Direitos
Humanos na Constituição
Brasileira de 1988
1) Princípio da Dignidade Humana
2) Prevalência dos Direitos Humanos nas Relações
Internacionais
3) Direito à Vida
4) Direito à Liberdade (Liberdade Religiosa)
5) Direito à Igualdade
6) Direito à Propriedade
7) Direito à Segurança
8) Direitos Sociais
9) Direitos Políticos
10) Direito à Nacionalidade
11) Direito ao Meio Ambiente
12) Direito dos Povos Indígenas
13) Direitos das Mulheres
14) Direitos dos Afro-Descendentes
15) Direito à Livre Orientação
Sexual
16) Direitos das Crianças e Adolescentes
17) Direitos dos Idosos
18) Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência
19) Garantias Constitucionais: Habeas Corpus, Mandado
de Segurança
e Aç&atil ????e ??????????de;o Popular
20) Novas Garantias Constitucionais: Mandado de Segurança
Coletivo, Habeas Data e Mandado de Injunção
DIREITOS
HUMANOS NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988
Ouvimos
freqüentemente que a Constituição é a “Lei
Maior”, a “Carta Magna”, a “Carta Política” de
um país a qual todos os cidadãos e governantes devem
conhecer e respeitar. Mas do que trata uma constituição?
Qual o seu conteúdo?
As Constituições nasceram para limitar o exercício
do poder do Estado e para assegurar direitos. Ela é o pacto
jurídico, político e social, contendo as decisões
mais importantes para o Estado e a sociedade.
Assim, podemos dividir o conteúdo das Constituições
contemporâneas em duas grandes partes estruturais. A primeira
prevê direitos, liberdades e garantias fundamentais. Por exemplo,
a Constituição de 1988, no seu título II, estabelece
os direitos e garantias fundamentais, os direitos civis, políticos,
sociais, bem como as garantias para a proteção desses
direitos. A segunda parte disciplina a organização
do Estado no âmbito geográfico-espacial e orgânico.
Por exemplo, a Constituição, no seu título III,
trata da organização do Estado, disciplinando a Federação
brasileira, integ ????e ??????????rada pela União, Estados, Municípios
e Distrito Federal. No título IV, consagra a organização
dos poderes, definindo as competências dos Poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário.
A Constituição de 1988, enquanto marco jurídico
da transição democrática e da institucionalização
dos direitos humanos no país, destaca, em seu título
I, seus princípios fundamentais. Eles refletem a ideologia
e a racionalidade constitucional, traduzindo seus valores mais preciosos.
A Constituição deve ser lida, interpretada e aplicada
seguindo a orientação desses princípios, que
projetam a importância da dignidade humana, da cidadania e
dos direitos humanos. Todo o aparato estatal criado e organizado
na segunda parte da Constituição deve funcionar à luz
dos direitos humanos enquanto princípios constitucionais fundamentais.
Em última instância, implica dizer que o Estado Brasileiro
existe para promover e proteger os direitos humanos, os direitos
fundamentais de seus cidadãos.
O significado dos princípios constitucionais pode ser melhor
apreendido a partir da análise particular dos princípios
e dos direitos humanos acolhidos na Constituição Brasileira
de 1988. Começaremos pelo princípio da dignidade da
pessoa humana, estabelecido como um dos fundamentos da Constituição
Federal de 1988 em seu Artigo 1º, inciso III.
Qual a função dos princípios constitucionais.
1)
Princípio
da Dignidade da Pessoa Humana.
A dignidade da pessoa humana pode ser considerada como o fundamento último
do Estado Brasileiro. Ela é o valor-fonte a determinar a interpretação
e a aplicação da Constituição, assim
como a atuação de todos os poderes públicos
que compõem a República Federativa do Brasil. Em síntese,
o Estado existe para garantir e promover a dignidade de todas as
pessoas. É nesse amplo alcance que está a universalidade
do princípio da dignidade humana e dos direitos humanos.
Como valor-fonte, é da dignidade da pessoa humana que decorrem
todos os demais direitos humanos. A origem da palavra dignidade ajuda-nos
a compreender essa idéia essencial. Dignus, em latim, é um
adjetivo ligado ao verbo defectivo decet (é conveniente, é apropriado)
e ao substantivo decor (decência, decoro). Nesse sentido, dizer
que alguém teve um tratamento digno significa dizer que essa
pessoa teve um tratamento apropriado, adequado, decente. Se pensarmos
em dignidade da vida humana ou o que é necessário para
se ter uma vida digna, começaremos a ver com mais clareza
como todos os direitos humanos decorrem da dignidade da pessoa humana.
Para que uma pessoa, desde sua infância, possa viver, crescer
e desenvolver suas potencialidades decentemente, ela precisa de adequada
saúde, alimentação, educação,
moradia, afeto, de liberdade para fazer suas opções
????e ?????????? profissionais, religiosas, políticas, afetivas, etc.
Portanto, a dignidade da pessoa humana implica em todas as múltiplas
e mínimas necessidades e capacidades para uma vida decente.
Essa gama de necessidades e capacidades nada mais é do que
o conteúdo dos direitos humanos, reconhecidos, por essa razão,
como princípios e direitos fundamentais na Constituição
Brasileira.
A dignidade é um atributo essencial do ser humano, quaisquer
que sejam suas qualificações. Em última instância,
a dignidade humana reside no fato da existência do ser humano
ser em si mesma um valor absoluto, ou como disse o filósofo
alemão Kant: o ser humano deve ser compreendido como um fim
em si mesmo e nunca como um meio ou um instrumento para a consecução
de outros fins. Por isso é que o Estado deve ser um instrumento
a serviço da dignidade humana e não o contrário.
Por essas razões, o princípio da dignidade da pessoa
humana exige o firme repúdio a toda forma de tratamento degradante
(indigna) do ser humano, tais como a escravidão, a tortura,
a perseguição ou mau trato por razões de gênero,
etnia, religião, orientação sexual ou qualquer
outra.
É
em decorrência do princípio da dignidade da pessoa humana
que a Constituição de 1988, no seu Título II, “Dos
Direitos e Garantias Fundamentais”, afirma uma extensa relação
de direitos individuais e coletivos (Capítulo I, Artigo 5º),
d ????e ??????????e direitos sociais (Capítulo II, Artigos 6º a 11), de
direitos de nacionalidade (Capítulo III, Artigos 12 e 13)
e de direitos políticos (Capítulo IV, Artigos 14 a16).
Defina, com suas próprias palavras, o que você entende
por dignidade da pessoa humana?
2)
Prevalência dos Direitos Humanos nas Relações
Internacionais.
A Constituição de 1988, em seu Artigo 4º, inciso
II, é a primeira em nossa história a estabelecer a
prevalência dos direitos humanos como princípio do Estado
Brasileiro em suas relações internacionais.
Inicialmente, trata-se de uma questão de coerência interna
do texto constitucional. Se a dignidade da pessoa humana com todos
os direitos humanos dela decorrentes devem orientar a atuação
do Estado no âmbito nacional, seria contraditório renegar
esses princípios no âmbito internacional. Afinal, não
são apenas os brasileiros que devem ter sua dignidade humana
respeitada e promovida, mas todas as pessoas, todos os seres humanos,
pelo fato único e exclusivo de serem pessoas. Negar a prevalência
desse princípio nas relações internacionais
seria negar a humanidade dos que não são brasileiros.
Assim, ao afirmar esse princípio, o Estado Brasileiro compromete-se
a respeitar e a contribuir na promoção dos direitos
humanos de todos os povos, independentemente de suas nacionalidades.
????e ?????????? A prevalência dos direitos humanos nas relações
internacionais ganha maior relevância no momento histórico
em que vivemos, no qual, em virtude do desenvolvimento tecnológico,
as distâncias entre as nações tendem a se encurtar
cada vez mais e todas as pessoas humanas tendem a se tornar verdadeiras
cidadãs do mundo. Um Estado regido pelo princípio fundamental
da dignidade da pessoa humana não pode desprezar as violações
dos direitos humanos praticadas por ou em outros Estados. Com a adoção
desse princípio, o Brasil une-se à comunidade internacional,
assumindo com ela e perante ela a responsabilidade pela dignidade
de toda pessoa humana.
A Carta de 1988 é a primeira constituição nacional
a consagrar um universo de princípios que guiam o Brasil no
cenário internacional, fixando valores a orientar a agenda
internacional do país. Essa orientação internacionalista
se traduz nos princípios da prevalência dos direitos
humanos, da auto determinação dos povos, do repúdio
ao terrorismo e ao racismo e da cooperação entre os
povos para o progresso da humanidade, nos termos do artigo 4º,
incisos II, III, VIII e IX. O artigo 4º, como um todo, simboliza
a reinserção do Brasil na arena internacional.
Essa inovação em relação às Constituições
anteriores consagra a prioridade do respeito aos direitos humanos
como a principal referência para a atuação do
país no cen&aac ????e ??????????ute;rio internacional. Isso implica não
apenas o engajamento do Brasil no processo de elaboração
de normas internacionais de direitos humanos mas também a
busca da plena incorporação de tais normas no direito
interno. Implica ainda o compromisso de adotar uma posição
política contrária aos Estados em que os direitos humanos
sejam gravemente desrespeitados.
Ao reconhecer a prevalência dos direitos humanos em suas relações
internacionais, o Brasil também reconhece a existência
de limites e condicionamentos à soberania estatal. Isto é,
a soberania do Estado fica submetida a regras jurídicas, tendo
como padrão obrigatório a prevalência dos direitos
humanos. Rompe-se com a concepção tradicional de soberania
estatal absoluta, relativizando-a em benefício da dignidade
da pessoa humana. Esse processo condiz com o Estado Democrático
de Direito constitucionalmente pretendido.
Se para o Estado brasileiro a prevalência dos direitos humanos é princípio
a reger o Brasil no cenário internacional, está-se,
conseqüentemente, admitindo a idéia de que os direitos
humanos são tema de legítima preocupação
e interesse da comunidade internacional. Nessa concepção,
os direitos humanos surgem para a Carta de 1988 como tema global.
Tudo isso tem levado o Brasil a adotar os mais relevantes tratados
internacionais de direitos humanos.
Também é de extrema importância o alcance da previsão
do Artigo 5&ord ????e ??????????m;, parágrafo 2º da Carta de 1988, ao determinar
que os direitos e garantias expressos na Constituição não
excluem outros decorrentes dos tratados internacionais em que o Brasil seja
parte. Isto é, ao aderir a um tratado internacional de direitos humanos,
o Brasil não apenas assume compromissos perante a comunidade internacional,
mas também amplia o catálogo de direitos humanos previstos em
nossa Constituição.
Qual a conseqüência para o exercício da soberania com o reconhecimento
da prevalência dos direitos humanos nas relações internacionais?
3) Direito à Vida.
A Constituição, em seu Artigo 5º, caput, garante a todos
os brasileiros a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança
e à propriedade. Cabe esclarecer que o caput (cabeça, cabeçalho)
do artigo 5º estabelece de maneira ampla e genérica esses cinco
valores fundamentais, enquanto que seus setenta e sete incisos esclarecem o
conteúdo desses valores.
O direito à vida se confunde com a dignidade da pessoa humana. Sem a
vida assegurada, não há como exercer a dignidade humana e todos
os direitos dela decorrentes. Assim, como não basta garantir a vida
como mera existência ou subsistência, mas sim uma vida plena de
dignidade. Por isso, o núcleo essencial de onde se originam todos os
demais direitos humanos reside na vida e na dignidade humanas.
Em virtude do princípio da inviolabilidade da vida, é vedada
a pena de morte (Art. 5º, inciso XLVII, alínea a); é proibida
a tortura e o tratamento desumano ou degradante (Art.5º, inciso III); é assegurado
aos presos o respeito à in ????e ??????????tegridade física e moral (Art.5º,
inciso XLIX) e é assegurado às presidiárias condições
para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação
(Art.5º, inciso L).
Veja que a proibição da tortura e a garantia da integridade física
e moral traduzem a idéia de que agredir o corpo humano é uma
forma de agredir à vida, pois esta se realiza naquele. A fim de assegurar
o cumprimento desses preceitos, a Constituição estabelece garantias
penais apropriadas, como o dever de comunicar imediatamente ao juiz competente
e à família ou pessoa indicada a prisão de qualquer pessoa
e o local onde se encontre; o dever também da autoridade policial de
informar ao preso seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, assegurada
a assistência da família e de advogado. Vale observar, para que
não se incorra em um erro freqüente, que esses direitos e garantias
não são “direitos de presos” ou “de bandidos”,
mas de todas as pessoas, inclusive dos suspeitos de crimes e criminosos. A
integridade físico-corporal é, portanto, um bem vital e revela
um direito fundamental do ser humano, cuja violação, em qualquer
circunstância, é criminosa
Com relação à integridade física, surge a questão
de saber se é lícito ao indivíduo alienar membros ou órgãos
de seu corpo. Se essa alienação se faz após a morte do
alienante, não há qualquer problema, desde que fosse essa sua
vontade em vida ou que haja a autorização de familiares. Em tal
caso não existirá qualquer ofensa à vida, que já não
existirá. Mas e se a pessoa, em vida, ????e ??????????oferece, mediante determinada
quantia em dinheiro, órgãos de seu corpo? A doação
(alienação sem contrapartida em dinheiro), sem riscos para a
vida do doador, sempre foi admitida, visando a suprir deficiência e até salvar
a vida de doentes. A Constituição (Art. 199, parágrafo
4º) determina que lei ordinária disponha sobre a condição
e requisitos para remoção de órgãos, tecidos e
substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento,
bem como a coleta, o processamento e a transfusão de sangue e seus derivados.
Tal regulamentação foi feita pela Lei Federal nº 10.205,
de 2001, mas proíbe expressamente todo tipo de comercialização.
Novos desafios surgirão com os avanços da bio-genética
e da bio-engenharia que têm tornado cada vez mais concreta a possibilidade
de clonagem de células e órgãos humanos. Quanto aos temas
da bio-ética (ética da vida), a Constituição de
1988 é silente porque, à época da Assembléia Nacional
Constituinte, eles não pareciam tão urgentes.
A Constituição também não tratou diretamente de
dois outros temas controvertidos no que diz respeito ao direito à vida:
a eutanásia e o aborto. Por eutanásia entendemos a morte que
alguém causa à outra pessoa já estado de agonia com a
finalidade de liberá-la do grave sofrimento provocado por doença
tida como incurável ou muito dolorosa. Por isso, a eutanásia
também é chamada de homicídio piedoso. É, contudo,
uma interrupção não-natural na vida humana. A maioria
dos juristas considera que nem mesmo o consentimento lú ????e ??????????cido do doente
exclui o sentido delituoso da eutanásia em nosso direito. Para sua reflexão,
ponderamos que o direito à vida implica em uma vida digna e não
vegetativa. E mais: a dignidade da pessoa humana também não implicaria
em uma morte digna?
