colorido
verde-amarelo e um ojeriza latente ao regime
soviético, Lênin, Stálin,
o Exército Vermelho, a tudo que cheirasse
a marxismo-leninismo.
Na época do Cascudo integralista,
o Brasil vivia a dicotomia de comunismo
e fascismo. Quem simpatizava com o comunismo
se filiava ou colaborava com o PC ou a ANL;
quem se atrevia a combater o comunismo,
o PCB e a ANL, ingressava na Ação
Integralista Brasileira-AIB. A maioria dos
intelectuais brasileiros era conservadora
e estava na AIB e/ou apoiava a ditadura
Vargas, nos anos trinta.
Por isso, não podemos analisar a
militância política dos intelectuais
brasileiros tomando por base os tempos atuais.
Antes de Luiz Carlos Prestes, presidente
de honra da ANL, lançar o apelo às
armas para derrubar Getúlio Vargas,
um gesto considerado precipitado e maluco,
pois a ANL e o PCB não tinham o apoio
das massas populares e as armas dos quartéis,
de forma ampla e integral, o escritor e
chefe da AIB, Plínio Salgado, em
artigo publicado na primeira página
de A Ofensiva, em 1001.1935, dizia: “Fala-se
hoje em conspirações, em preparativos
de golpes de Estado, em confabulações
de políticos, no sentido de apoderar-se,
de surpresa, do poder”(2)
Mais adiante, no mesmo editorial, intitulado
“Direito da Revolução”,
Salgado proclamava: “... Hoje, no
Brasil, só duas correntes têm
o direito de pretender transformar o Estado:
o integralismo e o comunismo. O Brasil e
a Rússia. O integralismo, para fazer
a independência econômico-financeira
da Pátria, sustentando os direitos
do Brasil; o comunismo, para fazer voltar
o Brasil aos tempos da Colônia, substituindo
Dom João VI por Stálin I”.
Pode dar vontade de rir, haja vista que
o comunismo não é sinônimo
de monarquia, mas esse era o estilo do jornalismo
político de direita, na década
de 30.
No dia 1 de março de 1936, nas páginas
10 e 12, no órgão porta-voz
da AIB, Cascudo publicou o artigo “Violência
Bolchevista”, em que procurou mostrar
que o comunismo é sinônimo
de violência, a própria essência
do regime soviético sob a égide
de Stálin. Os violentos combates
travados no Rio de Janeiro e recife e, em
menor grau, em Natal, durante a insurreição
de oficiais, cabos e soldados das guarnições
do Exército, entre 23 e 27 de novembro
de 1935, para derrubar Getúlio, foram
vistos com naturalidade, sem surpresas,
pelo jornalista Câmara Cascudo, pois,
para ele, “o bolchevismo sem violência
é cachorro sem dentes - é
inofensivo e barulhento”.
Dezesseis meses antes da revolução
comunista de Natal, Cascudo publicou em
“A Ofensiva” (01.07.34) outro
violento artigo contra o comunismo e a União
Soviética, com o título sugestivo:
“É Mentira! “. O artigo
era curto e grosso.
Leiamo-lo:
“A
Rússia é um paraíso
onde ninguém entra senão depois
de atos de fé partidária.
É o único país do mundo
inteiro que se conserva fechado dentro dos
seus limites e gelos, defendendo-se por
negação sistemática.
É um céu aberto onde cada
dia morrem dezenas de “felizes”
moradores que pretendem abandonar éden
vermelho e são fuzilados pelas patrulhas
que rondam as fronteiras. Somente na Rumânia
vivem três milhões de russos
que fugiram das delícias soviéticas.
Quando afirmamos esses fatos a resposta
dos bolchevistas é uma só
; -- Mentira! Invenção capitalista!
Calúnia burguesa!
E
não provam nada em contrário.
Continuam cerrando mais e mais as suas portas
e matando quem se atreve a querer abandonar
as supremas alegrias de um regime incomparável.
Ivan
Bunin, prêmio Nobel de Literatura
de 1933, diz que a Rússia é
o inferno vivo dos homens de inteligência.
Bunin é russo e era um revolucionário.
Mentira de Bunin!
Henri Bérard diz que na Rússia
o povo não pode escolher ninguém
para representá-lo. Bérard
é socialista radical.
Mentira de Bérard!
Jorge Popof diz que a Rússia está
debaixo de uma organização
policial sinistra e sanguinária como
nunca se pode imaginar.
Mentira de Popof!
Leon
de Poncin demonstra como nunca o capitalismo
sem pátria e sem alma dominou selváticamente
uma nação como agora a Rússia.
Mentira de Poncin!
Joseph
Douillet, que viveu nove anos na Rússia
escreve que a opressão oficial, a
tortura declarada, as mortes sem processos,
são formas comuns na República
Soviética.
Mentira de Douillet!
George Le Fevre que a morte das iniciativas
russas ante o “moloch” da G.P.U.,
toco mecanismo de espionagem e esmagamento,
são processos oficiais para manter
a população na obediência.
Mentira de Le Fevre!
Sergio
Petrovich Melganov, da União Acadêmica
Russa disse que o regime comunista é
apenas o “terror vermelho”.
Mentira de Melganov!
Nilostonski
chama o governo soviético de “embriaguez
de sangue dirigida por carrascos chineses”.
Mentira de Nilostonski!
Boris
Nolde transcreve as ordens de saques às
populações do interior a palavra
do governo autorizando a violação
de todos os direitos humanos, os horrores
de outubro de 1917.
Mentira de Nolde!
Trotski
acusa Stalin de estar tornando ( desculpem
se é pouco) um simples fascista.
Mentira de Trotski!
Que será verdade, Deus meu?
A
verdade é que a Rússia Soviética
é um paraíso onde todos os
anjos querem sair...
NOTAS;
1 - Luiz da Câmara Cascudo - 50 anos
de vida intelectual - 1918-1968, Fundação
José Augusto, Natal/RN, 1970 - 3
volumes.
2 - “Em meados de 1935, a conspiração
andava no ar. Sentia-se, respirava-se a
revolução, mas tudo parecia
o resultado de um estado insuportável
de insatisfação geral”,
corrobora Leôncio Basbaum, em História
Sincera da República, Editora Edaglit,
São Paulo, 1962, p. 91.
^
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O
INTEGRALISMO É O FASCISMO BRASILEIRO
“Quer
queiramos, quer não, o Movimento
Integralista teve o seu caráter reflexo
e por isso tinha que imitar o comportamento
do fascismo europeu. Era uma ação
político-social, não admitia
partidos, entendia que a nação
era um todo único, indivisível,
se propunha a fazer uma força paramilitar
inteiramente disposta a reivindicar, não
só poder para o partido, como também
se opor ao movimento comunista, que era
muito forte e, sobretudo, muito assustador,
da média e da grande burguesia naquela
época”.
Ovídio da Cunha, um dos fundadores
da AIB no Rio de Janeiro, em depoimento
prestado a revista de Ciência Política,
p. 149, Vol. 02, agosto de 1985 - Fundação
Getúlio Vargas, Rio de Janeiro.
