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Tecido Social
Correio Eletrônico da Rede Estadual de Direitos Humanos - RN

N. 023 – 03/03/04

REDH-RN E CARAVANAS DE DIREITOS HUMANOS

Direitos Humanos em todos os municípios do RN

Por Antonino Condorelli

Nordeste: veia aberta do Brasil. Rio Grande do Norte, minúsculo Estado econômica e políticamente insignificante na esquina do continente. Periferia da periferia. Foi aqui onde visionários e sonhadores, tantas vezes, aprenderam que do estrume nascem flores.

Foi em Natal, no bairro das Rocas, que Djalma Maranhão implantou, em 1961, a campanha “De Pé no Chão Também se Aprende a Ler”: escolas de palha que não agrediam o ambiente nem a cultura local e alunos descalços, pois para aprender a ler não é preciso ter sapatos. Em três anos, a campanha matriculou 17.000 alunos.

Foi neste Estado que, em 1963, Paulo Freire realizou as 40 horas de Angicos, inaugurando uma nova pedagogia que parte das exigências da pessoa humana e tem como fim a libertação. Naquela época, ele usava um projetor tchecoslovaco no meio de barracas de barro. 

Mais tarde, a tecnologia não era mais analógica nem tchecoslovaca, mas continuava sendo a ferramenta de um grupo de militantes humanistas do Brasil profundo. A DHNET – Rede Direitos Humanos e Cultura possui o maior acervo de dados e informações sobre Direitos Humanos e Memória Histórica em língua portuguesa. É uma central multimídia que contém centenas de megabytes de vídeos, material em audio, textos, fotos, desenhos, animações. Nasceu aqui, no Terceiro Mundo, em uma periferia perdida da região mais pobre do Brasil, no Rio Grande do Norte. “Aprendemos a enriquecer plutônio em plena caatinga”, diz Roberto Monte, coordenador do Centro de Direitos Humanos e Memória Popular (CDHMP), a organização que gerencia a DHNET em parceria com o CENARTE – Centro de Estudos, Pesquisa e Ação Cultural. Em um mundo que se articula em redes, um mundo globalizado, a única via de sobrevivência era criar um elo com o resto do planeta, projetar a micro-realidade do Rio Grande do Norte na macro-realidade do globo: criar uma rede “glocal”, que inserisse o local no global. 

Mas, ao longo destes anos que nos separam do nascimento da DHNET, foi se manifestando de maneira cada vez mais urgente a necessidade de levar para os municípios, as comunidades, a rua as informações, os mecanismos de proteção aos Direitos Humanos, a arte e a cultura, o resgate da memória histórica dos oprimidos que foram globalizados através da Rede. Se antes a atitude era de resistência, hoje há de ser se expansão: o objetivo é disseminar a cultura dos Direitos Humanos (no sentido mais amplo e abrangente da palavra, o de condições indispensáveis para o desenvolvimento pleno da vida: alimentação, saúde, educação, moradia digna, salário justo, acesso à água, acesso à terra, etc.) em todos os 5.561 municípios que compõem nosso grande, amado e desigual país.

                                    A Rede Estadual de Direitos Humanos - RN

Foi por isso que, no início de 2004, o mesmo grupo que criou a DHNET, com novos integrantes que se juntaram ao longo do caminho, começou a tecer a Rede Estadual de Direitos Humanos do Rio Grande do Norte (REDH-RN): uma articulação de organizações da sociedade civil, movimentos e instituições do Estado que trabalham com Direitos Humanos, tanto temáticos como gerais. O slogan da REDH-RN é Direitos Humanos para todos os Potiguares!

Seu principal objetivo: articular em cada um dos 167 municípios do Estado representantes dos três poderes públicos e da sociedade civil organizada - além de membros de sindicatos, partidos políticos, Igrejas comprometidas, mídia e até mesmo pessoas físicas interessadas em se envolver nesse processo - para criar núcleos permanentes de Direitos Humanos locais.