O aborto é tratado no Código Penal Brasileiro em seus artigos
124 a 128, que compreendem o aborto provocado pela gestante ou com o seu consentimento,
o aborto provocado por terceiro sem consentimento, o aborto necessário
e o aborto no caso de gravidez resultante de estupro (também chamado
aborto sentimental). Os dois primeiros casos são punidos criminalmente
como ofensa ao direito à vida. Os dois últimos são chamados
de aborto legal. Nesse caso, não se pune o ato praticado por médico
quando não há outro meio de salvar a vida da gestante ou se o
aborto é precedido de gravidez resultado de estupro e consentido pela
gestante.
Observe que em qualquer de caso de aborto com o consentimento da gestante há um
conflito entre princípios constitucionais fundamentais, ou seja, entre
o direito à vida e a liberdade de escolha e a dignidade da mulher. Nos
casos do aborto necessário e do aborto sentimental já podemos
observar que nem mesmo o direito à vida é absoluto. O direito
ao aborto tem sido uma das principais reivindicações dos movimentos
feministas, sendo que a legislação brasileira, ao criminalizar
o aborto, sofre contínua crítica por parte desses movimentos.
Sabe-se que a prática do aborto tem sido adotada para interromper uma
gravidez indesejada, sendo que no caso de a mulher possuir recursos, tal intervenção
pode ser feita de modo relativamente seguro, embora clandestino. Porém,
se a mulher não tem recursos materiais, em geral, ????e ??????????realiza tal intervenção
em precárias condições de higiene, sendo grave causa de
morte materna por todo o país. Cabe ressaltar a recomendação
da Plataforma de Ação de Beijing (extraída na Quarta Conferência
Mundial sobre a Mulher), no sentido de que os países considerem a possibilidade
de revisar as leis que estabelecem medidas punitivas contra mulheres que praticam
abortos ilegais, situando a questão do aborto no âmbito da saúde
pública.
Cabe também considerar que a vida humana não se limita a um conjunto
de elementos materiais. Ela também tem valores imateriais e morais.
A Carta de 1988 destacou o valor e a proteção da moral individual,
assegurando indenização em caso de dano moral (Art. 5º,
incisos V e X). A moral individual sintetiza a honra da pessoa, o bom nome,
a boa fama e a reputação. A dimensão moral é uma
dimensão estrutural para uma vida digna. Por isso, o respeito à integridade
moral assume também o caráter de direito fundamental.
Visite uma “instituição fechada” (prisão,
manicômio, centro de reabilitação de adolescentes) de sua
cidade e faça um pequeno-relatório mostrando de que forma está sendo
respeitado o direito à vida?
4) Direito à Liberdade
A liberdade é um dos direitos assegurados de maneira ampla no já mencionado
caput, do artigo 5º da Constituição Federal de 1988. Trata-se,
sem dúvida, de um valor complexo e aberto, passível de várias
interpretações e significações. Passaremos a identificar
as liberdades específicas reconhecidas em nossa Con ????e ??????????stituição
nos respectivos incisos do Art. 5º. Antes, note-se que a liberdade de
ação em geral – considera a liberdade base ou liberdade
matriz das demais liberdades específicas – é tratada logo
no inciso II do Art. 5º, que consagra o princípio da legalidade,
estabelecendo: “que ninguém será obrigado a fazer ou a
deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.”
Vale esclarecer que todos têm a liberdade de fazer ou de não fazer
o que bem entender, exceto quando a lei determinar o contrário. Esse
dispositivo, além de conter a previsão da liberdade de ação,
liberdade base das demais, confere fundamento jurídico às liberdades
individuais e coletivas e correlaciona liberdade e legalidade, assim como liberdade
e igualdade, uma vez que, ao afirmar que ninguém será obrigado
eqüivale dizer que a todos será permitido. Ou seja, a liberdade
de fazer ou deixar de fazer é para todos e não apenas para alguns.
Adotamos a seguir a classificação das liberdades constitucionais
específicas, tal como sugerida pelo constitucionalista José Afonso
da Silva. Segundo tal classificação, as liberdades objetivas
específicas previstas na Constituição podem ser distinguidas
em cinco grandes grupos:
I – Liberdade da pessoa física.
Ela se opõe ao estado de escravidão e de prisão. Se a
escravidão já foi abolida legalmente, resta ainda a outra forma
de oposição à liberdade da pessoa física que é a
detenção, a prisão por qualquer impedimento à locomoção
da pessoa, inclusive a doença. A liberdade de locomoção é a
e ????e ??????????ssência da liberdade da pessoa física, sendo que a Constituição
(Art. 5º, inciso XV) declara “livre a locomoção no
território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos
da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens.” Observamos
que a liberdade de circulação é a manifestação
característica da assegurada liberdade de locomoção: direito
de ir, vir e permanecer.
II – Liberdade de pensamento.
Inclui a liberdade de opinião, de religião, de informação,
artística e de comunicação do conhecimento. A liberdade
de pensamento é o direito de expressar por qualquer forma o que se pense
em ciência, arte, religião, política ou o que for. Trata-se
de liberdade de conteúdo intelectual e supõe o contato do indivíduo
com seus semelhantes. A liberdade de opinião, de certa forma, resume
a liberdade de pensamento em suas várias formas de expressão.
Por isso é considerada liberdade primária e ponto de partida
das demais.
Trata-se da liberdade do indivíduo adotar a atitude intelectual de sua
escolha, quer em pensamento íntimo, quer na tomada de uma posição
pública; liberdade de pensar e de manifestar o pensamento. A Constituição
a reconhece nas duas dimensões. Primeiramente como pensamento íntimo,
prevendo a liberdade de consciência e de crença, que declara inviolável
(Art. 5º, VI), assim como a liberdade de crença religiosa e de
convicção filosófica ou política (Art. 5º,
VII), admitindo inclusive a escusa de consciência (o direito de recusar
imposições que contrariem tais convicções ou cren ????e ??????????ças).
Isso significa que todos têm o direito de aderir a qualquer crença
religiosa como a o de recusar a todas, adotando o ateísmo, ou mesmo
criando sua própria religião, assim como o direito de seguir
qualquer linha de pensamento filosófica, política ou científica
ou ainda a de não seguir nenhuma.
Em segundo lugar, como aspecto externo da liberdade de opinião, temos
as diversas formas de sua expressão, por meio das liberdades de comunicação,
de religião, de expressão intelectual, artística, científica
e cultural e de transmissão e recepção do conhecimento.
O Art. 5º, inciso V, estabelece que é livre a manifestação
do pensamento, sendo vedado o anonimato. O Art. 220 dispõe que a manifestação
do pensamento, sob qualquer forma, processo ou veiculação não
sofrerá qualquer restrição, observado o disposto na Constituição,
sendo vedada qualquer forma de censura de natureza política, ideológica
e artística.
O pensamento liberal apresenta três fundamentos essenciais para a liberdade
de pensamento e de manifestação de opinião em suas várias
formas. A primeira, de cunho político e social, aponta a importância
da livre divulgação de ideais e projetos políticos em
uma democracia para que os cidadãos bem informados possam escolher melhor
os caminhos políticos que pretendem trilhar. A segunda, de cunho moral,
afirma a livre circulação de idéias é necessária
para que, no exercício de confrontar as diversas e até mesmo
opostas linhas de pensamento, a verdade moral seja encontrada. O terceiro argumento
vê na liberdade de pensamento e de opini&atild ????e ??????????e;o um fim em si própria,
já que ela contribui para a autonomia de consciência de todo ser
humano. No contato com a multiplicidade de formas de sentir e compreender a
realidade, o ser humano pode exercitar sua autonomia, crescendo como indivíduo.
III – Liberdade de ação profissional.
Implica no direito da livre escolha e exercício de trabalho, ofício
e profissão. Conforme enuncia o Art. 5º, XIII: “é livre
o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão,
atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.
Observe que, por razões de ordem econômica e social, a maioria
das pessoas não tem condições materiais de exercitar esse
direito de escolha. Portanto, é necessário dar conteúdo
a essa liberdade, estabelecendo condições materiais e efetivas
de acesso ao trabalho, ao ofício e à profissão. Esse é um
tema que se relaciona diretamente com os direitos sociais e a interdependência
entre os princípios da liberdade e da igualdade, como veremos adiante.
IV – Liberdades de expressão coletiva.
Compreende o livre acesso de todos à informação. Destaca-se
a dimensão coletiva do direito à informação previsto
pelo Art. 5º, inciso XIV, em que a informação é,
sobretudo, veiculada por meios de comunicação de massa, cuja
função social é ressaltada pelo Art.221; a liberdade de
reunião pacífica em lugares públicos, o que evidentemente
não exclui a liberdade de reuniões privadas – ( art. 5º,
inciso XVI); e a plena liberdade de associação, vedada a de caráter
paramilitar. Além disso, ning ????e ??????????uém pode ser obrigado a associar-se
ou a permanecer associado e que há o direito de representação
coletiva dos associados pelas respectivas associações quando
expressamente autorizadas. (Art. 5º, incisos XVII a XXI).
Note que a liberdade de reunião e a liberdade de associação
para fins pacíficos podem ser consideradas liberdades-condição,
uma vez que, sendo um direito em si mesmas, são também condição
para o exercício de outras liberdades, agregando a força de manifestação
coletiva: liberdade de pensamento, de expressão de convicção
filosófica, religiosa, científica e política e de locomoção
, como no caso de reunião para passeatas.
V – Liberdades de conteúdo econômico e social.
Incluem a liberdade econômica, a liberdade de comércio, a livre
iniciativa, a liberdade ou autonomia contratual, a liberdade de ensino e a
liberdade de trabalho, das quais trataremos quando cuidarmos dos direitos sociais,
que nos remetem ao direito à igualdade.
Quais são a formas de exercício da liberdade objetiva?
5)
Direito à Igualdade
Vivemos
um período fortemente marcado pela valorização
de idéias neoliberais. Nesse ideário, é geralmente
dado maior peso ao valor político da liberdade do que ao valor
político da igualdade. Mas a igualdade constitui o signo fundamental
de uma democracia republicana, uma vez que ela não admite
os privil&eacu ????e ??????????te;gios e distinções que um regime simplesmente
liberal consagra. Numa democracia (governo do povo), a coisa pública
(res publica), o Estado deve estar a serviço do bem comum,
que são os direitos humanos, cujo fundamento é justamente
a igualdade de todos os seres humanos em sua comum condição
de pessoas.
A Constituição Federal, em seu Art. 1º, caput, estabelece
que a República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático
de Direito. Nenhum governo em uma democracia republicana será legítimo
se não mostrar igual respeito e cuidado quanto ao destino de todos os
cidadãos. E quando a riqueza de uma nação é desigualmente
distribuída, como ocorre até hoje, mesmo nas nações
mais prósperas, há que se suspeitar da igualdade dispensada pelo
Estado aos seus cidadãos. É nesse contexto que dentre os objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil destaca-se, no Art. 3º,
inciso IV, a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem,
raça, sexo, cor, idade, e quaisquer outras formas de discriminação.
As Constituições têm reconhecido a igualdade em seu sentido
formal jurídico: igualdade de todos perante a lei. A Constituição
de 1988 abre o capítulo dos direitos individuais com o princípio
de que todos são iguais perante a lei sem distinção de
qualquer natureza (Art 5º, caput). O princípio da igualdade já é reforçado
no próprio caput do Art. 5º, quando ele é assegurado ao
lado da inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança
e à propriedade. Isto é, fi ????e ??????????ca muito clara a idéia de que
todos esses direitos fundamentais devem ser assegurados igualmente a todos.
A igualdade permeia e legitima o exercício de todos os demais direitos.
Assegurá-los a apenas uma parte do povo brasileiro significa ferir mortalmente
o ideal igualitário democrata-republicano da Constituição
de 1988. O princípio é reforçado em muitas outras normas
sobre a igualdade.
Assim é que, o primeiro inciso do Art. 5ª declara, pela primeira
vez na história do Direito brasileiro, que homens e mulheres são
iguais em direitos e obrigações. Se por um lado isso merece ser
celebrado, por outro desvela o lamentável tratamento desigual dispensado às
mulheres historicamente em nossa sociedade.
Adiante, os incisos XLI e XLII do mesmo Art. 5º, estabelecem respectivamente
que “a lei punirá qualquer discriminação atentatória
dos direitos e liberdades fundamentais e que a prática do racismo constitui
crime inafiançável e imprescritível”. Depois, no
artigo 7º, incisos XXX e XXXI, vêm regras para fortalecer a igualdade,
em seu sentido material, proibindo “diferença de salários,
de exercício de funções, e de critérios de admissão
por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil e qualquer discriminação
no tocante a salário e critérios de admissão por motivo
de sexo, idade, cor ou estado civil.”
Cabe ainda menção aos comandos constitucionais que celebram o
ideal da igualdade material, enquanto igualdade substantiva e justiça
social, destacando-se as previsões que estabelecem: a redução
das desigualdades sociais e regionais (Art. 3º, III); a universalidade
da seguridade social; a garantia ????e ?????????? ao direito à saúde; a educação
baseada em princípios democráticos e de igualdade de condições
para o acesso e permanência na escola, dentre outros.
A preocupação com a justiça social como objetivo das ordens
econômica e social (Arts. 170, 193, 196 e 205) traduz diretrizes concretas
para a realização da igualdade material, obrigando o poder público
a estabelecer políticas públicas capazes de progressivamente
alcançarem tais metas. Tais políticas públicas devem incluir
tanto medidas de caráter repressivo-punitivo, a exemplo da criminalização
do racismo, prevista no Art. 5, XLII, como medidas de caráter afirmativo
buscando assegurar igualdade material de oportunidades, que compensem o tratamento
desigual de minorias e/ou grupos sociais historicamente mais vulneráveis,
como mulheres, homossexuais, afro-descendentes, povos indígenas, pessoas
portadores de deficiências, etc. Exemplos dessas medidas podem ser encontrados
nos já mencionados incisos XXX e XXXI do Art. 7º, assim como no
mesmo Art. 7º, inciso XVIII, que garante licença à gestante,
sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração
de cento e vinte dias.
O princípio da igualdade estará presente em muitos dos outros
temas a serem tratados, em especial no que diz respeito às medidas afirmativas
para a proteção e promoção dos direitos de grupos
sociais mais vulneráveis ou que exijam o atendimento a necessidades
especiais em virtudes de diferenças específicas. Observe-se que
nos referimos a diferenças e não a desigualdades. Isso significa
reconhecer as diferenças existentes entre os seres humanos, o que não
implica em admitir ????e ??????????desigualdades política, social ou economicamente
impostas aos menos favorecidos por quaisquer circunstâncias.
Quais os sujeitos de direito declarados como iguais – pela primeira vez
na história do Direito Brasileiro – na Constituição
brasileira de 1988?