Em
1933, Câmara Cascudo contava com 34
anos de idade (ele nasceu a 30 de dezembro
de 1898) e já era um nome respeitado
na sociedade natalense que conhecia seus
dotes culturais e inteligência, haja
vista que começou a atividade jornalística
aos dezesseis anos no periódico “A
Imprensa”, de Natal/RN, adquirido
pelo seu pai, Francisco Justino de Oliveira
Cascudo, “unicamente visando o filho,
já admirado pela precocidade nas
pesquisas realizadas nos sertões
de sua terra”. (1)
A sua entrada na Ação Integralista
Brasileira/RN, em 14 de julho de 1933, teria
sido influenciada pelo seu vasto círculo
de amizade no mundo intelectual e católico
do Rio Grande do Norte, onde despontavam
nomes como Otto de Brito Guerra, Manoel
Rodrigues de Melo, Miguel Seabra Fagundes,
Ulisses de Góis, dom Marcolino Esmeraldo
Dantas e outros.
Na
década de 30, o Rio Grande do Norte
também passou a sofrer influência
da luta pelo poder que se desenrolava em
todo o Brasil, numa conjuntura em que a
Ação Integralista Brasileira
e a Aliança Nacional Libertadora,
esta fundada pelo Partido Comunista, disputavam
a hegemonia política. E Câmara
Cascudo viu muitos acontecimentos importantes
dessa luta política do alto do casarão
em que residia, na rua Junqueira Ayres,
nos limites dos bairros Cidade Alta e Ribeira,
em Natal, nas reuniões e comícios
integralistas, muitas vezes tumultuados
pela presença barulhenta dos comunistas.
Num casarão situado na praça
7 de setembro, ao lado do antigo Palácio
Potengi, sede do governo estadual, já
demolido, Cascudo e os líderes da
AIB/RN realizaram muitas pregações
aos jovens que por ali passavam.
Um testemunho da época, o falecido
escritor e musico Gumercindo Saraiva, escreveu
que o Rio Grande do Norte, politicamente,
ficou dividido entre Integralismo e Comunismo.,
“duas facções da política
internacional”. Escreveu ele: “O
maestro Waldemar de Almeida, diretor do
Instituto de Música, teve a sua vida
ameaçada por comunistas ferrenhos,
viajando incontinenti ao sul do país,
após o pichamento da fachada da sua
residência em Natal, onde os comunistas,
abertamente, entoavam canções
internacionais, entusiasmando os operários
e alguns incautos da doutrina vermelha”.
Acrescenta Gumercindo que “os comunistas
cantavam “A Internacional”,
insuflados por “pseudos idealistas”,
enquanto os integralistas “cantavam
em vozes estridentes, mas brasileiros, o
Hino Nacional e as canções
patrióticas”. (3)
Datam de 1934 os primeiros artigos artigos
de Luiz da Câmara Cascudo no jornal
“A Ofensiva” , de acordo com
as pesquisas que efetuamos na coleção
incompleta do veículo porta-voz da
AIB, em nosso poder e que pertenceu ao meu
pai, Manoel Genésio Cortez Gomes,
comerciante e ex-agenciador de assinaturas
do jornal católico “A Ordem”,
de Natal e último chefe integralista
no RN.
Em 18 de outubro de 1934, Cascudo publicou
o artigo “Integralismo é Cópia?
“, no qual procura mostrar, em poucas
e percucientes palavras que o integralismo
era o fascismo brasileiro. Antes, o professor
Francisco Veras também afirmou que
o integralismo é a fórmula
brasileira do fascismo que, onde anos antes,
através da revolução
feita por Benito Mussolini, tinha tomado
o poder na Itália. Hitler já
era Chanceler do III Reich alemão,
mas ainda não tinha botado as unhas
para fora e não se conhecia o caráter
perverso e desumano do nazismo. Nessa época,
Cascudo escreveu o seguinte:
O Integralismo é Cópia?
“O
integralismo não é uma cópia.
É a fórmula brasileira do
Fascismo. Aceitamos muitas soluções
internacionais da doutrina sem perder de
vista o elemento nacional onde ela é
chamada a operar.
Cópia
é o bolchevismo teórico de
certos internacionais de pacotilha. Cópia
é a elegância dos nossos “almofadas”,
eternos “faris” das “marionetes”
analfabetas de Hollywood.
Nós somos universalmente interdependentes.
É uma fatalidade social e biológica.
Não creio na autarquia de nenhum
povo porque teremos sempre a impossibilidade
de conciliar produção com
mercados. Se nós brasileiros usássemos
o material exclusivamente nacional, teríamos
outra forma de civilização.
Portugal nos deu o idioma que negros e índios
colaboram. A Europa nos manda tipos de indumentos
e de idéias. Devendo atender aos
reclamos desses aprioristas, falaríamos
Tupy, cercando a cultura com a euduape,
a cabeça com a acanquatara e na mão
o tacape dos Tuixáuas.
Tudo
em nós é uma herança
de milênios. Vive no menor dos nossos
gestos um memorial de gerações
anônimas e colaboradoras. Tradições,
culinárias, roupas, costumes, artes,
tudo veio de longe, em vias misteriosas
ou naturais. Tudo tem passado por um processo
secular de assimilação e de
acomodação lectivas.
Perguntem
ao crítico, que nos diz copiadores,
de onde lhe veio o fumo de seu cigarro,
a linha do seu traje, a palha de seu chapéu,
o corte de seu sapato, o modelo de seu colarinho?
Diga que tudo lhe chegou de fora e de longe,
hoje ou ontem, em sementes ou figurinos,
amostras ou contrabando. Ele não
criou nada. O indumento, o idioma, a culinária,
folclore possuem leis de circulação
e fusão ambientais. São idéias,
formas materiais, universais e que pertencem,
pela peculiaridade que assumem, a todos
os povos.
Assim
o integralismo surgiu brasileiro, para cumprir
o seu ciclo heróico, sem deixar de
ser um pensamento de todos os povos que
se renovam. É uma idéia geral
mais instintiva como a legítima defesa.
Vive em toda parte, mas adquire cambiantes
próprios das regiões onde
se levanta, como uma afirmativa de fé,
ante a matilha troante dos insultadores
da Pátria e da raça.
Nós
não copiamos nenhum fascismo. Sir
Mosley, o grande camisa-negra inglês,
já disse entre aplausos, que a saudação
romana era um patriotismo comum aos povos
cultos. Antes de levantar a mão para
o alto do que ter os dedos metidos na algibeira
do capitalista ou na jaqueta do operário,
pedindo dinheiro ou votos, servos de uma
gleba imóvel e com eterno dono -
“está-se usando”.
Integralismo é uma força que
está em nós mesmos. O raio
é a extensão do Brasil. A
trajetória é o infinito de
nossas almas que se libertaram de todos
os terrores “cósmicos”
ou políticos e se orientam para um
horizonte de trabalho e de justiça
social”.
E
Câmara Cascudo não se preocupava
apenas com o avanço do movimento
integralista no Brasil. Os variados tipos
de fascismos eram motivos de abordagens
e comentários nas colunas de A Ofensiva.
A situação política
na Europa, na Turquia (4), no Irã,
na antiga URSS, interessava tanto quanto
na vizinha República da Argentina,
como verificamos no artigo publicado em
15 de novembro de 1934 (.p.3), “O
fascismo na Argentina”.
“ Fascismo na Argentina? Há
e bem forte Nós não sabíamos
disso. No Brasil, só vivemos a história
das greves, dos discursos de Litvinov e
da saúde de Stalin. O movimento fascista
na Argentina é de combate nacionalista.