Estes últimos serão um elo entre a população local e os intrumentos estaduais, nacionais e internacionais de proteção aos Direitos Humanos (Secretarias e Coordenadorias estaduais, Ouvidorias, Corregedorias, Ministério Público Estadual e Federal, órgãos de proteção ao meio-ambiente, organismos internacionais como a OEA e a ONU, etc.), que nunca chegam às populações periféricas. Se encarregarão de levantar as violações de todos os direitos da população dos municípios, conscientizar e mobilizar a cidadania local, encaminhar denúncias, cobrar soluções do poder público: em poucas palavras, sua missão será promover os Direitos Humanos nos municípios. Neste âmbito, o Rio Grande do Norte está sendo o laboratório nacional de uma nova fórmula de conceber a luta pelos Direitos Humanos: uma luta em rede.

                                        As Caravanas de Direitos Humanos

Como vai ser tecida esta Rede? Vamos começar este ano com oito Caravanas de Direitos Humanos que atingirão cidades-pólo de micro-regiões e municípios menores do interior do Estado. As primeiras quatro serão em março, uma por semana, e atingirão Macau (dias 5 e 6), Parnamirim (dia 11), Carnaubais (dia 19) e Caicó (dias 25 e 26). As últimas quatro serão entre abril e maio e atingirão Mossoró, Pau dos Ferros, Ceará-Mirim e Macaíba.

Cada Caravana realizará uma ação “glocal” (que inserirá o município e as suas comunidades dentro dos mecanismos internacionais, nacionais e estaduais de proteção aos Direitos Humanos), que envolverá os poderes públicos, a sociedade civil organizada, a mídia e a população locais para levantar e discutir as questões centrais de Direitos Humanos do município, encaminhar as denúncias que serão realizadas e constituir no próprio município núcleos de ação permanente para a promoção e proteção dos direitos dos cidadãos.

Todas as Caravanas culminarão na I Conferência Municipal de Direitos Humanos de município, cada uma das quais – além de constituir o núcleo local de Direitos Humanos – levará propostas para a IV Conferência Estadual de Direitos Humamos do RN que terá lugar no final de maio. Esta última, junto com as dos outros Estados, levará o aporte do Rio Grande do Norte à IX Conferência Nacional que terá lugar em Brasília de 29 de junho a 3 de julho. Ela terá carácter deliberativo e terá como objetivo a criação de um Sistema Nacional de Proteção aos Direitos Humanos, organizando e sistematizando o que já existe e instaurando novos mecanismos.

O Guia RN de Direitos Humanos

Voltando ao nosso Estado, nossa “municipalização” da luta pelos Direitos Humanos será realizada ao mesmo tempo dentro da mãe de todas as redes. A REDH-RN será ao mesmo tempo uma rede presencial e uma rede online: esta última será encarnada pelo Guia RN de Direitos Humanos, que possuirá toda a informação sobre acesso aos Direitos Humanos, memória histórica e cultura de cada município do Estado. O Guia RN, por sua vez, será o laboratório do Rede Brasil de Direitos Humanos, a suma de 27 guias estaduais, que atingirá todos os 5.561 municípios do país.

Além da informação sobre acesso aos direitos, o Guia atribui uma enorme importância à arte, a cultura e a memória histórica. Por cada município, será inserido um ABC dos artistas militantes e dos combatentes sociais abrangendo a inteira história do Brasil, da Colonização aos dias atuais. Segundo Roberto Monte, esta operação é “uma releitura da história do Brasil na perspectiva dos vencidos, dentro de uma linha que junta Darcy Ribeiro e Eduardo Galeano”. De fato, acrecenta o ativista, “o Guia pretende realizar uma Memória do Fogo brasileira”, com referência à obra do escritor uruguaio Eduardo Galeano, uma reescritura da história do continente latinoamericano na ótica dos oprimidos impregnada de mitologia indígena e tradições populares.

 

Deste minúsculo Estado da periferia do Brasil nos chega, hoje, uma mensagem revolucionária: em um mundo em que os capitais, as mercadorias, os serviços, as tecnologias e os produtos culturais massificados são globalizados, mas as liberdades e os direitos das pessoas são cada vez mais reduzidos pelos poderes econômicos e políticos, a única saída é capilarizar, globalizar, universalizar a luta pelos Direitos Humanos através de redes de informação e articulações de movimentos, tendo sempre como ponto de partida e de chegada deste processo a realidade de cada município, de cada comunidade, de cada pessoa.

Veja também:
- Começam em Macau as Caravanas de Direitos Humanos
- Macau, uma população humilhada

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