6)
Direito à Segurança
A segurança – e no seu âmbito a segurança
jurídica – é um dos fundamentos do Estado de
Direito. De maneira genérica, pode-se dizer que a segurança
consiste na proteção conferida pela sociedade a cada
um de seus membros para conservação de sua pessoa e
de seus direitos. No âmbito das relações jurídicas,
e ainda de maneira genérica, a expressão segurança
jurídica significa um conjunto abrangente de idéias
e conteúdos que compreendem:
a) A existência de instituições estatais dotadas
de poder e garantias, assim como sujeitas ao princípio da
legalidade (Art. 5º, II), ao princípio da inafastabilidade
do poder judiciário, (Art. 5º, XXXV) e ao princípio
do contraditório e da ampla defesa (Art. 5º, LV). Como
já vimos, o princípio da legalidade nos assegura a
liberdade de fazer ou deixar de fazer tudo o que a lei não
nos obrigue em sentido contrário. Por sua vez, toda e qualquer
questão sobre a legalidade de uma conduta ou existência
de (ou ameaça a) um direito poderá sempre e sem exceção
????e ?????????? ser levada ao Poder Judiciário para a solução
da controvérsia. Durante esse processo, as partes têm
direito de argumentar e contra-argumentar, utilizando todos os meios
de defesa lícitos tais como o contraditório e a ampla
defesa;
b) A confiança nos atos do Poder Público que deverão
reger-se pela boa-fé e razoabilidade;
c) A estabilidade das relações jurídicas, manifestada
na durabilidade das normas, na anterioridade das leis em relação
aos fatos sobre os quais incidem e na conservação de
direitos em face da lei nova. É nessa discordância de
normas no tempo que o princípio da irretroatividade das leis
tem suma importância na proteção de direitos
subjetivos. Tal como consagrado no Art. 5º, XXXVI, “a
lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico
perfeito e a coisa julgada”;
d) A previsibilidade dos comportamentos, tanto os que devem ser seguidos
como os que devem ser suportados;
e) A igualdade na lei e perante a lei, com soluções
isonômicas para situações idênticas ou
próximas. O princípio da igualdade é, em última
instância, uma garantia ou uma condição da segurança
jurídica.
Vale reforçar o significado fundamental do princípio da irretroatividade
da lei para a segurança e a certeza das relações jurídicas.
Assim é que, além da proteção jurídica no âmbito
das relações sociais, c ????e ??????????itada no mencionado Art. 5º, XXXVI,
o princípio é previsto na Constituição de 1988
também para a proteção da liberdade do indivíduo
contra a aplicação retroativa (para trás no tempo) da
lei penal, contida no Art. 5º, XL: “a lei penal não retroagirá,
salvo para beneficiar o réu”. Para a proteção do
contribuinte contra a voracidade retroativa do Fisco, constante do Art., 150,
III, a “é vedada a cobrança de tributos em relação
a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei
que os houver instituído ou aumentado.”
Além da segurança jurídica em sentido amplo, fundamentada
no princípio da irretroatividade da lei, a Constituição
também garante a segurança dos indivíduos em sentido estrito
por meio de regras que consagram o direito do indivíduo ao aconchego
do lar com sua família ou só, quando define a casa como o “asilo
inviolável do indivíduo” (Art.5º, XI), bem como mediante
regras que protegem as comunicações pessoais, assegurando o sigilo
da correspondência e das comunicações telegráficas
e telefônicas (Art. 5º, XII).
Procure no noticiário de sua cidade e mostre um fato no qual a casa
não foi respeitada como “asilo inviolável do indivíduo”.
7)
Direito à Propriedade
O reconhecimento constitucional da propriedade como direito fundamental
na Constituição de 1988 relaciona-se essencialmente à sua
função de prote&cc ????e ??????????edil;ão pessoal (garantia
de condições mínimas de manutenção
de uma vida digna) e alcança tanto os que já são
proprietários quanto os que carecem desse direito para a
sua subsistência própria. A Constituição
brasileira reconhece explicitamente um direito de acesso à propriedade
ao admitir um usucapião extraordinário, tanto de
imóveis rurais (Art. 191), quanto de terrenos urbanos (Art.
183). Daí decorre que nem toda propriedade privada constitui
um direito fundamental da pessoa humana a merecer, por isso, uma
proteção constitucional.
Seria evidente contra-senso que essa qualificação fosse
estendida ao domínio sobre um latifúndio improdutivo
ou sobre uma gleba urbana não utilizada ou sub-utilizada em
cidades com graves problemas de moradia popular.
É
nesses termos que o regime jurídico da propriedade tem seu
fundamento na Constituição. Esta garante o direito
de propriedade, desde que atenda sua função social: “é garantido
o direito de propriedade (Art. 5º, XXII); a propriedade atenderá sua
função social”. Só se garante o direito
de propriedade que atenda a sua função social. A Constituição
autoriza a desapropriação, com pagamento mediante título
da dívida pública ou mediante títulos da dívida
agrária, respectivamente nos casos de imóveis urbanos
(Art. 182, Parágrafos 2º ????e ??????????; e 4º) e nos casos de imóveis
rurais (Art. 184), que não estejam cumprindo a sua função
social. Observe-se que a regra geral para desapropriação
por necessidade, utilidade pública ou por interesse social
estabelece prévia e justa indenização em dinheiro
(Art. 5º, XXIV). Há, portanto, um tratamento não
apenas mais rigoroso, mas, sobretudo, punitivo, aos proprietários
de imóveis que não desenpenhem sua função
social, por meio do instituto da “desapropriação
sanção”.
Diante do descumprimento, pelo proprietário, do dever fundamental
de dar aos bens uma destinação social, incumbe ao Estado,
entre outras medidas, redistribuir, tendo em vista o objetivo constitucional
de erradicação da pobreza e de redução
das desigualdades sociais, previsto no Art. 3º da Constituição.
Isso ocorre principalmente por meio da desapropriação. É evidente
que, ao desapropriar aquele que desatende a função
social da propriedade, o Estado não está simplesmente
sacrificando um direito humano individual às exigências
superiores da necessidade ou utilidade pública. Ele está,
na verdade, punindo um abuso do direito de propriedade.
Em conseqüência, a indenização a ser paga não
pode ser equivalente ao valor de venda do bem, como ocorre com a expropriação
normal. A Constituição impõe o pagamento de uma justa
indenização e não de uma indenizaç&atil ????e ??????????de;o pelo
valor de mercado. A justiça indenizatória é uma regra
de proporcionalidade, tendo em vista a situação concreta de cada
caso. Mas no caso do expropriado que descumpriu sua função social
da propriedade, se fosse indenizado pelo valor venal da coisa, não haveria
uma punição, mas um prêmio àquele que desrespeitou
o direito humano alheio.
Com relação aos imóveis urbanos, a Constituição,
em seu Art. 182, parágrafo 2º estabelece que “a propriedade
urbana cumpre sua função social quando atende às exigências
fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.
O plano, cuja aprovação pela Câmara Municipal é obrigatória
para toda cidade com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico
da política de desenvolvimento e de expansão urbana (Art. 182,
Parágrafo 1º).
Quanto à propriedade rural, a função social será cumprida
quando forem atendidos, simultaneamente, segundo critérios e graus de
exigência estabelecidos em lei, os seguintes requisitos: aproveitamento
racional e adequado; utilização adequada dos recursos naturais
disponíveis e preservação do meio ambiente; observância
das disposições que regulam as relações de trabalho
e exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários
e dos trabalhadores (Art. 186).
A Constituição também reconhece o direito à propriedade
sobre bens imateriais, como no caso do direito autoral, que compreende o direito à exclusiva “utilização,
publicação ou reprodução de obras, transmissí ????e ??????????;vel
aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar” (Art. 5º, XXVII). Também
consagra o direito à propriedade de inventos, de marcas de indústrias
e de nome de empresas. Especialmente no caso dos inventos, o privilégio
da utilização exclusiva do autor é temporário,
passando depois do tempo previsto em lei para o domínio público,
como no caso do direito autoral, o que uma vez mais ressalta a função
social da propriedade (Art. 5º, XXIX). No mesmo sentido, a propriedade
sobre marcas de indústrias, nome de empresas e outros signos distintivos
está condicionada pelo interesse social e pelo desenvolvimento tecnológico
e econômico do país.
Todas as limitações ao direito de propriedade associadas à sua
função social apontam para a verdadeira natureza constitucional
da propriedade, que é um direito-meio e não um direito-fim. A
Constituição não garante a propriedade em si mesma, mas
como instrumento de proteção de valores fundamentais da pessoa
humana.
Qual o objetivo constitucional ao garantir o direito de propriedade?
8) Direitos Sociais
Os direitos sociais e econômicos passaram a ser reconhecidos
pelas Constituições nacionais sob a influência
e a pressão dos movimentos sociais e políticos do final
do século XIX e início do século XX, principalmente
os movimentos da classe operária, de inspiração
anarquista, socialista e comunista, assim como o fortalecimento da
social-democracia européia. As primeiras Cons ????e ??????????tituições
a adotá-los foram a do México, de 1917, e a da Alemanha,
de 1919. No Brasil, a primeira Constituição a reconhecê-los
foi a de 1934. Esses direitos correspondem historicamente a uma “segunda
geração de direitos humanos”, porque reconhecida
depois da “primeira geração”, surgida com
o movimento constitucionalista ligado à “Era das Revoluções
Burguesas”, ao final do século XVIII.
Se a primeira geração visava afirmar direitos políticos
e civis individuais (as chamadas liberdades públicas) contra abusos
do Estado, a segunda geração, inspirada no valor da igualdade
(contraposta ao que se considerava liberdades meramente formais dos direitos
civis e políticos), buscava a conquista de direitos substanciais capazes
de garantir o exercício efetivo das liberdades públicas pelas
classes sociais menos favorecidas. Assim, dentre os direitos humanos de cunho
social e econômico, podemos relacionar os direitos à educação, à saúde,
ao lazer, à maternidade, à infância, à moradia,
ao trabalho, à previdência social, à assistência
aos desamparados etc. A idéia aqui é sintetizada pelo exemplo
de que de nada serve ao indivíduo o direito de votar e ser votado (direito
político) e a liberdade de expressão intelectual (direito civil)
se ele não tem necessidades vitais mínimas asseguradas, como
sua saúde, moradia e educação - direitos sociais que o
tornam apto a exercer seus direitos civis e políticos.
Note que a idéia de “gerações de direitos humanos” apena ????e ??????????s é utilizada
para indicar o reconhecimento das espécies de direitos humanos ao longo
da História. Mas isso não significa que os direitos de “segunda
geração” somente devam ser reconhecidos ou promovidos após
a total implementação dos direitos de “primeira geração”.
Não há aqui uma hierarquia ou uma sucessão geracional
de direitos. Esses direitos são, na verdade, inter-relacionados e interdependentes,
devendo ser igualmente respeitados, promovidos e protegidos. Por isso, a Constituição
de 1988 foi a primeira a incluir os direitos sociais, juntamente com os direitos
individuais, no universo dos Direitos e Garantias Fundamentais (Título
II).
Assim, a Constituição, em seu Art. 6º (que inaugura o Capítulo
II – “Dos Direitos Sociais” - do Título II ), estabelece
que “são direitos sociais a educação, a saúde,
o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social,
a proteção à maternidade e à infância, a
assistência social aos desamparados, na forma desta Constituição”.
A este capítulo conjuga-se o Titulo VIII da Constituição
dedicado à “Ordem Social”, o qual tem “como base o
primado do trabalho e como objetivo o bem estar e a justiça social (Art.
193). Ao longo da ordem social estão traçadas as diretrizes constitucionais
que devem nortear as políticas públicas para a promoção
da seguridade social (Arts. 194 a 204), que incluem as seções
da saúde, previdência e assistência social), para a promoção
da educação, da cultura e do desporto (Arts. 205 a 217, observando-se
q ????e ??????????ue cultura e desporto abrangem tanto o direito à educação,
como o direito ao lazer) e para a proteção da família,
da criança, do adolescente e do idoso (Arts. 226 a 230).
Portanto, os direitos sociais requerem prestações positivas do
Estado mediante a elaboração de políticas públicas
aptas a promovê-los e garanti-los. O estudo dos direitos sociais tal
como dispostos no Art. 6º deve sempre estar correlacionado com os dispositivos
da ordem social.
Cabe destacar que a seguridade social deverá atender, dentre outros,
aos objetivos democráticos da universalidade de cobertura e atendimento,
da uniformidade e da equivalência dos benefícios e serviços às
populações urbanas e rurais, da irredutibilidade do valor dos
benefícios e do caráter democrático e descentralizado
da administração (Art. 194). Com referência à intrínseca
correlação entre direitos sociais e a exigência de políticas
públicas adequadas a promovê-los, que a saúde é direito
de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas
que visem a redução da doença e de outros agravos e ao
acesso universal igualitário às ações e serviços
para sua promoção, proteção e recuperação
(Art. 196, caput).
A educação também é direito de todos e dever do
Estado (Art. 205), tendo por princípios: a igualdade de condições
para o acesso e permanência na escola; a liberdade de aprender, ensinar,
pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; o pluralismo de idéias
e de concepções pedagógicas; a ????e ??????????coexistência de instituições
públicas e privadas de ensino; a gratuidade do ensino público
em estabelecimentos oficiais; a valorização dos profissionais
do ensino; a gestão democrática do ensino público e a
garantia do padrão de qualidade (Art. 206). O acesso ao ensino fundamental
e gratuito é direito subjetivo público (Art. 208, Parágrafo
1º), implicando que todos podem exigir, em última instância,
perante o Poder Judiciário, que o Estado cumpra esse dever.
Visando a assegurar os meios financeiros para a consecução de
tais objetivos, a Constituição determina que a União aplique, “anualmente,
nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios,
vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos
na manutenção e desenvolvimento do ensino (Art. 212, caput).
Ainda no capítulo dos direitos sociais, a Constituição
dedica os Artigos 7º ao 11º aos direitos dos trabalhadores. O Art.
7º é dedicado aos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais em
suas relações individuais de trabalho. Os Artigos 8º a 11º são
dedicados aos direitos coletivos dos trabalhadores. Temos assim que no Art.
7º estão relacionados os direitos fundamentais de cada trabalhador
em sua relação individual de emprego, entre os quais: o salário
mínimo (inciso IV), a irredutibilidade de salário (inciso VI),
o décimo terceiro salário (inciso VIII), o repouso semanal remunerado
(inciso XV), férias anuais remuneradas (inciso XVII), licença
gestante (inciso XVIII), licença-paternidade (inciso XIX), aviso prévio
(XXI) e aposentadoria e integração à previdência
????e ?????????? social (inciso XXIV).
Dentre os direitos coletivos dos trabalhadores, cabe destacar a livre associação
sindical ou profissional (Art. 8º) e o direito de greve, “competindo
aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os
interesses que devam por meio dele defender” (Art. 9º, caput). Além
disso, sendo o trabalho um direito social, tal como definido no Art. 6º,
extrai-se do conjunto de normas da Constituição o direito ao
trabalho de cada cidadão, o qual exige a firme atuação
dos poderes públicos, por meio de políticas públicas,
aptas a gerarem o pleno emprego.
Pesquise em seu município e elenque duas instituições
que sejam fundamentais para o gozo de direitos sociais?
9)
Direitos Políticos
O titular da soberania no Estado Democrático de Direito, que
constitui a República Federativa do Brasil, é o povo
brasileiro. Os direitos políticos são o meio de exercício
dessa soberania popular. Eles caracterizam o direito de cada cidadão
contribuir para os desígnios da atuação do Estado,
compondo as decisões fundamentais a orientar o Estado. De
maneira geral, podemos dizer que os direitos políticos traduzem-se
na capacidade de votar e de ser votado. Note que a idéia de
votar e ser votado é hoje intimamente ligada à democracia
representativa, na qual o povo escolhe seus representantes políticos
que ocuparão os cargos, sobretudo nos Poderes Executivo e
Legislativo, com funç&ot ????e ??????????ilde;es de administrar e legislar
sobre o interesse comum. A democracia representativa é característica
das sociedades de massa que inviabilizam a participação
de todo e cada cidadão em todas as decisões públicas.