Logo, não pode interessar as agências
internacionais, compromissadas em boicotar
todas as manifestações do
espírito das pátrias.
Na
Argentina há fascismo e aptamente
organizado. Há mesmo mais de uma
agremiação mas só falarei
do grupo principal, a “Legião
Cívica”, cujo endereço
do “Comando General “é
Calle Juan Bautista Alberdi, 3251, Buenos
Aires. Estão localizadas as baterias.
A
Legião Cívica tem um chefe
militar e outro civil. O chefe militar é
o general do Exército Argentino Fasola
Castano e tem como ajudante o tenente-coronel
Emilio Kuiquelim. O chefe civil é
o doutor Floro Lavalle. Existe um diretor
de Propaganda e de Imprensa, Dr. Manuel
Rojas Silveira.
“ Os Legionários” usam
blusa cinzento escuro, casquete, bandas
de couro que se entrecruzam no peito, botas
e polainas. Desfilam armados de “casse-tête”
e tem pistola no cinto para casos de urgência.
Inúmeros oficiais do Exército
e da Marinha, estudantes e camponeses, mocidade
das escolas e pequenos proprietários,
estão filiados à Legião
Cívica. Diversos deputados e senadores
tem ostensiva simpatia pelo movimento. Esses
senhores se parecem bem pouco com os nossos
ilustres legislativos....
O grande poeta nacionalista argentino Leopoldo
Lugones é legionário.
A
“Legião Cívica”
tem tido vários encontros sangrentos
com elementos comunistas. Nos desfiles,
paradas e concentrações, é
fácil a tentativa de distúrbio
provocada pelos bolchevistas. O castigo
é imediato e eficaz. A brigada de
assalto entra em ação fulminante
e os “vermelhos” recuam, tocados
a pau e a murro.
A
“Legião Cívica”
se alastra pelas províncias argentinas
e tem uma ideologia mais ampla e mais aproximada
da nossa que sua congenere chilena, dirigida
pelo dr. Julio Schwarzenberg. Também
fascista, armada, municiada e militarizada.
O mais interessante é o amigo argentino,
que me dá estas informações
em carta, adiante, risonho: _ Como pude
ver, en nuestro país, las ideas fascistas
estan más entronizadas que en sua
tierra, y goza de las franquicias atual
e hasta tiene, más o menos encubiertos,
senados y deputados en los parlamentos y
camaras...”
Aí
está para que servem as agencias
telegráficas... Apesar de 300.000
brasileiros provarem a existência
e a vitalidade do fascismo no Brasil, com
vinte e cinco jornais, Chefia Nacional e
departamentos, milícia, desfiles,
choques e vítimas, ali em Buenos
Aires, pertinho, parede e meia conosco,
não se sabe coisa alguma da Ação
Integralista Brasileira.
Há
ou não um “boicote”?
Do
grupo fascista, o da “Revulsion”,
que tem atuação menos militar
mais intelectual, basta citar o trecho inicial
de sua “Declaracion de principios”.
“Somos
nacionalistas por razionamiento y por determinismo
biologico, pero estamos dispuesto a dejar
de serto, si por esto es posible, el dia
que nos entreguéis una tea, hecha
com las banderas de todas las naciones del
mundo, para quemar com ela nuestra nacional:
pero antes.... No!”
Sabiam
da existência desses companheiros
heróicos?
Sabíamos
apenas das histórias do senador socialista
Bravo, das denúncias contra compra
de armas, da literatura esquerdista que
invade as livrarias e da imprensa política,
unilateral, vesga, materializada e idiota.
Dos nossos companheiros “camisas grises”
não sabíamos”.
NOTAS:
1) Câmara Cascudo - musicólogo
desconhecido, de Gumercindo Saraiva, p.12,
1969, Natal/Rn, edição do
autor.
2) Cascudo entrou na AIB por influência
do intelectual cearense Gustavo Barroso,
muito amigo dele, segundo informação
prestada pelo dr. Otto de Brito Guerra ao
autor, no primeiro semestre de 1990, durante
o lançamento do livro de Nestor dos
Santos Lima, “Esqueçam a primavera,
irmão” , no Teatro Alberto
Maranhão.
3) Gumercindo Saraiva, op. cit., p. 17.
4) Na edição de 5 de julho
de 1934, Cascudo saudou a consolidação
do regime de Mustafá Kemal Pachá,
“o grande ditador da Turquia Moderna,
no artigo “Turquia Moderna”.
^
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OS COMUNISTAS
SOVIÉTICOS SÃO IGUAIS AOS
DE AREIA BRANCA
“O
socialismo exige uma enorme tensão
de forças, até chegar
as vítimas. E são cometidos
erros. Eu sei e admito que morreram
muitos comunistas honestos. Eu sou
o responsável por aquela política
e a considero certa. Reconheço
que foram cometidos graves erros e
exageros, mas em linha geral confirmo
que a política estava certa”.
Viaceslav Mikhailovic
Molotov, Ministro do Exterior da URSS
de 1936 a 1956, em depoimento ao escritor
russo Felix Chulev, in ISTO É,
p.50, edição de 28.03.1990.
Quem
tiver oportunidade para comprar o livro
de memórias do legendário
herói soviético, Molotov,
fiel seguidor e aplicador da política
externa da extinta URSS, terá a certeza
de que os textos cascudianos publicados
na imprensa integralista eram procedentes,
verídicos e irrefutáveis.
É claro que Câmara Cascudo,
integrante da cúpula consultiva integralista
brasileira, a Câmara dos Quatrocentos
da AIB, escrevia artigos anti-comunistas
porque a AIB era anti-comunista, assim como
os intelectuais e políticos da ANL
e PCB produziam textos anti-fascistas e
anti-integralistas. Os comunistas combatiam
o imperialismo, o capitalismo, o nazismo
e o fascismo.
Segundo informou o falecido advogado potiguar
Antonio Soares Filho, que foi chefe da Casa
Civil do Governo do Estado do RN, na gestão
de Dinarte Mariz (1956-1961), ele também
escreveu comentários sobre política
nacional e internacional , como correspondente
da imprensa da AIB. “Eu mandei notícias
daqui para A Ofensiva, mas Cascudo escreveu
muito mais do que eu”, lembrou o professor
Antonio Soares, que integrou a Milícia
Integralista e que não se arrependeu
de ter ingressado na AIB com 19 anos de
idade, por considerá-la a melhor
escola de civismo que o Brasil já
possuiu.
Câmara Cascudo foi intelectual admirador
do fascismo italiano, não tenho a
menor dúvida, pois ele mesmo assegurou
que o integralismo é a fórmula
brasileira do fascismo. Cascudo também
foi agraciado com uma medalha enviada especialmente
por Mussolini e que está depositada
no Museu Câmara Cascudo, no Centro
de Natal/RN. Extinta a AIB pelo golpe de
estado de novembro de 1937, Cascudo ainda
colaborou em revistas literárias
controladas por ex-integralistas, como “Cadernos
da Hora Presente”. Mas, logo após
o inicio da Segunda Guerra Mundial, o ex-chefe
provincial da AIB/RN foi designado Secretário
da Defesa Passiva Anti-Aérea de Natal,
atuando em perfeita sintonia com as autoridades
militares e civis brasileiras e americanas.
