Coleção
Memória das Lutas Populares no RN
Aldemir Lemos
Textos
sobre Aldemir Lemos
Aldemir
Lemos
Geraldo Pinto, Geraldão
Conheci o velho Aldemir
Lemos na vitória do movimento por um novo sindicalismo no
Sindicato dos Comerciários em 1987. Recém-chegado
a Natal, militava eu na Convergência Socialista, fração
do PT e da CUT, ele então máximo dirigente do PCBR
no estado.
O BR como era chamada
a corrente a qual o velho pertencia, estava no ocaso após
uma infeliz operação em Salvador que custou a alcunha
da responsabilidade. Aqui Aldemir representava uma esquerda muito
ligada à base, sem burocratismos e burocracia, mas também
sem qualquer institucionalidade, marca essa que Aldemir carrega
até hoje.
Aldemir Lemos é
um orgulho para a esquerda potiguar! Seus cabelos brancos e a barba
prateada, às vezes amarelada, testemunham um militante que
não se corrompeu ao canto da sereia do burocratismo sindical,
sempre viveu uma vida simples e nunca se locupletou. Na presidência
da CUT, a despeito de um viés stalinista herdado do velho
Pecebão, conviveu com trotskystas, anarquistas, o MST, sociais-democratas
e outros tantos tipos das várias matizes da esquerda.
Incompreendido muitas
vezes pela forma, às vezes sem o refino como queriam os jovens
professores universitários (muitos dos quais fundaram o PT
anos antes), Aldemir sempre foi um militante incansável.
De domingo a domingo
vive para a luta por um mundo de igualdade, justiça e fraternidade.
Mas a marca do Velho
na militância, além da disposição é
a língua e seus causos. Alguns deles eu vivi e compartilho
três delas com os amigos.
Em
1990 houve Congresso Nacional da CUT precedido das etapas estaduais.
Quatro teses disputavam a hegemonia nas terras de Poti - a da maioria
- PCBR, a da CUT pela Base, a da Articulação e a da
Convergência. Então dirigente dos Petroleiros, além
de dirigente da CUT estadual, tinha eu sido demitido por uma greve
de enfrentamento às demissões, fui defender a tese
da Convergência com muita eloquência que dizia em um
dos itens: “Collor tem os pés de barro”,
expressando a posição que se tratava de um governo
fraco, a tese do CUT pela Base era muito prolixa, e o velho nem
tratou de atacar, mas em seu discurso veio prá cima de mim
e disse:
- Gordo! A Convergência diz que Collor tem os pés
de barro, pode até ser, mas o cacete dele é de aço
e tá botando no c* da classe trabalhadora, veja você
foi fazer a greve e agora está demitido!
Risos da platéia
e a compreensão de que a caracterização era
um exagero político, a despeito de Collor não ter
base parlamentar nem social e de cair dois anos depois, o estrago
neoliberal foi feito e as privatizações foram levadas
a cabo.
Outra vez, em 2000, eu
tinha retornado a militância petista em 1997, mas não
tinha me organizado em nenhuma tendência. O velho acompanhado
de Fernando Mineiro, Marcelo Souza e Chagas (hoje Secretário
de Educação do RN) foram à minha casa discutir
a tese da Revolução Democrática, base teórica
do campo majoritário e me convidar para viajarmos o estado
discutindo com algumas lideranças.
Sairíamos
numa sexta-feira e retornaríamos no domingo fazendo um périplo
em Santa Cruz, Caicó, Jardim de Piranhas, Pau dos Ferros,
Apodi, Caraúbas, Campo Grande, Mossoró, Assu, Lajes
e retornando a Natal, num total de quase mil quilômetros.
Revezávamos á direção e na noite de
domingo, já de retorno a Natal, os outros três dormindo
no banco de trás, o velho me interroga sobre o que eu achava
desse negócio de Revolução Democrática.
- Como é essa Revolução? Não vai
ter um tiro? Um exército? A tomada do palácio?
E eu pus a explicar o que entendia da tese e o que estava escrito.
Ele retrucou:
- Não concordo que isso é Revolução,
prá mim é reformismo! Sentenciou.
Uma
parada a fim de fazer xixi no meio da estrada, fui apanhar a bolsa
no porta-malas e o velho olha para as estrelas e admirando o céu
fala tal qual Catulo da Paixão Cearense, só que sem
a lua:
- Como é lindo o céu do sertão e esse brilho
das estrelas!
Eu, como geofísico e sem qualquer dose de poético
retruquei:
- Mas o que você está vendo é só
o brilho, as estrelas não existem mais.
-Como assim? Indaga o Velho.
- É que elas tem cerca de 4 bilhões de anos de vida
e a luz demora esses 4 bilhões ou mais para chegar até
aqui na Terra. Assim só assistimos ao brilho, mas elas não
existem mais e se viajarmos ao seu encontro estaremos indo em busca
do passado.
Pragmaticamente o Velho disse:
- Aí é que eu não acredito mesmo, melhor
voltar para essa tua Revolução Democrática
aí!
Assim é o velho.
Simples, direto sem arrodeio.
Poderia ser um intelectual
orgânico, mas se recusa sempre às formalidades da superestrutura.
Faz da práxis a permanente ressignificação
das suas teorias.
Leal, honesto, não
tem hipocrisia nem papas na língua. Os amigos ele cultua
com uma amizade sincera e os inimigos podem ficar tranquilos que
ele só vai feri-los com a língua.
Mas de uma coisa a esquerda
potiguar pode se orgulhar: da vida de Aldemir Lemos. Um militante
socialista sem trégua e sem se vergar aos dominantes nem
às tentações do capitalismo que nestes tempos
turbulentos dominaram tantos companheiros históricos.
LONGA
VIDA A ALDEMIR LEMOS!
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