Em suas origens, a democracia era direta, quando todo e cada cidadão
exercia o seu voto com igual peso nas decisões comuns.
Vale salientar que os direitos políticos em nosso país
nem sempre foram respeitados, principalmente, durante o período
da ditadura militar em que muitos homens e mulheres “desapareceram” em
virtude de professar e atuar em prol de determinadas atividades político-partidárias.
Cabe, então, mencionar a Lei 9.140, de 4/12/1995 que reconheceu
como mortas pessoas desaparecidas em razão de participação
ou acusação de participação em atividades
políticas no período de 2/09/1961 a 15/08/1979. Esta
lei foi alterada pela Lei 10.536, de 14/08/2002 que, dentre outras
alterações, ampliou o período de reconhecimento
de pessoas desaparecidas para 2/09/1961 a 5/10/1988.
A Constituição de 1988 assegura que “todo o poder
emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou
diretamente, nos termos desta Constituição” (Art.1o,
parágrafo único). Adota, assim, a democracia representativa
mesclada com mecanismos importantes da democracia direta na qual
os cidadãos participam ativamente da tomada de decisões
de relevância pública. Por isso, nosso regime caracteriza-se
????e ?????????? como uma democracia participativa ou semi-direta. O Art. 14 da Constituição
determina que “a soberania popular será exercida pelo
sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com igual
valor para todos, e, nos termos da lei, mediante: I – plebiscito
, II – referendo; III – iniciativa popular”.
O sufrágio universal implica que cada cidadão tem direito
de voto, o qual será secreto e exercido diretamente por ele,
tendo cada voto o mesmo valor (da célebre formulação
em língua inglesa, one man, one vote – “um homem
um voto”, por evidente que a fórmula inclui todas as
mulheres com igual direito).
Os três incisos do artigo 14 indicam os mecanismos de democracia
direta ou democracia participativa adotados pela nossa Constituição
como meios de exercício da cidadania ativa. Por meio do plebiscito,
os cidadãos decidem diretamente determinada questão
de relevância pública. Os representantes políticos
deverão, obrigatoriamente, proceder e legislar conforme os
desígnios da maioria cidadã.
A título de exemplo, citamos o plebiscito em 1993 para que se escolhesse
a forma (república ou monarquia constitucional) e o sistema de governo
(parlamentarismo ou presidencialismo) a vigorar no país, tendo os cidadãos
escolhido diretamente a república presidencialista. Já no referendo,
os cidadãos têm o poder de aprovar (referendar) determinada medida
já acolhida pelo poder Legislativo para que a cidadania confirme ou
rejeite a norma em questão. A Constituiç ????e ??????????ão de 1988 atribuiu
competência exclusiva ao Congresso Nacional para autorizar referendo
e convocar plebiscito (Art. 49, XV).
Por sua vez, a iniciativa popular consiste mais precisamente na iniciativa
popular legislativa. Trata-se do direito assegurado ao conjunto de cidadãos
de iniciar o processo legislativo, apresentando projeto de lei à Câmara
dos Deputados, com observância aos requisitos constitucionais do Art.61,
parágrafo 2o. É de se lamentar que os mecanismos da democracia
participativa tenham sido até hoje pouco utilizados entre nós.
Dentre os fatores que contribuem para tanto, apontamos para a concentração
no Congresso Nacional da prerrogativa de provocar os mecanismos do plebiscito
e do referendo, condicionando, assim, a participação ativa dos
cidadãos em decisões públicas relevantes à vontade
de seus representantes eleitos – o que contraria toda a lógica
da democracia participativa, complexo sistema de coleta de assinaturas para
apresentação de projetos legislativos de iniciativa popular.
A incipiente educação cívica e política do povo
brasileiro, que prejudica a participação e a cidadania ativa, é outro
fator.
Seria, pois, de imensurável importância para o fortalecimento
da democracia participativa que os seus mecanismos fossem simplificados para
incentivar a ativa participação. Ressaltamos também que
os debates que antecedem a votação de um plebiscito ou referendo
sobre a participação do Brasil na ALCA ou da tomada de empréstimos
junto ao FMI, sob condições que exigem duros sacrifícios
sociais, têm em si mesmos um caráter educativo e pedagógico
para a participação política e ????e ??????????a cidadania ativa.
Quanto ao alistamento eleitoral, o exercício do voto é obrigatório
para os maiores de dezoito anos (Art. 14, Parágrafo 1º, I) e facultativos
para os analfabetos, os maiores de setenta anos e os maiores de dezesseis e
menores de dezoito anos (Art. 14, Parágrafo 1º, alíneas
a), b) e c)). Os estrangeiros e os que estão prestando serviço
militar obrigatório não podem alistar-se como eleitores (Art.
14, Parágrafo 2º). Nos termos do Art. 14, Parágrafo 3º,
as condições para a elegibilidade para cargos públicos
são: a nacionalidade brasileira; o pleno exercício dos direitos
políticos; o alistamento eleitoral; o domicílio eleitoral na
circunscrição (ou seja, no Município ou Estado para o
qual será eleito o representante, e evidentemente, no Brasil, para o
caso de eleição presidencial); a filiação a partido
político; e a idade mínima de trinta e cinco anos para Presidente
e Vice-Presidente da República e Senador, de vinte e um anos para Deputado
Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de
Paz, e de dezoito ano para Vereador. Não poderão ser eleitos
os analfabetos e os inalistáveis (Art. 14, Parágrafo 4º).
O
plebiscito, o referendo e a iniciativa popular são formas
de exercício de que forma de democracia?
10)
Direito à Nacionalidade
A nacionalidade é o vínculo jurídico-político
da pessoa a determinado Estado Nacion ????e ??????????al. É por meio da nacionalidade
que identificamos sob que regime e sistema político a pessoa
vive e quais os seus direitos e deveres, segundo as leis do Estado
do qual ela é nacional. Para considerar a importância
do direito à nacionalidade, pense na situação
da pessoa que não é nacional de nenhum país – o
apátrida (sem pátria, sem nação). Que
direitos ele tem? Quais são os seus bem jurídicos?
Quais são as normas que fundamentam seus direitos? No caso
do apátrida, todas essas perguntas ficam sem respostas. Ainda
que exista um relevante sistema de proteção internacional
dos direitos humanos, pode-se afirmar que o direito à nacionalidade
compõe o direito a ter direitos.
Nessa situação pode encontrar-se o “refugiado” que,
segundo o Estatuto do Refugiado (artigo primeiro, incisos I, II e
III) caracteriza-se como sendo todo indivíduo que “devido
a fundados temores de perseguição por motivos de raça,
religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas
encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não
possa ou não queira acolher-se à proteção
de tal país” ou, ainda, aquele(a) que, “não
tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve
sua residência habitual, não possa ou não queira
regressar a ele, em função das circunstâncias
descritas no inciso anterior”;ou que “devido a grave
e generalizada viola& ????e ??????????ccedil;ão de direitos humanos, é obrigado
a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio
em outro país”.
Ainda segundo o Estatuto do Refugiado, o Alto comissariado das Nações
Unidas para os Refugiados, atuando sob a autoridade da Assembléia
Geral, assume a tarefa de proporcionar proteção internacional,
sob os auspícios das Nações Unidas, aos refugiados
que reúnam as condições previstas Estatuto,
e de encontrar soluções permanentes ao problema dos
refugiados, ajudando aos governos e, com sujeição à aprovação
dos governos interessados, às organizações privadas,
a facilitar a repatriação voluntária de tais
refugiados ou a sua assimilação em novas comunidades
nacionais.
A Constituição de 1988 determina que a nacionalidade
pode resultar de fato natural – o nascimento – ou de
fato de fato voluntário, ocorrido depois do nascimento. No
primeiro caso, a Constituição prevê, no seu Art.
12, I, que são brasileiros natos: a) os nascidos na República
Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes
não estejam a serviço de seu país; b) os nascidos
no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde
que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa
do Brasil; e c) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou
mãe brasileira, desde que venham a residir no na República
Federativa ????e ??????????do Brasil e optem, em qualquer tempo, pela nacionalidade
brasileira.
Percebe-se que há dois critérios de adoção de nacionalidade
pelo nascimento: o critério do solo (ius solis), segundo o qual será brasileiro
nato aquele que nascer em solo brasileiro; e o critério do sangue (ius
sanguinis), segundo o qual será brasileiro aquele que for filho de brasileiro,
desde que atendidas as condições das referidas alíneas
b) e c) do Art. 12, I. Portanto, o critério que predomina é o
critério do solo com concessões para o critério do sangue.
No caso da nacionalidade por fato voluntário, a Constituição,
no Art. 12, II, estabelece que serão brasileiros naturalizados: a) os
que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários
de países de língua portuguesa apenas residência por um
ano ininterrupto e idoneidade moral; b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade
residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze
anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram
a nacionalidade brasileira. A Constituição veda à lei
estabelecer qualquer distinção entre brasileiros natos e naturalizados,
salvo nos caso previstos na própria Constituição (Art.
12, Parágrafo 2º).
No Parágrafo 3º do mesmo Art. 12, são previstos os cargos
públicos privativos de brasileiros natos: Presidente e Vice-Presidente
da República, Presidente da Câmara dos Deputados, Presidente do
Senado Federal, Ministro do Supremo Tribunal Federal, da carreira diplomática,
de oficial das forças armadas e de Ministro de Estado da Defesa.
No plano infra-constituci ????e ??????????onal, cabe citar, no que diz respeito à nacionalidade,
a Lei nº 9.584, de 10 de dezembro de 1997 que, dentre outras alterações,
dá nova redação ao artigo 30 da Lei 6.015, de 31 de dezembro
de 1973 que dispões sobre os registros públicos e acrescenta
inciso ao artigo 1º da Lei 9.265 , de 12 de fevereiro de 1996 que trata
da gratuidade nos atos necessários à cidadania, dentre estes
aqueles que capacitam o cidadão ao exercício da soberania popular,
o alistamento militar, pedidos de informação ao poder público,
quaisquer requerimentos ou petições que visem as garantias individuais
e a defesa do interesse público.
Outro importante passo dado em direção à promoção
dos direitos humanos, foi a Mobilização Nacional pelo Registro
de Nascimento em 25 de outubro de 2003 para garantir os direitos a um nome
e um sobrenome a milhares de brasileiros e brasileiras. Com o registro de nascimento
a pessoa passa a existir enquanto indivíduo sujeito de direitos e pode
pleitear a satisfação desses direitos. Destaca-se que com essa
mobilização e outros estudos está sendo criado o Plano
Nacional Para Registro Civil de Nascimento que tem a missão de estabelecer
ações articuladas que garantam a certidão de nascimento
a todos os brasileiros. Outras metas previstas no plano são erradicar
o subregistro de nascimento até outubro de 2006 e fortalecer o sistema
brasileiro de registro civil.
Quais são os critérios válidos de adoção
de nacionalidade?
11) ????e ??????????Direito ao Meio Ambiente
A Constituição Federal de 1988 inovou ao dedicar um
capítulo próprio ao direito ao meio ambiente. Trata-se
do Capítulo VI do Título VIII – Da Ordem Social.
No início do capítulo, é determinado que: “Todos
têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
como de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade
o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes
e futuras gerações” (Art. 225, caput).
O avanço tecnológico acelerado, ocorrido a partir da
Revolução Industrial no final do século XVIII
e acentuado ainda mais a partir de meados do século XX, além
de trazer comodidades e novos confortos para parte da população
mundial também implicou a drástica devastação
do meio ambiente, gerando graves ameaças para a saúde
do equilíbrio ecológico e da vida no planeta. A tomada
de consciência desse perigo, sobretudo a partir da década
de 1970, e o imenso patrimônio ecológico e de biodiversidade
do Brasil aparecem finalmente refletidos no Capítulo da Constituição
dedicado ao direito ambiente quando se reconhece o direito ao meio
ambiente equilibrado como “um bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida”. Note que o reconhecimento desse direito
não se limita ao presente, mas implica em verdadeiro pacto
entre as gerações presentes e ????e ??????????futuras. Isto é,
todos nós, além de titulares do direito ao meio ambiente,
temos o dever de preservá-lo para os nossos descendentes.
Trata-se da expressão do valor de fraternidade entre todos
os povos e entre gerações.
Por outro lado, a Constituição também impõe
ao Poder Público a obrigação de estabelecer
políticas públicas para assegurar a efetividade do
direito ao meio ambiente, cujas diretrizes aparecem no parágrafo
1º do Art 225: a) preservar e restaurar os processos ecológicos
essenciais e prover o manejo ecológico das espécies
e ecossistemas; b) preservar a diversidade e a integridade e do patrimônio
genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa
e manipulação de material genético; c) definir,
em todas as unidades da Federação, espaços territoriais
e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração
e a supressão permitidas somente por meio de lei, vedada qualquer
utilização que comprometa a integridade dos atributos
que justifiquem sua proteção; d) exigir, na forma da
lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente
causadora de significativa degradação do meio ambiente,
estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
e) controlar a produção, a comercialização
e o emprego de técnicas, métodos e substâncias
que comportem risco para a vida e o meio ambiente; f) promover a
????e ?????????? educação ambiental em todos os níveis de ensino
e a conscientização pública para a preservação
do meio ambiente; g) proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma
da lei, as práticas que coloquem em risco sua função
ecológica, provoquem a extinção de espécies
ou submetam os animais a crueldade.
Como se observa, as normas constitucionais refletem a consciência
de que o direito à vida digna como matriz de todos os demais
direitos humanos é que há de orientar todas as formas
de atuação no campo da tutela do meio ambiente. Compreendeu-se
que ele é um valor preponderante sobre quaisquer considerações,
tais como as relacionadas ao desenvolvimento econômico, ao
direito de propriedade e à iniciativa privada.
Assim, se a exploração madeireira ou mineradora gera
empregos e superávit no balanço entre exportações
e importações, ainda assim ela deverá respeitar
os limites de manejo e/ou manutenção da qualidade ambiental.
A propriedade e a livre iniciativa privada são direitos assegurados
no texto constitucional, mas não podem estar acima do direito
fundamental à uma vida digna, que está em jogo quando
se discute a tutela da qualidade do meio ambiente, que é instrumental
no sentido de que, por meio dessa tutela, o que se protege é um
valor maior: a qualidade da vida humana.
Qual a matriz constitucional que orienta a proteção
jurídica do meio ambiente? ????e ??????????
12)
Direito dos Povos Indígenas
O princípio da igualdade exige que as especificidades e as
diferenças entre todas as pessoas sejam observadas, reconhecidas
e respeitadas. Somente mediante essa perspectiva é possível
transitar-se da igualdade formal para a igualdade material ou substantiva.