A maioria dos artigos e editoriais assinados
por Luiz da Câmara Cascudo, na época
em foi admirador Benito Mussolini e Adolfo
Hitler e jornalista integralista, denota
a sua preocupação com a União
Soviética e o movimento comunista
internacional. Em 20 de dezembro de 1934,
A Ofensiva, p. 02, Cascudo comenta o tiroteio
ocorrido na Praça da Sé, em
São Paulo, entre integralistas e
comunistas, que resultou em diversas mortes,
e culpa os comunistas por tentarem massacrar
os “verdes “paulistas. O artigo
tem o título “A violência
comunista”. Diz Cascudo o seguinte:
“Na praça da Sé, os
comunistas mataram o comunismo no Brasil...
A técnica é a mesma. Sangue,
violação, massacre, estupidez
e bestialidade. Na pequenina cidade de Areia
Branca, no Rio Grande do Norte, os comunistas
escreveram a lista das pessoas que deviam
ser sacrificadas e a espalharam. São
os mesmos em toda parte”. Cabe aos
pesquisadores descobrirem essa lista contendo
os nomes dos anti-comunistas areiabranquenses
condenados ao “paredão”
das salinas.
Quatro meses depois do fracasso da insurreição
militar-civil, comandada pelos comunistas,
em 23 de novembro de 1935, em Natal, Recife
e Rio de Janeiro, Cascudo publicou o artigo
“Violência Bolchevista”,
na edição de 01 de março
de 1936 (págs. 10 e 12, do jornal
da AIB, cujo texto transcrevemos abaixo:
“Em
crônicas repetidas e claras, o sr.
Assis Chateaubriand surpreende-se com a
violência comunista. É a própria
essência do regime. O bolchevismo
sem violência é cachorro sem
dentes --- é inofensivo e barulhento.
A característica russa não
é outra senão A GPU, com a
sua polícia de choque, seus seqüestros
brutais, suas confiscações
despojadoras. A violência organizada,
sistematizada, erguida em dogma, empoleirada
em doutrina, explicada em cursos, é
o traço mais veemente da ortodoxia
soviética. Lealmente, os chefes vermelhos
nunca fizeram mistério desse ritual,
agora demonstrado em Recife, Rio e Natal.
Bukarin, um exegeta, altíssimo, explica:
“O divisor de águas entre nós
e a social democracia é o emprego
da violência. Chamam-nos de bárbaros
porque empregamos a violência, mas
nós existimos com os nossos métodos
violentos, bárbaros, não-europeus,
grosseiros. Que é que mostrou a prova
prática com isso? A prova prática
fala a nosso favor e contra seus adversários”.
Stálin
ensina: “A violência é
uma afirmação de força
ante a covardia sinuosa dos nossos inimigos.
Só a violência demonstra que
somos fortes e que saberemos receber condignamente
todas as conseqüencias dos nossos atos”.
René
Fulop Müller, no agora clássico
“Geist und Gesicht des Bolschewismus”
( há uma tradução brasileira
do prof. Alvaro Franco - “Espírito
e Fisionomia do Bolchevismo”), termina
seu longo trabalho, confessando:”...
O abuso iluminado da violência está
íntimamente ligado aos fundamentos
do comunismo russo”.
Poetas e escritores soviéticos não
cantaram outro tema.
Maiakowski:
“Deveis destruir
Inferno e demônios!
Parti ao meio as chamas!
Avançai sem temor!
Demian Bednyi:
“Fere de morte, fere de morte!
Fere de morte a todos os criminosos do povo!
Operariado: agora também reduz a
mingau
Com teus punhos a Deus o fantasma!
Para frente: Triunfo, marchai, marchai!
Para frente! E, tiro, após tiro!
ou então, esse quadro delirante:
“Senhores!
Morram vocês! Morram!
Vocês
cujos ossos apodrecem na banha: deita-te
aí, rafeiro! Carrasco, fecha o focinho!
Vós, sujeira humana feita carne:
Morrei!
Morram vocês! Morram!
Abaixo a camarilha!
Um, dois!
Um, dois!
Marche!
Um monte de lixo é o Estado Burguês!
O governo está agora nas mãos
dos proletários.
Ninguém toque aí!
O
mesmo Maiakovski:
Concluam
agora o palavrório
A
palavra tens tu, camarada Mauser!
Leis do tempo de Adão e Eva,
Leis, nós vos destruímos.
O mundo está em farrrapos”.
E
mais esse exemplo:
“ Os fazedores de esmolas, os contempladores
do umbigo,
sobre suas caretas fazei brilhar a machadinha!
Golpeai! Golpeai!
Bravos: os crânios são bons
para cinzeiros”.
Essa é a estética sonora que
alimenta os meninos do Konsomol. Toda sua
literatura monocórdica, artificial,
caolha, propaga o emprego da força
física, o murro, o tiro, a baioneta,
a pata do cavalo.
O adversário não se reduz
pelo livro, pela palavra, pela doutrina.
A adesão é obtida pelo pavor,
pela ameaça, pela fome. E são
felizes.
A “desculpa” dessa trepidação
sanguinária, desse trotear de hunos
sob a estrela vermelha, é que a imaginação
dos poetas oficiais do P.C. é livre.
Só é livre neste estilo.
Daí,
não é assombro a violência
passada nem a futura.
O sr. Assis Chateaubriand espere pela machadinha,
pela metralhadora, pela Ilha da Trindade.
Os métodos comunistas são
estes e jamais foram outros.
Coerentemente, os oficiais do Terceiro Regimento
provaram quanto eram bolchevistas. Bolchevismo
é isso mesmo. Por nós ou contra
nós. Não discutamos. Como
filiados ao P.C.B. os oficiais foram até
ao massacre dos companheiros. E saíram
“sorridentes” como reparou....”(
O fim do artigo está inelegível).
Nota: As reportagens “O problema social
do Brasil é político”,
“O comunismo sem violência é
cão sem dentes” e “Integralismo
é o fascismo brasileiro” foram
originalmente publicadas no jornal natalense
“Tribuna do Norte” , entre 18
de março 01 de abril de 1990. Ordem
da direção do jornal proibiu
a continuação das matérias
a respeito da fase integralista de Câmara
Cascudo.
CONCLUSÃO
Câmara
Cascudo, um dos integrantes da cúpula
nacional da AIB, não foi somente
um simples propagandista provinciano da
ideologia do integralismo. Ele ajudou a
criar a “Província Integralista
do Rio Grande do Norte”, dirigindo
as atividades da AIB potiguar durante certo
período e liderando centenas de camisas-verdes.
Fez proselitismo no interior do RN e nas
páginas de jornais e revistas integralistas.
Cascudo estava no comando nacional da AIB,
através do seu órgão
normativo e diretivo, sob a chefia única
de Plínio Salgado, que era chamado
de “genial chefe”pelos seus
comandados. Os artigos de Cascudo são
variados, os seus textos jornalísticos
têm a ideologia integralista como
pano de fundo. Comparando os seus textos
com os demais intelectuais brasileiros que
atuaram na Ação Integralista,
a produção cascudiana é
inigualável, pois é concisa,
enxuta, clara e informativa. Câmara
sem foi um repórter e não
um genial filosofo.
