Mãe
deve trabalhar para evitar que filhos recebam superproteção
DIÁRIO DE PERNAMBUCO – 26.03.1967
As
mães precisam trabalhar fora do lar, para que possam dar oportunidade
aos filhos de se educarem sem a sua superproteção. Este ponto
de vista é emitido pela advogada Mércia de Albuquerque Ferreira,
que afirma: “Já se foi o tempo em que tinha valor o ditado –
a mulher nasceu para o lar”.
Defende
aquela advogada que a criança precisa cair, se resfriar, a fim
de se formar para a vida. Uma doméstica pode atender às crianças
durante a ausência da mãe e ela não entende por que se condena
a empregada que sentou na cadeira o menino que “queria pegar
na chaleira quente”.
Acha
ainda a advogada Mércia que um dos fatores influentes no homossexualismo
é o fato de muitas mães educarem as crianças com a superproteção
e quando os jovens começam a se sentir sós recorrem a evasivas
como esta, hoje tão comum nas grandes e pequenas cidades.
PROFISSIONAL
– Mércia de Albuquerque é advogada com intensa atuação na defesa
de presos políticos e outras atividades forenses. No entanto,
encontra tempo de educar o seu filho de um ano e nove meses.
O nascimento deste ocorreu quando ela acabava de preparar o
habeas corpus em favor de Ivo Valença e hoje “é uma brasa, mexe
nas coisas, sobe nas cadeiras e vai ser um homem dinâmico”.
Sua residência, localizada na Conde da Boa Vista, está sempre
sob suas vistas, porque entre uma questão e outra, vai ver como
estão as coisas.
Há
ainda algumas “paradas” chocantes para ela, que como mulher
considera duras de enfrentar. Quando defende um estudante, por
exemplo: não entende como é que um juiz condena criaturas que
não passam de instrumentos em mãos de políticos hábeis. A seu
ver o juiz deveria proceder como pai, que compreende a fraqueza
dos filhos.
Por
outro lado, rejeita defender criminosos acusados de crimes,
tais como estupro. Reconhece que ele tem direito a defesa, como
todos os criminosos, todavia, por força de educação que teve
em colégios de freira, não se sente bem defendendo estas causas
que “precisam mais de médicos do que de advogado”.
CONCILIAÇÃO
– A bacharela Mércia de Albuquerque Ferreira, concluinte da
turma de 1963 na Faculdade de Direito da UFP, não encontrou
mais dificuldade por parte de sua família, para ingressar na
Universidade. Alguns a queriam médica, mas ninguém achou que
ficava feio uma moça estudando com rapazes, como se queixam
outras senhoras.
Ao
concluir o curso, não encontrou dificuldades para se firmar
como profissional. Confessa que não fora boa aluna nem usou
táticas especiais para conseguir clientes. Apenas aceitava poucas
causas e se dedicava a todas, com carinho. Quando tinha dúvidas,
recorria a mestres e colegas e não improvisava defesas.
Ainda
há desambientação para a mulher na vida forense, mas ela já
sabe que isto desaparecerá como aconteceu com as médicas. Não
vê incompatibilidade entre esta vida e a do lar. “O lar é meu
refúgio depois das canseiras do trabalho”, explica.
SENTIMENTOS
– Crê que a condição de mulher tem a sua influência no coração
dos juízes, “sensibilizando-os para um exame mais completo da
situação do réu, sobretudo quando a causa é justa. Lamenta que
em consequência de preconceitos poucas são as mulheres formadas
em Direito. As duas juízas e algumas promotoras públicas lotadas
em Pernambuco lutam contra sérias barreiras, “todavia isto é
um bom começo”.
EMANCIPAÇÃO
– Acredita que a mulher brasileira já iniciou, desde algum tempo,
a marcha pela sua emancipação, o que constitui um caminho longo
e difícil. Entre as próprias mulheres existem ainda desentendimentos
a dissipar. Os preconceitos de que são vítimas as dividem. Afora
isso, ainda há, segundo a advogada Mércia, tentativas de inclusão
da mulher em muitos acontecimentos políticos, “alguns até de
caráter retrógrados”.
Alerta
suas companheiras a reagir contra estas manobras, fazendo-se
presentes aos legítimos ideais de democracia, lembrando que
“a verdadeira marcha é a favor do progresso da construção de
um Brasil emancipado”.