Tal perspectiva concretizou-se com o processo de multiplicação
dos direitos humanos. Esse processo de “proliferação
de direitos” envolveu não apenas o aumento dos bens
merecedores de tutela, mediante a previsão dos direitos à prestação
(como os direitos econômicos, sociais e culturais), como também
envolveu a extensão da titularidade de direitos.
A partir da extensão da titularidade de direitos, há o
alargamento do próprio conceito de sujeito de direito, que
passou a abranger, além do indivíduo, as entidades
de classe, as organizações sindicais, os grupos vulneráveis
e a própria humanidade, como no caso do direito ao meio ambiente.
Esse processo implicou ainda a especificação do sujeito
de direito, tendo em vista que, ao lado do sujeito genérico
e abstrato, delineia-se o sujeito de direito concreto, visto em sua
especificidade e na concretude de suas diversas relações.
Isto é, do ente abstrato, genérico, destituído
de cor, sexo, idade, classe social, etnia, dentre outros critérios,
emerge o sujeito de direit ????e ??????????o concreto, historicamente situado, com
especificidades e particularidades. Daí apontar-se não
mais ao indivíduo genérica e abstratamente considerado,
mas ao indivíduo “especificado”, considerando-se
categorizações relativas ao gênero, idade, etnia,
raça, orientação sexual, etc.
Consolida-se, gradativamente, um aparato normativo especial de proteção
endereçado à proteção de pessoas ou grupos
de pessoas particularmente vulneráveis que merecem proteção
especial. Os sistemas normativos internacional e nacional passam
a reconhecer direitos endereçados às crianças,
aos idosos, às mulheres, às pessoas vítimas
de tortura, às pessoas vítimas de discriminação
racial, dentre outros. No âmbito internacional, são
elaboradas a Convenção Internacional sobre a Eliminação
de todas as formas de Discriminação Racial, a Convenção
Internacional sobre a Eliminação de todas as formas
de Discriminação contra a Mulher, a Convenção
Internacional contra a Tortura, a Convenção sobre os
Direitos da Criança, dentre outros importantes instrumentos
internacionais.
Esse sistema internacional de proteção realça o processo
de especificação do sujeito de direito no qual o sujeito de direito é visto
em sua especificidade e concretude. As Convenções que integram
esse sistema são endereçadas a determinado sujeito de ????e ?????????? direito,
ou seja, buscam responder a determinada violação de direito.
No caso brasileiro, o processo de especificação do sujeito de
direito ocorreu fundamentalmente com a Constituição Brasileira
de 1988 que, por exemplo, traz capítulos específicos dedicados à criança,
ao adolescente, ao idoso, aos índios, bem como dispositivos constitucionais
específicos voltados às mulheres, à população
afro-descendente, às pessoas portadoras de deficiência, etc.
Os povos indígenas foram os habitantes originários do território
brasileiro. Sabemos que, ao longo do período Colonial, esses povos foram
escravizados, explorados e dizimados pelos colonizadores. Mesmo depois da Independência
e da proclamação da República, o avanço na ocupação
de terras tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas feriu mortalmente
as tradições e mesmo a sobrevivência de vários grupos
indígenas. A Constituição de 1988 traduz o reconhecimento
dessa dívida histórica e da vulnerabilidade social dos povos
indígenas e objetiva proteger suas tradições, além
de sinalizar, com medidas afirmativas, o respeito à dignidade dos povos
indígenas. Esse é o espírito com que deve ser lido e interpretado
o caput do Art. 231, que abre o capítulo dedicado aos povos indígenas: “São
reconhecidos aos índios sua organização social, costumes,
línguas, crenças e tradições, e os direitos originários
sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União
demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.
Além de torn ????e ??????????ar dever dos poderes públicos a proteção
e respeito ao patrimônio material, social e cultural dos povos indígenas,
a Constituição também atribui aos próprios índios,
suas comunidades e organizações a legitimidade para defender
seus direitos e interesses ativamente perante o Poder Judiciário. Se
anteriormente à Constituição de 1988 os índios
(silvícolas) eram considerados sujeitos de direito relativamente capazes,
com a sua publicação, eles adquirem capacidade jurídica
plena.
A Fundação Nacional do Índio - FUNAI é o órgão
do governo brasileiro que estabelece e executa a Política Indigenista
no Brasil, dando cumprimento ao que determina a Constituição
de 1988.
Na prática, significa que compete à FUNAI promover a educação
básica aos índios, demarcar, assegurar e proteger as terras por
eles tradicionalmente ocupadas, estimular o desenvolvimento de estudos e levantamentos
sobre os grupos indígenas. A Fundação tem, ainda, a responsabilidade
de defender as Comunidades Indígenas, de despertar o interesse da sociedade
nacional pelos índios e suas causas, gerir o seu patrimônio e
fiscalizar as suas terras, impedindo as ações predatórias
de garimpeiros, posseiros, madeireiros e quaisquer outras que ocorram dentro
de seus limites e que representem um risco à vida e à preservação
desses povos.
No âmbito da Secretaria Especial dos Direitos Humanos – SEDH, cabe
ao Conselho Nacional de Combate à Discriminação - CNCD,
criado em outubro de 2001, a função de propor e acompanhar políticas
públicas para a defesa dos direitos de indiv& ????e ??????????iacute;duos e grupos sociais
vítimas de discriminação racial e étnica ou outra
forma de intolerância, dentre estes, os povos indígenas.
Qual
a principal mudança introduzida pela Constituição
de 1988 em relação aos povos indígenas?
13) Direitos das Mulheres
A reflexão a respeito da mulher e o debate sobre direitos
humanos no Brasil levanta duas questões centrais: a) Como
compreender a gramática contemporânea dos direitos humanos
das mulheres?; b) Quais os principais desafios e perspectivas para
a proteção destes direitos no cenário brasileiro?
Em face do processo de internacionalização dos direitos
humanos, foi a Declaração e Programa de Ação
(Viena-1993) que, de forma explícita, afirmou, em seu parágrafo
18, que os direitos humanos das mulheres e das meninas são
parte inalienável, integral e indivisível dos direitos
humanos universais. Esta concepção foi reiterada pela
Plataforma de Ação de Pequim, de 1995. O legado de
Viena é duplo: endossa a universalidade e a indivisibilidade
dos direitos humanos invocada pela Declaração Universal
de 1948 e também confere visibilidade aos direitos humanos
das mulheres e das meninas, em expressa alusão ao processo
de especificação do sujeito de direito e à justiça
enquanto reconhecimento de identi ????e ??????????dades.
Importa ressaltar que a primeira fase de proteção dos
direitos humanos foi marcada pela ótica da proteção
geral, que expressava o temor da diferença que, no nazismo,
havia sido orientada para o extermínio com base na igualdade
formal. Basta avaliar quem é o destinatário da Declaração
Universal de 1948, bem como atentar para a Convenção
para a Prevenção e Repressão ao Crime de Genocídio,
também de 1948, que pune a lógica da intolerância
pautada na destruição do “outro” em razão
de sua nacionalidade, etnia, raça ou religião.
Torna-se, contudo, insuficiente tratar o indivíduo de forma genérica,
geral e abstrata. É necessária a especificação
do sujeito de direito, que passa a ser visto em suas peculiaridades e particularidades.
Neste sentido, determinados sujeitos de direitos, ou determinadas violações
de direitos, exigem uma resposta específica e diferenciada. Transita-se
do paradigma do homem, ocidental, adulto, heterossexual e dono de um patrimônio
para a visibilidade de novos sujeitos de direitos.
Neste cenário, as mulheres devem ser vistas nas especificidades e peculiaridades
de sua condição social. Ao lado do direito à igualdade,
surge, como direito fundamental, o direito à diferença. O direito à diferença
implica o direito ao reconhecimento de identidades próprias, o que propicia
a incorporação da perspectiva de gênero, isto é,
reinterpretar os direitos humanos a partir da relação entre os
gêneros, como um tema transversal.
????e ?????????? O balanço das últimas três décadas permite arriscar
que o movimento internacional de proteção dos direitos humanos
das mulheres centrou seu foco em três questões centrais: a) a
discriminação contra a mulher; b) a violência contra a
mulher e c) os direitos sexuais e reprodutivos.
Na experiência brasileira, a Constituição Federal de 1988,
enquanto marco jurídico da transição democrática
e da institucionalização dos direitos humanos no país,
incorporou a maioria significativa das reivindicações formuladas
pelas mulheres.
O êxito do movimento de mulheres em relação aos avanços
constitucionais é evidenciado pelos dispositivos constitucionais que,
dentre outros, asseguram: a) a igualdade entre homens e mulheres em geral (artigo
5o, I) e especificamente no âmbito da família (artigo 226, parágrafo
5o); b) a proibição da discriminação no mercado
de trabalho, por motivo de sexo ou estado civil (artigo 7o, XXX, regulamentado
pela Lei 9.029, de 13 de abril de 1995, que proíbe a exigência
de atestados de gravidez e esterilização e outras práticas
discriminatórias para efeitos admissionais ou de permanência da
relação jurídica de trabalho); c) a proteção
especial da mulher do mercado de trabalho, mediante incentivos específicos
(artigo 7o, XX, regulamentado pela Lei 9.799, de 26 de maio de 1999, que insere
na Consolidação das Leis do Trabalho regras sobre o acesso da
mulher ao mercado de trabalho); d) o planejamento familiar como uma livre decisão
do casal, devendo o Estado propiciar recursos educacionais e científicos
para o exercício desse direito (artigo 226, par&aacu ????e ??????????te;grafo 7o, regulamentado
pela Lei 9.263, de 12 de janeiro de 1996, que trata do planejamento familiar,
no âmbito do atendimento global e integral à saúde); e)
o dever do Estado de coibir a violência no âmbito das relações
familiares (artigo 226, parágrafo 8o).
Além desses avanços, merece ainda destaque a Lei 9.504, de 30
de setembro de 1997, que estabelece normas para as eleições,
dispondo que cada partido ou coligação deverá reservar
o mínimo de trinta por cento e o máximo de setenta por cento
para candidaturas de cada sexo. Adicione-se, também, a Lei 10.224, de
15 de maio de 2001, que dispõe sobre o crime de assédio sexual.
Há que se observar que os avanços obtidos no plano internacional
têm sido capazes de impulsionar transformações internas.
Nesse sentido, cabe destaque ao impacto de documentos como a Convenção
sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher,
de 1979, a Declaração e Programa de Ação de Viena-1993,
a Conferência sobre População e Desenvolvimento do Cairo,
de 1994, a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar
a Violência contra a Mulher, de 1994 e a Declaração e a
Plataforma de Ação de Pequim, de 1995, na construção
dos direitos humanos das mulheres no contexto brasileiro. Tais instrumentos
internacionais têm possibilitado ao movimento de mulheres exigir, no
plano local, a implementação de avanços obtidos na esfera
internacional.
No que se refere à discriminação contra a mulher, a experiência
brasileira está em absoluta consonância com os parâmetros
protetivos internacion ????e ??????????ais, refletindo tanto a vertente repressiva-punitiva
(pautada pela proibição da discriminação contra
a mulher), como a vertente promocional (pautada pela promoção
da igualdade, mediante políticas compensatórias).
Quanto à violência contra a mulher, embora a Constituição
de 1988 seja a primeira a explicitar a temática, merecendo destaque
também a lei que tipifica a violência do assédio sexual,
não há ainda legislação específica a tratar,
por exemplo, da violência doméstica. É emergencial a adoção
de políticas públicas voltadas à prevenção,
punição e erradicação da violência contra
a mulher em todas as suas manifestações, eis que este padrão
de violência constitui grave violação aos direitos humanos
das mulheres.
Quanto aos direitos reprodutivos, a Carta de 1988 simboliza novamente um avanço
ao reconhecer o planejamento familiar como uma livre decisão do casal,
devendo o Estado propiciar recursos educacionais e científicos para
o exercício desse direito, vedada qualquer coerção. Resta,
todavia, a necessidade de assegurar amplos programas de saúde reprodutiva,
reavaliando a legislação punitiva referente ao aborto, de modo
a convertê-lo efetivamente em problema de saúde pública.
No âmbito da estrutura governamental, compete à Secretaria Especial
de Políticas para as Mulheres – SEPM – criada pela Lei 10.683,
de 28/05/2003 - que integra a Presidência da República, assessorar
direta e imediatamente o Presidente da República na formulação,
coordenação e articula&ccedi ????e ??????????l;ão de políticas para
as mulheres, bem como elaborar e implementar campanhas educativas e anti-discriminatórias
, de caráter nacional; elaborar o planejamento de gênero que contribua
na ação do governo federal e demais esferas governamentais com
vistas à promoção da igualdade entre homens e mulheres
através da cooperação com organismos nacionais e internacionais,
públicos e privados voltados para a implementação de políticas
para as mulheres. Para a implementação de políticas, a
SEPM conta, em sua estrutura básica, com o Conselho Nacional dos Direitos
da Mulher - CNDM, órgão colegiado de caráter consultivo,
criado pela Lei 7353, de 29/08/1985, complementado pelo Decreto 4.773, de 07/07/2003
que tem por finalidade promover, no âmbito nacional, políticas
para as mulheres com a perspectiva de gênero, que visem eliminar o preconceito
e a discriminação, inclusive as de aspectos econômicos
e financeiros, ampliando o processo de controle social sobre as referidas políticas.
Apesar dos significativos avanços obtidos na esfera constitucional e
internacional, reforçados pela legislação infra-constitucional
esparsa, que refletem, cada qual ao seu modo, as reivindicações
e anseios contemporâneos das mulheres ainda persiste na cultura brasileira
uma ótica sexista e discriminatória com relação às
mulheres que as impedem de exercer, com plena autonomia e dignidade, seus
direitos mais fundamentais.
Os avanços constitucionais e internacionais, que consagram a ótica
da igualdade entre os gêneros, têm, por vezes, a sua força
nor ????e ??????????mativa gradativamente pulverizada e reduzida mediante uma cultura que praticamente
despreza o alcance dessas inovações, sob uma perspectiva discriminatória,
fundada em uma dupla moral que ainda atribui pesos diversos e avaliações
morais distintas a atitudes praticadas por homens e mulheres.
Daí a urgência em se estimular uma cultura fundada na observância
dos parâmetros internacionais e constitucionais de proteção
aos direitos humanos das mulheres, visando a implementação dos
avanços constitucionais e internacionais já alcançados.
Esses avanços consagram uma ótica democrática e igualitária
em relação aos gêneros. É preciso criar uma doutrina
jurídica, sob a perspectiva de gênero, que seja capaz de visualizar
a mulher e fazer visíveis as relações de poder entre os
gêneros. Essa doutrina há de ter como base o padrão de
discriminação e as experiências de exclusão e violência
sofridas por mulheres. Deve ainda ter como objetivo central a tarefa de transformar
essa realidade. Como meio, essa doutrina deve se valer dos instrumentos internacionais
de proteção dos direitos da mulher e da Constituição
de 1988.
É
importante compreender que não há direitos humanos sem a plena
observância dos direitos das mulheres, ou seja: não há direitos
humanos sem que metade da população mundial exerça, em
igualdade de condições, os direitos mais fundamentais.
Como o direito à diferença pode complementar o direito à igualdade?