Assinando matérias em publicações
em que despontavam Miguel Reale, Ovídio
Cunha, Menotti Del Picchia, Roland Corbisier,
Gustavo Barroso, além do próprio
líder nacional, Plínio Salgado,
o escritor Luiz da Câmara Cascudo
tornou-se um nome nacional, um jornalista
conhecido nos meios culturais e políticos
da capital da República, o Rio de
Janeiro, onde se concentrava a elite da
intelectualidade brasileira.
Enquanto existiu a AIB, Cascudo, o tarimbado
repórter natalense, escreveu artigos
que repercutiam na direção
do movimento integralista. Alguns artigos
eram identificados pelas iniciais L.C.C.
Vários foram publicados na primeira
página do jornal A Ofensiva, porta-voz
da AIB, enquanto que outros textos mereceram
destaques nas revistas “Anauê
“( 1934) e “Panorama”.
Essas duas publicações eram
responsáveis pela veiculação
dos trabalhos teóricos dos intelectuais
integralistas.
Após a extinção da
AIB, Cascudo publicou artigos e ensaios
na revista de grupos remanescentes do integralismo,
como “Cadernos da Hora Presente”
, de São Paulo/SP, que circulou até
meados da década de quarenta.
Propostas transformadoras da sociedade?
Câmara
Cascudo foi simpatizante de movimentos monarquistas
e, antes de ingressar na AIB, ajudou a formar
um grupo de estudos em Natal, o Centro de
Cultura Social Conde D’Eu, que instalou-se
na sede da Associação Potiguar
de Estudantes, na noite do dia 29 de junho
de 1934, em sessão presidida pelo
então padre Walfredo Gurgel. (1)
Cascudo era um homem maduro quando ingressou
nas fileiras da AIB. Segundo o falecido
professor Oto de Brito Guerra, o seu ingresso
deu-se por indicação do escritor
cearense Gustavo Barroso, que chegou a disputar
a chefia da AIB com Plínio Salgado.
Ambos eram historiadores e os laços
de amizade foram fatores fortíssimos
para a entrada de Cascudo no movimento verde-amarelo.
Cascudo foi um dos mais ativos propugnadores
da disseminação da ideologia
integralista no seio da juventude norte-rio-grandense.
Adotou a doutrina pliniana como forma de
transformação radical da arcaica
sociedade brasileira, onde a riqueza, concentrada
nas mãos de uma minoria sempre ávida,
domina todos departamentos da ação
individual, sobrepujando a própria
dignidade do homem, que “ imagem e
semelhança, criado e mantido por
Deus, está aviltado e sujo pelos
ídolos que sua ambição
criou”. ( A Ofensiva, p.03, 28.12.1935)
Acreditou
no integralismo como força revolucionária,
“uma filosofia para o Brasil”
, capaz de nos tirar da humilhante situação
de miséria moral, intelectual e econômica
que perdura até os dias de hoje.
Defendeu a doutrina de Plínio Salgado
em todos os seus textos publicados na imprensa
integralista, principalmente na fase áurea
do movimento, entre 1934 e 1937.
As proposta de Cascudo de transformação
da sociedade eram mesmas defendidas pela
AIB, sob o lema “Deus, Pátria
e Família”.
Comentarista
político internacional
Cascudo também defendeu seus ideais
fascistas no jornal A República,
de Natal, de propriedade do Governo do Estado
do Rio Grande do Norte, onde, também,
no período pós guerra, assinou
uma coluna diária, “Acta Diurna”.
Cascudo publicou um artigo sintomático
das suas preferências ideológicas,
“Adolf Hitler através da numerologia”
, na edição de 01.10.1933,
bastante simpático ao “fueher”
alemão. Esse artigo e mais “
O sigma vitorioso” , “República
Manchú” e o “Soviet Anedótico
( A República de 12.09 e 29.10.33,
estão registrados no livro de Zila
Mamede. ( 2) Nos três artigos, Cascudo
discorre sobre a doutrina integralista,
o nazismo e critica o socialismo soviético.
Como comentarista político internacional,
ele preocupou-se com a situação
da União Soviética, sob o
comando de Stálin, a conjuntura política
da Europa ( ele errou quando previu que
os russos seriam os deflagradores da II
Guerra Mundial e o avanço do fascismo
no mundo. Entre 1934/36, o período
mais profícuo da produção
jornalística de Cascudo, além
de seus artigos laudatórios sobre
o fascismo nos Estados Unidos da América
do Norte e na América Latina, História
do Brasil, cinema, música, etc.,
escreveu sobre moral política e o
ensino na ex-URSS, chegando ao ponto de
elogiar reforma educacional soviética
de 1935. Foi o único ponto de concordância
de Cascudo com postulados soviéticos,
isto é, a modernização
e desenvolvimento dos métodos educacionais
soviéticos.
Sobre os rumores de que Alemanha nazista,
dois anos após a ascenção
de Hitler, estava se armando para uma desforra
com os países vencedores da Primeira
Guerra, L.C.C., em “O pretexto do
armamentismo alemão” ( A Ofensiva,
p.1, 10.01.35) culpava a União Soviética
pelo “estado de alarme europeu”
, pois “o russo sempre foi hábil
e plástico em prometer e arranjar
acontecimentos oportunos” e isentava
a Alemanha de ser uma provocadora de ‘casus-belli”.
A história mostrou, quatro anos depois,
que a havia fundadas razões para
que a França e a URSS denunciassem
o rearmamento alemão, e, ao contrário
do que previa Luiz da Câmara Cascudo,
não foram os soviéticos que
transformaram “a doce França
da canção de Roland numa colônia
moscovita” , mas a barbárie
nazista que subjugou o povo francês
durante cinco anos da II Grande Guerra,
com a colaboração de fascistas
franceses.
Cascudo e o ensino soviético
A respeito da lei que entrou em vigor na
URSS, em 18 de maio de 1934, Cascudo considerou
que a reforma do ensino soviético
era uma anomalia, já que ressuscitaria
métodos educacionais burgueses e
abjuraria princípios marxistas ortodoxos.
“A
Rússia voltou à metodologia
moderna européia., recusou dos detalhes
que a prática mostrava inviáveis
e anti-humanos. É uma linda atitude
de inteligência e de coragem essa
confissão. A se-lo-ia maior se os
adeptos fossem mais leais e dissessem o
que realmente houve: o repúdio numa
alta percentagem, ao que se julgava a última
palavra em matéria de ensino”.
( A Ofensiva, p.03, 14.09.1935).
O
anti-comunismo exarcebado de Cascudo é
justificável: integralista, ligado
à corrente anti-semita de Gustavo
Barroso ( 3) , admirador de Hitler e Mussolini,
ele só podia escrever de forma simpática
ao movimento naza-fascista internacional.
A propósito, deve-se salientar que
Plínio Salgado jamais foi admirador
do nazismo. Ao contrário, escreveu
artigos mostrando as diferenças entre
a sua ideologia e os postulados racistas
do nazismo. Apesar de suas fortes inclinações
com o grupo de ultra-direita de Gustavo
barroso, que quase derrotava Plínio
no Congresso Integralista de Vitória/ES,
em 1934, não encontramos nenhum artigo
de Cascudo que denotasse tendência
anti-judáicas.
Sobre
aquele período turbulento de nossa
história, Ovídio da Cunha
( 4 ) diz que “o anti-comunismo, na
época de 30 a 40, era ingênuo
e até primário. O comunista
era olhado como uma espécie de diabo:
os padres viam o comunismo como um pecado.