14) Direitos dos Afro-Descendentes
????e ?????????? Ao tratar do tema da igualdade, a Constituição Brasileira acolhe
duas vertentes distintas e complementares: o combate à discriminação
e a promoção da igualdade. Isto é, o combate à discriminação
torna-se insuficiente se não se verificam medidas voltadas à promoção
da igualdade. Por sua vez, a promoção da igualdade, por si só,
mostra-se insuficiente se não se verificam políticas de combate à discriminação.
A Constituição Brasileira, em seu artigo 5º, incisos XLI
e XLII, estabelece que a "lei punirá qualquer discriminação
atentatória dos direitos e liberdades fundamentais", acrescentando
que “a prática do racismo constitui crime inafiançável
e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos
da lei."
A fim de conferir cumprimento ao dispositivo constitucional, surgiu a Lei
n. 7.716 de 5 de janeiro de 1989, que definiu os crimes resultantes de preconceito
de raça ou cor. A Lei 7716/89, denominada Lei Caó, veio a ser
alterada posteriormente em 1997 (Lei 9.459/97), para também contemplar
a injúria baseada em discriminação racial (ex: as humilhações,
os xingamentos,…). A Lei 9.459/97 ainda ampliou o foco para a punição
de atos resultantes de preconceito de etnia, religião ou procedência
nacional, já que a Lei 7716/89 teve seu objeto originariamente restrito
ao combate dos atos resultantes de preconceito de raça ou cor.
Na experiência brasileira constata-se que a Lei Afonso Arinos de 1951
(Lei 1390/51) foi a primeira a tipificar o racismo como contravenção
penal (crime de menor ????e ?????????? potencial ofensivo). Portanto, somente com a Constituição
de 1988, 100 anos após a abolição da escravatura, o racismo
foi elevado a crime, inafiançável, imprescritível e sujeito à pena
de reclusão, nos termos do art.5o, XLII.
Contudo, em relação a discriminação racial, o aparato
repressivo-punitivo, embora relevante e necessário, tem se mostrado
insuficiente para enfrentar tal forma de discriminação. Até 2000,
passados mais de dez anos de vigência da Lei, as condenações
criminais por racismo não chegavam a uma dezena no país. As indenizações
por danos morais, na esfera cível, têm se mostrado uma via mais
exitosa. Dois parecem ser os motivos: a) a reduzida sensibilidade dos operadores
do Direito para responder aos casos e b) a insuficiência de limitar o
enfrentamento da discriminação apenas à vertente repressiva.
De um lado, faz-se necessário fomentar a capacitação jurídica
para que, os diversos atores: delegados/as, promotores, advogados/as, magistrados/as,
possam, com maior eficácia, inclusive mediante a criação
de serviços jurídicos especializados, responder à gravidade
do racismo. No mesmo sentido, cabe aprimorar e fortalecer o aparato repressivo,
como sugere o documento brasileiro à Conferência de Durban, tornando
o racismo, a xenofobia e outras formas de intolerância, agravantes de
crimes. Ressalte-se que as ações individuais indenizatórias
por danos morais não devem resumir-se no único caminho no enfrentamento
do racismo. A propositura de ações coletivas e da ação
civil pública, em particular, com f ????e ??????????undamento no princípio da
igualdade, pode e deve ser mais uma alternativa na luta contra o racismo e
sua forma contemporânea de manifestação.
Por outro lado, não basta o mero reforço da vertente repressiva,
como comprova a própria experiência brasileira. É necessário
transcender a perspectiva punitiva, a fim de que seja aliada à perspectiva
promocional.
No Direito brasileiro, a Constituição Federal de 1988 estabelece
importantes dispositivos que demarcam a busca da igualdade material, que transcende
a igualdade formal. A título de registro, destaca-se o artigo 7º,
inciso XX, que trata da proteção do mercado de trabalho da mulher,
mediante incentivos específicos, bem como o artigo 37, VII, que determina
que a lei reservará percentual de cargos e empregos públicos
para as pessoas portadoras de deficiência. Adicione-se também
o Programa Nacional de Direitos Humanos, que faz expressa alusão às
políticas compensatórias, prevendo como meta o desenvolvimento
de ações afirmativas em favor de grupos socialmente vulneráveis;
o Programa de Ações Afirmativas na Administração
Pública Federal; e a adoção de políticas de cotas
em Universidades (ex: UERJ, UNEB, UnB,...).
Em um país em que os afro-descendentes são 64% dos pobres e 69%
dos indigentes (dados do IPEA), em que o índice de desenvolvimento humano
geral (IDH, 2000) figura o país em 74o lugar, mas que, sob o recorte étnico-racial,
o IDH relativo à população afro-descendente indica a 108a
posição (enquanto o IDH relativo à população
branca indica a 43a posição), faz ????e ??????????-se necessária a adoção
de ações afirmativas em benefício da população
negra, em especial nas áreas da educação e do trabalho.
Para cumprir os compromissos assumidos pelo Brasil, em nível internacional,
de combate à discriminação em todas as suas formas, foi
criada, no âmbito da Presidência da República, através
da Lei 10.678, de 23/05/2003, a Secretaria Especial de Políticas de
Promoção da Igualdade Racial – SEPPIR, à qual compete
dentre outras atribuições, assessorar o Presidente da República
direta e imediatamente na formulação, coordenação
e articulação de políticas e diretrizes para a promoção
da igualdade racial; na formulação, coordenação
e avaliação das políticas públicas afirmativas
de promoção da igualdade e da proteção dos direitos
de indivíduos e grupos raciais e étnicos, com ênfase na
população negra, afetados por discriminação racial
e demais formas de intolerância; na formulação, coordenação
e acompanhamento das políticas transversais de governo para a promoção
da igualdade racial, no planejamento, coordenação da execução
e avaliação do Programa Nacional de Ações Afirmativas
e na promoção do acompanhamento da implementação
de legislação de ação afirmativa e definição
de ações públicas que visem o cumprimento dos acordos,
convenções e outros instrumentos congêneres assinados pelo
Brasi ????e ??????????l, nos aspectos relativos à promoção da igualdade
e de combate à discriminação racial ou étnica.
Dê exemplos concretos da política promocional de combate a discriminação
dos afro-descendentes.
15)
Direito à Livre Orientação
Sexual
Como já observamos, o paradigma que, em geral, ainda orienta
o pensamento político, jurídico e social no Brasil
e em boa parte do mundo Ocidental é o do homem, adulto, ocidental,
heterossexual e dono de um patrimônio. Dentre as muitas exclusões
sociais geradas por tal paradigma, uma das mais cruéis é a
sofrida pelas pessoas com orientação sexual distinta
da heterossexual. A crueldade aqui atinge a esfera da liberdade e
identidade pessoal, da autonomia de escolha e de consciência,
da vida íntima e da capacidade de amar e escolher e conviver
dignamente com o ser amado.
Para se ter uma medida de quanto o preconceito é disseminado
em nossa sociedade vale referir a uma pesquisa da UNESCO (Órgão
da ONU para Educação, Ciência e Cultura) divulgada
nas primeiras semanas de março de 2004, que ouviu 16.422 estudantes
do ensino fundamental e médio de 14 cidades brasileiras. Segundo
o estudo, aproximadamente 25% dos estudantes afirmaram que não
gostariam de ter um colega de classe homossexual – entre os
meninos, são quase 40%. Portanto, já temos uma jovem
geração marcada pelo pre ????e ??????????conceito e pela idéia
de exclusão do homossexual e sem a cultura ética da
liberdade de orientação sexual.
Em uma pesquisa sobre crimes homofóbicos documentados em 25
países de todos os quadrantes, o Brasil situa-se no topo da
lista, com uma média de 128 mortes anuais, seguido do México
com 35 assassinatos e, em terceiro lugar, dos Estados Unidos, com
25 crimes de ódio homofóbico por ano.
A Constituição de 1988 deu, já sabemos, largos
passos, na superação do tratamento discriminatório
fundado no sexo, ao equiparar os direitos e obrigações
de homens e mulheres. Contudo, uma das questões mais debatidas
na Assembléia Nacional Constituinte, com relação à sexualidade
e igualdade, referiu-se às então chamadas “discriminações
dos homossexuais”. Tentou-se introduzir uma norma que a vedasse
claramente, mas, lamentavelmente, isso não ocorreu sob o argumento
de que “não se encontrou uma expressão nítida
e devidamente definida que não gerasse extrapolações
inconvenientes”. Uma delas foi justamente a de reconhecer a
igualdade, sem discriminação de orientação
sexual no Art. 3º, IV, reconhecendo, assim, não apenas
a igualdade, mas também a liberdade das pessoas de ambos os
gêneros adotarem a orientação sexual que lhes
conviesse. Porém, houve o receio de que a expressão
orientação sexual abrigasse “deformaç&oti ????e ??????????lde;es
prejudiciais a terceiros”. Daí a opção
por vedar distinções de qualquer natureza e qualquer
forma de discriminação, consideradas suficientemente
abrangentes para incluir também aqueles fatores que têm
servido de base para desequiparações e preconceitos.
Infelizmente, a timidez da Constituinte demonstra o quanto a questão
ainda é tabu em nossa sociedade, o que é reiterado
pelo atravancamento no Congresso Nacional do Projeto de Lei que reconhece
a união civil entre pessoas do mesmo sexo e pela inexistência
de legislação federal que criminalize (tal como no
caso do racismo) a discriminação com base na orientação
sexual.
Apear de tudo isso, a Constituição de 1988 elenca direitos
e garantias fundamentais, tais como o direito à liberdade
e à igualdade em geral, à liberdade de consciência, à intimidade, à vida
privada e, na essência de todos, à dignidade da pessoa
humana, cuja interpretação adequada só reafirma
o direito à livre orientação sexual. Com base
nesses preceitos, é possível afirmar uma cultura jurídica
que inspire uma consciência ética em nossa sociedade
de respeito à diferença e à livre orientação
sexual. Um importante exemplo, nesse sentido, foi a recente decisão
do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul de determinar
que os cartórios de registro civil aceitassem e registrassem
a uni&a ????e ??????????tilde;o civil de pessoas do mesmo sexo. Além de evitar
preconceitos, esse tipo de medida garante aos homossexuais o direito
de herdarem os bens de seus companheiros(as), dividir planos de saúde,
e outros direitos civis de qualquer cidadão brasileiro.
O enfrentamento da homofobia no país requer a educação
sexual em todos os graus escolares, ensinando a todas as crianças,
jovens e adultos que o homossexual é ser humano digno de respeito
e que a livre orientação sexual é um direito
inalienável de cidadania. Faz-se também necessária
a adoção de leis que punam exemplarmente os que discriminam,
violentam e assassinam gays, travestis e lésbicas, capacitando
a polícia e a justiça a investigar, julgar e punir
com exemplar severidade os autores de crimes homofóbicos.
Some-se ainda a necessidade de campanhas de esclarecimento junto à população
em geral, substituindo a homofobia por sentimentos e ações
de tolerância e respeito à diversidade sexual.
Iniciativas governamentais como o “Programa Brasil Sem Homofobia – Programa
Brasileiro de Combate à Violência e à Discriminação
contra Gays, Lésbicas, Transgêneros e Bissexuais, e
de Promoção da Cidadania Homossexual”, lançado
em 25/05/2003, propõe a transversalidade do tema nas ações
das esferas e níveis governamentais, sendo uma conquista histórica
para o movimento homossexual.O referido Programa tem como princípios: “ a
incl ????e ??????????usão da perspectiva da não discriminação
por orientação sexual e de promoção dos
direitos humanos de gays, lésbicas, transgêneros e bissexuais,
nas políticas públicas e estratégias do Governo
Federal, a serem implantadas (parcial ou integralmente) por seus
diferentes Ministérios e Secretarias; a produção
de conhecimento para subsidiar a elaboração, implantação
e avaliação das políticas públicas voltadas
para o combate à violência e à discriminação
por orientação sexual, garantindo que o Governo Brasileiro
inclua o recorte de orientação sexual e o segmento
GLTB em pesquisas nacionais a serem realizadas por instâncias
governamentais da administração pública direta
e indireta; a reafirmação de que a defesa, a garantia
e a promoção dos direitos humanos incluem o combate
a todas as formas de discriminação e de violência
e que, portanto, o combate à homofobia e a promoção
dos direitos humanos de homossexuais é um compromisso do Estado
e de toda a sociedade brasileira”.
O Conselho Nacional de Combate à Discriminação
- CNDC terá papel de suma importância nesse processo,
uma vez que representa o coletivo da sociedade brasileira, e é o
responsável pelo controle das ações que visem
a promoção da igualdade e o fim da discriminação
em todas as suas vertentes, onde se inclui o co ????e ??????????mbate à discriminação
com base na orientação sexual.
Estão previstas avaliações anuais do Programa Brasil Sem
Homofobia, sendo que, ao final do segundo ano, terá lugar processo de
avaliação que envolverá organizações de
defesa dos direitos de homossexuais e de defesa dos direitos humanos que, juntamente
com o Governo Federal, definirá as bases para a sua continuidade.
Pesquise
em seu município e dê um exemplo de crime
homofóbico.
16)
Direitos das Crianças e dos Adolescentes.
Ainda persiste em nosso país a cultura adultocêntrica,
que percebe o mundo e a vida a partir da lente dos adultos. Dissemina-se
a cultura da “menorização”, em que crianças
e adolescentes são vistos como seres inferiores, menores,
em direitos e dignidade. A própria etmologia de infância
aponta ao “infant”, que é o sem voz e sem fala.
Frise-se que, ao longo de décadas, as crianças não
detinham qualquer autonomia. Eram integradas ao mundo dos adultos
e conduzidas por rigida disciplina.
No Brasil, vigorava, até a última década, a
doutrina do “menor em situação irregular” (inspiradora
do Código de Menores), o que traz a marca da herança
cultural correicional, que só vê a criança em
situação de irregulari ????e ??????????dade e não como uma pessoa
dotada de dignidade. Foi somente com a Constituição
Brasileira de 1988, com o Estatuto da Criança e do Adolescente
(Lei n.8069/90) e com a Convenção sobre os Direitos
da Criança de 1989 (ratificada pelo Brasil em 24.09.90), que
se introduziu, na cultura jurídica brasileira, um novo paradigma
inspirado pela concepção da criança e do adolescente
como verdadeiros sujeitos de direito, em condição peculiar
de desenvolvimento.
O novo paradigma introduzido pela CF 1988 e pela Convenção
fomenta a doutrina da proteção integral à criança
e ao adolescente. Consagra, deste modo, uma lógica e uma própria
voltadas a assegurar a prevalência e a primazia do interesse
superior da criança e do adolescente.Como afirma o texto constitucional
criança é prioridade absoluta. Na qualidade de sujeitos
de direito em condição peculiar de desenvolvimento, à criança
e ao adolescente é garantido o direito à proteção
especial.
Sob a perspectiva dos direitos humanos, tanto a Convenção sobre
os Direitos da Criança (1989), como a Constituição de
1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), traduzem uma visão
integral dos direitos humanos das crianças e dos adolescentes, contemplando
a indivisibilidade destes direitos, sua implementação recíproca
e a igual importância de todos os direitos, sejam civis, políticos,
sociais, econômicos ou culturais, consagrando a criança e o adolescente
como indivíduos, po ????e ??????????rtanto, cidadãos.
No entanto, apesar da clareza dos comandos normativos nacionais e internacionais
em atribuir direitos às crianças e aos adolescentes, testemunhamos
um padrão de desrespeito aos mais elementares direitos humanos, de que
são titulares as crianças e os adolescentes. Destacam-se, no
quadro das graves violações aos direitos humanos das crianças
e adolescentes: a) a violência, o abuso e a exploração
sexual; b) o trabalho infantil; e c) o tratamento do adolescente em conflito
com a lei. No que se refere, especificamente, ao adolescente em conflito com
a lei, a situação é ainda mais caótica. A atribuição
da autoria de prática de delitos gera freqüentemente a desqualificação
dos adolescentes, como se estes deixassem de ser sujeitos de direitos e perdessem
o estatuto de cidadania. Os adolescentes em conflito com a lei, os quais integram
a categoria chamada de delinqüência juvenil, geram reações
e sentimentos hostis de grupos sociais que não analisam o contexto sócio-econômico,
político e cultural em que vivem. Normalmente, tais reações
são imediatistas e expressam um desejo de simplesmente excluir, ainda
mais, esta camada da população, sem que exista alguma mobilização
para a transformação desta realidade . Nota-se, também,
um processo de culpabilização direcionado ao adolescente, à família
deste e, até mesmo, ao Estatuto da Criança e do Adolescente.
As instituições que acolhem esses menores considerados infratores
se propõem a isolar, a punir ou educar? Em algum momento, essas menores
vão sair. Será que a maioridade é o suficiente? Como será enfrentada
????e ?????????? a vida social após, por exemplo, dez anos de isolamento? Outra questão
que recobre o fenômeno é a faixa etária. Nesse aspecto,
a idade de 18 anos é uma marca, uma vez que, a partir daí, quem
infringe a lei vai para os presídios. Além disso, surge a questão
social. Dificilmente, entre aqueles menores, existe algum que pertença à classe
média ou média alta. Portanto estes menores são, na maioria,
provenientes de lares carentes. Mas isso não quer dizer que ser violento é sinônimo
de carente. Se isso fosse verdade, estaríamos transformando a periferia
da cidade em viveiros de menores violentos que teriam que ser isolados para
poder deixar a sociedade livre de suas atitudes e comportamentos violentos.
Atente-se ainda que a discriminação implica em pobreza e que
a pobreza implica em discriminação. No Brasil, as crianças
e os adolescentes representam 61 milhões (35,9% da população
local). Deste universo, 45% do total de crianças e adolescentes são
pobres, sendo que 71% das crianças indígenas o são e 58%
das crianças negras também. Adicione-se que 74% das crianças
e adolescentes da área rural são pobres – o dobro da percentagem
encontrada nas áreas urbanas.
Daí a importância de identificar as mais graves violações
e de se “desnaturalizar” as desigualdades, bem como o padrão
de violência estrutural, sistemática e persistente, que afeta
diversamente crianças e adolescentes, dependendo de sua raça,
etnia, gênero, região, dentre outros critérios. A pertença
a estas diversas raças, etnias, gênero não pode dificultar
o pleno e livre exercício dos direit ????e ??????????os humanos, mitigando a dignidade
e restringindo as potencialidades destes sujeitos de direitos.
Neste contexto, é essencial a apropriação de novos valores
e a implementação dos parâmetros constitucionais e internacionais,
que afirmam as crianças e adolescentes como verdadeiros e efetivos sujeitos
de direito, em condição peculiar de desenvolvimento, a merecer
especial proteção.
Como exemplo de um amplo esforço de articulação e integração
entre governo e sociedade civil organizada capaz de promover a necessária
sinergia entre as várias ações que afetam a qualidade
de vida das crianças e dos adolescentes, o Presidente Luiz Inácio
Lula da Silva assumiu o compromisso de garantir, na sua gestão, prioridade às
políticas voltadas para promover os direitos de cidadania às
crianças e aos adolescentes brasileiros.
Em resposta a este compromisso a Fundação Abrinq pelos Direitos
da Criança apresentou o Plano Presidente Amigo da Criança e do
Adolescente, que prima pelo respeito à legislação brasileira
expressa na Constituição Federal de 1988 e no Estatuto da Criança
e do Adolescente – ECA, o qual foi lançado na última Conferência
Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, em dezembro de 2003.
O Plano observa os acordos internacionais relativos à criança
e ao adolescente ratificados pelo Brasil na Convenção Internacional
sobre os Direitos da Criança de 1989 e, particularmente, na Seção
Especial pela Criança realizada pela ONU em 2002, que estabeleceu no
documento “Um Mundo para as Crianças” os compromissos de:
promover vidas saudáveis; prover educa&c ????e ??????????cedil;ão de qualidade,
proteger contra abuso, proteção e violência e combater
HIV/AIDS.
A responsabilidade pela implementação do Plano será de
uma Comissão Interministerial, coordenada pela Secretaria Especial de
Direitos Humanos e composta por representantes dos seguintes órgãos:
Ministério da Assistência Social; Ministério das Cidades;
Ministério da Educação; Ministério Extraordinário
da Segurança Alimentar e Combate à Fome; Ministério da
Integração Nacional; Ministério da Justiça; Ministério
do Planejamento, Orçamento e Gestão; Ministério da Saúde;
Ministério do Trabalho Emprego; Secretaria Especial dos Direitos Humanos;
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, e Conselho Nacional dos Direitos
da Criança e do Adolescente.
A Rede de Monitoramento Amiga da Criança acompanhará a implementação
dos compromissos de gestão do Plano Presidente Amigo da Criança,
analisando os avanços das metas nas áreas de educação,
saúde e proteção, e propondo recomendações
Um outro exemplo é o Plano Nacional de Prevenção e Erradicação
do Trabalho Infantil, a ser lançado em junho de 2004, elaborado pela
Comissão Nacional de Combate ao Trabalho Infantil – Conaeti – no âmbito
do Ministério do Trabalho e Emprego, a partir das diretrizes propostas
pelo Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação
do Trabalho Infantil – FNPETI (articulação quadripartite,
responsável pela articulação de políticas de enfrentamento
ao trabalho infantil no Brasil)
É emergencia ????e ??????????l romper, em definitivo, com as reminiscências de uma
cultura e prática autoritárias, que inibem a construção
emancipatória dos direitos humanos das crianças e adolescentes,
violando, sobretudo, seu direito fundamental ao respeito e à dignidade.
Descubra
em seu município uma entidade que trabalhe com direito
da criança e do adolescente e relate um trabalho desenvolvido
por ela que tem como base a doutrina da proteção integral.
17) Direito dos Idosos
A Política Nacional do Idoso tem por objetivo assegurar os
direitos sociais do idoso, criando condições para promover
sua autonomia, integração e participação
efetiva na sociedade e foi instituída pela Lei 8.842, de 4/01/1994.
A Política apontou para as seguintes diretrizes: viabilização
de formas alternativas de participação, ocupação
e convívio do idoso, que proporcionem sua integração à demais
gerações; participação do idoso, através
de suas organizações representativas, na formulação,
implementação e avaliação das políticas,
planos, programas e projetos a serem desenvolvidos; priorização
do atendimento ao idoso através de suas próprias famílias,
em detrimento do atendimento asilar, à exceção
dos idosos que não possuam condições que garantam
sua própria sobrevivência;
????e ??????????
A Constituição de 1988 também reconhece a especificidade
dos idosos como sujeitos de direito. Assim é que o Art. 230
estatui que a família, a sociedade e o Estado têm o
dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação
na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes
o direito à vida.
Tal perspectiva foi explicitada e regulamentada, em boa hora, com
a recente promulgação do “Estatuto do Idoso” (Lei
Federal nº 10.741 de 03 de outubro de 2003). O novo Estatuto é um
marco jurídico para a proteção especial ao idoso,
considerando sua peculiar vulnerabilidade, suas demandas e seus direitos
especiais.
Considere, nesse ponto, o aumento considerável da população
idosa no Brasil e no mundo, em face da elevação da
expectativa de vida e da redução da taxa de fecundidade.
O fenômeno do aumento da expectativa de vida, por si só,
demandará a revisão dos conceitos de infância,
juventude e velhice. A título de exemplo, cabe citar o caso
norte-americano: em 1900 a expectativa de vida girava em torno de
46 anos, enquanto que em 2000 gira em torno de 80 anos. Vale dizer,
em 100 anos houve o prolongamento da vida em 34 anos. Seguramente,
em virtude dos avanços da biotecnologia, se imaginarmos o
ano 2100, a população norte-americana viverá no
mínimo 115 anos. Quem será o(a) idoso(a) neste contexto,
se aos sessenta anos estar-se-ia a alcançar a metade da vida?
????e ??????????
De todo modo, pode-se afirmar que o Estatuto significa um divisor
de águas: há a proteção aos idosos pré e
pós o Estatuto do Idoso. A proposta não é apenas
garantir a vida no âmbito quantitativo (quanto se vive), mas,
sobretudo, no âmbito qualitativo (como se vive). O Estatuto
tem o grande mérito de dar visibilidade ao idoso enquanto
pleno sujeito de direito, a demandar especial proteção. É,
assim, previsto um universo de direitos às pessoas com idade
igual ou superior a 60 (sessenta) anos, que vem a regulamentar o
comando constitucional do artigo 230.
Neste âmbito, dois princípios merecem destaque: a) o
princípio da proteção integral; e b) o princípio
da absoluta prioridade ao idoso. Quanto ao princípio da proteção
integral, o Estatuto reflete a indivisibilidade, interdependência
e inter-relação dos direitos humanos. Consagra aos
idosos tanto os direitos civis e políticos, como os direitos
sociais, econômicos e culturais, no marco da proteção
integral dos direitos, a fim de que todo idoso possa viver em condições
de liberdade e dignidade. Deste modo, é obrigação
da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público
assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação
do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura,
ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade,
????e ?????????? ao respeito e à convivência familiar e comunitária.
Quanto ao princípio da prioridade, o Estatuto afirma que a
garantia de prioridade compreende, por exemplo, o atendimento preferencial
imediato e individualizado junto aos órgãos públicos
e privados prestadores de serviços à população;
a preferência na formulação e na execução
de políticas sociais públicas específicas; a
destinação privilegiada de recursos públicos
nas áreas relacionadas com a proteção ao idoso;
dentre outras medidas.
O Estatuto ainda estabelece que nenhum idoso será objeto de
qualquer tipo de negligência, discriminação,
violência, crueldade ou opressão, prescrevendo crimes
e prevendo penas aos atos que violem os direitos dos idosos.
Para combater a violência e garantir os direitos dos idosos,
o Governo federal, em consonância com o Estatuto do Idoso,
está avaliando a implantação e implementação
do Plano Nacional de Enfrentamento à Violência contra
o Idoso. O documento traz ações conjuntas da Secretaria
Especial de Direitos Humanos, Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa) e Ministério da Saúde, Justiça,
Cidades, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do Esporte
e Lazer.
As ações propostas variam desde a implantação
de infra-estrutura e obras para facilitar a locomoção
de idosos e deficient ????e ??????????es físicos, medidas para melhorar a vida
do idoso que está preso até a realização
de campanhas de sensibilização junto à sociedade.
O plano também propõe monitorar e avaliar o funcionamento
das instituições de longa permanência para os
idosos. A proposta do Ministério da Saúde é inspecionar
a cada ano 50% das instituições asilares brasileiras
e, num prazo de dois anos, traçar um diagnóstico.
Em suma, o Estatuto, de forma inédita, vem a consagrar a todos
o direito a um envelhecimento digno, endossando à pessoa idosa
a condição de pleno sujeito de direito. A implementação
do Estatuto do Idoso exigirá que a cultura jurídica
seja capaz de introjetar novos valores, novas referências e
um novo paradigma quanto aos direitos dos idosos. A legislação
parece mais avançada que a própria realidade. Deve,
assim, ser instrumento para uma ação ousada, transformadora
e emancipatória, que permita aos idosos viver com respeito
e com dignidade, na qualidade de verdadeiros e plenos sujeitos de
direitos.
No campo dos direitos humanos, além das inovações
legais, faz-se fundamental a mudança cultural. É apenas
por meio da mudança de mentalidade e de visão do mundo
que as legislações protetivas aos direitos humanos
(compreendendo, por exemplo, a lei que pune a tortura; a lei que
pune o racismo; o Estatuto da Criança e do Adolescente, dentre
tantas outras) terão vitalidade ????e ?????????? e eficácia.
Porque os idosos são considerados enquanto merecedores de
uma proteção especial? Qual o mais recente documento
jurídico no Brasil que tem como objetivo a proteção
da pessoa idosa?
18)
Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência.
Não se sabe ao certo qual é o número de pessoas
portadoras de deficiência no Brasil. Todavia, podemos afirmar
que se trata de expressivo número de brasileiros(as), que
vêm sendo apartados(as) da vida social e que, apenas recentemente,
receberam proteção constitucional.
A história constitucional brasileira revela que, dispositivos
específicos acerca dos direitos das pessoas portadoras de
deficiências, somente puderam ser observados a partir de 1978,
com a edição da Emenda Constitucional 12/78, que representou
um marco na defesa deste grupo. Seu conteúdo pode ser considerado
abrangente, uma vez que compreendia os principais direitos das pessoas
portadoras de deficiência (educação, assistência
e reabilitação, proibição de discriminação
e acessibilidade). A Carta de 1988 manteve os direitos que já eram
previstos na Emenda Constitucional 12/78, conferindo-lhes maior detalhamento
e especificidade, bem como fixando as atribuições executivo-legislativas
de cada estado.
Vale destacar que o momento histórico de 1988 favoreceu a
participa&cc ????e ??????????edil;ão democrática das associações “de/para” deficientes
no processo de elaboração da Carta Magna, o que permitiu
a ampla incorporação dos direitos então reivindicados
por este grupo. Ressalte-se, ainda, que a Constituição
sofreu a influência e o impacto de um movimento crescente de
tutela da pessoa portadora de deficiência no âmbito internacional.
A Carta Brasileira de 1988, ao revelar um perfil eminentemente social,
impõe ao poder público o dever de executar políticas
que minimizem as desigualdades sociais e é neste contexto
que se inserem os sete artigos constitucionais (Art. 7º, XXXI;
Art. 23, II; Art. 24, XIV; Art. 37, VIII; Art. 203, IV e V; Art.
227, Parágrafo 1º, II e Parágrafo 2º e Art.
224) atinentes às pessoas portadoras de deficiência.
Estes dispositivos devem ser aplicados de modo a consagrar os princípios
da dignidade humana, da igualdade, da cidadania e da democracia.
Vale dizer, a elaboração legislativa, a interpretação
jurídica e o desenvolvimento das atividades administrativas
devem se pautar por estes princípios, a fim de alcançar
o ideal de uma sociedade mais justa, democrática e igualitária.