Jocosamente, nós dizíamos:
“os comunistas têm rabo de cão”.
Então, o antagonismo comunismo/integralismo,
no sentido da imagem popular, era ingênuo,
como se, por exemplo, hoje discutíssemos
a questão da macumba, não
tinha um sentido teórico-ideológico.
O clero apresentava o comunismo como capaz
de todas as misérias, os comunistas
seriam capazes dos crimes mais horrorosos,
e todos aqueles estereótipos que
se formam em certas sociedades subdesenvolvidas
contra uma seita religiosa ou uma seita
política envolvia os comunistas.
Os integralistas passariam a ser os anjos-da-guarda,
congregando marianos da defesa da tradição,
da família, da propriedade, da integridade
da pátria, e, do outro lado, os anjos-maus,
que eram os comunistas. Havia da parte dos
integralistas e do líder católico
um grande namoro pelo proletário,
a preocupação de cativar o
proletário. Mas o proletário
autêntico não tinha valor nenhum,
o problema dele era puramente fisiológico,
era sobreviver, e se valores existissem,
eram os valores das religiões populares
de hoje, ele não tinha cultura, não
tinha percepção para essas
sutilezas ideológicas de hoje. De
modo que o movimento se fazia na classe-média
e na sacristia das igrejas. Houve vários
sacerdotes que foram integralistas.”.
( 5 )
NOTAS: 1) Conforme notícia publicada
na p. 07, de A República, edição
de 01.07.1933, no final de 1932 esteve em
Natal uma “embaixada universitária
monarquista” , recepcionada pelo dr.
Jaime Wanderley, poeta, em sua residência,
na rua São Tomé. O mesmo jornal
informava que “.... na noite de 29
p.p. uma conferência do acadêmico
Vival Silva, na Associação
Potiguar de Estudantes, que se reunira em
sessão solene sob a presidência
do pe. Valfredo Gurgel. Vival fez uma análise
percuciente e lógica do regime republicano
e das tendências sociais do Brasil,
sendo muito aplaudido ao terminar. O salão
estava completamente cheio e notamos os
mais representativos elementos da nossa
sociedade. Falou o dr. Luiz da Câmara
Cascudo instalando o Centro de Cultura Social
Conde D’Eu e, explicando sua finalidade,
exclusivamente voltada ao estudo e a observação
dos problemas atinentes ao desenvolvimento
da pátria comum, sem função
política regional e geral, antes
reunindo notações para um
regime que integre o Brasil em suas tradições
de paz, de garantia, de labor e de honestidade.
Perorando disse que o Império sonhado
não podia ser a monarquia latifundiária,
capitalista e burguesa de 1889 e sim o Estado
corporativo, totalitário, em vez
do domínio de uma classe exclusiva
sobre todas as outras, teríamos a
convergência produtora de todas as
atividades para o vértice único
da Grande Pátria una e soberana em
sua expressão indivisível
de Religião, Raça e Família.
Foi aplaudidíssimo. O pe. Walfredo
Gurgel encerrou a sessão, pronunciando
um discurso de estímulo a campanha
de renovação moral e material
do Brasil. O dr. Câmara Cascudo, pela
Associação Potiguar de Estudantes,
ofereceu uma recepção em sua
residência, onde se reuniu a sociedade
natalense na mais íntima e intensa
cordialidade festiva”. 2) Luiz da
Câmara Cascudo - 50 anos de vida intelectual
- 1918-1968 - Zila Mamede, Fundação
José Augusto - Natal/Rn - 1970. 3)
O dr. Oto Guerra informou ao autor que o
historiador Gustavo Barroso levou Cascudo
para a AIB. Já o folclorista e escritor
Veríssimo de Melo, no Teatro Alberto
Maranhão, na noite do lançamento
do livro “Esqueçam a primavera,
irmão”, do embaixador Nestor
Lima, em 1990, também opinou sobre
as três reportagens publicadas na
Tribuna do Norte sobre “Cascudo, o
jornalista integralista”. Para Veríssimo,
Cascudo ingressou no integralismo porque
era muito jovem e que “o grande mestre”
não gostava de falar sobre o seu
passado na AIB, “um erro da juventude”.
Cascudo não teria abandonado, formalmente
, a AIB, pois não há registro,
mas participou, em Natal, dos festejos do
Jubileu de Prata ( 25 anos) da criação
da AIB, em outubro de 1957, na sede do Alecrim
Clube, onde proferiu ardoroso discurso integralista,
segundo me informou Pedro Dantas, gerente
do cemitério Morada da Paz, em Parnamirim.
4) Trecho da entrevista de Ovídio
da Cunha, líder integralista no Rio,
à Revista de Ciência Política,
da Fundação Getúlio
Vargas, Rio, Vol. 28, agosto de 1985, p.148.
5) O padre Valfredo Gurgel foi um dos representantes
da cúpula do clero católico
de maior destaque no integralismo potiguar.
Ulisses de Góis foi o grande incentivador,
deu apoio aos integralistas, mas não
se filiou ao movimento. Dom Marcolino Dantas
era simpatizante e dava apoio por “debaixo
do pano”. Os irmãos e padres
Eimar e Erildo L ‘Eraistre Monteiro,
de Caicó, foram integralistas, ambos
capelães militares e apoiaram o regime
militar pós-64. Do padre Erildo,
capelão do 16 RI, em Natal, eu ouvi
ele dizer, durante um sermão, em
1984, que “comunista é a mesma
coisa que satanás”. Eu, comigo
mesmo, disse: “é o novo! “.
Sobre o Valfredo, eu testemunhei o seguinte:
em plena campanha para governador, em 1965,
apoiado pelo governador Aluizio Alves, ele
participou da solenidade de inauguração
do Comitê Estudantil da Cruzada da
Esperança, na rua Princesa Isabel.
Perguntei se ele ainda era integralista,
ele respondeu que não “porque
o movimento acabou, mas continuo com os
mesmos princípios”. Houve outros
padres na AIB/RN, como Luiz Adolfo, em Macaíba,
e Raimundo Leão, em Caraúbas,
entre outros, no Rn.
****
^
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14/02/05
CASCUDO NÃO
DEVOLVEU COMENDA DE MUSSOLINI
Apesar dos pesquisadores acadêmicos
e não acadêmicos de todo país
terem alardeado que o folclorista Luiz da
Câmara Cascudo tinha devolvido a comenda
de Cavaleiro da Ordem da Coroa da Itália,
que lhe foi dada pelo Rei Vittorio Emanuele
III, por proposição do Duce
Benito Mussolini, em 1939, a exibição
desse documento numa das salas térreas
do lado direito de quem entra no prédio
neoclássico do Memorial Câmara
Cascudo, no centro de Natal, é uma
prova irrefutável de que ele jamais
refugou a honraria enviada pelos dignitários
italianos fascistas. À vista de todos
os interessados em conhecer objetos de uso
pessoal e utensílios da casa em que
o Cascudo residiu, além da biblioteca
com quase 10.000 volumes, cartas, títulos
e peças artesanais, está o
original do diploma enviado pelo rei italiano,
exposto ao lado de outros documentos honoríficos,
como a Ordem do Mérito Aeronáutico
e Ordem do Mérito do Estado do Rio
Grande do Norte e um título ofertado
pela Prefeitura Municipal de Natal, na gestão
de José Agripino Maia.
Ao contrário do que continua sendo
registrado pelos historiadores potiguares,
inclusive os renomados escritores e pesquisadores
João Wilson Mendes de Melo e Itamar
de Souza, talvez por desconhecimento da
totalidade da documentação
exposta no Memorial, a própria Fundação
José Augusto, mantenedora do prédio,
confeccionou um pequeno folheto sobre o
memorial, contendo a “Biografia de
Câmara Cascudo - Memorial –
O Prédio” e detalhes da exposição.
O horário de funcionamento é
das 9 às 17 horas, de terça-feira
a sábado, e das 11 às 17 horas,
aos domingos. No quinto parágrafo
do folhetim, está escrito: “Entre
outras distinções, foi Grande
Oficial da Ordem do Mérito Naval,
Comendador do Mérito Militar (Brasil),
Ordem do Mérito Militar de Cristo
(Portugal), Ordem dos Cisneiros (Espanha),
Ordem de São Gregório (Santa
Fé), Ordem da Coroa (Itália),
além de várias Ordens particulares
e honoríficas”. Portanto, a
comenda da Coroa Italiana está lá,
exibida como uma das principais homenagens
recebidas e preservadas pelo eminente folclorista
potiguar e conservadas pelos seus familiares
e o poder público do Estado do Rio
Grande do Norte. “Todo o acervo do
Memorial pertence à família
de Câmara Cascudo, sob a guarda da
Fundação José Augusto”,
diz Neusinha, funcionária da FJA
e responsável pela catalogação
de todos os objetos, livros e pertences
do folclorista. A comenda é um troféu
cascudiano. Se Cascudo tivesse devolvido
o importante título concedido pelo
regime fascista de Mussolini, o diploma
de Cavaleiro da Coroa da Itália não
estaria em exposição no Memorial
Câmara Cascudo, prédio tombado
em 24 de agosto de 1989, com o “objetivo
preservar e divulgar a vida e a obras de
Luís da Câmara Cascudo”.
Na urna de madeira e vidro (redoma), numa
sala amplamente iluminada – o que
prejudica a conservação de
documentos por causa do excesso de luz solar
– vê-se o diploma, redigido
em italiano, em caracteres itálicos
próprios dos documentos monárquicos,
com o seguinte texto: S. M. Vittorio Emanuele
III - Per Grazia Di Dio e Per Volontá
Della Nazione
RED’ITALIA E DI ALBANIA
IMPERATORE D’ETIOPIA
Gran Mastro dell’Ordine della Corona
d’Italia
Sulla proposta del Duce del Fascismo, Capo
del Governo, e del Ministro Segatario di
Stato per gli Affair Esteri;
Com Decreto in data Roma, 30 de novembro
de 1939 = XVIII = La conferito l’Onorificenza
di:
Cavaliere
Dell Ordine dela Corona di Italia, com facoltá
de fregiarsi delle insegne stabilite per
tale grado onorifico,
Al sig. Luiz da Camara Cascudo
Cittadino brasiliano = Pubblicista
Al Concelliere dell ‘Ordine della
Corona d’Italia,
Incariato della esecuzione di tale Decreto,
dichiara
Che questo venne registrato alla Cancelleria
delli ‘Ordine predetto e che:
Il sig. Luiz da Câmara Cascudo
Fu inscritto nell ‘Elenco des Cavalieril
(Esteri) al número 3225 (Serie 3
)
Il Cancelliere dell ‘Ordine
(assinatura)
Il Diretore Capo della Divisione I
(assinatura)
Além das comendas oriundas da Itália
e dos países em que vigoravam regimes
ditatoriais fascistas, como a Espanha franquista
e Portugal salazarista, o Memorial expõe
outros diplomas e honrarias, inclusive placas
de uma loja maçônica de Natal.
A placa, colocada em 20.08.1988, pelo Grão
Mestre Estadual Paulo Viana Nunes, do Grande
Oriente do Estado do Rio Grande do Norte,
é uma “Homenagem ao Mestre
Maçon Luiz da Câmara Cascudo,
Iniciado em 03 de abril de 1920 e Exaltado
em 98 de agosto de 1921”. Conforme
informou-me (informalmente), o historiador
Olavo de Medeiros Filho, Dom Marcolino Esmeraldo
de Souza Dantas disse a Cascudo que ele
não iria receber a medalha de São
Gregório Magno porque ele era maçon,
o que levou o folclorista, de imediato,
a redigir um documento assegurando a sua
profissão de fé católica
e/ou a pedir desligamento da instituição
franco-maçônica. Não
existe prova documental do desligamento
ou abjuração, mas o jornal
A ORDEM, de 3 de setembro de 1937, advertia
os leitores católicos que “estão
em pleno vigor para a nossa Diocese as seguintes
determinações da circular
de 20.08.1926: as Irmandades e Associações
Católicas saibam que declaramos írrita
e nula de pleno direito toda e qualquer
admissão de pessoas filiadas a seitas,
associações ou instituições
condenadas pela Santa Igreja. Os irmãos
que, sendo maçons, desejam continuar
católicos, façam a sua confissão
fervorosa, abjurem a seita secreta e recebam
do confessor a absolvição
dos seus pecados e das penas espirituais
em que incorreram inscrevendo-se na maçonaria”.
(1) Portanto, deduz-se daí que Câmara
Cascudo estava éticamente impedido
de receber a alta comenda católica.
Como recebeu a Medalha de São Gregório
Magno, o fez depois de sanado o impedimento.
Como a Igreja Católica evoluiu e
democratizou-se muito após o pontificado
do Papa João XXIII, hoje, o maçon
pode ser católico e participar das
atividades da sua paróquia ou diocese,
sem nenhum constrangimento A paranóia
pós-Dom Vital se acabou. Ainda bem.
Homem
sem vaidades, como as que abundam entre
os pequenos intelectuais provincianos e
das várzeas botocudas, Luís
da Câmara Cascudo, apesar dos erros
e falhas cometidas ao longo da sua profícua
e duradoura atividade cultural, o que tornou-o
um sábio e um verdadeiro “HOMEM”,
conforme assegurou o poeta Gilberto Amado,
“realizou-se sem pedir de graça
o nome da vida para com ela transacionar
o escrúpulo de se meter com riquezas,
honrarias e reputações”,
segundo lembra o poeta Sanderson Negreiros,
seu discípulo, no seu artigo “Cascudo
e sua medida”, publicado no Boletim
Informativo do Centro Norte-rio-grandense,
do Rio de Janeiro, página 20, março
de 1968.