Com a Constituição Federal de 1988 verificam-se, portanto,
relevantes avanços no plano do direito, reconhecidos, inclusive,
pelos próprios interessados. Todavia, passados mais de quinze
anos de vigência desta Carta, mesmo com a previsão especificada
dos direitos das pessoas portadoras ????e ?????????? de deficiência, bem como
dos instrumentos garantidores destes direitos, a violação
subsiste e a concretização dos dispositivos constitucionais
ainda constitui meta a ser alcançada.
O problema reside na falta de efetividade das referidas normas, pois
nem o Poder Público, nem a sociedade, em geral, possuem sensibilidade
suficiente para lidar com a questão dos portadores de deficiência..
Para tanto, é fundamental a efetiva implementação
de sua força normativa, pelos diversos atores sociais, o que
compreende uma cultura vigilante e praticante da Constituição,
por meio de uma cidadania popular ativa e combativa, bem como da
atuação dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário,
um dos principais responsáveis pelo cumprimento da Lei Maior.
No âmbito infra-constitucional, a legislação
federal é satisfatória, na medida em que abarca praticamente
todos os direitos da pessoa portadora de deficiência e prevê a
criação de instituições para elaborar
e implementar políticas, programas, planos e projetos referentes
aos seus principais direitos.
O assunto que maior atenção mereceu por parte dos legisladores
brasileiros foi a inserção no trabalho da pessoa portadora
de deficiência, em conformidade com os comandos constitucionais
dos valores do trabalho e da dignidade humana.
Existem, todavia, algumas lacunas a serem preenchidas, tais como,
normas sobre combate à exploração, assistência à fam& ????e ??????????iacute;lia
e acessibilidade para portadores de deficiência sensorial (já que
grande parte das leis existentes refere-se à deficiência
motora).
Além destas omissões, constata-se que a legislação
federal é abundante e dispersa; tem sido elaborada sem a participação
da sociedade civil e a falta de fiscalização tem limitado
sua eficácia.
Em relação à atuação governamental,
nota-se que as esferas federal, estadual e municipal contemplam programas
nas áreas de educação, saúde, trabalho
e previdência, lazer e acessibilidade, o que indica a existência
de uma mudança em curso. Com efeito, há alguns anos
as questões relativas a este grupo sequer eram mencionadas.
A previsão de programas mostra uma gradual incorporação
da causa das pessoas portadoras de deficiência na agenda governamental,
reflexo dos avanços constitucionais.
Na esfera do governo federal, inicialmente no âmbito do Ministério
da Justiça, foi criado através da Medida Provisória
1799-6/1999 o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora
de Deficiência – órgão superior de deliberação
colegiada. Em maio de 2003, o CONADE passou a ser vinculado à Presidência
da República, por meio da Secretaria Especial de Direitos
Humanos, através da Lei 10683/2003. O CONADE tem como principal
competência, acompanhar e avaliar o desenvolvimento da Política
Nacional para in ????e ??????????tegração da Pessoa Portadora de Deficiência
e das políticas setoriais de educação, saúde,
trabalho, assistência social, transporte, cultura, turismo,
desporto, lazer e política urbana dirigidas a este grupo social.
A função de implementar a Política Nacional
e orientar sua atuação tanto do ponto de vista normativo
e regulador das ações nesta área no âmbito
federal , quanto para a articulação de políticas
públicas existentes em todas as esferas governamentais foi
instituída, por meio da Lei 7.853/89 e do Decreto 3.298/99,
a Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa
Portadora de Deficiência – órgão de Assessoria
da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência
da República,
Entretanto, títulos de programas não são indicativos
de respeito aos direitos das pessoas portadoras de deficiência.
A exemplo do que ocorre com a legislação, os inúmeros
programas e políticas públicas existentes são
elaborados sem a consulta e participação da sociedade
civil (ou com participação fictícia) e não
são implementados. Na opinião de entidades representativas
dos direitos das pessoas portadoras de deficiência, a falta
de implementação deve-se ao abismo entre as propostas
de governo e sua execução, quer seja por motivos políticos,
quer seja pela ausência de capacitação e sensibilidade
dos agentes estatais ????e ?????????? incumbidos de executá-las.
Porém, a maior dificuldade está na ausência de
conscientização da sociedade, bem como no desenvolvimento
de uma cultura inclusiva, os mais eficazes meios de garantir o respeito às
pessoas portadoras de deficiência.
Quais são as ações que o poder municipal pode
tomar para facilitar a acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência?
19)
Garantias Constituicionais: Habeas Corpus, Mandado de Segurança
e Ação Popular.
As garantias ou remédios constitucionais são ações
judiciais que permitem ao cidadão invocar a proteção
do Poder Judiciário em caso de ameaça ou de violação
de direitos humanos por um agente público. Daí a idéia
de “remédio constitucional”. São ações
constitucionalmente previstas para fazer cessar uma ameaça
ou violação de direitos fundamentais do cidadão.
O Habeas Corpus é a ação que pode ser utilizada
quando houver ameaça ou violação do direito
da liberdade de ir e vir. Nos termos do Art. 5º, inciso LXVIII,
conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer
ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação
em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso
de poder. Esse remédio geralmente é utilizado contra
????e ?????????? o abuso de autoridade policiais do poder de prisão, infelizmente,
muitas vezes praticadas ilegalmente. Trata-se de uma cultura herdada
de nossa história político-social autoritária
e arbitrária que só o fortalecimento das instituições
e práticas democráticas pode mudar. O habeas corpus
tem sido um útil instrumento para tal mudança. Trata-se,
portanto, de remédio destinado a garantir o direito de liberdade
de locomoção, liberdade de ir, vir e permanecer. Tem
natureza de ação constitucional penal.
O Mandado de Segurança é a ação constitucional
destinada a proteger as ameaças ou violações,
por autoridades ou agentes delegados, de todos os direitos que não
sejam tutelados por habeas corpus ou habeas data. A Constituição
prevê duas espécies de mandado de segurança:
o mandado de segurança individual e o mandado de segurança
coletivo. Passamos a considerar o primeiro, deixando o segundo para
o próximo item.
Dispõe a Constituição em seu Art. 5, inciso
LXIX, conceder-se-á mandado de segurança para proteger
direito líquido e certo, não amparado por “habeas
corpus” ou “habeas data”, quando o responsável
pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública
ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições
do Poder Público”.
Esse remédio, como se nota, ampara o direito pessoa ????e ??????????l líquido
e certo, ou seja, o direito expresso em norma constitucional ou legal
e que traz em si todos os requisitos para ser exercido pela pessoa
que sofre a ilegalidade ou abuso de poder por qualquer agente público
ou agente de pessoas jurídicas privadas que executem, a qualquer
título, atividades, serviços e obras públicas.
O mandado de segurança é um remédio constitucional,
com natureza de ação civil, que constitui um poderoso
instrumento em favor do cidadão contra eventuais e freqüentes
desmandos e ilegalidades praticadas pelos que ocupam cargos ou exercem
funções públicas.
A Ação Popular é também um poderoso instrumento
em favor da cidadania ativa, de vez que qualquer cidadão é parte
legítima para propor ação popular que vise a
anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade
de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao
meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural,
ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de
custas judiciais e do ônus da sucumbência (Art. 5º,
inciso LXXIII).
Essa é uma ação que visa a permitir a qualquer
cidadão que fiscalize ou denuncie o mau uso da coisa pública.
Nesse caso, o cidadão atua não apenas em seu interesse
pessoal, mas no interesse da coletividade. O autor popular faz valer
um interesse que lhe cabe como membro da comunidade. A ação
deve visar a defesa de direito ou de interesse p&uacu ????e ??????????te;blico. Trata-se
de um remédio constitucional pelo qual qualquer cidadão
fica investido de legitimidade para o exercício de um poder
de natureza essencialmente política, e constitui manifestação
direta da soberania popular, consubstanciada no Art. 1º, parágrafo único
da Constituição: todo poder emana do povo, que o exerce
por meio de seus representanes eleitos ou diretamente. Sob esse aspecto, é uma
garantia constitucional política. É uma forma de participação
do cidadão na vida pública, no exercício que
lhe pertence primariamente.
A atuação do cidadão é facilitada pela
inexistência de custas judiciais ou de encargos de sucumbência,
ou seja, o cidadão não precisa pagar nada para mover
a ação, nem se perder, salvo se a tiver movido por
má-fé, visando, por exemplo, prejudicar um inimigo
político (o que caracterizaria um desvio da finalidade pública
e impessoal da ação popular.
Vale ressaltar que assim como o habeas corpus e o mandado de segurança,
a ação popular já era admitida em Constituições
anteriores, mas a Constituição de 1988 inovou ao alargar
o objeto da ação popular para incluir a defesa e a
fiscalização cidadã da moralidade administrativa
(muitas vezes um ato administrativo legal pode ser manipulado de
forma imoral e prejudicial ao interesse publico), do meio ambiente
e do patrimônio histórico e cultural.
????e ??????????
Vale insistir que a ação popular deriva da soberania
popular e do princípio republicano. A res (coisa) é pública.
Daí a república. Se a coisa é do povo, a este
cabe o direito de fiscalizar aquilo que é seu.
Em que situação a ação popular pode ser
usada como forma de proteção dos direitos humanos ?
20)
Novas Garantias Constitucionais: Mandado de Segurança
Coletivo, Habeas Data e Mandado de Injunção.
O Mandado de Segurança Coletivo é um remédio
constitucional com as mesmas finalidades já vistas do Mandado
de Segurança Individual. A diferença reside na legitimidade
ativa (quem pode propor a ação) e no objeto (circunstâncias
e defesa de que espécies de direito). Nos termos do Art.
5º, inciso LXX, da Constituição Federal, o mandado
de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido
político com representação no Congresso Nacional;
b) organização sindical, entidade de classe ou associação
legalmente constituída e em funcionamento há pelo
menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados.
Portanto, o mandado de segurança coletivo assenta-se em
dois elementos: um, institucional, caracterizado pela atribuição
de legitimação processual a instituições
associativas ????e ?????????? para defesa de interesses de seus membros ou associados;
outro, objetivo, caracterizado pelo uso do remédio para
a defesa de interesses coletivos.
O Habeas Data é um remédio constitucional que tem
por objeto proteger a esfera íntima dos indivíduos
contra: a) usos abusivos de registros de dados pessoais coletados
por meios fraudulentos, desleais ou ilícitos; b) introdução
nesses registros de dados sensíveis (assim chamados os de
origem racial, opinião política, filosófica
ou religiosa, filiação partidária e sindical,
orientação sexual, etc.); c) conservação
de dados falsos ou com fins diversos dos autorizados em lei.
O habeas data contempla o direito de conhecer dados pessoais e
de retificá-los, tal como previsto no Art. 5º, LXXII
da Constituição: conceder-se-á habeas data:
a) para assegurar o conhecimento de informações relativas á pessoa
do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades
governamentais ou de caráter público; b) para a retificação
de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo
sigiloso, judicial ou administrativo.
Note que o direito de reconhecer e retificar os dados, assim como
o de impetrar o habeas data para fazer valer esse direito quando
não espontaneamente prestado, é personalíssimo
(exclusivo) do titular dos dados. Ninguém poderá fazê-lo
por ele. Pode-se dizer que o reconheci ????e ??????????mento do cidadão de
dispor dos dados pessoais eqüivale ao seu direito de dispor
do livremente do próprio corpo. Assim, todos temos o direito
de saber que tipo de informações o poder público
tem a nosso respeito e, se houver equívocos ou dados não
verdadeiros, temos o direito garantido por habeas data de retificá-los.
O Mandado de Injunção é uma nova garantia
instituída no Art. 5ª, inciso LXXI da Constituição
de 1988, com o seguinte enunciado: conseder-se-á mandado
de injunção sempre que a falta de normas regulamentadoras
torne inviável o exercício de direitos e liberdades
constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania
e à cidadania.
Constitui um remédio ou ação constitucional
posto à disposição de quem se considere titular
de um direito, liberdade ou prerrogativa previsto na Constituição,
mas cujo exercício depende de norma regulamentadora exigida
pela própria Constituição, mas ainda não
elaborada pelo órgão do Poder Legislativo ou Executivo
competente. Sua principal finalidade consiste assim em conferir
imediata aplicabilidade à norma constitucional portadora
daqueles direitos e prerrogativas, inerte em virtude de falta de
regulamentação. Isto deve ocorrer através
da edição de norma regulamentadora para o caso concreto
pelo próprio Poder Judiciário. Revela-se, neste ????e ?????????? sentido,
como um instrumento de realização prática
da disposição do Art. 5º, parágrafo 1º,
que estatui: as normas definidoras de direitos e garantias fundamentais
têm aplicabilidade imediata.
Portanto, podemos dizer que o mandado de injunção
foi criado pela Constituinte em atendimento ao reclamo generalizado
pela busca de uma maior efetividade do exercício de direitos
constitucionais. Contudo, é de se lamentar, que, passados
mais de quinze anos de vigência da Constituição,
inegavelmente o mandado de injunção não atendeu,
de modo significativo, às expectativas criadas com a sua
introdução. A principal causa de tal frustração
de propósitos reside na posição jurisprudencial
adotada pela maioria do Supremo Tribunal Federal (órgão
máximo do Poder Judiciário), que esvazia de funcionalidade
o novo instituto. Isto é, para o STF o mandado de injunção
não tem por finalidade tornar viável o exercício
de um direito constitucional, que se encontrava obstado por faltar
norma regulamentadora. Nna linha da decisão lavrada no julgamento
do Mandado de Injunção nº 107-3-DF, afirma-se
que:
“É
ele (o mandado de injunção)... ação
que se propõe contra o Poder, órgão, entidade
ou autoridade omissos quanto a norma regulamentadora necessária à viabilização
do exercício do ????e ??????????s direitos, garantias e prerrogativas a que
alude o art. 5º, LXXI da Constituição, e que
se destina a obter sentença que declare a ocorrência
da omissão constitucional, com a finalidade de que se dê ciência
ao omisso dessa declaração, para que adote as providências
necessárias,...”
Vê-se que o entendimento do Supremo Tribunal Federal foi
no sentido de que o mandado de injunção tem natureza
mandamental (ou seja, através dele o judiciário “manda” que
o poder omisso supra a omissão), o sujeito passivo, contra
quem se move o mandado, é o poder órgão ou
entidade omissos, e a finalidade da ação é a
declaração da omissão, com mera ciência
ao omisso para que adote as providências necessárias.
Ocorre que, geralmente, o poder omisso é o Legislativo Federal,
corporificado no Congresso Nacional, ou o poder Executivo, os quais
tomam ciência da declaração de sua omissão,
mas não tomam qualquer providência para supri-la.
Ou seja, a interpretação dada ao mandado de injunção
pelo Supremo Tribunal Federal (STF) torna o remédio constitucional
inócuo. Ao isentar-se de prover a norma regulamentadora
para o caso concreto, o poder Judiciário acaba também
por se tornar omisso diante de um remédio constitucional
criado justamente para suprir omissões que inviabilizem
o exercício de direitos.
????e ?????????? Diante da crítica generalizada e com a recente nomeação
de três novos Ministros para o STF, renasce a esperança
de que o remédio constitucional venha a cumprir sua finalidade.
Imagine uma situação, em seu município, na
qual o mandado de segurança coletivo poderia ser usado para
impedir a violação de um direito?