Defesa
Passiva
O livro Radiografia de uma Administração(
Secretario do Interior e Justiça
– Imprensa Oficial – Natal -
1961) é o relatório da comissão
revisora das aposentadorias ocorridas no
desastrado final da administração
de Dinarte de Medeiros Mariz, integrada
por Hélio Mamede de Freitas Galvão,
Manoel Benício de Melo Sobrinho e
Raimundo Nonato Fernandes , presidida por
Aluizio Gonçalves Bezerra, então
Secretário do Interior e Justiça
do Governo Aluizio Alves. Hélio Galvão
foi o responsável pelo texto do relatório
e o averiguador das irregularidades administrativas
do governo de Dinarte Mariz, na área
de recursos humanos. O relatório
ficou famoso na época por causa dos
erros, falhas e crimes apontados à
administração anterior. Hélio
Galvão não livrou a cara de
ninguém e fez uma verdadeira devassa,
conforme lhe foi ordenado pelo governador
Aluizio Alves. A comissão detectou
que muitos funcionários públicos,
na gestão anterior, se aposentaram
com certidões de tempo de serviço
na Diretoria Regional de Defesa Passiva
Anti-Aérea, assinadas pelo folclorista
Luiz da Câmara Cascudo ( portador
da Carteira de Identidade do então
Ministério da Guerra de número
14671, expedida a 25/01/1958) que tinha
sido seu secretário nos anos da Segunda
Guerra. Hélio, ex-integralista como
Cascudo, não inquiriu o folclorista,
mas Erivan França mandou um ofício
para Cascudo, no qual indagou sobre a localização
dos arquivos da Defesa Passiva, que funcionou
entre 1942 e 1945 em Natal. A resposta de
Cascudo foi que não existia arquivo
algum , que os papéis tinha sido
incinerados e as certidões ele dava
com base na memória.
Segundo o relatório da comissão,
as certidões não obedeciam
aos critérios do Decreto n. 2.468,
de 6 de maio de 1954, que dispunha sobre
as condições do funcionário
público civil do Estado se beneficiar,
isto é, ter sido convocado para prestar
serviços na Diretoria Regional da
Defesa Passiva e apresentar certificado
comprovando haver atendido à referida
convocação efetivamente prestado
os serviços. Cada repartição
pública deveria encaminhar uma lista
com os nomes dos servidores convocados pela
Defesa Passiva ao secretário regional
para posterior certificação.
Mas “as certidões contidas
nos processos de aposentadoria não
obedeciam a essas regras. O decreto n. 3.808,
de 15.2.61, transferiu ao Departamento do
Serviço do Pessoal o encargo de expedir
tais certidões. Mas quando se tratou
da remoção do respectivo arquivo,
o antigo Secretário do Serviço
de Defesa Passiva informou que não
havia arquivo nenhum, pois os papéis
tinham sido incinerados e as repartições
não tinham enviado as relações
a que se referia o art. 5º do decreto
n. 2.468. De sorte, conclui o antigo Secretário,
que as certidões eram expedidas Segundo
suas notas pessoais e a reminiscência
fiel dos companheiros. Em face disso, à
Comissão se afigurou impossível
aceitar as certidões expedidas com
base nessas lembranças e notas particulares
do eminente historiador”. As certidões
emitidas foram eliminadas porque não
obedeciam ao Decreto 2.468, “seja
porque não extraídas de fonte
documental, seja porque não autorizados
pelo governador”, advindo daí
que muitas aposentadorias, subtraída
a parcela de tempo, não puderam ser
mantidas. A revisão efetuada pela
comissão atingiu 100 processos de
aposentadoria ( 90 por tempo de serviço
e 10 por invalidez), inclusive cancelando
as do ex-presidente da OAB/RN, Claudionor
Telógio de Andrade, Descartes de
Medeiros Mariz, do advogado João
Medeiros Filho, de Hemetério Fernandes
Raposo Melo Filho, Hesíquio Fernandes
de Sá, Dante de Melo Lima, entre
outros. Entre os treze nomes que a comissão
decidiu pela aposentadoria, sujeitos à
revisão do cálculo, está
o de Luis da Câmara Cascudo, que tinha
se aposentado em 3.1.1961, no finalzinho
do governo de Dinarte Mariz, como Terceiro
Consultor Geral. (Cascudo tinha tempo de
serviço como professor e ex-diretor
do Colégio Estadual do Atheneu Norte-rio-grandense.
Professor Emérito da Universidade
do Rio Grande do Norte, foi aposentado “a
partir de 22 de maio de 1967, por invalidez,
por ato do Magnífico Reitor, com
base no parágrafo primeiro do Artigo
53, da Lei n. 4.881-A, de 6.12.65, publicado
no D. O. n. 95, S-I P- II, pág. 1187,
de 22.5.67. Port. N. 58 de 29.7.66”,
conforme a sua ficha funcional n. 1058,
pertencente ao Arquivo Geral da UNIVERSIDADE
FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE. A ficha
funcional foi o único documento de
Luiz da Câmara Cascudo encontrado
no Arquivo Geral, em março de 2.000.
Segundo informações, grande
parte do acervo daquele arquivo foi incinerada
por ordem de uma ex-dirigente do Departamento
de Serviços Gerais).
Apreciando o mandado de segurança
n. 243, impetrado pelo dr. Claudionor de
Andrade, a comissão emitiiu o seguinte
parecer: “A 3ª Consultoria Geral
do Estado foi criada pela lei n. 2.387 de
18 de março de 1959 e para ele foi
nomeado o dr. Luis da Câmara Cascudo.
Aposentado este, sem que tivesse emitido
um só parecer, para seu substituto
foi indicado o dr. Antonio Soares Filho,
Chefe da Casa Civil do Governador. Mas intermediáriamente
apareceram dois outros candidatos à
terceira Consultoria: o Secretário
do Interior e Justiça ( o impetrante)
e o dr. João Medeiros Filho ( docs.
Ns. 1, 2 e 3 ). Então as coisas se
arranjaram de tal modo que de 3 a 13 de
janeiro se aposentaram três Consultores
Gerais da terceira Consultoria e foi nomeado
um quarto”. Os consultores recebiam
salários iguais aos dos desembargadores
do Tribunal de Justiça. O caso ficou
conhecido como “O escândalo
das Consultorias”, título do
livro impresso pela Secretaria do Interior
e Justiça, Imprensa Oficial, Natal,
1962. Câmara Cascudo , Antonio Soares
Filho e Hélio Galvão tinham
sido integralistas nos anos 30, mas não
ficaram inimigos por causa do “inventário”
do governo Dinarte Mariz. O relatório
da Comissão Revisora foi encaminhado
ao governador Aluizio Alves pelo vice-governador
Walfredo Gurgel, padre e outro ex-integrante
da cúpula potiguar da Ação
Integralista Brasileira. Apesar de ter a
sua aposentadoria cancelada, João
Medeiros Filho se reconciliou com Aluizio
Alves (1961-1965) e foi o seu Procurador
Geral da Justiça durante mais de
dois anos. Todos os funcionários
nomeados no “trem da alegria”
de Dinarte Mariz, a famosa “vaga existente”,
perderam todos os recursos na justiça
e somente foram admitidos pelo gesto de
concórdia do governador Monsenhor
Walfredo Gurgel ( 1966-1970), através
de um acordo.
Durante
o período da Segunda Guerra, integravam
a Defesa Passiva, além de civis e
militares das unidades militares sediadas
em Natal, o coronel Guerreiro e o folclorista
Luiz da Câmara Cascudo. O general
Antonio Fernandes Dantas foi nomeado interventor
após a enfermidade de Rafael Fernandes,
que enlouqueceu no Rio de Janeiro. O general
Cordeiro de Farias era o comandante da guarnição
em Natal. O chefe de polícia era
o bacharel José Ildelfonso Emerenciano
e o delegado do DOPS , José Batista
Emerenciano (este teve atuação
e muita influência na Secretaria de
Segurança Pública do Estado
até meados da década de 80).
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dos Direitos Humanos no Brasil
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